Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Coluna do
Doc Mariz
Um Anarquismo Saudável
Foto: Arquivo
Doc Mariz não é humano. Ele veio do Planeta Vulcan.
E como todo bom Vulcano, ele acredita na honestidade,
no bom caráter, na boa índole, na capacidade
da pessoa aprender a ser educado e a praticar o que
aprendeu.
Ele também acredita que o poder corrompe os indivíduos
e é contra qualquer forma de governo que não
seja a conscientização através dos próprios atos, uma
espécie de “anarquismo saudável”, como diriam os terráqueos.
Doc Mariz escreve livros de contos bem humorados na
língua portuguesa, pois poucos seres conseguiriam ler
na sua língua natal.
Atualmente, Doc está na sua quinta vida terrestre, algo
como 370 anos e continua escrevendo suas estórias. A
partir desta edição é colunista fixo da Revista Cariocas.
Se você tem uma boa estória para contar, envie uma
internet terrestre para ele: docmariz@globo.com
Crônica
Por Doc Mariz
Casa Grande e Sem Sala
“Minas Gerais é o estado mais religioso do país. Do
modo que os motoristas dirigem é um tal de: Valha-me
Deus! Jesus Amado! Minha Nossa Senhora!”
Seu Carlinhos, dono da vendinha, daquela minúscula
cidade no interior mineiro, já estava no quinto
casamento. Sujeito respeitável na cidade, apesar do
currículo pouco cristão, presidente do coral municipal,
ex-vereador mais votado na cidade, padrinho de
dezenas de crianças, mulherengo semiprofissional e
fofoqueiro mor. Seus casamentos acabavam quando
as fofoqueiras de plantão denunciavam suas puladas
de cerca. Cidade pequena, a fofoca corre rápido e a
esposa da vez não suportava e tornava-se ex-esposa.
Mas não havia quem não passasse na sua vendinha
para uma prosa, uma cachacinha, uma pitada no fumo
de fundo de quintal, um docinho de abóbora e uma
fofoquinha.
A especialidade das especialidades do seu Carlinhos
era conversar e colocar apelidos. Colocava apelidos em
todo mundo que passasse na sua vendinha. Ninguém
escapava.
- Bom dia Dona Margarida!
- Olha qui, seu Carlim! Scutei dizê que o sinhô anda me
chamano de “jardim botânico”! Qui istória é essa, sô!?
- Fofoca do povo, Dona Margarida. Fofoca do povo que
não tem o que fazer!
- Ah bom! Pois si fô pur conta da minha “poupança”
grande o sinhô vai si vê com o Antunes.
- E quem é esse tal de Antunes, Dona Margarida?
- Minha “peixeira”! Meu facão di capá porco! Inté mais,
seu Carlim!
Não havia na cidade quem não ganhasse apelido!
Se andasse curvado para frente era “vento a favor”.
Se andasse curvado para trás era “vento contra”.
Problema na perna curta era “ponto e vírgula”. Velho
metido a garotão com cabelo pintado de preto era “Fred
Flinstone”. Velho tarado era “promoção do Viagra”.
Velho feliz andando de mãos dadas com uma novinha
era “corno sorridente”. Moça baixinha e atrevida era
“formiga de óculos”. Moça bonita e brava era “onça
pintada”. Mulher negra e brava era “pantera no cio”.
Homem negro e careca era “lâmpada queimada”.
Gordo que falava demais era “kombi sem freio”. Moça
gostosuda com calça apertada era “capô de fusca”.
Velha faladeira na janela da própria casa era “Matraca
Trica”. Velha que andava devagar e usando bengala
era “Tartaruga Touchê”. Homem pinguço era “pudim de
cachaça”.
- Seu Carlim, vortei aqui pra pedi discurpa pro sinhô!
- O que foi agora, Dona Margarida? O que foi que eu
fiz?
- O sinhô num fez nada, mas eu que fiz.
- Fez o quê, Dona Margarida?
- Coloquei apelido nu sinhô: “mosca de padaria”. Voa,
voa, voa e não come nada! Hahaha! Inté mais, seu
Carlim. Fofoqueiro da boca grande!
REVISTA CARIOCAS - 39