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#Manual de Direito do Consumidor (2017) - Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpsção Neves

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elação com a teoria da perda <strong>do</strong> tempo útil, analisada a seguir.<br />

Ainda para ilustrar a respeito <strong>do</strong>s transtornos, <strong>do</strong> Informativo n. 463 <strong>do</strong> STJ extrai-se ementa segun<strong>do</strong> a qual o envio ao<br />

consumi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> cartão pré-pago não gera dano moral, haven<strong>do</strong> apenas uma má-prestação <strong>de</strong> serviços, sem maiores repercussões no<br />

campo <strong>de</strong> prejuízos:<br />

“Dano moral. Cartão megabônus. O envio ao consumi<strong>do</strong>r <strong>do</strong> <strong>de</strong>nomina<strong>do</strong> cartão megabônus (cartão pré-pago vincula<strong>do</strong> a programa<br />

<strong>de</strong> recompensas) com informações que levariam a crer tratar-se <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>iro cartão <strong>de</strong> crédito não dá ensejo à reparação <strong>de</strong> dano<br />

moral, apesar <strong>de</strong> configurar, conforme as instâncias ordinárias, má prestação <strong>de</strong> serviço ao consumi<strong>do</strong>r. Mesmo constata<strong>do</strong> causar<br />

certo incômo<strong>do</strong> ao contratante, o envio não repercute <strong>de</strong> forma significativa na esfera subjetiva <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r. Também assim, a<br />

tentativa <strong>de</strong> utilizar o cartão como se fosse <strong>de</strong> crédito não vulnera a dignida<strong>de</strong> <strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r, mostran<strong>do</strong>-se apenas como mero<br />

dissabor. Anote-se haver multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ações que buscam essa reparação (mais <strong>de</strong> 60 mil) e que já foi editada a Súm. 149-TJRJ,<br />

<strong>do</strong> mesmo teor <strong>de</strong>ste julgamento. Prece<strong>de</strong>ntes cita<strong>do</strong>s: REsp 1.072.308-RS, DJe 10.06.2010; REsp 876.527-RJ, DJe 28.04.2008;<br />

REsp 338.162-MG, DJ 18.02.2002; REsp 590.512-MG, DJ 17.12.2004, e REsp 403.919-MG, DJ 04.08.2003” (STJ – REsp<br />

1.151.688-RJ – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – j. 17.02.2011).<br />

Na mesma linha, tem-se entendi<strong>do</strong>, naquela Corte Superior, que o mero lançamento <strong>de</strong> valor incorreto na cobrança <strong>do</strong> cartão<br />

<strong>de</strong> crédito, por si só, não gera dano moral in<strong>de</strong>nizável. Nos termos <strong>de</strong> aresto publica<strong>do</strong> no seu Informativo n. 479, que elenca várias<br />

situações que servem <strong>de</strong> ilustração, “não há dano moral in re ipsa quan<strong>do</strong> a causa <strong>de</strong> pedir da ação se constitui unicamente na<br />

inclusão <strong>de</strong> valor in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong> na fatura <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito <strong>de</strong> consumi<strong>do</strong>r. Assim como o saque in<strong>de</strong>vi<strong>do</strong>, também o simples<br />

recebimento <strong>de</strong> fatura <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito na qual incluída cobrança in<strong>de</strong>vida não constitui ofensa a direito da personalida<strong>de</strong><br />

(honra, imagem, privacida<strong>de</strong>, integrida<strong>de</strong> física); não causa, portanto, dano moral objetivo, in re ipsa. Aliás, o STJ já se<br />

pronunciou no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a cobrança in<strong>de</strong>vida <strong>de</strong> serviço não contrata<strong>do</strong>, da qual não resultara inscrição nos órgãos <strong>de</strong><br />

proteção ao crédito, ou até mesmo a simples prática <strong>de</strong> ato ilícito não têm por consequência a ocorrência <strong>de</strong> dano moral (AgRg no<br />

AREsp 316.452-RS, Quarta Turma, DJe 30/9/2013; e AgRg no REsp 1.346.581-SP, Terceira Turma, DJe 12/11/2012). Além<br />

disso, em outras oportunida<strong>de</strong>s, enten<strong>de</strong>u o STJ que certas falhas na prestação <strong>de</strong> serviço bancário, como a recusa na aprovação <strong>de</strong><br />

crédito e bloqueio <strong>de</strong> cartão, não geram dano moral in re ipsa (AgRg nos EDcl no AREsp 43.739-SP, Quarta Turma, DJe<br />

4/2/2013; e REsp 1.365.281-SP, Quarta Turma, DJe 23/8/2013). Portanto, o envio <strong>de</strong> cobrança in<strong>de</strong>vida não acarreta, por si só,<br />

dano moral objetivo, in re ipsa, na medida em que não ofen<strong>de</strong> direito da personalida<strong>de</strong>. A configuração <strong>do</strong> dano moral <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá<br />

da consi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> peculiarida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> caso concreto, a serem alegadas e comprovadas nos autos. Com efeito, a jurisprudência tem<br />

entendi<strong>do</strong> caracteriza<strong>do</strong> dano moral quan<strong>do</strong> evi<strong>de</strong>ncia<strong>do</strong> abuso na forma <strong>de</strong> cobrança, com publicida<strong>de</strong> negativa <strong>de</strong> da<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

consumi<strong>do</strong>r, reiteração da cobrança in<strong>de</strong>vida, inscrição em cadastros <strong>de</strong> inadimplentes, protesto, ameaças <strong>de</strong>scabidas, <strong>de</strong>scrédito,<br />

coação, constrangimento, ou interferência malsã na sua vida social, por exemplo (REsp 326.163-RJ, Quarta Turma, DJ<br />

13/11/2006; e REsp 1.102.787-PR, Terceira Turma, DJe 29/3/2010). Esse entendimento é mais compatível com a dinâmica atual<br />

<strong>do</strong>s meios <strong>de</strong> pagamento, por meio <strong>de</strong> cartões e internet, os quais facilitam a circulação <strong>de</strong> bens, mas, por outro la<strong>do</strong>, ensejam<br />

frau<strong>de</strong>s, as quais, quan<strong>do</strong> ocorrem, <strong>de</strong>vem ser coibidas, propician<strong>do</strong>-se o ressarcimento <strong>do</strong> lesa<strong>do</strong> na exata medida <strong>do</strong> prejuízo”<br />

(STJ – REsp 1.550.509/RJ – Rel. Min. Maria Isabel Gallotti – j. 03.03.2016 – DJe 14.03.2016).<br />

O que se concluiu, acertadamente, é que o mero <strong>de</strong>scumprimento <strong>do</strong> negócio <strong>de</strong> consumo ou a má-prestação <strong>do</strong> serviço, por si,<br />

não gera dano moral ao consumi<strong>do</strong>r. Pelo bom senso, pela equida<strong>de</strong> e pelas máximas <strong>de</strong> experiência, <strong>de</strong>ve estar evi<strong>de</strong>nciada a<br />

lesão aos direitos da personalida<strong>de</strong>, para que se possa falar em dano imaterial reparável. Isso, para que o nobre instituto <strong>do</strong> dano<br />

moral não caia em <strong>de</strong>sprestígio.<br />

Um caso em que a lesão a direito da personalida<strong>de</strong> parece estar presente diz respeito à situação concreta em que o consumi<strong>do</strong>r<br />

envia uma carta registrada que não atinge o seu <strong>de</strong>stinatário. Como bem pontuou a Segunda Seção <strong>do</strong> Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça,<br />

em acórdão publica<strong>do</strong> no ano <strong>de</strong> 2015, “a contratação <strong>de</strong> serviços postais ofereci<strong>do</strong>s pelos Correios, por meio <strong>de</strong> tarifa especial,<br />

para envio <strong>de</strong> carta registrada, que permite o posterior rastreamento pelo próprio órgão <strong>de</strong> postagem revela a existência <strong>de</strong> contrato<br />

<strong>de</strong> consumo, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> a fornece<strong>do</strong>ra respon<strong>de</strong>r objetivamente ao cliente por danos morais advin<strong>do</strong>s da falha <strong>do</strong> serviço quan<strong>do</strong> não<br />

comprovada a efetiva entrega. É incontroverso que o embarga<strong>do</strong> sofreu danos morais <strong>de</strong>correntes <strong>do</strong> extravio <strong>de</strong> sua<br />

correspondência, motivo pelo qual o montante in<strong>de</strong>nizatório fixa<strong>do</strong> em R$ 1.000,00 (mil reais) pelas instâncias ordinárias foi<br />

manti<strong>do</strong> pelo acórdão proferi<strong>do</strong> pela Quarta Turma, porquanto razoável, sob pena <strong>de</strong> enriquecimento sem causa” (STJ – EREsp<br />

1.097.266/PB – Rel. Min. Ricar<strong>do</strong> Villas Bôas Cueva – Segunda Seção – j. 10.12.2014 – DJe 24.02.2015). Lamenta-se apenas o<br />

valor que foi fixa<strong>do</strong> a título <strong>de</strong> reparação imaterial, irrisório na opinião <strong>de</strong>ste autor.<br />

Assim, <strong>de</strong>ve-se atentar para louvável ampliação <strong>do</strong>s casos <strong>de</strong> dano moral, em que está presente um aborrecimento relevante,<br />

notadamente pela perda <strong>do</strong> tempo útil. Essa ampliação <strong>de</strong> situações danosas, inconcebíveis no passa<strong>do</strong>, representa um caminhar<br />

para a reflexão da responsabilida<strong>de</strong> civil sem dano, na nossa opinião. Como bem exposto por Vitor Guglinski, “a ocorrência

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