EFEITOS DO TABACO NA FECUNDIDADE E NA GRAVIDEZ* - BIPS
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<strong>EFEITOS</strong> <strong>DO</strong> <strong>TABACO</strong> <strong>NA</strong><br />
<strong>FECUNDIDADE</strong> E <strong>NA</strong> <strong>GRAVIDEZ*</strong><br />
Dra. Ana Aroso, ginecologista e obstetra<br />
O <strong>TABACO</strong> E A <strong>FECUNDIDADE</strong><br />
O número de cigarros fumados por dia<br />
tem uma influência directa sobre a<br />
fertilidade. As fumadoras, incluindo as<br />
expostas ao fumo passivo, necessitam<br />
de mais de 1 ano para engravidar (mais<br />
54% de casos que nas não<br />
fumadoras). A FSH (hormona<br />
folículo estimulante) basal está<br />
aumentada em mais 66% nas<br />
fumadoras e 39% nas fumadoras<br />
passivas relativamente às não<br />
fumadoras. Os ciclos menstruais<br />
são inferiores a 28 dias. A<br />
produção de estrogéneos está<br />
diminuída.<br />
Alguns dos constituintes químicos<br />
do tabaco interferem com a divisão<br />
das células germinativas (efeito<br />
também encontrado a nível dos<br />
esperma-tozóides).<br />
Discute-se também um efeito<br />
teratogéneo do tabaco.<br />
Fumar está associado a um maior<br />
risco de aborto espontâneo. Talvez<br />
por um efeito sobre o aumento das<br />
vaginoses, verifica-se um aumento<br />
dos abortos tardios e de parto<br />
prematuro.<br />
Um estudo epidemiológico<br />
identificou o consumo de tabaco<br />
CONSELHO DE PREVENÇÃO <strong>DO</strong> TABAGISMO<br />
Avenida Estados Unidos da América, 53 D - 4º<br />
1700-165 Lisboa, Portugal<br />
Tel.: +351 218 464 219<br />
Fax: +351 218 464 212<br />
Email cpt@dqsaude.min-saude.pt<br />
http:// www.dgsaude.pt<br />
durante a gravidez como a causa de<br />
diminuição da produção de<br />
espermatozóides em filhos de mulheres<br />
fumadoras, efeito que é atribuído ao<br />
cadmium.<br />
página01<br />
Os tratamentos da medicina da<br />
reprodução são menos eficazes nas<br />
fumadoras pelas seguintes razões:<br />
• Maior dose de gonadotrofinas<br />
necessária para estimulação ovárica;<br />
• Diminuição do pico de estradiol;<br />
• Diminuição dos oócitos recolhidos;<br />
• Aumento dos ciclos cancelados;<br />
• Diminuição da taxa de implantação;<br />
• Aumento da falha de ciclos de<br />
fertilização;<br />
• A idade e o tabaco têm um efeito<br />
sinérgico na deplecção dos oócitos;<br />
• Aumento da gravidez ectópica<br />
(alteração sobre os cílios das trompas<br />
de Fallopio);<br />
• Aumento da gravidez gemelar.<br />
O <strong>TABACO</strong> E A GRAVIDEZ<br />
São conhecidos mais de 4000<br />
químicos na composição do<br />
tabaco. Os mais prejudiciais são a<br />
nicotina, o monóxido de carbono<br />
(CO) e o cianeto de hidrogénio.<br />
A nicotina causa vasoconstrição<br />
com diminuição da circulação<br />
placentar contribuindo para a<br />
hipóxia fetal.<br />
A afinidade da hemoglobina é 200<br />
vezes maior para o monóxido de<br />
carbono que para o oxigénio,<br />
reduzindo a libertação de oxigénio<br />
nos tecidos maternos e fetais.<br />
Estes efeitos estão implicados no<br />
atraso de crescimento intra-uterino<br />
dos fetos das mães fumadoras.<br />
Alguns carcinogéneos do tabaco<br />
atravessam a placenta e tem uma<br />
acção sobre o desenvolvimento<br />
fetal que é independente do<br />
número de cigarros fumados.<br />
Fumar tem um efeito directo sobre<br />
a reactividade da frequência<br />
cardíaca fetal. Este efeito tem de<br />
ser tido em conta na interpretação do<br />
registo cardio-tocográfico da vigilância<br />
do bem estar fetal antenatal.<br />
(continua página 2)<br />
* Adaptação da comunicação apresentada no 2 º<br />
Encontro Sobre Prevenção e Tratamento do<br />
Tabagismo, que decorreu no Porto nos dias 12 e<br />
13 de Janeiro de 2006
página02<br />
Entrevista<br />
Prof. M. Pais Clemente<br />
Presidente do Conselho de Prevenção do Tabagismo<br />
Portugal ratificou em Novembro de 2005 a Convenção-Quadro<br />
para o Controlo do Tabaco (CQCT). Em resumo, o que é esta<br />
convenção?<br />
A ideia da Convenção-Quadro para o Controlo do Tabaco (CQCT) surgiu na<br />
48ª Assembleia Mundial da Organização Mundial da Saúde em 1995. No dia<br />
21 de Maio de 2003, os 192 Estados representados na 56ª Assembleia Mundial<br />
da Saúde aprovaram por unanimidade a Convenção-Quadro para o Controlo<br />
do Tabaco. Desenvolver, negociar e aprovar a Convenção demorou 8 anos.<br />
Este dado é, por si só, uma evidência da importância deste documento que<br />
ficará para a história como o primeiro tratado mundial no âmbito da saúde.<br />
Após a aprovação na Assembleia Mundial da OMS, no dia 30 de Novembro<br />
de 2004 o Peru foi o 40º país a ratificar a Convenção. Ficou assim cumprida a<br />
condição necessária para esta Convenção aceder ao estatuto de Lei<br />
Internacional. Portugal assinou a Convenção no dia 9 de Novembro de 2004<br />
e ratificou-a no dia 8 de Novembro de 2005.<br />
Para definir a Convenção em poucas palavras, podemos recorrer ao primeiro<br />
parágrafo do seu preâmbulo: “As partes que subscrevem esta Convenção estão<br />
determinadas a dar prioridade à protecção da Saúde Pública”. A finalidade da<br />
Convenção é harmonizar à escala mundial a luta contra o tabagismo que, nos<br />
termos da OMS, é a principal causa evitável de doença e morte.<br />
Que implicações terá a ratificação da CQCT para o controlo do<br />
tabagismo em Portugal?<br />
A primeira implicação é o reconhecimento do tabagismo como o principal<br />
flagelo para a Saúde Pública. O tabagismo causa, por ano, cerca de 500 mil<br />
mortes na UE e cerca de 10.000 em Portugal. O fumo do tabaco é também o<br />
principal agente poluidor de espaços fechados. Esperamos a curto prazo a<br />
publicação de uma nova Lei de Prevenção e Controlo do Tabagismo em Portugal<br />
que, à semelhança do que tem acontecido noutros países europeus,<br />
nomeadamente a Irlanda, a Itália e a Espanha, proíba o fumo do tabaco nos<br />
locais de trabalho e limite o seu uso nos espaços públicos.<br />
E que implicações terá para limitar as consequências do tabagismo<br />
na gravidez?<br />
A gravidez é a forma mais grave de tabagismo passivo. Aplica-se neste caso<br />
de forma inequívoca o conceito de tabagismo coercivo. Desde logo, o<br />
desenvolvimento do bebé é prejudicado pelo tabagismo activo ou passivo da<br />
mãe. Um estudo recente que realizámos em Portugal no âmbito do Projecto<br />
EURO-scip, um projecto europeu sobre o tabagismo na gravidez, indica que<br />
cerca de 50% das grávidas que trabalham estão expostas ao fumo ambiental<br />
de tabaco nos seus locais de trabalho. Face aos riscos conhecidos do tabagismo<br />
na gravidez, é inadmissível que metade das grávidas não possa evitar a<br />
exposição de si próprias e dos seus bebés à poluição do fumo ambiental do<br />
tabaco. A proibição de fumar nos locais de trabalho acabará com este atentado<br />
à saúde de todos, em especial à saúde dos nossos bebés!�<br />
(continuação página 1)<br />
O <strong>TABACO</strong> E O RECÉM-<strong>NA</strong>SCI<strong>DO</strong><br />
O tabaco é uma das causas de morte<br />
súbita do recém-nascido.<br />
Fumar durante a gravidez está associado<br />
a alterações do metabolismo das proteínas<br />
da actividade enzimática no sangue<br />
do cordão umbilical. A placenta perde<br />
a sua capacidade de inactivar os<br />
carcinogéneos e de regular o transporte<br />
de agentes tóxicos.<br />
A longo prazo verifica-se um aumento<br />
da morbilidade e mortalidade perinatal.<br />
Actualmente estão em curso estudos sobre<br />
os efeitos do tabaco no desenvolvimento<br />
intelectual dos filhos das mães<br />
fumadoras.<br />
O TRATAMENTO DAS<br />
GRÁVIDAS FUMA<strong>DO</strong>RAS<br />
Perguntar sempre às grávidas se fumam.<br />
Aconselhar as fumadoras a deixar totalmente<br />
de fumar. Ajudar se necessário<br />
com a prescrição de Bupropiona. Se for<br />
impossível a suspensão do uso do tabaco<br />
por causa do síndrome de abstinência<br />
é preferível usar pastilhas ou adesivos<br />
de nicotina. Evita-se assim o contacto<br />
com mais de 4000 substâncias nocivas<br />
que compõem o tabaco e que podem<br />
atravessar a placenta e causar efeitos<br />
nocivos no feto.<br />
É também indicado marcar consultas com<br />
frequência para monitorizar a suspensão<br />
de fumar e verificar o apoio imprescindível<br />
da família e amigos.<br />
EM RESUMO, FUMAR DURANTE A<br />
GRAVIDEZ ESTÁ ASSOCIA<strong>DO</strong> A:<br />
– Aborto espontâneo<br />
– Atraso do crescimento intra-uterino<br />
– Rotura prematura de membranas<br />
– Parto pré-termo<br />
– Descolamento da placenta �<br />
Sabia que?<br />
FUMAR DURANTE A<br />
GRAVIDEZ É UM FACTOR DE<br />
RISCO PARA A DEPENDÊNCIA<br />
DE NICOTI<strong>NA</strong> <strong>DO</strong>S FILHOS<br />
Os filhos de mães que fumaram 20<br />
ou mais cigarros durante a gravidez<br />
têm maior tendência para a<br />
dependência da nicotina ao longo da<br />
sua vida do que os filhos de mães<br />
que não fumaram durante a gravidez.<br />
Buka SL, Shenassa ED, Niaura R., Elevated risk of<br />
tobacco dependence among offspring of mothers who<br />
smoked during pregnancy: a 30-year prospective study,<br />
Am J Psychiatry, 2003 Nov; 160 (11): 1978-84
ACONSELHAR GRÁVIDAS A DEIXAR DE FUMAR CAUSA STRESSE?<br />
Com a finalidade de estudar se o<br />
aconselhamento intensivo para deixar de<br />
fumar causa stresse nas grávidas foi realizado<br />
um ensaio aleatório e controlado<br />
com 900 participantes. Estas mulheres<br />
foram aleatoriamente distribuídas por 3<br />
grupos:<br />
• O grupo A (controlo) teve um<br />
aconselhamento breve de acordo com<br />
a rotina clínica no Reino Unido;<br />
• O grupo B recebeu aconselhamento<br />
mais intensivo: foi avaliado com base<br />
no Modelo Transteórico da Mudança de<br />
Proshaska e DiClemente, foi alvo de 3<br />
sessões de exercícios com base em<br />
materiais de auto-ajuda para parar de<br />
fumar ajustados à fase em que se situavam<br />
no Modelo da Mudança e receberam<br />
orientação e aconselhamento<br />
personalizado para deixar de fumar<br />
• O grupo C realizou as mesmas actividades<br />
do grupo B e também 3 sessões<br />
de 20 minutos num programa<br />
interactivo de computador.<br />
Os níveis de stresse nas grávidas foram<br />
medidos com base no Perceived Stress Scale<br />
(PSS) em vários momentos (baseline, 30 semanas<br />
de gestação, 1 mês antes do parto e<br />
10 dias após o parto)<br />
As medidas do grau de stresse não são<br />
significativamente diferentes nos vários<br />
momentos e nos 3 grupos estudados. Também<br />
não foram encontradas diferenças<br />
nos níveis de stresse das grávidas que<br />
declararam ser importante para si<br />
corresponder às expectativas dos profissionais<br />
de saúde parando de fumar, ou nas<br />
grávidas que deixaram de fumar mas recaíram<br />
ou nas que estavam grávidas pela<br />
primeira vez.<br />
Os autores concluíram que a recomendação<br />
às grávidas para parar de fumar e o<br />
aconselhamento intensivo nesse sentido<br />
não estão associados ao aumento do grau<br />
de stresse e, portanto, que o<br />
aconselhamento para parar de fumar na<br />
gravidez deve ser integrado na prática dos<br />
profissionais de saúde materna sem o receio<br />
de agravar o stresse na gravidez.<br />
Os autores ressalvam que estes resultados<br />
podem dever-se ao modo como estas<br />
intervenções, foram realizadas, com base<br />
ABORDAGEM MOTIVACIO<strong>NA</strong>L COM GRÁVIDAS<br />
QUE CONSUMIAM ÁLCOOL<br />
São conhecidos os riscos para o feto do<br />
consumo de álcool durante a gravidez.<br />
A finalidade deste estudo foi avaliar a<br />
eficácia de uma Abordagem Motivacional<br />
breve com grávidas que bebiam<br />
álcool. A amostra foi constituída por 42<br />
grávidas que declararam ter bebido pelo<br />
menos uma vez no mês passado. Estas<br />
grávidas foram aleatoriamente<br />
distribuídas por dois grupos, um que<br />
recebeu informação por escrito sobre o<br />
consumo de álcool na gravidez e outro<br />
que foi alvo de uma sessão preparada<br />
de acordo com os princípios da<br />
Abordagem Motivacional. Nesta sessão<br />
as grávidas discutiam os resultados da<br />
avaliação do seu comportamento e a<br />
informação sobre os potenciais riscos da<br />
exposição dos bebés ao álcool. Os<br />
principais objectivos das intervenções<br />
foram aumentar a consciência das<br />
grávidas para as consequências de beber<br />
e promover a mudança no sentido da<br />
abstinência do consumo de álcool<br />
durante a gravidez.<br />
Na avaliação, realizada 2 meses após a<br />
intervenção, as 32 grávidas que foi<br />
possível acompanhar tinham reduzido a<br />
quantidade de álcool e os níveis de<br />
intoxicação alcoólica. As grávidas que no<br />
início da gravidez tinham níveis mais<br />
elevados de taxa de alcoolémia e que<br />
foram alvo da intervenção com base na<br />
Abordagem Motivacional apresentaram<br />
uma redução significativa dessa taxa. O<br />
estudo concluiu que a Abordagem<br />
Motivacional é eficaz nas intervenções<br />
com o objectivo de reduzir o consumo de<br />
álcool durante a gravidez, em especial<br />
nos casos mais graves. Nos casos menos<br />
graves, abordar o comportamento e<br />
disponibilizar materiais informativos pode<br />
ser suficiente.�<br />
Handmaker, N.S., Miller, W.R., & Manicke, M.<br />
Journal of Studies on Alcohol, 60, 1999, 285-287<br />
página03<br />
no Modelo Transteórico da<br />
Mudança e na Abordagem<br />
Centrada na Pessoa, que<br />
são reconhecidas como<br />
estratégias que não causam<br />
stresse. Também<br />
nos materiais utilizados<br />
houve o cuidado de<br />
não enfatizar os perigos<br />
para o feto ou<br />
de não pressionar as<br />
grávidas a parar de<br />
fumar. É possível<br />
que estes resultados<br />
não se verifiquem<br />
quando as<br />
abordagens forem<br />
orientadas por princípios<br />
e com base em estratégias<br />
e materiais diferentes dos utilizados<br />
nesta investigação.�<br />
Paul Aveyard et al., Is advice to stop smoking from<br />
a midwife stressful for pregnant women who<br />
smoke? Data from a randomised controlled trial,<br />
Preventive Medicine, 40, 2005 575-582<br />
Sabia que?<br />
FUMAR AFECTA A<br />
CAPACIDADE<br />
REPRODUTIVA DA<br />
MULHER<br />
As mulheres que fumam têm uma<br />
menopausa precoce. Esta ocorre, em<br />
média, por volta dos 47 anos nas<br />
fumadoras e depois dos 49 nas não<br />
fumadoras. As fumadoras têm<br />
problemas uterinos mais frequentes<br />
do que as não fumadoras. Além<br />
disso, fumar afecta a função<br />
fertilizante das mulheres e diminui as<br />
suas possibilidades de engravidar.<br />
Estes dados são ainda mais relevantes<br />
quando sabemos que cada vez mais<br />
mulheres desejam ter filhos depois<br />
dos 35 anos de idade.<br />
Nouvelles de l’AT (www.at-suisse.ch) and F. Di<br />
Prospero et al., Cigarette smoking damages<br />
women’s reproductive life, in: Reproductive<br />
BioMedicine Online 2004; 8: 246-24.<br />
www.rbmonline.com
página04<br />
PREVENIR A RECAÍDA A SEGUIR AO PARTO<br />
Está demonstrado que o uso de Bupropiona<br />
facilita a prevenção da recaída a seguir ao<br />
parto e que este resultado é independente<br />
do diagnóstico de Depressão Major no<br />
passado (Cox et al., 2004). Considerando<br />
ainda que chega ao bebé apenas uma<br />
quantidade mínima da substância activa, a<br />
Bupropriona reúne as condições necessárias<br />
para ser utilizada com a finalidade de evitar<br />
a recaída em mulheres a amamentar<br />
(Tobacco Control 2004; 13: 52-56).<br />
Apesar desta recomendação, que está a ser<br />
assumida nas Normas de Orientação<br />
Clínica para Tratamento do Tabagismo em<br />
vários países, a prevenção da recaída não<br />
deve ser reduzida ao uso de medicamentos.<br />
De acordo com as abordagens baseadas<br />
no Modelo Transteórico da Mudança<br />
(Prochaska e Diclemente, 1992), que é o<br />
modelo mais utilizado no tratamento dos<br />
comportamentos aditivos em países como<br />
o Canadá e os EUA, as tentativas bem<br />
sucedidas para deixar de fumar assentam<br />
em 4 estratégias principais. O Modelo<br />
Transteórico define as estratégias de<br />
mudança como os actos, os sentimentos e<br />
os pensamentos da pessoa que está a tentar<br />
mudar relativamente ao problema e à<br />
mudança em causa. O terapeuta ou o<br />
profissional de saúde deve activar essas<br />
estratégias de modo a contribuir para a<br />
mudança. Quando o objectivo é prevenir a<br />
recaída, as estratégias chave são: relação<br />
de ajuda e suporte (construída com base<br />
na aceitação do outro, na compreensão dos<br />
seus problemas e na confiança mútua),<br />
gestão de reforços (administração de<br />
recompensas relacionadas com a mudança<br />
pelo próprio ou por outras pessoas<br />
próximas), contra-condicionamento<br />
(descobrir alternativas para lidar com as<br />
situações e os problemas onde o<br />
comportamento tem uma função<br />
importante) e controlo de estímulos (evitar<br />
ou controlar estímulos e situações que<br />
estimulam o comportamento em causa).<br />
Outra recomendação crucial quando se<br />
trabalha com a mudança de<br />
comportamentos é ter sempre em conta as<br />
características próprias da pessoa com<br />
quem trabalhamos. A abordagem deve ser<br />
centrada no outro. Nestas situações<br />
aplicam-se os princípios “cada caso é um<br />
caso” e cada história é única. No caso das<br />
mulheres grávidas que fumam, existem<br />
muitas características comuns, mas também<br />
existem diferenças e particularidades em<br />
cada caso. Querer resolver os problemas<br />
da mulher grávida que fuma através da<br />
desejada “cura milagrosa” é obviamente<br />
uma utopia que não podemos realizar nem<br />
devemos alimentar.<br />
Vários estudos concluíram que, para evitar<br />
a recaída a seguir ao parto, é essencial não<br />
cair no erro de centrar o tratamento do<br />
tabagismo apenas nas vantagens de não<br />
PRINCÍPIOS DA ABORDAGEM MOTIVACIO<strong>NA</strong>L<br />
A Abordagem Motivacional é um método<br />
directivo, centrado na pessoa, destinado a<br />
aumentar a sua motivação para mudar<br />
através da exploração e resolução da<br />
ambivalência. Este artigo apresenta os<br />
princípios deste método que tem<br />
conseguido bons resultados em casos de<br />
dependências e, também, na mudança de<br />
outros comportamentos de risco<br />
(alimentação incorrecta, sedentarismo,<br />
stresse, …).<br />
De acordo com os seus autores (Miller e<br />
Rollnick, 1992), a Abordagem Motivacional<br />
baseia-se em 4 princípios gerais:<br />
1.º - EXPRESSAR EMPATIA<br />
Empatia implica olhar para a realidade<br />
através dos olhos do cliente, pensar sobre as<br />
coisas como pensa o cliente, sentir como o<br />
cliente sente, enfim, partilhar as experiências<br />
do cliente. Expressar empatia é crucial na<br />
Abordagem Motivacional. Quando o cliente<br />
se sente compreendido, sente-se também<br />
mais seguro e confiante para se abrir e<br />
partilhar as suas experiências. Também assim<br />
o cliente sente-se mais confortável para<br />
enfrentar e discutir a sua ambivalência sobre<br />
a mudança e defende-se menos relativamente<br />
aos seus problemas.<br />
2.º - REFORÇAR AUTO-EFICÁCIA<br />
Auto-eficácia é a confiança do cliente na sua<br />
capacidade para resolver um problema e<br />
mudar. Esta confiança é uma fonte importante<br />
de motivação para a mudança e deve ser<br />
desenvolvida e reforçada no aconselhamento.<br />
Por exemplo, o profissional de<br />
saúde deve discutir com o seu cliente outras<br />
tentativas já realizadas para mudar<br />
comportamentos relevantes para a saúde<br />
e enfatizar as conquistas já realizadas e as<br />
aprendizagens que possam ter ficado<br />
dessas experiências.<br />
3.º - LIDAR COM A RESISTÊNCIA<br />
Através da abordagem motivacional a<br />
resistência do cliente face à mudança tende<br />
a diminuir porque as respostas do tipo<br />
“advogado do diabo” ou de contestação às<br />
propostas do profissional não são reforçadas.<br />
A Abordagem Motivacional encoraja os<br />
clientes a encontrar e adoptar as suas próprias<br />
fumar durante a gravidez e nos benefícios<br />
para o bebé (Curry et al., 2001; Scheibmeir,<br />
2000). Se o profissional adoptar esta<br />
estratégia, a recaída a seguir ao parto será<br />
bastante provável. É importante tratar o<br />
tabagismo na gravidez de modo mais<br />
global, integrando na abordagem<br />
terapêutica os diferentes elementos<br />
relacionados com o uso do tabaco.�<br />
Cox, Lisa-Sanderson et al. (2004) Efficacy of<br />
Bupropion for relapse prevention in smokers with<br />
and without a past history of major depression.<br />
Journal of General Internal Medicine. Aug 2004;<br />
vol 19 (8): 828-834.<br />
Curry, Susan J. et al.(2001) Motivation for smoking<br />
cessation among pregnant women. Psychology of<br />
Addictive Behaviors. Jun 2001; vol. 15(2): 126-132.<br />
Prochaska, J., Diclemente, C. et Norcross, J.C.<br />
(1992) In search of how people change,<br />
applications to addictive behaviors. American<br />
psychologist, pp.1102-1144.<br />
Scheibmeir, Monica S. (2000) Examination of causal<br />
factors associated with smoking status during<br />
pregnancy. Dissertation Abstracts International:<br />
Section B: The Sciences and Engineering. March<br />
2000; vol 60 (8-B): 3854.<br />
Tobacco Control 2004; 13 : 52-56<br />
soluções para os problemas que eles próprios<br />
identificaram e definiram. A tradicional<br />
hierarquia entre profissional de saúde e cliente<br />
tende a esbater-se na Abordagem<br />
Motivacional.<br />
4.º - AMPLIFICAR DISCREPÂNCIAS<br />
Segundo Miller, “a motivação para mudar<br />
surge quando as pessoas percebem a<br />
discrepância entre aquilo que fazem e aquilo<br />
que acham que deveriam fazer (ou entre<br />
aquilo que são e o que acham que deveriam<br />
ser)”. Amplificar esta discrepância é uma<br />
estratégia muito utilizada na Abordagem<br />
Motivacional. Quando os clientes percebem<br />
que o seu comportamento não está em<br />
consonância com os seus valores ou objectivos<br />
ficam mais motivados para realizar mudanças<br />
importantes na sua vida.�<br />
Miller, W. R., Zweben, A., DiClemente, C. C., &<br />
Rychtarik, R. G. (1992). Motivational Enhancement<br />
Therapy manual: A clinical research guide for<br />
therapists treating individuals with alcohol abuse<br />
and dependence. Rockville, MD: National Institute<br />
on Alcohol Abuse and Alcoholism.