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mundo

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apenas em altitudes e, com esporádicas aparições no pampa, agora passou a ser comum. A pecuária tornara-se uma<br />

atividade cada vez mais ingrata, posto que as pastagens, antes perenes, morriam com as neves do inverno. Por outro<br />

lado, o frio não parecia incomodar os mastodontes, que dispunham de imensas florestas de folhas perenes para<br />

alimentarem-se, mesmo no inverno. Isso alterou o equilíbrio do poder na região. Restou aos estancieiros riograndenses<br />

formarem uma aliança com os missioneiros para proteger o rebanho de mastodontes, do qual também<br />

rio-grandenses, os conselheiros de Dom Pedro II, o jovem príncipe regente, passaram a exigir tributos escorchantes<br />

dos estancieiros que, liderados por Bento Gonçalves, iniciaram uma campanha pela independência da província de<br />

Os Sete Povos mantinham-se neutros, como parte do tratado. São Miguel, na fronteira oeste, era vital na economia da<br />

Política, entretanto, era algo que não interessava a João dos Fortes. Ele era um tropeiro qualquer, sem nada de<br />

especial, exceto pelo fato de ser seguido por um lobo pampeano. Não era realmente um lobo. Na verdade, tratava-se<br />

de um grande carnívoro marsupial, sem qualquer relação com lobos verdadeiros da América do Norte e da Eurásia.<br />

Mas botava medo em eventuais ladrões de estrada que ousassem atacar os tropeiros e suas reses pelos caminhos da<br />

Naquela manhã, João estava particularmente contente. Com a chegada das caravanas missioneiras, ele podia obter<br />

pelas precárias estradas de chão batido era lenta, posto que os mastodontes missioneiros precisavam puxar carroças<br />

abarrotadas com toneladas de grãos. Eram necessários homens rústicos e destemidos para proteger os comboios de<br />

trigo, homens sem nada a perder. Homens sem chão, gaudérios, como João. Tropeiros eram tolerados, mas não<br />

aceitos, pela maioria das comunidades. E São Leopoldo não era exceção. Mas o dinheiro não era a única recompensa.<br />

Havia Inga. A doce “Ingá”, como gostava de chama-la. Filha de pai austríaco e mãe alsaciana, ela normalmente estaria<br />

fora de seu alcance. Os germânicos tinham chegado uma década antes, fugindo dos longos invernos da Europa e de<br />

um continente arruinado por Napoleão. Sob a promessa da falecida imperatriz Leopoldina, Herr Weigert, sua esposa<br />

“Homens bons criam raízes. Homens bons são pais e filhos. Não aventureiros sem eira nem beira”, dizia Herr Weigert,<br />

E não era de todo ruim ouvi-lo. Para começo de conversa, Herr Weigert jamais consideraria dar a mão de sua filha a<br />

dois anos antes. E passara a frequentar a casa dos Weigert. Sua filha caíra enfeitiçada pelo rapaz de pele acobreada e<br />

NOVA LITERATURA - AS FERAS DE UM MUNDO AO SUL<br />

PÁGINA 17<br />

CONTO<br />

Ao longo do último século, os invernos foram se tornando cada vez mais longos e gelados. A neve, antes presente<br />

eles auferiam seus proventos.<br />

Mas isso estava para mudar. Com o sucesso da criação conjunta desse gigantesco gado pelos missioneiros e pelos<br />

São Pedro.<br />

província de São Pedro e de boa parte do Império Brasileiro.<br />

província de São Pedro.<br />

um bom dinheiro conduzindo carregamentos de trigo e outras mercadorias, até o vale do Rio dos Sinos. A viagem<br />

alsaciana, e sua filha, haviam deixado tudo para trás, em busca do novo <strong>mundo</strong>.<br />

a João, sempre que recebia o precioso trigo das missões.<br />

um tropeiro. E mestiço, ainda por cima. João caíra nas graças do austríaco após salvá-lo do ataque de bandoleiros,<br />

olhos verdes, o que começava a preocupá-lo. Um tropeiro não era o tipo de marido que ele queria para sua filha.<br />

“Terei que ser gentil com esse índio”, disse ele, à esposa, em alemão, enquanto jantavam.

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