27.04.2017 Views

#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

o mais extensivamente possível, segun<strong>do</strong> esta corrente, para que as normas <strong>do</strong> CDC possam ser aplicadas a um número cada vez<br />

maior <strong>de</strong> relações <strong>de</strong> consumo”.15<br />

Entre os maximalistas, <strong>de</strong>staca-se o trabalho muito bem articula<strong>do</strong> <strong>de</strong> Alinne Arquette Leite Novaes, que lhe valeu o título <strong>de</strong><br />

mestre em <strong>Direito</strong> Civil pela Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> da Universida<strong>de</strong> Estadual <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, sob a orientação <strong>do</strong> Professor<br />

Gustavo Tepedino. Nessa obra, a partir <strong>de</strong> uma interpretação <strong>do</strong> art. 29 <strong>do</strong> Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r – que traz o conceito<br />

<strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r por equiparação ou bystan<strong>de</strong>r –, a <strong>do</strong>utrina<strong>do</strong>ra <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que o Código Consumerista <strong>de</strong>ve ser aplica<strong>do</strong> a to<strong>do</strong>s os<br />

contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, aqueles com conteú<strong>do</strong> imposto por uma das partes. Vale transcrever as suas palavras finais, conclusivas <strong>do</strong><br />

cita<strong>do</strong> trabalho:<br />

“Concluímos, então, dizen<strong>do</strong> que o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r é totalmente aplicável aos contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, em virtu<strong>de</strong> da<br />

extensão <strong>do</strong> conceito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r, equiparan<strong>do</strong> a este todas as pessoas expostas às práticas previstas nos seus Capítulos V e VI,<br />

estan<strong>do</strong>, como é sabi<strong>do</strong>, os contratos <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são disciplina<strong>do</strong>s <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sse último. E isso ocorre porque a intenção <strong>do</strong> legisla<strong>do</strong>r, ao<br />

elaborar o Código <strong>de</strong> Defesa <strong>do</strong> Consumi<strong>do</strong>r, foi garantir justiça e equida<strong>de</strong> aos contratos realiza<strong>do</strong>s sob sua égi<strong>de</strong>, para equilibrar<br />

partes contratuais em posições diferentes, tutelan<strong>do</strong> <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> especial o partícipe contratual, que julgou ser vulnerável. Assim,<br />

enten<strong>de</strong>u o legisla<strong>do</strong>r que a simples exposição às práticas por ele previstas no CDC era suficiente para gerar uma situação <strong>de</strong><br />

insegurança e <strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong>, consi<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>, portanto, que o simples fato <strong>de</strong> se submeter a um contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são colocava o<br />

a<strong>de</strong>rente em posição inferior, se equiparan<strong>do</strong> ao consumi<strong>do</strong>r”.16<br />

Com to<strong>do</strong> o respeito que merece, não se filia a tal forma <strong>de</strong> pensar, eis que, conforme o Enuncia<strong>do</strong> n. 171 <strong>do</strong> CJF/STJ,<br />

aprova<strong>do</strong> na III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Civil, o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, menciona<strong>do</strong> pelos arts. 423 e 424 <strong>do</strong> CC, não se confun<strong>de</strong> com o<br />

contrato <strong>de</strong> consumo. Ora, para a caracterização <strong>do</strong> contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, leva-se em conta a forma <strong>de</strong> contratação, haven<strong>do</strong> uma<br />

imposição, por uma das partes da relação negocial. Por outra via, o contrato <strong>de</strong> consumo tem como conteú<strong>do</strong> os elementos<br />

subjetivos e objetivos que aqui estão sen<strong>do</strong> expostos.<br />

Na prática, é comum que o contrato <strong>de</strong> consumo seja <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, e vice-versa. Mas não necessariamente, pois o contrato po<strong>de</strong><br />

ser <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são sem ser <strong>de</strong> consumo. Cite-se, por exemplo, o contrato <strong>de</strong> franquia ou franchising, na relação franquea<strong>do</strong>r e<br />

franquea<strong>do</strong>. Para o último é imposto, na gran<strong>de</strong> maioria das situações, o conteú<strong>do</strong> <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o negócio, por meio <strong>do</strong> manual <strong>do</strong><br />

franquea<strong>do</strong>. Porém, o franquea<strong>do</strong> não é consumi<strong>do</strong>r, pois não é <strong>de</strong>stinatário final fático e econômico <strong>do</strong>s produtos ou serviços<br />

(nesse senti<strong>do</strong>, por to<strong>do</strong>s: TJRS – Apelação Cível 70031345077, Porto Alegre – Décima Oitava Câmara Cível – Rel. Des. Pedro<br />

Celso Dal Prá – j. 10.09.2009 – DJERS 18.09.2009, p. 103; e TJSP, Agravo <strong>de</strong> Instrumento 7343481-2 – Acórdão n. 3616551, São<br />

Paulo – Vigésima Quarta Câmara <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong> – Rel. Des. Salles Vieira – j. 23.04.2009 – DJESP 01.06.2009).<br />

A propósito, ainda no que diz respeito à franquia, recente julgamento <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, publica<strong>do</strong> no seu<br />

Informativo n. 569, aduz que “no contrato <strong>de</strong> franquia empresarial, estabelece-se um vínculo associativo entre socieda<strong>de</strong>s<br />

empresárias distintas, o qual, conforme a <strong>do</strong>utrina, caracteriza-se pelo ‘uso necessário <strong>de</strong> bens intelectuais <strong>do</strong> franquea<strong>do</strong>r<br />

(franchisor) e a participação no aviamento <strong>do</strong> franquea<strong>do</strong> (franchise)’. Dessa forma, verifica-se, novamente com base na <strong>do</strong>utrina,<br />

que o contrato <strong>de</strong> franquia tem relevância apenas na estrita esfera das empresas contratantes, traduzin<strong>do</strong> uma clássica obrigação<br />

contratual inter partes. A<strong>de</strong>mais, o STJ já <strong>de</strong>cidiu por afastar a incidência <strong>do</strong> CDC para a disciplina da relação contratual entre<br />

franquea<strong>do</strong>r e franquea<strong>do</strong> (AgRg no REsp 1.193.293/SP – Terceira Turma – DJe 11.12.2012; e AgRg no REsp 1.336.491/SP –<br />

Quarta Turma – DJe 13.12.2012). Aos olhos <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, entretanto, trata-se <strong>de</strong> mera intermediação ou revenda <strong>de</strong> bens ou<br />

serviços <strong>do</strong> franquea<strong>do</strong>r, que é fornece<strong>do</strong>r no merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> consumo, ainda que <strong>de</strong> bens imateriais. Aliás, essa arquitetura comercial<br />

– na qual o consumi<strong>do</strong>r tem acesso a produtos vincula<strong>do</strong>s a uma empresa terceira, estranha à relação contratual diretamente<br />

estabelecida entre consumi<strong>do</strong>r e ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r – não é novida<strong>de</strong> no cenário consumerista e, além disso, não ocorre apenas nos contratos<br />

<strong>de</strong> franquia. Desse mo<strong>do</strong>, extrain<strong>do</strong>-se <strong>do</strong>s arts. 14 e 18 <strong>do</strong> CDC a responsabilização solidária por eventuais <strong>de</strong>feitos ou vícios <strong>de</strong><br />

to<strong>do</strong>s que participem da introdução <strong>do</strong> produto ou serviço no merca<strong>do</strong> (REsp 1.058.221/PR – Terceira Turma – DJe 14.10.2011; e<br />

REsp 1.309.981/SP – Quarta Turma – DJe 17.12.2013) – inclusive daqueles que organizem a ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fornecimento –, as<br />

franquea<strong>do</strong>ras atraem para si responsabilida<strong>de</strong> solidária pelos danos <strong>de</strong>correntes da ina<strong>de</strong>quação <strong>do</strong>s serviços presta<strong>do</strong>s em razão da<br />

franquia, ten<strong>do</strong> em vista que cabe a elas a organização da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> franquea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> serviço” (STJ – REsp 1.426.578/SP – Rel. Min.<br />

Marco Aurélio Bellizze – j. 23.06.2015, DJe 22.09.2015).<br />

Em suma, a correta conclusão <strong>do</strong> acórdão é no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que entre franquea<strong>do</strong>r e franquea<strong>do</strong>, internamente, não há uma<br />

relação <strong>de</strong> consumo. Todavia, tal relação está presente frente aos adquirentes finais <strong>do</strong>s produtos e <strong>do</strong>s serviços advin<strong>do</strong>s <strong>de</strong>sse<br />

negócio, haven<strong>do</strong> solidarieda<strong>de</strong> entre franquea<strong>do</strong>r e franquea<strong>do</strong> frente ao consumi<strong>do</strong>r, nos casos da presença <strong>de</strong> vícios <strong>do</strong> produto<br />

ou <strong>do</strong> serviço, conforme será <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong> no próximo capítulo <strong>de</strong>sta obra.<br />

Seguin<strong>do</strong> no estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> tema, a rebater a visão maximalista, <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista organizacional e meto<strong>do</strong>lógico <strong>do</strong> sistema<br />

jurídico, o Código Civil <strong>de</strong> 2002 não po<strong>de</strong> per<strong>de</strong>r total prestígio diante <strong>do</strong> CDC, como lei central <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Priva<strong>do</strong>. A<strong>de</strong>mais,

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!