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Revista Curinga Edição 05

Revista Laboratorial do Curso de Graduação em Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto.

Revista Laboratorial do Curso de Graduação em Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto.

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<strong>Curinga</strong><br />

<strong>Revista</strong> Laboratório | Comunicação Social - Jornalismo | UFOP<br />

Abril de 2013 | Ano III | n º <strong>05</strong><br />

ATÉ ONDE VAI<br />

A SUA<br />

LIBERDADE?<br />

1


,<br />

<strong>Curinga</strong><br />

Expediente<br />

<strong>Curinga</strong> é uma publicação da disciplina<br />

Laboratório Impresso II – <strong>Revista</strong> produzida<br />

pelos alunos do curso de Jornalismo da Ufop<br />

Universidade Federal de Ouro Preto.<br />

Editor geral e jornalista responsável<br />

Frederico Tavares - 11311/MG<br />

Editora de planejamento visual<br />

Priscila Borges<br />

Editor de Fotografia<br />

Anderson Medeiros<br />

Editor geral<br />

Thiago Guimarães<br />

Subeditora<br />

Thalita Neves<br />

Editor fotográfico<br />

Gabriel Sales<br />

Editora de arte<br />

Giovana Bressani<br />

Subeditora de Arte<br />

Nathália Barreto<br />

Editor digital<br />

Jorge Lelis<br />

Editores e revisores<br />

Greiza Tavares, Lázaro Borges,<br />

Lidiane Andrade, Luiza Barufi,<br />

Mayara Coutrim, Maysa Souza, Rafael Camara<br />

Repórteres<br />

Alice Piermatei, Flávia Pupo, Jéssica Michellin,<br />

João Felipe Lolli, Kael Ladislau, Kamilla Abreu, Lais Queiroz,<br />

Lorena Silva, Maressa Nunes, Mickael Barbieri<br />

Diagramadores<br />

Ana Luísa Ruggieri, Camila Maia, Eduardo Braga, Janini<br />

Sanches, Laio Monteiro, Luisa Oliveira,<br />

Mateus Meirelles, Pablo Gomes<br />

Fotógrafos<br />

Aline Barreira, Di Anna Lourenço, Flávia Rodrigues,<br />

Gustavo Aureliano, Jamylle Mol,<br />

Natalia Ambrósio, Ricardo Maia<br />

Produtores digitais<br />

Flávio Ulhoa, Joenalva Porto,<br />

Leonardo Alves, Marcela Servano<br />

Nicole Alves, Renata Felício, Yasmini Gomes<br />

Endereço<br />

Rua do Catete 166, Centro, CEP 35420-000<br />

Mariana-MG<br />

Tiragem<br />

1.500 exemplares<br />

Abril 2013<br />

Cartas do leitor<br />

Para comentar as matérias ou sugerir pautas para nossa<br />

próxima edição, envie e-mail para<br />

revistacuringa@icsa.ufop.br


Editorial<br />

Thiago Guimarães e<br />

Thalita Neves<br />

Construir, desconstruir.<br />

Produzir, reproduzir. Viver<br />

em sociedade traz dilemas<br />

de como se posicionar frente<br />

a conceitos que circulam<br />

no nosso meio. Nesta edição,<br />

a <strong>Curinga</strong> discute a<br />

construção de padrões e os<br />

mecanismos que os tornam<br />

legítimos. Colocamos você,<br />

leitor, como peça fundamental<br />

desse processo que,<br />

com a popularização das<br />

redes sociais, torna-se cada<br />

vez mais abrangente, fazendo<br />

da consolidação de tendências<br />

e conceitos uma via<br />

de múltiplas possibilidades.<br />

A construção de padrões,<br />

quando não estabelecida de<br />

forma colaborativa, e sim<br />

impositiva, configura-se<br />

como uma Ditadura. Como<br />

então detectar Ditaduras<br />

presentes no cotidiano de<br />

nossas ações? Fomos às<br />

ruas e problematizamos a<br />

questão. A política ditatorial<br />

por trás de uma falsa democratização,<br />

a linguagem persuasiva<br />

das propagandas, os<br />

padrões de comportamento<br />

e beleza impostos pela mídia,<br />

os reflexos da censura<br />

no próprio fazer midiático,<br />

são temas que nos desafiaram<br />

a trazer uma reflexão<br />

que pluralize e democratize<br />

visões e opiniões. Explore<br />

suas ideias, quebre regras,<br />

faça seu jogo. As cartas estão<br />

na mesa!


Sumário<br />

6<br />

10<br />

12<br />

18<br />

22<br />

Entrevista<br />

Crônica<br />

Comunicação para quem?<br />

Alegria, alegria!<br />

Infográfico


24<br />

28<br />

29<br />

33<br />

34<br />

Uma geração do contra<br />

Palco<br />

Perfil<br />

E Aí?<br />

Quebrando Regras<br />

36<br />

42<br />

O pop nosso de cada dia<br />

Coluna


Entrevista<br />

MEMÓRIA MARCADA<br />

Os jornalistas Sérgio Gomes e Audálio Dantas participaram da mesa de<br />

debate “Os jornalistas e a Ditadura Militar” - que aconteceu no dia 13 de março<br />

durante a IV SECOM da UFOP - e compartilharam suas experiências na luta<br />

pela democracia durante os “Anos de Chumbo”.<br />

Texto: Flávia Pupo<br />

<strong>Edição</strong> Gráfica: Luisa Oliveira<br />

Foto: Di Anna Lourenço<br />

Sérgio Gomes<br />

Sérgio Gomes<br />

6<br />

AUDÁLIO DANTAS


“Desilusão, desilusão<br />

Danço eu, dança você<br />

na dança da solidão”<br />

Essa música do cantor Paulinho da Viola tem história<br />

para Sérgio Gomes. “O que é o contrário da solidão e começa<br />

com S? Solidariedade. Quem já passou por uma situação<br />

em que foi objeto da solidariedade ou pôde ser realmente<br />

solidário, aconteça o que acontecer, nunca mais é igual”,<br />

afirma o jornalista.<br />

Assim como para Sérgio, as marcas deixadas pela experiência<br />

da Ditadura Militar também acompanham a<br />

biografia de Audálio Dantas de forma indelével. “Quando<br />

falam que eu tenho 60 anos de profissão não é verdade,<br />

eu tenho 20 anos de ofício, porque o exercício da profissão<br />

terminou ali, em 1975. Eu não conseguia mais voltar para o<br />

dia-a-dia do jornalismo, que era a minha paixão”.<br />

Para ambos, as lembranças daquele período, sejam elas<br />

da coletividade, da solidariedade, da mobilização ou de<br />

submissões e renúncias estão refletidas no Brasil de hoje e<br />

nos rumos que suas vidas tomaram.<br />

Em entrevista à 5ª edição da revista <strong>Curinga</strong>, os jornalistas<br />

expuseram opiniões em relação à sociedade brasileira,<br />

ao governo atual e à instauração da democracia. Mesmo<br />

com angulações diferentes e opiniões bem definidas, os<br />

dois compartilham uma visão semelhante: há ineficiência<br />

do poder público sobre os esclarecimentos acerca dos episódios<br />

da época e sobre a baixa mobilização da sociedade<br />

diante dos problemas herdados.<br />

Atualmente professor da PUC-SP, diretor do projeto<br />

OBORÉ - Projetos Especiais em Comunicação e Arte e atuante<br />

direto na militância do período da Ditadura Militar no<br />

Brasil, Sérgio Gomes foi preso e torturado pelos militares,<br />

junto com Vladimir Herzog. Audálio Dantas presidiu o Sindicato<br />

dos Jornalistas de São Paulo no período da Ditadura<br />

e, atualmente, preside a Comissão da Verdade da Fenaj<br />

(Federação Nacional dos Jornalistas). Neste ano, lançou o<br />

livro “As duas guerras de Vlado Herzog”.<br />

7


Audálio Dantas<br />

<strong>Curinga</strong>: Você foi<br />

presidente do Sindicato<br />

dos Jornalistas Profissionais<br />

do Estado de São Paulo<br />

durante a Ditadura. Militar<br />

Como foi essa luta pela<br />

liberdade de imprensa?<br />

Audálio: Os jornalistas<br />

vinham sofrendo um<br />

problema fundamental: a<br />

questão da censura. Quando<br />

a diretoria que presidi<br />

foi eleita, tinha um propósito<br />

muito mais trabalhista<br />

do que sindical. Ela queria<br />

lutar contra a censura que<br />

atingia não só os jornalistas,<br />

mas também a sociedade.<br />

O Sindicato dos Jornalistas<br />

foi transformado<br />

numa espécie de trincheira.<br />

Era procurado por pessoas<br />

cujos membros da família,<br />

amigos e colegas de profissão<br />

estavam sendo presos e<br />

torturados.<br />

C: Como seu livro “As Duas<br />

Guerras de Vlado Herzog”<br />

relata esse período?<br />

A: O principal objetivo<br />

do livro foi reconstituir a<br />

história do ponto de vista<br />

do Sindicato dos Jornalistas,<br />

porque muita gente<br />

fala que houve uma reação,<br />

mas as pessoas me perguntavam:<br />

como? De que jeito?<br />

Provocada pelo que? Costumo<br />

dizer que o livro tem<br />

uma visão de dentro para<br />

fora, que é a minha visão.<br />

Eu vivi intensamente todos<br />

aqueles dias e acho que consegui<br />

colocar isso no livro.<br />

Quando eu comecei a escrever,<br />

senti que aquilo ia sair<br />

de uma vez, foi quase como<br />

um vômito.<br />

C: Durante a pesquisa desenvolvida<br />

para a elaboração<br />

do livro, quais incômodos<br />

despontaram ao tratar<br />

da morte de “Vlado”?<br />

A: Na busca sobre informações<br />

da morte de Vlado<br />

no Arquivo Nacional, em<br />

2011, a direção me exigiu<br />

apresentar a certidão de<br />

óbito dele. Então eu fiquei<br />

indignado, porque não entendia<br />

como o governo brasileiro,<br />

depois de 30 anos,<br />

me pede um documento<br />

desse, falso. O atestado dizia<br />

que ele havia se enforcado,<br />

quando na verdade ele morreu<br />

sendo torturado. Hoje, o<br />

registro de óbito consta que<br />

ele morreu através de violência<br />

dentro da prisão.<br />

C: A Comissão da<br />

Verdade dos Jornalistas<br />

Brasileiros, presidida por<br />

você, foi responsável por<br />

retificar esse registro. Há<br />

esperança de um veredito<br />

oficial e definitivo sobre o<br />

sequestro e assassinato<br />

de Vladimir Herzog e de<br />

outros jornalistas?<br />

A: Isso é o que esperamos.<br />

A instauração da Comissão<br />

da Verdade dos Jornalistas<br />

tem esse objetivo,<br />

porque muitos desses casos<br />

ficavam relatados somente<br />

pela Comissão da Anistia.<br />

Até hoje não se sabe direito<br />

o que aconteceu. A Comissão<br />

da Verdade não tem autoridade<br />

pra punir ninguém,<br />

mas tem o dever de apontar<br />

para a sociedade os nomes<br />

dos autores desses assassinatos,<br />

e isso já é importante<br />

para que sejam punidos pela<br />

opinião pública, por conta<br />

dos crimes que cometeram.<br />

C: Qual a contribuição<br />

deixada pela luta de vocês<br />

para os governos pós-<br />

Ditadura?<br />

A: As liberdades que o<br />

país desfruta hoje são o resultado<br />

do movimento operário,<br />

que estava sufocado.<br />

No entanto, é estranho que<br />

os governos democráticos<br />

que vieram depois da Ditadura,<br />

graças a essas lutas,<br />

tenham ocupado o poder<br />

sem a devida coragem para<br />

enfrentar, inclusive, a questão<br />

do acesso aos documentos<br />

do Regime. Nós avançamos<br />

muito e recuperamos<br />

as liberdades fundamentais,<br />

afinal nós contribuímos<br />

para diminuir a censura<br />

nesse sentido.<br />

C: A Ditadura Militar estará<br />

sempre presente nas<br />

nossas vidas de alguma<br />

maneira?<br />

A: Sim, mas não para<br />

o resto da vida. Depende<br />

da capacidade de mobilização<br />

da sociedade brasileira.<br />

Infelizmente, a Ditadura<br />

Militar causou um prejuízo<br />

muito grande. Uma geração<br />

inteira foi sacrificada, alienada.<br />

Tivemos um apagão<br />

da história nesse período.<br />

C: Por que?<br />

A: As pessoas, hoje em dia,<br />

têm medo de discutir as<br />

dificuldades que o país enfrenta.<br />

Depois da fase do<br />

neoliberalismo no país, elas<br />

agiram com receio, umas<br />

com medo de perder o emprego,<br />

outras que foram em<br />

busca de um diploma, apenas<br />

para competir ao invés<br />

de tê-lo como bem público.<br />

Mas, ainda assim, a sociedade<br />

vai caminhando.<br />

8


Sérgio gomes<br />

C: Como você analisa<br />

a reação da população<br />

no período da Ditadura e<br />

os resultados gerados por<br />

ela?<br />

Sérgio: A reação da população<br />

à repressão funcionou<br />

como um catalisador,<br />

como se fosse produzir uma<br />

reação química para que a<br />

sociedade se levantasse. E,<br />

ainda assim, levou um longo<br />

tempo. Nós estávamos<br />

em 1975 e fomos ter eleição<br />

direta para presidente somente<br />

14 anos depois. Esse<br />

processo foi muito lento.<br />

C: Que heranças sociais<br />

ainda permaneceram<br />

nesse processo?<br />

S: Fomos o primeiro país<br />

em que a classe trabalhadora<br />

foi transportada em um<br />

navio negreiro, ou seja, num<br />

porão onde você não tem um<br />

relato de bordo que dê conta<br />

do que foi essa tragédia de<br />

milhões e milhões. O sujeito,<br />

quando consegue um<br />

mínimo de ascensão social,<br />

vem para o “convés”, para<br />

poder comer três vezes ao<br />

dia e ter amigos. Ele esquece<br />

que nesse “navio” chamado<br />

Brasil, há um comando que<br />

é mais ou menos o mesmo,<br />

desde sempre. Você tem aí<br />

de 10% a 15% da população,<br />

a classe média, que está no<br />

“convés”. O resto está no<br />

“porão”. A burguesia brasileira<br />

é a mais sagaz de todas<br />

as burguesias da América<br />

do Sul. Mas há uma grande<br />

dificuldade dessa classe, até<br />

agora, em entender o que<br />

foi feito pelo “porão” nos<br />

últimos anos.<br />

C: Você acredita que<br />

as repressões daquele<br />

tempo cessaram por<br />

completo?<br />

S: As repressões ainda<br />

estão acontecendo hoje.<br />

Agora mesmo que estamos<br />

nessa sala, tem alguém, que<br />

possivelmente é pobre, está<br />

morando e ganhando mal,<br />

sendo submetido a pau de<br />

arara e choques elétricos,<br />

exatamente com os mesmos<br />

métodos de antes, em delegacias<br />

de polícia. Isso é uma<br />

prática que segue acontecendo<br />

e, no entanto, não há<br />

polícia científica. O sistema<br />

brasileiro dá um cacete para<br />

arrancar a confissão do sujeito<br />

rápido, se possível para<br />

contar onde está a mercadoria<br />

para que a polícia<br />

vá lá e fique com ela. Para<br />

nós, qualquer coisa pode ficar<br />

para amanhã, mas para<br />

uma pessoa que está pendurada<br />

de ponta-cabeça, é<br />

muito tempo.<br />

C: Os jovens tiveram<br />

grande participação nos<br />

movimentos estudantis na<br />

época da Ditadura. Como<br />

você avalia a atuação dos<br />

jovens hoje?<br />

S: Quando se tem uma<br />

sociedade complexa, e de<br />

instituições sólidas, o papel<br />

dos indivíduos é relativamente<br />

pouco importante,<br />

pois você tem uma máquina<br />

que funciona. No caso dos<br />

brasileiros, as instituições<br />

são muito frágeis, independentemente<br />

de quem seja o<br />

líder político. Ou seja, até<br />

que se consiga instituições<br />

democráticas sólidas, haverá<br />

essa alegria que nem<br />

o alemão nem o inglês têm,<br />

mas que o brasileiro pode<br />

ter. Enquanto aqui pode-se<br />

fazer algo pela política aos<br />

25 ou 30 anos, na Europa é<br />

preciso esperar os sessenta.<br />

C: Como você avalia a<br />

democracia no Brasil?<br />

S: A democracia não ganha<br />

simplesmente a feição<br />

do povo quando sua gestão<br />

se traduz em melhorias na<br />

qualidade de vida. No Brasil,<br />

temos o exemplo do<br />

Bolsa Família, que beneficia<br />

grande parte das famílias<br />

carentes e, mesmo assim, é<br />

criticado como algo que está<br />

sendo jogado fora. Porém,<br />

não se leva em consideração<br />

o custo do Programa, que é<br />

de 14 bilhões, sendo que o<br />

valor pago aos bancos pela<br />

dívida externa foi de 174<br />

bilhões. Ou seja, 14 para os<br />

pobres e 174 para os bancos<br />

estrangeiros.<br />

C: Na sua opinião, o<br />

que é necessário para<br />

melhorar a mobilização<br />

em busca de um país<br />

ainda mais igualitário?<br />

S: Trabalhar para realizar<br />

coisas concretas que<br />

melhorem a vida desde já,<br />

o ensino, a pesquisa... que a<br />

universidade pública preste<br />

serviços à comunidade. Não<br />

é esse o papel da universidade?<br />

Atuar por meio de ensino,<br />

pesquisa e extensão?<br />

Então, se os estudantes se<br />

organizarem para isso, poderão<br />

verificar a importância<br />

do trabalho em equipe<br />

e essa dispersão começa a<br />

desaparecer.<br />

9


onde fica? Onde fica o horário voltado para<br />

nós? E se eu quiser dormir dez minutinhos<br />

a mais e colocar o celular no “soneca”? Precisamos<br />

mesmo estar o tempo todo olhando<br />

o relógio? Será mesmo que esta ditadura<br />

chamada tempo é tão importante ao ponto<br />

de nos esquecermos o que significa viver?<br />

Viver, sabe, desprendido de qualquer amarra,<br />

viver de forma livre e solta. Desprendernos,<br />

não do objeto relógio, mas dos horários<br />

que simbolizam as normas impostas por<br />

uma sociedade acostumada a lidar sempre<br />

com padrões e rotinas.<br />

De repente, em um solavanco, saio do<br />

meu estado de inércia e percebo que passei<br />

do ponto no qual deveria descer. Em um<br />

sinal desesperado, peço ao motorista para<br />

que pare o ônibus. Demoro alguns segundos<br />

para conseguir sair. Quando finalmente<br />

consigo, olho para o meu pulso, e já são<br />

19 horas. Confiro na minha agenda, e meu<br />

compromisso estava marcado para meia<br />

hora atrás. Sinto raiva por ter atrasado,<br />

mas não há nada mais que eu possa fazer.<br />

Pego meu celular, ligo para o meu professor,<br />

explico-lhe o que aconteceu e remarco a<br />

reunião. Em seguida, dirijo-me para a pracinha<br />

e começo a ler o livro que carrego em<br />

minha bolsa. Tic tac,tic tac – o despertador<br />

do meu celular interrompe minha leitura<br />

para alertar que ainda tenho aula de inglês.<br />

E, sem pensar, desligo o telefone, tiro meu<br />

relógio de pulso, o guardo na bolsa e decido<br />

que não vou mais me prender a horários.<br />

Não por hoje!<br />

existissem os padrões. E se a regra fosse ser<br />

totalmente livre? É como um contrassenso,<br />

um conceito impalpável, quase transcendental.<br />

Seria como estar preso em sua própria<br />

liberdade inventada, ou até mesmo estar<br />

livre numa prisão. E o tempo, o que tem<br />

a ver com isso? Perguntava-me.<br />

Eu, você, todos. Sempre queremos mais<br />

tempo. Mas para quê? Ainda me questiono.<br />

A ditadura se impõe por estes dois ponteiros<br />

incessantes. Assim, sem nem notarmos,<br />

os segundos se transformam em minutos, e<br />

depois em horas, dias, meses e quando nos<br />

damos contai, em um piscar de olhos, já se<br />

passaram anos. O tempo que é inversamente<br />

proporcional à nossa felicidade: quanto<br />

mais tempo se passa, mais infelizes parecemos<br />

estar. Com o tempo, a idade vem e, com<br />

ela, as rugas, os cabelos brancos, o esquecimento.<br />

A todo instante, vidrados no horário<br />

para não esquecermos nenhum compromisso.<br />

É o trabalho de manhã, uma reunião<br />

importante à tarde, levar e buscar os filhos<br />

na escola, ir para a academia, estudar para o<br />

concurso, cuidar da casa... E o nosso tempo,<br />

FIM<br />

10


Crônica<br />

Crônica sobre o peso do tempo ou<br />

apenas um conto sobre um dia qualquer<br />

[Leia no sentido horário]<br />

Texto: Kamilla Abreu<br />

<strong>Edição</strong> Gráfica: Laio Monteiro<br />

Foto: Jamylle Mol<br />

afazeres. E é este o peso do tempo: uma ditadura<br />

silenciosa que cerca e regula a nossa<br />

existência.<br />

Agora sou eu quem mostra certa inquietude<br />

em minhas ações, pois ainda tenho<br />

uma reunião com meu professor. Até que,<br />

após alguns demorados minutos, avisto no<br />

letreiro do ônibus “Ouro-Preto/Mariana” e<br />

já me posiciono para enfrentar quase uma<br />

“luta” na busca por um lugar para sentar.<br />

Empurrões, conversas altas, risadas. Passo a<br />

catraca e me acomodo em uma cadeira perto<br />

da janela. De relance, reparo, então, que<br />

o mesmo rapaz que estava ao meu lado, no<br />

ponto de ônibus, agora me observa cuidadosamente.<br />

Acho que ele busca nos meus<br />

olhos, através dos seus, alguma pista do que<br />

se passava, pois como já diziam os poetas,<br />

“os olhos são a janela da alma”. Mudo a direção<br />

do meu olhar e fixo-o na rua e, assim,<br />

vou contemplando a paisagem. Perco-me<br />

nas minhas idéias. Começo a divagar sobre<br />

a liberdade, sobre regras e, novamente, sobre<br />

como o tempo influencia nossas vidas.<br />

Fico indagando-me como seria a vida se não<br />

Hoje foi um dia como todos os outros. A<br />

noite já começa a cair e as poucas nuvens<br />

restantes formam imagens desconhecidas<br />

no céu. As pessoas passam rapidamente por<br />

mim, todas ocupadas demais para desejar,<br />

pelo menos, “boa tarde” ou “boa noite”.<br />

Os carros vêm e vão em um ritmo frenético.<br />

Eu, sentada no banco, apenas espero<br />

o ônibus depois de uma jornada difícil de<br />

trabalho. O pensamento está longe. Consigo<br />

apenas lembrar-me da minha cama bagunçada<br />

que, ao fim, será o meu único e último<br />

refúgio. Já são 18 horas. Ao meu lado, um<br />

rapaz que olha atentamente para os ponteiros<br />

de seu relógio de pulso. Talvez ele esteja<br />

cansado demais, e, assim como eu, só quer<br />

ir logo para a casa. Olhos perdidos, tentando<br />

avistar no horizonte algum sinal. Mãos<br />

aflitas e o balançar das pernas: o tic-tac<br />

do relógio, que se manifesta mentalmente<br />

no meu pensamento, começa a perturbar.<br />

Questiono-me, então, se realmente tem<br />

que ser assim. Se as horas que delimitam<br />

as nossas vidas são mesmo fundamentais.<br />

Paro um instante, observo, mais uma vez, o<br />

jovem e percebo sua ansiedade estampada<br />

em pequenos fragmentos de atitudes involuntárias.<br />

Estalar dos dedos, passos apertados<br />

de um lado para outro... Penso, então,<br />

no tempo, não aquele controlado pelas horas,<br />

mas sim o que se refere ao cotidiano,<br />

aos hábitos e à rotina, o responsável por ditar<br />

as nossas vidas. Vivemos em um sistema<br />

delimitado por horários, compromissos e<br />

11


Democracia<br />

Comu<br />

Os meios de comunicação no Brasil<br />

estão concentrados nas mãos de<br />

poucas empresas. Esse contexto<br />

prejudica o fazer jornalístico, comprometendo<br />

a pluralidade de ideias,<br />

opiniões e a liberdade de expressão.<br />

Uma regulamentação, como o Marco<br />

Regulatório das Comunicações, contribuiria<br />

para democratizar a comunicação,<br />

ampliando a possibilidade<br />

de se informar e ser informado, diminuindo<br />

barreiras políticas, sociais,<br />

culturais e ideológicas.<br />

12


presas, cujas relações políticas<br />

e o modo de pensar são<br />

muito parecidos. Por isso,<br />

o que é mediado, acaba se<br />

constituindo em uma verdade.<br />

A forma com que os<br />

meios propagam essas informações<br />

são de interesse<br />

coletivo, e não diz respeito<br />

somente a quem as produz.<br />

A liberdade de expressão<br />

e a democratização da<br />

informação são questões<br />

que vêm ganhando força no<br />

cenário político-social contemporâneo.<br />

Apesar de ser<br />

um direito garantido pela<br />

Constituição, a liberdade<br />

de expressão por vezes é<br />

negada a cidadãos que não<br />

seguem ou reproduzem o<br />

que a mídia hegemônica<br />

prega. Mesmo com o advennicacão<br />

para quem?<br />

~<br />

Texto: Kael Thomas Ladislau e Maressa Nunes<br />

<strong>Edição</strong> gráfica: Ana Luísa Ruggieri<br />

Fotos/Ilustrações: Flávia Rodrigues<br />

A comunicação é inerente<br />

ao ser humano. Seja<br />

como receptor, produtor ou<br />

consumidor, todos nós participamos,<br />

de alguma forma,<br />

desse processo. É por<br />

meio dela que nos tornamos<br />

seres capazes de compreender<br />

e sermos compreendidos.<br />

Desse ponto de vista,<br />

os meios de comunicação<br />

como rádio, jornais, revistas,<br />

televisão e internet são<br />

importantes e funcionam,<br />

como o próprio nome já diz,<br />

como uma mediação entre<br />

o ser humano e o mundo a<br />

sua volta. Contudo, no Brasil,<br />

essa mediação é exercida<br />

por poucos. Os meios de<br />

comunicação midiática são<br />

concentrados e pertencem<br />

a grupos restritos de em-<br />

13


to da internet e as múltiplas<br />

maneiras de se expressar, é<br />

possível perceber o domínio<br />

dos conglomerados comunicacionais.<br />

Um exemplo recente<br />

é o do jornalista Luiz<br />

Carlos Azenha, que foi condenado<br />

a pagar R$ 30 mil ao<br />

diretor geral de jornalismo e<br />

esportes da Rede Globo, Ali<br />

Kamel, por danos morais. O<br />

que motivou a ação foi uma<br />

série de postagens no Blog<br />

Viomundo, relacionadas à<br />

campanha presidencial de<br />

2006, quando Azenha era<br />

repórter da emissora.<br />

Segundo o professor da<br />

Universidade Federal de<br />

Santa Catarina (UFSC), Rogério<br />

Christofoletti, os meios<br />

de comunicação no Brasil se<br />

número de veículos de comunicaçãopertencentes a políticos<br />

58<br />

DEM<br />

48<br />

PMDB<br />

43<br />

PP<br />

PMSB<br />

23<br />

16 16<br />

PTB<br />

Dez partidos com maior número de políticos donos de veículos<br />

PSB<br />

14<br />

PPS<br />

13<br />

PDT<br />

12<br />

PL<br />

pautam por interesses políticos<br />

e econômicos e nem<br />

sempre levam em consideração<br />

a real importância da<br />

comunicação. “Nós temos,<br />

historicamente, um sistema<br />

comunicacional concentrado.<br />

Três fatores explicam:<br />

são poucas empresas no<br />

ramo; essas empresas são<br />

de propriedade familiar; há<br />

relações escusas e complicadas,<br />

questionáveis do ponto<br />

de vista ético e legal”, diz<br />

o professor. Além disso, os<br />

maiores detentores de concessões<br />

de rádio e televisão<br />

são políticos, o que é proibido<br />

por lei.<br />

Segundo o artigo 54 da<br />

Constituição Federal de<br />

1988, deputados e senadores<br />

não poderão, no exercício<br />

de seus cargos, firmar ou<br />

manter contrato com pessoa<br />

jurídica de direito público,<br />

autarquia, empresa pública,<br />

sociedade de economia<br />

mista ou empresa concessionária<br />

de serviço público”.<br />

No entanto, segundo dados<br />

do site “Donos da mídia”,<br />

em 2009, 271 políticos eram<br />

sócios ou diretores de 324<br />

veículos de comunicação.<br />

A discussão que visa a regulamentar<br />

concessões de<br />

veículos midiáticos no Brasil<br />

é, por vezes, silenciada,<br />

como aponta o gráfico sobre<br />

a relação de empresas<br />

comunicacionais e partidos<br />

políticos.<br />

O projeto Donos da Mídia<br />

(www.donosdamidia.<br />

com.br) é um site que atesta<br />

os monopólios e oligopólios<br />

das grandes empresas de comunicação.<br />

Sua plataforma<br />

oferece informações relacionadas<br />

ao campo político<br />

e econômico das mídias no<br />

Brasil. Analisa também a<br />

participação econômica de<br />

cada rede de comunicação,<br />

sendo filtrado por região,<br />

estado e até mesmo cidade<br />

onde se encontram.<br />

Apesar das complicações,<br />

a sociedade civil tem<br />

se organizado para mudar<br />

o cenário, pressionando os<br />

parlamentares para que as<br />

leis sejam modificadas, deixando,<br />

assim, mais claras as<br />

regras do jogo.<br />

10<br />

PT<br />

Em 2009, a Conferência<br />

Nacional de Comunicação<br />

(Confecom), convocada pelo<br />

Governo Federal, apontou<br />

resoluções que modificaram<br />

o modelo comunicacional<br />

adotado no país. Durante a<br />

Confecom, representantes<br />

do poder público, da sociedade<br />

civil e empresários<br />

aprovaram cerca de 700 propostas,<br />

em debates esclarecedores<br />

sobre a necessidade<br />

de atualizar as leis. Dentre<br />

as propostas, foi sugerida a<br />

criação do Marco Regulatório<br />

das Comunicações, que<br />

é um conjunto de normas<br />

que sancionam os meios e<br />

as tecnologias de comunicação.<br />

Tratam-se de normatizações<br />

fundamentais para a<br />

democracia da informação.<br />

Apesar da iniciativa,<br />

Christofoletti afirma: “O<br />

que a gente percebe é que<br />

a legislação é deficiente e o<br />

Estado é complacente. Ele é<br />

omisso muitas vezes e está<br />

ligado a interesses contrários<br />

aos da coletividade.”<br />

Em março deste ano, o governo<br />

brasileiro anunciou<br />

que não encaminharia a implantação<br />

de um Marco Regulatório<br />

antes do término<br />

do mandato da presidente<br />

Dilma Rousseff. O tema é<br />

delicado e gera opiniões divergentes<br />

dos dois lados da<br />

corrente: os que acreditam<br />

que uma legislação será benéfica<br />

e auxiliará na democratização<br />

da informação e<br />

os que enxergam a criação<br />

do Marco como um retorno<br />

da censura.<br />

As diferentes concepções<br />

tocam na noção de<br />

liberdade entendida por<br />

cada indivíduo. Segundo o<br />

professor Venício Lima, em<br />

entrevista ao Portal UFMG,<br />

há dois tipos de liberdade:<br />

a liberal clássica e a visão<br />

republicana. Na primeira,<br />

14


a liberdade é entendida como a ausência de restrição externa<br />

para a ação individual, “é a perspectiva de liberdade<br />

negativa, uma construção que põe o Estado na posição de<br />

principal inimigo da liberdade individual”. Já a republicana<br />

é oposta, “nela, o que se propõe é uma liberdade construída<br />

em conjunto com os outros no espaço democrático”. Esta<br />

última tem papel central na discussão sobre o implemento<br />

do Marco Regulatório.<br />

Regular para libertar<br />

Para garantir que a liberdade de expressão seja construída<br />

em um espaço democrático é preciso que haja uma regulamentação<br />

da informação. O Marco tem como principal<br />

objetivo a garantia do direito à livre comunicação a todos os<br />

cidadãos. De acordo com texto da Plataforma para um Novo<br />

Marco Regulatório, construída pelo Fórum Nacional de Democratização<br />

para os Meios, a falta de uma regulação legal<br />

favorece às poucas empresas midiáticas, o que ocasiona a<br />

concentração e impede a pluralidade de ideias. Em países<br />

como Reino Unido, França, Portugal, Estados Unidos e Alemanha,<br />

que adotaram essas regras, tais regulamentações<br />

não se configuram como restrição.<br />

No Brasil, a antiga Lei de Imprensa, de 1967, revogada<br />

em 2009, foi produzida durante a Ditadura Militar e trazia<br />

marcas claras do regime. Já o Código Nacional de Telecomunicações,<br />

de 1962, permanece vigente e está desatualizada<br />

em relação à Constituição. A normatização pelo Marco<br />

poderia se tornar uma maneira de enfrentamento a essa defasagem,<br />

considerando a liberdade e a igualdade no acesso<br />

e difusão da informação.<br />

Suzana Singer, ombudsman da Folha de S. Paulo, avalia<br />

o processo do Marco Regulatório como uma polarização<br />

exagerada. “Do jeito que a questão está sendo encaminhada<br />

ela está configurando como um teste para o trabalho de<br />

imprensa. Temos uma briga de alguns lados. Um que defende<br />

que está ótimo e que não tem que mudar nada. E outro<br />

que diz que há monopólio nos meios de comunicação.”<br />

Christofoletti defende a concretização do projeto. “Se<br />

tivermos regras nós vamos poder jogar o jogo. Se nós não<br />

as conhecemos, não conseguimos jogar. Sem elas, o jogo é<br />

muito bom para quem está no poder. Para quem tem pouco<br />

poder, a ausência de regras é sempre muito opressora”.<br />

15


Alternativas<br />

Com a popularização da internet, emergiram características descentralizadoras,<br />

o que possibilitou um pensamento democratizador e contrahegemônico.<br />

Pode-se pensar o ciberespaço como uma nova esfera pública<br />

e um meio alternativo de informação. Nesse contexto, os blogs aparecem<br />

como uma forma de expressão livre dos grandes meios comunicativos.<br />

Quanto vale a liberdade de expressão nessas plataformas? Para algumas<br />

pessoas ela se tornou cara. Luiz Carlos Azenha chegou a ameaçar fechar o<br />

seu blog Viomundo, por conta do alto custo da indenização que terá que<br />

pagar. Mas, comovido pelo apelo dos leitores de seu blog e nas redes sociais,<br />

resolveu continuar com o projeto, realizando algumas alterações. No texto<br />

publicado no dia 1º de abril de 2013, ele afirma: “Com as grandes corporações<br />

de mídia, vivemos uma espécie de Gulag ao contrário: nosso corpo<br />

está livre, mas nosso pensamento frequentemente é prisioneiro de uma<br />

pauta que não nos interessa e, mais que isso, desconhece o interesse público,<br />

precariza as relações de trabalho e<br />

concentra ainda mais o capital na mão<br />

de poucos”. Viomundo existe há 10 anos<br />

e se afirma como um espaço dos movimentos<br />

sociais de contraposição à mídia<br />

tradicional.<br />

Outro caso é do também jornalista<br />

Fábio Pannuzio. Ele decidiu não postar<br />

mais no Blog do Pannuzio pelo mesmo<br />

motivo de Azenha: altos custos judiciais.<br />

O blog já sofreu vários processos, mas o<br />

que o incentivou a encerrar as publicações,<br />

no ano de 2012, foi um processo<br />

Na mesma linha do Marco Regulatório para a comunicação, há um projeto civil determinando a retirada do ar de<br />

de lei conhecido como Marco Civil da internet que surgiu para definir uma um post que continha críticas ao atual<br />

série de direitos e obrigações que dizem respeito a usuários da web. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin.<br />

Criado em 2009, publicou quase 8<br />

fato configura-se como uma política pública reivindicada pela sociedade<br />

civil, de modo que a ferramenta comunicativa não fique atrelada aos mil textos com o objetivo de compor um<br />

interesses dos grandes grupos econômicos ou aos governos de plantão. espaço de manifestação pessoal e reflexão<br />

política.<br />

Essa regulamentação na internet também bate de frente com importantes<br />

setores privados e fortalece a ideia de como é tênue a linha que separa<br />

o interesse privado do político, pois, enquanto a regulamentação<br />

não entra em funcionamento, Projetos de Leis que expõem dados dos<br />

usuários da rede são votados às escuras. Uma delas, a PL 4.906/2001,<br />

permitiria que empresas de comércios virtuais coletassem informações<br />

pessoais sem que o cidadão optasse ou soubesse disso. Para a retirada<br />

dessas informações, a pessoa teria que solicitar a saída. Uma segunda, o<br />

PL 4.060/2012, estabeleceria mecanismos de retirada de conteúdos de<br />

sites sem ordem judicial.<br />

Os dois projetos caíram, mas foram fortemente discutidos nos bastidores<br />

do parlamento. Fator que frisa a importância da regulamentação do Marco<br />

Civil e chama a atenção do interesse público para uma política mais<br />

democrática.<br />

Para o jurista gestor do projeto em sua primeira fase, Paulo Rená, o “Marco<br />

civil traz importantes previsões, seja porque permite entender melhor<br />

a relação do direito do consumidor com os aspectos jurídicos da internet,<br />

seja porque contém regras específicas para garantir os direitos, com a<br />

possibilidade da defesa judicial de direitos coletivos”, afirma em entrevista<br />

ao site do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação<br />

(www.fndc.org.br).<br />

16


O nome que se dá a esse processo é o de judicialização<br />

dos conteúdos dos blogs. Segundo o deputado Paulo<br />

Pimenta (PT – Rio Grande do Sul), em um pronunciamento<br />

na Câmara dos Deputados no dia 1º de abril de 2013,<br />

“as entradas nos processos judiciais são coordenadas pelos<br />

grandes meios de comunicação, com empenho e apoio do<br />

Judiciário conservador. Diante da internet há uma maior<br />

possibilidade de multiplicação dos protagonistas. Estes,<br />

que vêm sendo perseguidos e condenados pelas suas ações,<br />

podem fazer com que suas opiniões e ideias circulem na<br />

sociedade sem a dependência editorial dos grandes e tradicionais<br />

meios de comunicação”.<br />

Outro meio alternativo de informação são as rádios comunitárias,<br />

que representam 25% dos veículos de mídia do<br />

país, segundo o site Donos da Mídia. Em Santa Bárbara,<br />

interior de Minas Gerais, a rádio comunitária Triunfo representa<br />

uma alternativa de informação da região. Segundo<br />

o coordenador da rádio, Autran Fernandes, “é um grande<br />

desafio fazer rádio comunitária nos dias de hoje, competindo<br />

com grandes emissoras a níveis nacionais, levadas ao ar<br />

pelas afiliadas”. Autran completa dizendo que, apesar das<br />

dificuldades, agradece a seus ouvintes e aos profissionais<br />

que trabalham pelo sucesso da rádio. Ainda segundo ele, o<br />

compromisso da rádio é levar, com credibilidade, as notícias<br />

e os informativos locais. “Claro que assuntos nacionais importantes<br />

são levados ao ar, mas nosso objetivo é destacar o<br />

que acontece e o que acontecerá em nossa cidade” ressalta.<br />

Mesmo com a internet e outras alternativas, o direito<br />

à livre expressão em uma mídia como a brasileira, ainda é<br />

limitado. É essa a liberdade de expressão que a sociedade<br />

quer? O que se faz necessário é que todos tenham conhecimento<br />

de como funcionam os meios de comunicação no<br />

país para, dessa forma, lutar pela democratização da informação.<br />

17


18<br />

Ensaio Fotográfico


Alegria, alegria!<br />

Nossos planos de vida se baseiam em diferentes formas de<br />

encontrar a felicidade, mesmo que não sejam os desejos de<br />

cada indivíduo, mas impostos por um coletivo invisível. Entre<br />

a confecção de um corpo impecável e a procura do amor eterno<br />

existe a ideia de uma vida perfeita. Em busca da contemplação<br />

de um ideal aparente, efêmero e pouco refletido, nos submetemos<br />

a procedimentos que vão no caminho oposto do que realmente<br />

desejamos. Nesse jogo de vontades e imposições, por<br />

que não podemos ser felizes a nosso modo? O que acontece<br />

se tentarmos? Existe alguma regra que imponha um modelo<br />

ideal de felicidade? O que é a felicidade?<br />

Fotos: Ricardo Maia<br />

<strong>Edição</strong> Gráfica: Camila Maia<br />

Maquiagem: Lorena Rocha<br />

Luz: Elias Figueiredo<br />

Figurino: Cia. Calor de Laura<br />

Modelos: Bruna Silveira, Du Sarto e Luana Crempe<br />

Apoio: TV UFOP<br />

Confira mais fotos deste ensaio em: jornalismo.ufop.br/revistacuringa<br />

19


20<br />

Ricardo Maia


21


2<br />

É notável hoje que a<br />

beleza feminina está<br />

diretamente ligada às<br />

imposições da indústria<br />

da moda e da mídia.<br />

Muitas mulheres<br />

cedem à chamada<br />

Ditadura da beleza.<br />

Entretanto, os padrões<br />

existem desde os primórdios<br />

da civilização<br />

ocidental.<br />

A mulher, ao longo<br />

da história, sempre<br />

foi influenciada nas<br />

maneiras de se vestir,<br />

pintar e comportar.<br />

Os modelos de beleza<br />

estão diretamente relacionados<br />

aos aspectos<br />

culturais e à dinâmica<br />

de cada civilização.<br />

360 a.C.<br />

Vestidos<br />

justos e curtos<br />

Simétrico, pele clara, seios<br />

pequenos<br />

simétrico, pele clara, seios pequenos<br />

Tecidos claros e leves<br />

Valorização da política e da arte<br />

tecidos claros e leves<br />

Vênus de Milo<br />

valorização da política e da arte<br />

Séc XII<br />

Roliço e cintura fina<br />

Vestidos volumosos e espartilho<br />

roliço e cintura fina<br />

Vestidos volumosos e espartilho<br />

Pudor<br />

Monalisa<br />

pudor<br />

Infográfico<br />

Moldes do belo<br />

texto: Fádia Calandrini<br />

<strong>Edição</strong> Gráfica: Pablo Gomes<br />

Foto: Lorena Silva<br />

Séc. XIX<br />

ampulheta, cintura muito marcada<br />

Ampulheta, cintura marcada<br />

Espartilho, babado, rendas e chapéu<br />

espartilho, vestidos com babados e chapéu<br />

1930<br />

fragilidade, delicadeza<br />

Fragilidade e delicadeza<br />

Mabel Normand<br />

retilíneo, anulação de curvas<br />

Retilíneo, anulação de curvas<br />

Saias curtas, largas e achatadores de seios e quadris<br />

Saias curtas, largas e<br />

achatadores de seios e quadris<br />

Modernidade e<br />

independência feminina<br />

Coco Channel<br />

Consumo<br />

22<br />

1


Malhado, musculatura pouco acentuada<br />

1<br />

Músculos e<br />

uso de<br />

próteses<br />

Julia Roberts<br />

Cortes retos e soltos<br />

Extremamente magro<br />

Globalização<br />

Madonna<br />

1990<br />

Moldes do belo<br />

1980<br />

Cotidiano urbano<br />

Couro jeans e ombreiras<br />

Janis Joplin<br />

Movimento hippie<br />

Longa, solta e estampada<br />

Culto a liberdade<br />

Elegância e sensualidade<br />

Marilyn Monroe<br />

1970<br />

Saias rodadas e com pregas<br />

Curvas exaltadas<br />

CORPO:<br />

ROUPA:<br />

IDEAL:<br />

ÍCONE DE<br />

BELEZA:<br />

1950<br />

Gracyanne Barbosa<br />

2<br />

23


Grafite<br />

Uma geração<br />

“Maria amava seu filho. Por que minha mãe não me ama?”<br />

indagava um dos hippies de Hair, musical estadunidense<br />

da década de 60. Na canção, que leva o nome da peça<br />

teatral, o jovem hippie se pergunta sobre o porquê da<br />

desaprovação dos pais quanto ao seu estilo de cabelo:<br />

longo. Cabelos longos para um homem naquela época<br />

poderia ter muitos significados, todos eles considerados<br />

ruins para uma sociedade conservadora: desobediência,<br />

rebeldia, homossexualidade. As roupas, bem coloridas,<br />

leves, e até rasgadas, também chocavam. Integrantes da<br />

chamada contracultura, os hippies eram pessoas contrárias<br />

ao modo de viver e à cultura vigentes na sociedade.<br />

Texto: LaÍs Queiroz<br />

<strong>Edição</strong> Gráfica: Eduardo Braga e Gustavo Aureliano<br />

Fotos: Gustavo Aureliano<br />

24


do contra<br />

Os movimentos sociais de contracultura das décadas de de pulseira. Márcio também<br />

contra<br />

participou da versão brasileira<br />

60 e 70 tinham como ideais o amor livre, o desejo de renovação<br />

e a quebra dos tabus. Também valorizavam o “viver tal paulista, foi preso. “Depois do teatro a gente fazia festa<br />

de Hair, apresentando-se no Rio e em São Paulo. Na capi-<br />

o momento”, negavam a sociedade do consumo e pregavam<br />

uma revolução pacífica, sem guerras, e defendiam o Estávamos com muitas drogas. A repressão era muito for-<br />

na casa dos amigos e um dia a polícia bateu lá. Foi feio.<br />

uso das drogas como libertação da mente. “Paz e amor” e te, terrível. Eles falavam que a gente era a parte podre da<br />

“sexo, drogas e rock‘n’roll” foram dos jargões famosos para sociedade”, diz.<br />

definir a geração.<br />

Márcio, assim como os hippies, pertencia ao movimento<br />

“Eu tinha 13 anos. Deixei meu cabelo crescer e nós fizemos<br />

uma banda inspirada na Jovem Guarda e nos Beatles. to retrógrado, conservador e moralista que prevalecia nos<br />

que surgiu da necessidade de contestar não só o pensamen-<br />

Chamava-se The Rebels”, conta o marianense Márcio Moraes,<br />

que na década de 60 assustava a pequena cidade de atitudes de um país que se enriquecia e promovia a guer-<br />

Estados Unidos dos anos 60, mas também questionava as<br />

Mariana com seu cabelo nos ombros e seus braços cheios ra matando milhares de famílias inocentes no Vietnã; que<br />

25


pregava a igualdade, mas<br />

discriminava os negros e as<br />

mulheres.<br />

O ano de maior efervescência<br />

contracultural,<br />

segundo o historiador Leon<br />

Kaminski, foi 1968. Naquele<br />

ano, aconteceu uma<br />

das mais importantes manifestações<br />

juvenis em Paris,<br />

França: o Maio de 68.<br />

Segundo o historiador, “foi<br />

uma surpresa para as pessoas<br />

tudo o que se passava,<br />

pois os EUA e a Europa não<br />

estavam vivendo uma crise<br />

econômica, então todos se<br />

perguntavam o que estava<br />

acontecendo”. A partir daí,<br />

de acordo com Kaminski,<br />

vários pensadores começaram<br />

a pesquisar tal fenômeno<br />

de movimentação da<br />

juventude e o historiador<br />

e sociólogo americano Theodor Roszac utilizou o termo<br />

“contracultura”, que mais tarde denominou os movimentos<br />

de rebeldia dos anos 60.<br />

No Brasil, o momento mais forte da contracultura foi<br />

durante o regime militar. Além de críticas ao sistema vigente<br />

na época, a Ditadura trouxe inquietação e vontade<br />

de mudança por parte de uma significativa parcela da sociedade<br />

brasileira. De acordo com Kaminski, o movimento<br />

era mal visto pelos pesquisadores e intelectuais da época,<br />

que classificavam os integrantes como alienados, irracionalistas<br />

e subjetivistas. “A contracultura no Brasil era chamada<br />

de desbunde. Nesse processo, eles eram deixados de<br />

lado ou eram tratados de forma parcial, como pessoas que<br />

fumavam maconha e ‘desbundavam’”, completa o historiador.<br />

Arte e contracultura<br />

As manifestações contraculturais tinham sua força na<br />

arte. Tanto nos EUA como no Brasil, nomes como Caetano<br />

Veloso, Chico Buarque, Geraldo Vandré, Jimi Hendrix,<br />

Janis Joplin, Bob Dylan e Raul Seixas são lembrados. Mas<br />

não só a música era um meio artístico de protesto e críticas<br />

ao sistema. O teatro também teve forte caráter contracultural<br />

na época.<br />

Para a filósofa Guiomar de Grammont, foi no seio do<br />

teatro que nasceram grandes manifestações de contestação<br />

do período. Um exemplo foi o Living Theatre, o “teatro<br />

vivo que quebrava a separação entre arte e vida, fazendo<br />

críticas aos tabus sociais dos locais onde se apresentavam,<br />

por meio de representações realistas e irreverentes”. O Living<br />

esteve inclusive em Ouro Preto, no ano de 1971, para<br />

se apresentar no Festival de Inverno, mas seus<br />

integrantes foram presos durante a abertura<br />

do evento.<br />

Essa arte foi alvo de fortes repressões<br />

na Ditadura Militar brasileira. No ano de<br />

1968, integrantes do Comando de Caça<br />

aos Comunistas (CCC) invadiram o Teatro<br />

Ruth Escobar, em São Paulo, e espancaram<br />

o elenco da peça Roda Viva. “Foi na frente<br />

desse teatro que houve as manifestações quando<br />

mataram o estudante Édson Luis, um marco<br />

da truculência da Ditadura”, lembra Guiomar.<br />

26


Ontem e hoje<br />

Considerados por Jean-Paul Sarte<br />

como a “Geração Perdida”, os beatniks foram<br />

os precursores dos movimentos anti-sistema, na década<br />

de 50. A Geração Beat era constituída por pessoas<br />

que, diferentemente dos demais, não desejavam ter os<br />

eletrodomésticos e carros do ano, viviam com pouco, ou quase<br />

nada. Isso ainda é observado na sociedade contemporânea?<br />

A existência de uma contracultura atual gera conflito entre estudiosos.<br />

Para a filósofa Guiomar de Grammont, não há uma contestação tão<br />

forte como antes. “Não sei se há contracultura na atualidade. Sem dúvida, houve<br />

uma retração diante dessa nova sociedade, que é uma sociedade mais livre, mais<br />

leve e isso acaba repercutindo e influenciando nas relações interpessoais”, enfatiza.<br />

Para a filósofa, os movimentos de contracultura foram fundamentais para a liberdade<br />

de expressão. Guiomar diz que houve também uma conscientização dos limites e das<br />

relações pessoais no que diz respeito à liberdade sexual. “Outras questões que atingiram a<br />

contemporaneidade, como a AIDS, foram fundamentais para impedir as pessoas de viverem<br />

o amor livre”, enfatiza a filósofa.<br />

Márcio Moraes, o cidadão que viveu a geração “paz e amor”, acredita que há um comodismo nos<br />

jovens de hoje. “O que eu vejo hoje não tem nada a ver com o que era antes. A juventude atual está<br />

deixando a desejar, é muito devagar. Antes a gente protestava mais”, afirma. Ainda sim, ele é otimista:<br />

“Acredito sim que conseguimos mudar algumas mentalidades”.<br />

Hip hop, funk, grafite e punk são movimentos considerados pelo historiador Leon Kaminski<br />

como contraculturas atuais, porém, de menor impacto comparados aos movimentos anteriores. Segundo Kaminski,<br />

a atual despolitização do pensamento crítico e consequente queda no poder de reivindicação se deve ao consenso<br />

de que as conquistas já foram alcançadas pelos jovens dos anos 60 e 70.<br />

Os protestos nos meios digitais, como o movimento de mídia independente e os hackers, que disponibilizam<br />

conteúdos para baixar gratuitamente na internet, também estão inseridos no movimento de concracultura atual,<br />

de acordo com Kaminski. “Isso é uma contracultura porque você está dando acesso ao conhecimento para várias<br />

pessoas e, ao mesmo tempo, você tenta quebrar com os padrões de uma sociedade. É uma questão do bem cultural:<br />

por que você tem que pagar pelo bem cultural?”<br />

Vigente ou não, é certo que o movimento de contracultura gerou<br />

grandes transformações socioculturais nos últimos 50 anos. A<br />

juventude unida, impulsionada pelo incômodo, conseguiu e ainda<br />

consegue quebrar padrões, chocar e alterar, mesmo que de forma<br />

parcial, um cenário que não a agrada. Como cantou Caetano Veloso,<br />

”apaches, punks, existencialistas, hippies, beatniks de todos os tempos,<br />

uni-vos”. Uni-vos para fazer a revolução.<br />

27


Palco<br />

Texto: Greiza Tavares<br />

<strong>Edição</strong> Gráfica: Pablo Gomes<br />

Foto: Ricardo Maia<br />

Rosas cor de sangue<br />

O cenário intriga. Pode-se perceber, através do breu da sala 35 da Escola de Minas, em Ouro Preto,<br />

jornais espalhados pelo chão e cadeiras dispostas próximas ao palco. Ao centro, a bandeira do Brasil. A<br />

expectativa é notável em todos os vultos que adentram o espaço. Cinco jovens atores prometem um relatomanifesto<br />

sobre o período da Ditadura Militar no Brasil: começa o espetáculo “O Jardim do Silêncio”.<br />

O texto original de Márcio Oliveira Silva trata das resoluções instaladas a partir do Ato Institucional<br />

número 5. A encenação expõe a visão de personagens opostos: militares e militantes. Também são abordadas<br />

as ditaduras vividas hoje, como nas redes sociais. “Cada vez mais vemos que essas Ditaduras que<br />

vivemos hoje não se diferem tanto das outras daquela época. Descobrimos informações que fazem toda<br />

diferença nesse olhar crítico para as opressões”, afirma o diretor da peça, Du Sarto.<br />

As rosas espalhadas em meio às folhas de jornal formam um jardim que lembra os torturados e mortos.<br />

“Como enterrar os mortos de uma guerra que não existiu?” Essa pergunta é repetida ao longo da peça<br />

remetendo ao fato de que pouco se sabe sobre o que realmente houve naquele período.<br />

Os atores Adriana Maciel e Gabriel Edeano tornam-se grandes e corajosos em cena. A hábil Gabriela<br />

Felipe consegue arrancar gargalhadas falando com cinismo de passagens graves. Hideo Kushiyama nos<br />

faz querer ter também um motivo pelo qual lutar. Thiago Meira irrita com seus atos institucionais e nos<br />

prende falando verdades que não queremos ouvir.<br />

Cerca de quinhentas pessoas assistiram a peça entre janeiro e fevereiro de 2013. Contemplada com o<br />

edital Micro Projeto São Francisco, a Cia. Calor de Laura cumpre a promessa e apresenta, com um misto<br />

de força e leveza, uma história que deve ser lembrada para que nunca mais volte a acontecer no Brasil.<br />

28


Perfil<br />

Texto: Mickael Barbieri<br />

<strong>Edição</strong> Gráfica: Mateus Meireles<br />

Fotos: Natália Ambrósio<br />

Espere o ônibus no ponto da rua Tupinambás, em<br />

frente ao número 933, entre e reflita sobre<br />

a dimensão de 33 hectares de uma comunidade<br />

ainda não reconhecida na capital mineira<br />

,<br />

29


30<br />

Ele. Ela. Ou ninguém. A forma de se<br />

referir é um problema menor frente aos<br />

preconceitos que surgem quando se tenta<br />

enquadrar um metro por outro da terra<br />

vermelha no entorno das casas muito bem<br />

construídas. A área desperta na população<br />

de Belo Horizonte a ojeriza que ela prefere<br />

fingir não ter. Mas o chão ocupado sabe<br />

que tem. Ele defende os moradores que lhe<br />

deram a função social em falta nos últimos<br />

40 anos. O nome já carrega força. A energia<br />

da posse emana muito antes de o ônibus que<br />

dá acesso à comunidade dobrar a esquina e<br />

já se poder ver Dandara. E o vento, o mesmo<br />

que derrubou a placa de boa recepção, perde<br />

a moleza e levanta o pó para jogá-lo na cara<br />

de quem se sente deslocado por não pisar em<br />

rua de asfalto. Parada solicitada.<br />

O espaço, apropriado em toda a sua<br />

extensão, grita seus anseios pelas frases das<br />

quase mil famílias que massageiam o terreno<br />

diariamente. Ele está em cena como um filho<br />

de pais separados, que não entram em acordo<br />

sobre a quem pertence o direito de cuidar do<br />

rebento, e porta-se bem diante do tribunal<br />

do estado figurado através da presença<br />

dos líderes comunitários incansáveis. A<br />

notícia de que o juiz concedera a guarda<br />

temporária da terra aos dandarenses,<br />

trazida pelos advogados do grupo de apoio<br />

Brigadas Populares, em fevereiro de 2013,<br />

foi comemorada com fogos de artifício<br />

na comunidade, ainda que os moradores<br />

tenham de conviver com o temor de que<br />

novos recursos judiciais possam surgir em<br />

instâncias superiores à estadual. O júbilo<br />

escorreu na pele de quem não deixou de<br />

acreditar na causa, sensação contrária à dos<br />

representantes da Construtora Modelo, que<br />

se diz dona do terreno, mas é devedora de<br />

mais de R$2.000.000 de reais em impostos<br />

que lhe são de responsabilidade. Insatisfeitos,<br />

também, ficaram os motoristas do centro da<br />

cidade, reclamando do trânsito no dia da tal<br />

audiência e que sequer foram tomados por<br />

uma centelha de curiosidade para saber do<br />

que se tratava aquela marcha, em que o povo<br />

batia panelas e assoprava apitos com altivez<br />

nos rostos.<br />

Prestes a completar quatro anos, Dandara<br />

quer, menos do que revolucionar algum<br />

sistema vigente, ganhar o respeito pelas<br />

histórias que ali se encontraram. O senso<br />

de pertencimento das pessoas ao lugar já se<br />

mostra nas pequenas ações e na busca da<br />

dignidade da qual desfrutam os bairros ao


edor. Quando atacados, todos se tornam um<br />

para defender o chão em que vivem, mas se<br />

dividem com gentileza para exibir o valor de<br />

cada indivíduo que respira ali dentro. Uma<br />

certa positividade nas ruas ecoa para que a<br />

grande guerreira da capital possa discutir, com<br />

civilidade, as questões que ainda lhe afligem<br />

sem ser calada precocemente pelas autoridades<br />

que tapam os sentidos para não ter de lidar<br />

com a ”verruga” da região da Pampulha.<br />

O lugar respira a ocupação, e não invasão,<br />

desde o primeiro dia, a sexta-feira santa de<br />

2009. Mais de 100 famílias se apossaram do<br />

futuro, orientadas por membros do Movimento<br />

dos Sem Terra, que hoje acompanham de<br />

longe o desenrolar do que estimulou naquele<br />

ano. Nada importava senão um canto, aquele<br />

entoado frente aos olhos distantes e abismados<br />

dos vizinhos que viam os barracos de lona<br />

sendo fincados pouco a pouco. O start foi<br />

dado, principalmente, pelas esposas e mães<br />

que tiveram o desatino de revolver a situação<br />

em que se encontravam e tentaram mudar a<br />

própria vida. Por isso a denominação Dandara<br />

se encaixa palmo a palmo no terreno, em<br />

referência à esposa de Zumbi dos Palmares,<br />

negra e escrava tida como a estrategista por<br />

trás das ações do marido no Brasil colonial.<br />

As mulheres-dandara de hoje são ainda mais<br />

atinadas quanto ao seu papel de liderança e<br />

não perdem o entusiasmo para, um dia, ver<br />

as correspondências entregues no endereço de<br />

suas casas com registro oficial.<br />

A causa é representada por figuras que se<br />

fazem notar por sinalizações que anunciam<br />

os nomes das ruas. Entre eles, Martin Luther<br />

King e Nelson Mandela trazem ao lugar o<br />

significado de um esforço nunca cessante para<br />

que as minorias possam ter vez na sociedade.<br />

Com o trabalho de um grupo de estudantes<br />

de arquitetura da faculdade PUC-Minas e<br />

da Universidade Federal de Minas Gerais,<br />

concentrado na imagem profissional de Tiago<br />

Castelo Branco Lourenço, Dandara ganhou<br />

o seu desenho de acordo com os parâmetros<br />

exigidos pelos órgãos competentes da capital<br />

mineira. Essa pretensão arquitetônica norteou<br />

os caminhos de ida e volta para construir as<br />

casas de alvenaria, ainda que tenha sido preciso<br />

driblar os olhos dos policiais que se postavam<br />

em frente ao terreno e impediam os caminhões<br />

com os materiais de entrar na comunidade. Para<br />

esse fim, até carrinhos de bebês foram usados.<br />

O projeto urbanístico é exposto com orgulho<br />

em uma pintura na parede de um dos prédios<br />

comuns do agrupamento, ao gosto de todos, e<br />

31


32<br />

já foi selecionado como um dos melhores trabalhos de graduação do mundo da área de Arquitetura para<br />

exibição nos Estados Unidos, no Massachussetts Institute of Technology Department of Architecture (MIT). A<br />

internacionalização do movimento ajuda no esforço contínuo de legitimar o assentamento rururbano.<br />

As roupas para embelezar Dandara já foram encomendadas, só que a entrega deve demorar<br />

um tempo a mais do que o desejado pelos moradores. Quem já teve de experimentar a realidade<br />

de uma cidade falsamente acolhedora como Belo Horizonte não hesita em expressar gratidão<br />

aos responsáveis pelo teto em que dorme, estejam eles no plano físico ou espiritual ligado à<br />

religiosidade. Ainda assim, o texto sai quase decorado das portas quando se pergunta o que ainda<br />

falta na comunidade. Não há luz elétrica normatizada, tampouco água e sistema para escoar<br />

o esgoto, que corre a céu aberto em alguns pontos. A solução emergencial é a de apelar para<br />

“gatos” que puxam os itens básicos da distribuição pública. Da mesma forma, instituições<br />

de ensino e unidades de saúde parecem fazer vistas grossas para atender às necessidades<br />

dandarenses. Há, segundo os moradores, uma escola pública logo atrás do terreno que<br />

não aceita a matrícula da maioria das crianças e adolescentes da comunidade, já que<br />

eles não possuem um comprovante legal de moradia.<br />

O lugar, porém, já está incrustrado na personalidade dos moradores como se eles<br />

tivessem passado todas as fases de suas histórias naquele pedaço de terra, como se<br />

pudessem desenterrar o álbum de fotos antigas de cada um na próxima esquina.<br />

As críticas encalcam uma vontade de desmontar a figura criada pela mídia acerca<br />

do modo de vida em um terreno ocupado. Alguns até se arrependeram assim<br />

que chegaram, outros passaram por um período de adaptação ao local, malencarado<br />

à primeira vista, mas a vontade que reina é a de não mais deixar<br />

aquele espaço que já é quase totalmente deles. O tempo abrandou os medos<br />

e a palavra ganhou potência.<br />

A terra que tanto foi furada, escavada e prensada jamais deixou de<br />

ser cuidada, como uma cirurgia em que é preciso um pouco de vigor<br />

na operação para que o resultado esperado seja possível. Em meio a<br />

Dandara pode-se notar árvores de grande porte ou até menores com<br />

frutos carnosos que foram conservadas. Este apreço não é acidental,<br />

porque, desde o princípio, foi decidido em grupo que a transformação<br />

daquele espaço generoso aconteceria com perspectivas viáveis<br />

para encaixar a narrativa do agrupamento na coletânea de Belo<br />

Horizonte. Dandara exige arremate e reconhecimento.<br />

O caminho de chegada é o mesmo que revela o retorno,<br />

um ciclo de passagens para fortalecer a sensação de que o<br />

terreno agora deixa marcas de ansiedade na barra da calça.<br />

É preciso sentir para entender, olhar para acreditar. E<br />

pisar para pertencer. Os valores são os mesmos dentro<br />

e fora, mas o que diferencia é a intensidade como cada<br />

qual se une para batalhar um bem comum. O título<br />

aponta na esquina e, com os faróis altos, lembra que<br />

o tempo do contato estabelecido já se excede. No<br />

peito as pegadas e na cabeça a aproximação com<br />

um corpo social formado ao alcance e acesso<br />

de quem se colocar à prova, e, nos dedos, o<br />

ressentimento de uma vizinhança com uma<br />

opinião construída da porta para dentro. Os<br />

metros quadrados transpassam conceitos e<br />

inebriam a percepção das pessoas destes<br />

dias, que se dão por satisfeitas por<br />

conhecer os arredores através somente<br />

de megabytes intocáveis. Mas para<br />

bom entendedor, meia Dandara<br />

basta. E também uma passagem de<br />

ônibus. Parada solicitada.


Seção<br />

E Aí?<br />

Texto: Jéssica Michellin<br />

<strong>Edição</strong> gráfica: Pablo Gomes<br />

Fidel Castro é um ditador? Há liberdade na Coréia do Sul? As mulheres<br />

ocidentais ditam o padrão de beleza pelo mundo? Há alguma ditadura<br />

onde você vive? Nessa edição do “E aí?”, fizemos essas e outras perguntas a<br />

estudantes do Brasil, Coréia do Sul, Argentina e Cuba para saber o que eles<br />

acham de possíveis imposições em seus locais de origem, seja na política ou<br />

no comportamento. Confira!<br />

Dabi Kim, 23 anos<br />

Coréia do Sul<br />

“Na Coréia do Sul, somos livres para votar e temos direitos igualitários entre homens<br />

e mulheres na sociedade e na política. Porém, acredito que vivemos numa Ditadura da<br />

beleza. Grande parte das garotas já fizeram plásticas no rosto e no corpo, porque querem<br />

se encaixar no padrão de beleza das bonecas ocidentais: olhos largos, nariz afinado e corpo<br />

esguio. A Coréia do Sul é o país em que a população feminina mais recorre às cirurgias<br />

plásticas para ocidentalizar o rosto. Acredito que o problema da busca incessante pela beleza<br />

afeta não só as sul-coreanas, mas as mulheres em geral. É por isso, também, que os<br />

transtornos alimentares têm afetado muitas meninas pelo mundo. Espero que essa realidade<br />

mude num futuro próximo.”<br />

“Ao ser perguntado, logo pensei nos conflitos que os estudantes estão tendo com o atual<br />

governador do Espírito Santo porque, desde 2011, a passagem de ônibus tem aumentando<br />

exorbitantemente. Os discentes fizeram passeatas e manifestos contrários aos preços e foram<br />

reprimidos com violência; além disso, as passagens subiram mesmo contra a vontade<br />

da população. Então, em minha opinião, o Espírito Santo sofre certa Ditadura nesse sentido,<br />

pois tentam calar a voz de quem não concorda com as decisões do governo.”<br />

Jorge Saura, 20 anos<br />

Cuba<br />

“Em Cuba, vivemos uma Ditadura política nos últimos 54 anos. É complicado viver<br />

num regime como esse, já que você não tem nenhum direito legal. Acredito que a única<br />

maneira de não contribuir para a Ditadura de Fidel e Raul Castro é deixando de se envolver<br />

com a política. Para evitá-la completamente, só mesmo deixando o país. Acredito que os<br />

irmãos Castro ainda estão no poder porque eles cercearam a liberdade política dos cubanos.<br />

Cuba não possui eleição para presidente, como existe em grande parte dos países. Isso<br />

mostra que Castro é o principal líder de um regime totalitário e que toma as decisões sem<br />

consultar o seu povo.”<br />

“O que percebo aqui, em Parauapebas (PA), acredito que não é muito diferente da realidade<br />

de outras cidades brasileiras. Vejo uma certa Ditadura do consumo. As novidades<br />

e lançamentos do mercado chegam atrasadas em relação a outras partes do Brasil, mas<br />

assim que chegam causam o mesmo impacto. Os provedores das famílias muitas vezes<br />

podem não garantir o alimento para os filhos durante todo o mês, mas a maioria das casas<br />

possuem televisão, um ou mais celulares e outros equipamentos de última geração com a<br />

ideia de que isso traz conforto e inclusão social.”<br />

Jamil Ribeiro, 22 anos<br />

Espírito Santo<br />

Priscila Nonato, 26 anos<br />

Pará<br />

33<br />

Imagens retiradas do site: http://iciocartunista.blogspot.com.br/2012/06/caderno-sobre-ditadura-jornal-diario-da.html


Quebrando Regras<br />

MODA para<br />

QUESTIONAR<br />

“A militância cega no Brasil promove a própria cegueira<br />

do nosso povo”. Com essa fala o estilista mineiro Ronaldo<br />

Fraga rebate as críticas sobre o uso de palhas de aço nos<br />

cabelos das modelos em sua Coleção Verão 2014. Em<br />

entrevista exclusiva à <strong>Revista</strong> <strong>Curinga</strong>, Fraga fala sobre a<br />

relação da moda com os mais diversos tipos de Ditadura.<br />

Texto: Jéssica Michellin<br />

<strong>Edição</strong> gráfica: Pablo Gomes<br />

<strong>Curinga</strong>: Como surgiu a ideia de se tornar estilista?<br />

Ronaldo Fraga: Na verdade, foi por meio do desenho,<br />

porque eu sempre gostei muito de desenhar. Fiz um curso<br />

técnico de desenho de moda gratuito no Senac, me formei<br />

como o melhor da turma e recebi a oferta de um emprego<br />

numa fábrica de tecidos. Desde então, não parei mais.<br />

C: Quando você iniciou sua carreira, há duas décadas,<br />

a moda no Brasil ainda não tinha uma identidade própria.<br />

Como foi participar dessa construção e valorização do<br />

que era feito aqui?<br />

RF: Foi um período difícil. Fazer parte de um grupo que<br />

desbrava, que faz primeiro, não é algo fácil, mas não deixa<br />

de ser gratificante. É um desafio nosso, até hoje em dia, de<br />

fazer moda de um jeito brasileiro. Acredito que caminhamos<br />

bastante, mas ainda tem muito a ser feito.<br />

C: Naquele momento, suas coleções representavam<br />

uma ruptura em relação ao que era feito no país?<br />

RF: Fui muito criticado por aqueles que me elogiam<br />

hoje, porque, no início, quando eu chegava trazendo<br />

histórias fechadas por meio da moda, isso não era muito<br />

comum. E, não raro, eu fui acusado de carnavalesco da<br />

moda. Mas eu nunca me deixei levar por essas críticas e<br />

persisti nas minhas ideias.<br />

C: O tema da nossa edição é Ditadura. O que vem a<br />

sua cabeça quando falamos disso?<br />

RF: Pra mim, Ditadura é toda e qualquer imposição<br />

de conceitos e estilos. Eu acho que o mundo sempre foi<br />

movido por isso e há de se quebrar toda e qualquer forma de<br />

Ditadura. Só que essa quebra demanda autoconhecimento,<br />

autoestima, apropriação da história e da cultura de um<br />

povo. Hoje, vivemos num país democrático e livre, mas<br />

nós temos a Ditadura do pensar: esse ato simples já é uma<br />

forma de subversão e de ir contra todo esse patrulhamento<br />

que a gente vive.<br />

C: A sua coleção “Quem matou Zuzu Angel” foi uma<br />

forma de protesto e sensibilização em relação aos fatos<br />

ocorridos durante a Ditadura Militar no Brasil?<br />

RF: Eu fui um adolescente extremamente militante.<br />

Eu deixava qualquer coisa no colégio pra poder ir às ruas e<br />

protestar. Eu já estava até acostumado ao gás lacrimogênio<br />

e cassetadas dos anos 80. Eu venho de uma geração, talvez<br />

a última delas, muito politizada nesse sentido. A escolha<br />

da Zuzu Angel veio porque foi o primeiro nome da moda<br />

que me chamou atenção. Foi uma brasileira que usou a<br />

34


moda como uma bandeira de protesto, ato que custou a<br />

sua própria vida. Então, eu acho que a nova geração de<br />

estudantes de moda, arte e cultura no país tem muito o que<br />

aprender com figuras que fizeram muito pelo país através<br />

da roupa, como Ney Galvão e a própria Zuzu.<br />

C: Você utiliza a arte como uma maneira de resgatar,<br />

analisar e protestar em relação aos mais variados<br />

aspectos da cultura do nosso país?<br />

RF: Eu uso principalmente a moda como um vetor de<br />

apropriação cultural. Num lugar em que a cultura é dada<br />

e bem tratada não existe miséria. Não tem mudança de<br />

governo que tire uma autoestima com o viés cultural de<br />

um povo. Se esse universo cultural vai me levar a protestar,<br />

a falar coisas do meu tempo, ok, mas o principal é a<br />

apropriação cultural. Toda e qualquer situação do cotidiano<br />

que me emocione ou até me assombre pode virar tema do<br />

meu trabalho.<br />

C: Você acredita que existe uma Ditadura da beleza<br />

na moda?<br />

RF: Claro que existe. O padrão que impera é o anglo<br />

-saxônico, fato que me parece muito antigo, porque lutamos<br />

tanto pela liberdade, pelas conquistas, e ainda continuamos<br />

agarrados a certos padrões. Por mais que se fale: a modelo<br />

negra é linda. Ainda é uma negra que tem os traços finos<br />

e o cada vez mais cabelo descolorido, aproximando do<br />

loiro. A japonesa de pele amarela e a indígena também<br />

não têm vez. Eu acho até que isso é sério, tem que ser<br />

discutido. Mas tem outras coisas urgentes e básicas que<br />

a gente precisa tratar no país, para que as pessoas tenham<br />

um olhar aberto em relação a esses padrões. Uma coisa<br />

que me incomoda profundamente é o preconceito racial.<br />

Meus filhos estudam numa escola particular que deve ter<br />

dois alunos negros. Isso me incomoda muito mais do que o<br />

padrão de beleza na moda.<br />

C: Qual é o papel da moda?<br />

RF: A moda é muito mais que um vetor econômico. Ela<br />

tem um vetor cultural, porque estimula a transformação<br />

do olhar e do pensar das pessoas. E é muito sério quando<br />

eu te digo que a roupa é a primeira mídia que você tem<br />

controle, porque é a primeira coisa que você vai colocar e<br />

expor no seu corpo. A moda diz muito sobre quem você é.<br />

C: A sua última coleção gerou muitos<br />

comentários nas redes sociais por<br />

causa das palhas de aço nos cabelos<br />

das modelos. Qual foi a sua intenção ao<br />

compor esse visual?<br />

RF: A comoção em torno dessa questão<br />

me gerou muita surpresa. Mostra que<br />

essa militância cega no Brasil promove<br />

a própria cegueira, já que continuamos<br />

sem dar atenção a inúmeros problemas.<br />

É como se estivessem discutindo a cor da<br />

bolinha da calcinha da formiga enquanto<br />

os elefantes estão passando vigorosos. Já<br />

tinha usado o material nas coleções de 96<br />

e 94, e em nenhuma delas causou tanta<br />

polêmica quanto nessa, em que o ponto da<br />

discussão era o preconceito racial nos anos<br />

50, quando negro não podia ver jogo nos<br />

estádios e muito menos jogar. Antes, era<br />

permitido aos jogadores e juízes surrarem o<br />

jogador negro quando ele cometesse falta,<br />

então o negro tinha que ter a malícia para<br />

desviar a bola do oponente sem fazer falta.<br />

Isso é a arte que foi retratada no desfile.<br />

Na época, a palha era utilizada para tentar<br />

melhorar o sinal das TVs, por isso, a ideia<br />

de colocar o material no desfile. A sensação<br />

que eu tenho é a de que muita gente entra<br />

no twitter, pega uma frase e simplesmente<br />

retwitta aquilo sem o menor discernimento.<br />

Um dos twittes dizia: “desfile homenageia<br />

negros com a peruca de bombril”. O desfile<br />

não é uma homenagem aos negros, o desfile<br />

fala de futebol!<br />

Ilustrações: Ronaldo Fraga<br />

35


Frequência<br />

O pop nosso de cada dia<br />

36


FOTO: LINCON ZARBIETTI<br />

“Todo mundo tá revendo o que nunca foi visto,<br />

todo mundo tá comprando os mais vendidos”.<br />

Os versos são de 1990, mas revelam uma<br />

característica que é mais do que atual na nossa<br />

sociedade. “O Papa é Pop”, dos Engenheiros<br />

do Hawaii, trata da exposição que a mídia faz<br />

de celebridades e suas produções e critica a<br />

maneira como lidamos com nossos ídolos. Será<br />

que o pop realmente não poupa ninguém?<br />

Ligado a uma lógica comercial, a cultura do<br />

pop diz respeito a um conjunto de dinâmicas<br />

que padronizam comportamentos e gostos.<br />

Seus grandes representantes transitam entre<br />

o rock, o gospel, o axé, o funk, o sertanejo ou<br />

qualquer estilo de música. Há sempre um hit que<br />

ganha destaque no cenário musical e se torna<br />

tão popular, que o artista é capaz de conduzir e<br />

influenciar um grupo enorme de fãs. Estes ídolos<br />

são diferentes no estilo e na maneira de agir e<br />

fazem uso de linguagens distintas ao difundir<br />

suas músicas. Mas todos têm algo em comum:<br />

são considerados por muitos fãs como referência.<br />

37


TO: Frame do Clipe ”Your body”<br />

d i k f h g e j n<br />

38


“Geralmente eu procuro ouvir alguns artistas<br />

porque a Christina disse que gosta em alguma<br />

entrevista. Acabo indo atrás e gostando. Talvez se<br />

eu não tivesse visto ela comentado em algum lugar<br />

eu nem teria parado para conhecê-los” Daniel Duarte<br />

Texto: João Felipe Lolli e Lorena Silva<br />

<strong>Edição</strong> Gráfica: Janini Sanches<br />

O estudante de música Daniel Duarte,<br />

24 anos, não coleciona somente as canções<br />

e fotos do seu ídolo, Christina Aguilera. Há<br />

seis anos, a paixão pela cantora é tão grande<br />

que perfumes, DVDs, revistas e vinis originais,<br />

que ele mantém intactos, também fazem<br />

parte da sua coleção. Apesar de nunca<br />

ter ido a uma apresentação da artista, que<br />

só fez dois shows no Brasil em 2000, o fã se<br />

arrepende de não ter feito o possível para<br />

vê-la em 2011, quando a cantora veio ao<br />

país lançar sua linha de roupas em parceria<br />

com uma loja brasileira e também para assistir<br />

ao desfile da São Paulo Fashion Week.<br />

Segundo Daniel, Christina Aguilera<br />

exerce forte influência em seu conhecimento<br />

musical. Foi a partir dela que ele conheceu<br />

alguns nomes do blues e do jazz, como<br />

Etta James, Nina Simone, Aretha Franklin<br />

e até mesmo as mais pop’s como Judy Garland,<br />

Julie Andrews e Barbra Streisand.<br />

“Geralmente eu procuro ouvir alguns artistas<br />

porque a Christina disse que gosta<br />

em alguma entrevista. Acabo indo atrás e<br />

gostando. Talvez se eu não tivesse visto ela<br />

comentado em algum lugar eu nem teria<br />

parado para conhecê-los”, explica.<br />

Acostumado a fotografar profissionalmente<br />

artistas do universo pop, como<br />

Beyoncé, Rihanna, Michel Teló e Maria<br />

Gadú, tanto em shows quanto para produção<br />

de capas de CDs e DVDs, Marcos Hermes<br />

já esteve perto de alguns de seus ídolos,<br />

como Paul McCartney e Gilberto Gil. O<br />

fotógrafo ingressou nessa área por querer<br />

registrar seus artistas favoritos no palco.<br />

Como fã, Hermes é privilegiado nessa relação<br />

com seus ídolos, já que aos poucos pôde<br />

chegar mais perto deles, até poder conhecêlos.<br />

“Você acaba virando amigo dos ídolos,<br />

pelo contato e pela confiança”, explica. Mas<br />

quem constrói esse ídolo?<br />

Uma gênese pop<br />

Segundo o editor assistente do caderno<br />

de cultura da Folha de S. Paulo, Rodrigo<br />

Levino, a imagem de um ícone pop é<br />

construída pela indústria cultural. O termo<br />

foi utilizado pela primeira vez por Theodor<br />

Adorno e Max Horkheimer, filósofos alemães<br />

do século XX, para definir a condição<br />

da produção artística na sociedade capitalista<br />

contemporânea. Representa o conjunto<br />

de instituições que produzem, distribuem e<br />

transmitem conteúdo artístico com o objetivo<br />

de obter lucro.<br />

Para Ronaldo Helal, professor da Universidade<br />

do Estado do Rio de Janeiro (UERJ),<br />

essa construção do ídolo na mídia se faz em<br />

uma via de mão dupla. “A mídia legitima,<br />

edita, destaca alguns elementos, superdimensiona<br />

outros, mas ela só faz isso de<br />

acordo com as ações do ídolo e da sociedade”,<br />

completa. No contexto de uma cultura<br />

mercantilizada, artistas e público formam<br />

um circuito orientado pelo consumo.<br />

39


A mídia é capaz de difundir<br />

o gestual, as roupas e<br />

a linguagem dos ídolos pop,<br />

ou seja, toda uma identidade,<br />

que é percebida mais facilmente<br />

na televisão, meio<br />

em que imagem e voz se<br />

aliam e onde esses artistas<br />

muitas vezes despontam e<br />

aparecem com frequência.<br />

O aspecto visual de um<br />

músico também contribui<br />

fundamentalmente para<br />

sua ascensão. Por trabalhar<br />

com a fotografia e produção<br />

da imagem de muitos desses<br />

artistas, Marcos Hermes<br />

compreende essa importância.<br />

“Hoje é difícil imaginar<br />

um artista que faz sucesso<br />

sem uma imagem coerente<br />

com a sua obra”, comenta.<br />

Para Daniel, vários são<br />

os responsáveis por construir<br />

a imagem que Christina<br />

Aguilera transmite: a mídia,<br />

os fãs e também quem<br />

a produz. A cantora gravou<br />

um álbum em novembro de<br />

2012 e a gravadora desistiu<br />

de sua divulgação alegando<br />

que a artista estaria acima<br />

do peso. “Acredito que os<br />

fãs vão continuar gostando<br />

dela, estando gorda ou magra”,<br />

diz Daniel. “Mas talvez<br />

ela (a gravadora) acredite<br />

que não é suficiente para<br />

alcançar seu público alvo,<br />

atiçar a mídia e vender”.<br />

O cenário musical tem<br />

se configurado em torno<br />

das produtoras e das assessorias<br />

de imprensa desses<br />

artistas, que possuem<br />

o intuito de distribuir suas<br />

produções para a mídia e<br />

alimentar um mercado voltado<br />

às vendas e ao lucro.<br />

Muitos são os mecanismos<br />

que colaboram para que um<br />

artista saia do anonimato e<br />

se torne uma figura pública.<br />

Alguns desses mecanismos,<br />

por exemplo, incluem pagar<br />

para que as rádios toquem<br />

determinada música. “Existia<br />

isso (pagar as rádios) antigamente,<br />

e tem até hoje.<br />

Não é uma coisa divulgada,<br />

mas com certeza existe”,<br />

afirma Celso Alves, artista<br />

mineiro com dois discos<br />

gravados e curador de música<br />

do Festival de Inverno de<br />

Ouro Preto e Mariana entre<br />

2009 e 2012.<br />

Celso lembra ainda que<br />

muitos artistas não precisam<br />

investir em divulgação.<br />

“Claro que o empresário do<br />

Roberto Carlos não precisa<br />

pagar nada pra tocarem<br />

“Esse cara sou eu”, porque<br />

é interesse da rádio tocar a<br />

música. Mas agora se é um<br />

cantor que está começando,<br />

a gravadora ou o empresário<br />

pagam pra rádio tocar”, declara<br />

o artista, que não considera<br />

essa prática desleal.<br />

“Se eu tivesse dinheiro pagaria<br />

sim uma rádio pra tocar,<br />

pagaria pra aparecer no<br />

Faustão, acho isso natural”,<br />

confessa Celso Alves, que já<br />

chegou a mandar seu material<br />

para um diretor musical<br />

da Rede Globo, no Rio<br />

de Janeiro. “De repente ele<br />

ouve e me encaixa em uma<br />

novela, quem sabe? Mas seria<br />

muita sorte, um em um<br />

milhão”, declara.<br />

Outros palcos<br />

Assim como a TV e o rádio,<br />

a internet contribui hoje<br />

de forma significativa na difusão<br />

da música pop. Uma<br />

das vantagens da internet<br />

é o artista poder divulgar<br />

seu trabalho sem que seja<br />

necessário um espaço físico,<br />

além da velocidade na troca<br />

de informações. Para o estudante<br />

de jornalismo André<br />

Salmerón, 22 anos, na internet<br />

sempre se pode buscar o<br />

que ouvir, já que há milhões<br />

de artistas à disposição. “É<br />

tudo uma questão de escolha:<br />

você pode correr atrás<br />

de novas influências ou<br />

deixar a MTV fazer isso pra<br />

você”, comenta. O editor da<br />

Folha de S. Paulo, Rodrigo<br />

Levino, complementa: “não<br />

há canal que coopere mais<br />

para a ascensão de um ídolo<br />

pop hoje do que a internet.<br />

Se não há barreira geográficas<br />

nem linguísticas, tudo é<br />

permitido”.<br />

A Colonial FM, da cidade<br />

de Congonhas do Campo,<br />

que fica a 80 quilômetros de<br />

Belo Horizonte, é um exemplo<br />

de rádio popular, já que<br />

trata de trânsito, resumo de<br />

novelas, horóscopo e balcão<br />

de empregos. Musicalmente,<br />

toca pagode, sertanejo,<br />

axé. “Se você tem uma rádio<br />

‘pop’, essa grade de programação<br />

vai ser estritamente<br />

popular, com informações<br />

de acesso mais fácil”, explica<br />

o coordenador artístico<br />

da Colonial, Marcos Silva.<br />

Com três décadas de experiência,<br />

tendo passado por<br />

emissoras como o sistema<br />

Globo de rádio, Jovem Pan,<br />

98 FM, dentre outras, Marcos<br />

acredita que a novela<br />

ainda dita o que toca ou não<br />

nas rádios do país. “A novela<br />

é de um apelo muito popular,<br />

ela está todo dia na sua<br />

casa, e as pessoas se apegam<br />

aos personagens e também<br />

às músicas”, completa.<br />

Nos impressos, Levino<br />

enfatiza que esses artistas<br />

têm menos espaço do que<br />

mereceriam. “Cadernos de<br />

cultura operam como se fossem<br />

uma reserva de um tipo<br />

de cultura mais refinada, o<br />

que na maior parte das vezes<br />

é verdade”.<br />

40


FOTO: Frame do vídeo “Especial de natal”exibido pela Rede Globo - Dez/2012<br />

A autora da novela<br />

Salve Jorge, da Rede<br />

Globo, Glória Perez,<br />

encomendou do “Rei”<br />

Roberto Carlos a canção<br />

“Esse cara sou eu”.<br />

O hit dos protagonistas<br />

Théo e Morena está entre<br />

os mais tocados das<br />

rádios de todo Brasil<br />

desde outubro de 2012.<br />

Segundo o jornalista, não há como ignorar<br />

completamente o movimento das<br />

ruas, os artistas que estão fazendo sucesso<br />

nas emissoras de rádio e na internet, por<br />

exemplo. Esse é o momento de um bom<br />

caderno de cultura se debruçar sobre esses<br />

fenômenos, qualificá-los e tentar explicar<br />

para os leitores, com visão mais ou menos<br />

crítica, o seu significado.<br />

O professor Ronaldo Helal acredita que<br />

na internet todo mundo é senhor da sua<br />

própria notícia. Ao invés de uma cultura de<br />

massa, temos uma troca de informações,<br />

onde os que eram somente receptores também<br />

passam a emitir mensagem e conte-<br />

údo. “A internet quebra com a ideia monopolizadora<br />

da indústria cultural”, enfatiza.<br />

O estudante André não tem um ídolo<br />

considerado pop. É fã de jazz, rock’n’roll,<br />

MPB e de músicos como Lou Reed, Sonic<br />

Youth, Miles Davis e Los Hermanos, artistas<br />

que não estão sempre expostos na mídia,<br />

mas são igualmente admirados pelo estudante.<br />

Segundo André, é possível se ausentar<br />

da cultura pop até certo ponto. Antes,<br />

fugir do que era proposto pela mídia era<br />

mais difícil, mas hoje escolher é possível, já<br />

que há ferramentas capazes de direcionar a<br />

outros artistas. O pop nosso de cada dia já<br />

não é mais o mesmo.<br />

41


Opinião<br />

VOCÊ NÃO PODE PERDER ESTA OFERTA!<br />

Texto: Alice Piermatei<br />

<strong>Edição</strong> Gráfica: Laio Monteiro<br />

Posso. Podemos. Ligamos a televisão: anúncio, propaganda,<br />

merchandising. Modelo famosa que, através do seu<br />

sorriso e do creme dental “x”, conquistou o mundo. Apresentador<br />

bem sucedido falando sobre um novo benefício do<br />

banco “tal”, a loja de eletrodomésticos que “tem preço” e<br />

entre as coisas que fazem você parecer mais respeitável está<br />

um sedan novo na garagem.<br />

Ser induzido a comprar, consumir ou fazer parte do grupo<br />

de pessoas que possui determinado bem é hoje algo comum.<br />

Somos levados a uma necessidade de consumo imperante.<br />

Esse imediatismo da posse - reiterado em pesquisa do<br />

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que<br />

afirma que entre 2003 e 2011 o poder de compra do rendimento<br />

de trabalho dos brasileiros aumentou em 22,2% - me<br />

faz pensar que, ao passar o cartão de crédito na maquininha,<br />

enquanto dividimos a conta em 6 vezes sem juros – eu<br />

disse em até 6 vezes sem juros! - quase nunca temos certeza<br />

da vontade que nos levou até a compra.<br />

A magia mostrada nos filmes publicitários, nos outdoors<br />

e cartazes transporta a sociedade para o que seria, inconscientemente,<br />

seu ideal de perfeição. Afinal, quem não<br />

gostaria de ter uma família feliz e estruturada como as que<br />

são mostradas nos comerciais de margarina? Quem não<br />

quer adquirir respeito e status como o que pode lhe trazer<br />

um carro do ano? Quem não gostaria de ter um crediário de<br />

12 prestações, realimentado todos os anos e através do qual<br />

as dívidas crescem cada vez mais?<br />

Segundo reportagem do Estado de Minas, de maio de<br />

2011, há uma perspectiva do governo para um crescimento<br />

da massa salarial a uma taxa anual de 9% até 2014. Partindo<br />

desse pressuposto, ao mesmo tempo em que novas<br />

oportunidades de consumo surgem, vindas dos crescentes<br />

aumentos de salários, as portas do mercado se abrem para<br />

as classes emergentes.<br />

Poderíamos dizer, supondo que nossos gastos refletem<br />

nossos gostos e hábitos, que a fatura que chega às nossas<br />

casas é a definição de nossa personalidade? Não sei medir<br />

até que ponto nossas projeções e idealizações de futuro,<br />

imagem e carreira perpassam as ordens de consumo recebidas.<br />

Talvez um relógio novo consiga realmente dizer aos<br />

meus colegas que sou uma pessoa mais séria, mas não sei<br />

quem me convenceu disso. Seriam os tais comandos repassados<br />

pelas inúmeras propagandas?<br />

Difícil julgar comportamentos cíclicos e habituais. O papel<br />

dos profissionais de publicidade é justamente vender a<br />

marca, fazê-la ser lembrada e consumida. A economia se<br />

aquece através das vendas, por isso tem que ter capital girando<br />

para se manter. A ordem natural do sistema está posta,<br />

não se pode negar. Nisso, a quantidade que consumimos<br />

é o “x” da questão, ela é grande demais.<br />

E aí, quem é o responsável por isso? Nós, compradores,<br />

que desenvolvemos necessidades supérfluas? Os publicitários,<br />

por nos induzirem a cultivar essas necessidades? O<br />

mercado, que tem que se manter? Ou o capitalismo, modelo<br />

econômico vigente, que funciona nessa dinâmica?<br />

Ao vermos um anúncio publicitário, uma mensagem<br />

é enviada ao nosso cérebro, ela dispara um sentimento de<br />

desejo, de necessidade, um impulso a partir do qual temos<br />

vontade de adquirir o que é proposto, e rapidamente.<br />

Segue-se uma busca pelo produto: sites, lojas, telefonemas,<br />

encomendas. “Vocês aceitam cartão?” No meio do turbilhão<br />

de informações, entre os apelos de “Compre! Compre! Compre!”,<br />

esquecemos de nos perguntar qual a real necessidade<br />

de ter o objeto de desejo. Ou, ainda, de nos questionar sobre<br />

o próprio desejo.<br />

Às vezes, fazemos coleções de coisas praticamente idênticas<br />

e tentamos nos convencer de que são totalmente diferentes<br />

e úteis. Tudo isso para, no dia seguinte, ambicionar<br />

outro produto recém-lançado e muito bem cotado pela crítica.<br />

Então, seguimos com as mesmas desculpas, retiradas<br />

da necessidade imposta a nós, mas não por nós. Tem certeza<br />

que você não pode perder esta oferta?<br />

42<br />

LIgue para 0800-0000-0800 e faça seu pedido !!!


LAMPIÃO<br />

Jornal Laboratório do curso de Jornalismo da<br />

Universidade Federal de Ouro Preto<br />

Conheça: jornalismo.ufop.br/lampiao<br />

<strong>Curinga</strong><br />

online<br />

Confira o o conteúdo exclusivo em nosso site.<br />

Acesse: www.revistacuringa.ufop.br<br />

43


44<br />

2013<br />

www.revistacuringa. ufop. br

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