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dinheiro arrecadado no mês para cima, ficando<br />
para mim o que cai fora e para Ele<br />
aquele que cai dentro do mesmo. E o vigário<br />
José como é que faz?, quis saber<br />
com a mesma curiosidade.<br />
– Já eu traço uma linha reta no quintal<br />
de casa e, assim como o senhor, jogo o<br />
dinheiro para cima, o montante que cai<br />
do lado direito é do<br />
Todo-Poderoso e a<br />
quantia que vier<br />
para o lado esquerdo<br />
é minha.<br />
Percebendo os<br />
dois que o titular<br />
da igreja judaica<br />
estava propositadamente<br />
alheio, fizeram-lhe<br />
em coro<br />
a mesma pergunta:<br />
– E o líder Jacob,<br />
nestes termos,<br />
como é que<br />
age com sua arrecadação<br />
mensal?<br />
De pronto e<br />
sem vacilações o<br />
seguidor de Judá<br />
sentenciou:<br />
– Como sabedor<br />
consciente da Sua onipotência, eu<br />
fecho os olhos com muito fervor e jogo a<br />
grana o mais alto possível; aquela que o<br />
Senhor de todos nós apanhar é dele,<br />
toda a que voltar é minha, por justo merecimento.<br />
Pois bem. Conhecedor da força do<br />
seu dinheiro junto à comunidade interiorana<br />
em que vive, o pecuarista e cafeicultor<br />
Zequinha da Passeio, fazenda cujo<br />
nome justifica o latifúndio que administra<br />
cá nas Gerais, sofreou seu ajaezado<br />
cavalo diante da matriz, saltou exibindo<br />
as reluzentes esporas de prata, subiu as<br />
escadas com elas, tilintantes, acercou-se<br />
do vigário e arrotou altaneiro:<br />
– Eu só vim aqui hoje, no mei da sumana,<br />
por causa de batizá meu cavalo,<br />
seu pade.<br />
– O senhor está ficando louco, seu Zequinha?<br />
Não está vendo que eu não cometerei<br />
tal heresia?<br />
E foi aquele deus nos acuda entre as<br />
beatas presentes à missa matutina, enquanto<br />
o fazendeiro não estava nem aí<br />
com todo aquele alvoroço. Meteu a mão<br />
no bolso, tirou de lá dez notas de cem<br />
reais, abanou o rosto com as cédulas em<br />
forma de leque e provocou seguro de si:<br />
– O sinhô é qui sabe. Eu trouche essa<br />
gaita pra ajudá sua igreja. Quédizêqui é u’a<br />
nota dessa pra cada três dia do mêis...<br />
– Não é bem assim, seu Zequinha –<br />
abrandou-se o sacerdote. – O senhor há<br />
de convir que eu não faria uma coisa<br />
destas cá dentro da matriz, mas se puder<br />
ser lá fora...<br />
– Eu quero é batizá meu animá, pois<br />
qui ele tem sido como um irmão pra<br />
mim e meus fios – justificou-se o ricaço.<br />
Dito e feito. O vigário pôs a estola, assoprou<br />
baixo e sabidamente algumas palavras<br />
em latim, espargiu água benta no<br />
corpo do belo equino e fez o sinal da<br />
cruz em sua direção.<br />
Galgando de um salto sobre a cavalgadura,<br />
o feliz agricultor arrematou:<br />
– Era assim qu’eu queria, na base do latinóro<br />
– e foi se afastando de costas,<br />
quando escutou o servo de Deus gritar-lhe:<br />
– Preste bem atenção, seu Zequinha,<br />
na Semana Santa não se esqueça de trazer<br />
o “Incitatus” – nome que apôs ao cavalo<br />
–, para que possamos crismá-lo.<br />
* Tiãozito Cardoso é tabelião aposentado<br />
em Brumado-BA<br />
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