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Filosofia a Experiência do Pensamento - Sílvio Gallo

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174<br />

unidade VI<br />

A metafísica<br />

O segun<strong>do</strong> perío<strong>do</strong> tem seu centro na filosofia de<br />

Kant, que demonstra a impossibilidade <strong>do</strong>s conceitos<br />

tradicionais da metafísica para alcançar e conhecer a<br />

realidade em si das coisas. Em seu lugar, como vimos no<br />

Capítulo 9, Kant propõe que a metafísica seja o conhecimento<br />

de nossa própria capacidade de conhecer —<br />

seja uma crítica da razão pura teórica.<br />

A metafísica poderá continuar usan<strong>do</strong> o mesmo<br />

vocabulário que usava tradicionalmente, mas o senti<strong>do</strong><br />

conceitual das palavras mudará totalmente, pois<br />

não se refere ao que existe em si e por si, mas ao que<br />

existe para nós e é organiza<strong>do</strong> por nossa razão. Embora<br />

com muitas diferenças (que veremos mais tarde),<br />

Husserl trilhará um caminho próximo ao de Kant.<br />

A metafísica contemporânea é chamada de ontologia<br />

(veremos adiante o senti<strong>do</strong> dessa palavra) e procura<br />

superar tanto a antiga metafísica quanto a concepção<br />

kantiana. Considera o objeto da metafísica a<br />

relação originária mun<strong>do</strong>-homem. Seus principais<br />

objetivos são:<br />

E investigar os diferentes mo<strong>do</strong>s como os entes ou os<br />

seres existem;<br />

E investigar a essência ou o senti<strong>do</strong> (a significação) e a<br />

estrutura desses entes ou seres;<br />

E investigar a relação necessária entre a existência e<br />

a essência <strong>do</strong>s entes e o mo<strong>do</strong> como aparecem<br />

para nossa consciência, por meio das várias formas<br />

em que a consciência se realiza (percepção,<br />

imaginação, memória, linguagem, intersubjetividade,<br />

reflexão, ação moral e política, prática artística,<br />

técnicas);<br />

E fornecer uma descrição das estruturas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e<br />

<strong>do</strong> nosso pensamento; o que faz com que alguns<br />

considerem que a metafísica ou ontologia contemporânea<br />

deva ser chamada de descritiva, distinguin<strong>do</strong>-se<br />

das metafísicas anteriores, que ofereciam uma<br />

explicação causal da realidade.<br />

O nascimento da metafísica<br />

O realismo da filosofia nascente<br />

Como vimos na Unidade 5, embora a filosofia sempre<br />

tenha trata<strong>do</strong> <strong>do</strong>s problemas <strong>do</strong> conhecimento<br />

verdadeiro, o sujeito <strong>do</strong> conhecimento só se tornou<br />

ponto de partida para a atividade filosófica com o racionalismo<br />

clássico ou moderno, no século XVII. Sua<br />

indagação era: “Pode nosso pensamento conhecer a<br />

realidade?”.<br />

crítica<br />

Kant emprega a palavra crítica no senti<strong>do</strong> que<br />

possuía em grego: ‘estu<strong>do</strong> das condições da<br />

possibilidade de algo’ – no caso, esse algo seria o<br />

conhecimento verdadeiro. Sua obra Crítica da razão<br />

pura analisa a estrutura da razão humana como<br />

atividade teórica de conhecimento.<br />

Antes disso, a questão proposta pelos filósofos desde<br />

a Grécia antiga era: “O que é a realidade que nosso<br />

pensamento conhece?”. Assim, a filosofia iniciava sua<br />

investigação voltan<strong>do</strong>-se para o objeto <strong>do</strong> conhecimento,<br />

partin<strong>do</strong> da afirmação da existência da realidade e<br />

de que ela poderia ser conhecida verdadeiramente pela<br />

razão ou pelo pensamento.<br />

Porque a pergunta inicial tinha como pressuposto<br />

a existência da realidade exterior ao pensamento,<br />

costuma-se dizer que a filosofia nasceu como um<br />

rea lismo, e desse realismo surgiu a metafísica.<br />

Da cosmologia à metafísica<br />

A filosofia nasce da admiração e <strong>do</strong> espanto, dizem<br />

Platão e Aristóteles. Admiração: “Por que o mun<strong>do</strong><br />

existe?”. Espanto: “Por que o mun<strong>do</strong> é tal como é?”.<br />

Desde seu nascimento, a filosofia perguntou: “O que<br />

existe?”, “Por que existe?”, “O que é isso que existe?”,<br />

“Como é isso que existe?”, “Por que e como surge, muda<br />

e desaparece?”, “Por que a natureza ou o mun<strong>do</strong> se<br />

mantêm ordena<strong>do</strong>s e constantes, apesar da mudança<br />

contínua de todas as coisas?”.<br />

Como vimos na Unidade 1, essas perguntas levaram<br />

os primeiros filósofos a buscar uma explicação racional<br />

para a origem de um mun<strong>do</strong> ordena<strong>do</strong>, o cosmo. Por<br />

esse motivo, a filosofia nasce como cosmologia. A busca<br />

<strong>do</strong> princípio que causa e ordena tu<strong>do</strong> quanto existe<br />

na natureza (minerais, vegetais, animais, humanos, astros,<br />

qualidades como úmi<strong>do</strong>, seco, quente, frio) e tu<strong>do</strong><br />

quanto nela acontece (dia e noite, estações <strong>do</strong> ano, nascimento,<br />

transformação e morte, bem e mal, belo e<br />

feio, etc.) foi a busca de uma força natural denominada<br />

pelos primeiros filósofos com o nome de physis. A cosmologia<br />

era uma explicação racional sobre a physis e,<br />

portanto, uma física, ou, como a chamava Aristóteles,<br />

uma fisiologia – isto é, o estu<strong>do</strong> da physis.<br />

Como, então, surgiu a metafísica? Como surgiu um<br />

saber que suplantou a cosmologia ou física <strong>do</strong>s primeiros<br />

filósofos? Como e por que a metafísica acabou<br />

tornan<strong>do</strong>-se o centro e a disciplina mais importante<br />

da filosofia?

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