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11 - Jornal Paraná Novembro 2018

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OPINIÃO<br />

Estratégia para o açúcar e o etanol<br />

Nosso programa é único, robusto e flexível; é hora de internacionalizá-lo criando um "círculo<br />

virtuoso" no qual os países direcionem o seu excedente de cana para produzir álcool<br />

MARCOS SAWAYA JANK (*)<br />

OBrasil perdeu a posição<br />

de maior produtor<br />

mundial de açúcar<br />

para a Índia, que neste<br />

ano vai produzir 35 milhões<br />

de toneladas, contra 30 milhões<br />

de toneladas do Brasil. Logo<br />

atrás do Brasil vem a Tailândia<br />

com produção de 15 milhões e<br />

exportações de 13 milhões.<br />

Até 2010 navegamos solitários<br />

e imbatíveis no mercado mundial<br />

de açúcar, graças aos ganhos<br />

de produtividade ocorridos<br />

após a desregulamentação<br />

do setor nos anos 1990, à<br />

existência de forte demanda no<br />

mundo e à introdução da frota<br />

de veículos flex-fuel no Brasil<br />

em 2003. O etanol consome 50<br />

a 60% da cana produzida.<br />

Mas nuvens negras foram se<br />

acumulando no horizonte deste<br />

setor. A primeira foi a política inconsequente<br />

de congelamento<br />

dos preços dos derivados de<br />

petróleo no Brasil, que destruiu<br />

a rentabilidade da Petrobras e<br />

dos produtores de etanol. Felizmente<br />

essa política nefasta foi<br />

desmontada no governo Temer.<br />

A segunda, mais sutil, é que a<br />

crise gerada pela falta de investimentos<br />

no setor a partir de<br />

2010, que incentivou concorrentes<br />

a expandirem a sua produção.<br />

Até 2000, a produtividade<br />

de açúcar por hectare da<br />

Tailândia e do norte da Índia<br />

(em Uttar Pradesh, principal estado<br />

produtor) era cerca de metade<br />

da alcançada pelo Brasil.<br />

Hoje ela quase se iguala à<br />

nossa.<br />

Enquanto ficamos esperando<br />

uma política pública decente<br />

para o etanol, que ainda não se<br />

materializou, nossos principais<br />

concorrentes nos alcançaram<br />

na produtividade da cana e na<br />

beterraba açucareira.<br />

Ocorre que esses países concederam<br />

pesados subsídios e<br />

proteções aos seus produtores,<br />

como a fixação de preços garantidos<br />

para a cana-de-açúcar,<br />

elevadas tarifas de importação,<br />

incentivos para conversão de<br />

terras para cana e pesados<br />

subsídios para insumos, crédito,<br />

fretes e exportações.<br />

Isso criou um "círculo vicioso"<br />

em que altos preços fixos de<br />

cana geram excedentes de<br />

açúcar, que são jogados no<br />

mercado mundial com o apoio<br />

dos Estados, derrubando os<br />

preços internacionais e gerando<br />

pressão por mais protecionismo.<br />

O drama do setor sucroenergético<br />

brasileiro é que o etanol<br />

perdeu competitividade para a<br />

Enquanto ficamos esperando<br />

uma política pública decente<br />

para o etanol, que ainda não se<br />

materializou, nossos principais<br />

concorrentes nos alcançaram<br />

em produtividade.<br />

gasolina entre 2008 e 2017 e<br />

agora o açúcar perde mercado<br />

com a expansão acelerada da<br />

cana e da beterraba no mundo,<br />

turbinada por vários governos.<br />

A solução seria criar um "círculo<br />

virtuoso" no qual os países<br />

direcionassem o seu excedente<br />

de cana-de-açúcar para produzir<br />

etanol, em vez de açúcar, seguindo<br />

a experiência brasileira.<br />

China, Índia e Tailândia fixaram<br />

metas de misturar 10% de etanol<br />

na sua gasolina, mas jamais<br />

criaram os instrumentos para<br />

cumpri-las. Se o fizessem, poderiam<br />

consumir 26 bilhões de<br />

litros de etanol por ano até o fim<br />

desta década, reduzindo a sua<br />

dependência por petróleo e as<br />

emissões de gases de efeito estufa,<br />

melhorando a qualidade do<br />

ar e gerando renda e emprego<br />

nos países. Nesse último mês,<br />

o governo da Índia sabiamente<br />

adotou diversas medidas nessa<br />

direção.<br />

Sempre poderemos recorrer à<br />

OMC (Organização Mundial do<br />

Comércio) para questionar subsídios<br />

e proteções que não respeitam<br />

as regras multilaterais de<br />

comércio, mas os processos<br />

levam anos para serem concluídos<br />

e o resultado é incerto, e<br />

nem sempre aplicado.<br />

Temos uma rica experiência<br />

para transmitir a esses países<br />

em termos de flexibilidade de<br />

conversão da cana (em açúcar<br />

ou etanol), mandatos obrigatórios<br />

de mistura de etanol na gasolina<br />

(hoje fixado em 27% no<br />

Brasil) e de carros flex que dão<br />

ao consumidor a opção de<br />

abastecer com gasolina ou etanol.<br />

Nosso programa de etanol é<br />

único, robusto e flexível. É hora<br />

de internacionalizar essa experiência<br />

na Ásia, ajudando os<br />

nossos concorrentes a encontrarem<br />

uma saída virtuosa para<br />

resolver o principal fator que<br />

hoje destrói a rentabilidade global<br />

do setor açucareiro<br />

(*) Marcos Sawaya Jank é especialista<br />

em questões globais<br />

do agronegócio, trabalha<br />

em Singapura. É livre-docente<br />

em engenharia agronômica<br />

pela USP<br />

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