REBOSTEIO Nº 1
Revista REBOSTEIO DIGITAL número um - entrevistas, arte, cultura, poesia, literatura, comportamento, cinema, fotografia, artes plásticas.
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Neste número especial de Rebosteio,<br />
um depoimento<br />
de primeira grandeza. Dispensamos a tradicional<br />
entrevista para apresentar a vocês Letícia Lanz e sua<br />
história, que foge a todos os padrões pré-estabelecidos<br />
sobre gênero, sexualidade, afetividade.<br />
Sua clareza nos surpreendeu desde o primeiro<br />
momento. Sua simpatia, posteriormente em<br />
contato conosco, resultou em futura parceria<br />
nos próximos números da revista.<br />
Conheça agora alguém que rompeu<br />
corajosamente com a ditadura do gênero.<br />
Ao nascer (ou até muito antes disso, ainda no<br />
útero de nossas mães…), com base exclusiva no<br />
órgão genital que trazemos entre as pernas,<br />
somos enquadrados em uma das duas únicas<br />
categorias oficiais de pessoas que a sociedade<br />
“autoriza” existir nesse mundo. Quem nasce<br />
macho, isto é, com um pinto, é chamado de<br />
homem e quem nasce fêmea, ou seja, com uma<br />
vagina, é chamado de mulher. Embora baseada<br />
tão somente no órgão genital do bebê, essa<br />
rotulação condiciona, de maneira drástica e<br />
definitiva, tudo o que o recém-nascido poderá ou<br />
não fazer da sua vida durante sua (breve) estadia<br />
nesse planeta. Através dessa apropriação do<br />
“sexo biológico” e de sua transformação em<br />
“sexo social”, a Sociedade cria e mantém o mais<br />
poderoso dispositivo de controle sobre os seus<br />
membros: – o “Gênero”. Assim, dessa forma,<br />
arrogante e arbitrária – e não através de uma<br />
herança genética determinista como,<br />
ingenuamente, a maioria das pessoas continua<br />
acreditando – são criados e perpetuados os<br />
padrões de conduta, os papéis e as funções<br />
específicas que “machos” e “fêmeas” biológicos<br />
deverão desempenhar dentro da comunidade e<br />
da época em que viverem.<br />
Talvez não seja pura coincidência que essas duas<br />
categorias sociais – “homem” e “mulher” ou<br />
“masculino” e “feminino” – sejam chamadas de<br />
“gênero”. O gênero é uma “ultra-super-mais-doq<br />
u e ” g e n e r a l i z a ç ã o , u m a g r o s s e i r a<br />
“simplificação” das infinitas e totalmente<br />
singulares possibilidades de expressão de cada<br />
ser humano. Por causa do gênero, a maioria das<br />
pessoas – sem saber disso – passam a vida<br />
confinadas dentro de uma “camisa-de-força<br />
social”, impedidas de explorar e de manifestar ao<br />
mundo aspectos absolutamente fundamentais da<br />
sua individualidade.<br />
Todo o imenso arcabouço psico-sócio-políticoeconômico<br />
da nossa sociedade repousa na<br />
divisão dos seres humanos nesses dois grupos<br />
distintos: – masculino e feminino. É com base<br />
nessa plataforma binária, simplista e totalmente<br />
“sexualizada”, que a sociedade identifica, separa<br />
e classifica seus bilhões de membros, pouco se<br />
importando que eles se sintam ou não<br />
confortáveis dentro do “'rótulo social” que<br />
receberam ao nascer.<br />
Muitos, realmente, jamais se sentem. Eu sou um<br />
deles.<br />
Quem não se adequa ao rótulo de gênero<br />
recebido ao nascer torna-se, obviamente, um<br />
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