César do Carmo
17 "Feria Sexta in Parasceve" (Sexta-feira na Paixão), do ponto de vista da quantidade e duração, é o dia mais intenso das cerimônias da Semana Santa e mesmo de todo o ano litúrgico, e cujas celebrações referem-se principalmente à crucifixão e morte de Jesus Cristo, que também foi o tema desta composição de estátuas construídas pelo Aleijadinho e pintadas por mestre Ataíde para um dos passos do Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, de Congonhas do Campo. As cerimônias públicas da Sexta-feira Santas mais freqüentes no Brasil, desde pelo menos o século XVIII, são as seguintes: 1. Ofício de Trevas (Matinas e Laudes) 2. Missa dos Catecúmenos 3. Adoração da Cruz 4. Procissão ao Santíssimo Sacramento 5. Procissão do Enterro Muitos são os atrativos das cerimônias desse dia, como a celebração com a igreja às escuras, o canto dos Salmos e das Lições das Matinas por meio das fórmulas ou "tons" apropriados para cada um deles. Outro desses atrativos é a Paixão de São João, cantada por três padres, no altar e nos púlpitos, com a participação do coro polifônico no fundo da igreja. A “Procissão do Enterro” Na noite de Sexta-feira Santa é celebrada, no mundo lusófono, uma cerimônia conhecida como “Procissão do Enterro”, que consta de uma encenação do descendimento de Cristo da cruz e seu enterro no Santo Sepulcro. Originada na Diocese de Braga (Portugal) em fins da idade Média, a Procissão do Enterro foi concebida como uma intensa teatralização das cenas relacionadas à morte. De Portugal, a Procissão do Enterro difundiuse, a partir do século XVI, para as colônias portuguesas da Ásia, África e América, principalmente devido à atuação missionária jesuítica. O primeiro registro conhecido desta cerimônia, fora de Portugal, ocorreu em Goa (Índia), no ano de 1558, mas, na mesma região, os jesuítas descreveram minuciosamente a Procissão do Enterro na Sexta-feira Santa de 1576: “Faz-se esta procissão desta maneira: que à noite que precede a Sexta-feira se arma um sepulcro todo coberto de negro, muito bem feito, e depois de acabada a missa, à Sextafeira, saem todos os padres e irmãos em procissão da sacristia, com a fralda do manto sobre a cabeça, com que fica cobrindo a cabeça à maneira de dó; e outros seis padres, vestidos com alvas e cobertas as cabeças e os rostos com os amictos, trazem uma tumba coberta de veludo preto, diante da qual vão uns anjos com os mistérios da paixão e, após eles, dois coros de apóstolos e, detrás da tumba, um coro das Marias, os quais se representam pelos meninos de casa e alguns outros cantores da nossa capela. Estes todos vão cantando uns versos da Sagrada Escritura a propósito do que se representa, ora cantando uns, ora respondendo outros, com as vozes tão lacrimosas e tristes e com um Heu! Heu! Domine! Salvator noster!, que respondem as Marias, que bastam para quebrar os corações.” IA música da Procissão do Enterro envolve o canto coral Heu! Heu! Domine! Salvator noster! (que popularizou-se como o "Canto das Três Marias" ou das "Beús"), assim como o "Canto da Verônica" O vos omnes. Vale a pena presenciar a Procissão do Enterro na noite de hoje e observar uma cerimônia medieval ainda em prática no século XXI.A César do Carmo