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primeiro número na íntegra - Áskesis

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O semiárido e os constructos sobre o trabalho feminino<br />

Na agricultura familiar do semiárido, a exemplo do que ocorre <strong>na</strong>s demais regiões do país, os<br />

papéis no mundo do trabalho são determi<strong>na</strong>dos sexualmente: ao homem cabe as atividades<br />

de plantio e colheita do roçado, enquanto que à mulher cabe a capi<strong>na</strong>ção da roça; o tanger<br />

passarinho para assegurar a colheita; o cuidado e a alimentação dos animais; o pegar água<br />

para o consumo e as necessidades da família; retirar lenha da caatinga para o preparo dos<br />

alimentos e, sobretudo, a organização do trabalho doméstico e os cuidados com os filhos. No<br />

que pese esta sobrecarga de trabalho e a sua importância para a família e a comunidade, este<br />

não é visto como um trabalho socialmente reconhecido. É considerado um tipo de ajuda ao<br />

companheiro, por que a roça é o local privilegiado para o trabalho do homem, especialmente<br />

do chefe da família.<br />

o lugar que as mulheres ocupam no sistema produtivo agropecuário revela formas históricas<br />

de desigualdade de gênero. trata-se de fenômeno estrutural com raízes complexas e instituído<br />

social e culturalmente de tal forma que se processa cotidia<strong>na</strong>mente de maneira quase<br />

imperceptível e com isso é dissemi<strong>na</strong>do deliberadamente, ou não, por certas instituições como<br />

o próprio estado que só recentemente tem reconhecido a legitimidade das reivindicações dos<br />

movimentos sociais de mulheres como condição para um projeto <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l de desenvolvimento<br />

rural sustentável e uma sociedade mais democrática. Como afirma Scott:<br />

o gênero é uma das referências recorrentes pelas quais o poder político foi<br />

concebido, legitimado e criticado. ele se refere à oposição homem/mulher<br />

e fundamenta ao mesmo tempo seu sentido. [...] Desta forma, a oposição<br />

binária e o processo social das relações de gênero tor<strong>na</strong>m-se, ambos, partes<br />

do sentido do próprio poder. Colocar em questão ou mudar um aspecto<br />

ameaça o sistema por inteiro. (SCott,1995, p.10)<br />

a entrada recente e crescente das mulheres do campo dessa região no mercado assalariado<br />

de trabalho só foi possível a partir da queda da taxa de fecundidade <strong>na</strong>s décadas de 70 e 80 do<br />

século passado e também pelo aumento do seu nível de instrução. hoje, <strong>na</strong>s áreas pesquisadas,<br />

as mulheres têm entre dois e três filhos em média, o que lhes permitem conciliar melhor o<br />

seu papel de mães e de trabalhadoras. há quarenta anos atrás cada mulher tinha no mínimo<br />

6,3 filhos (SaFIottI, 1997, p. 7), o que tor<strong>na</strong>va impraticável qualquer trabalho assalariado fora<br />

do lar, já que, culturalmente, a responsabilidade com o lar e as crianças sempre foi da mãe.<br />

Contudo, independente da sua escolaridade e capacitação profissio<strong>na</strong>l, são elas colocadas em<br />

atividades de baixa remuneração e em setores com menores níveis de proteção social.<br />

Para a oIt – organização Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l do trabalho –, a questão da igualdade está relacio<strong>na</strong>da<br />

com o trabalho Decente (Convenções Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is do trabalho, 29, 87, 98, 100, 105,<br />

111, 138 e 182), cujas características pautam-se em quatro eixos:<br />

1. Criação de emprego de qualidade para homens e mulheres;<br />

2. extensão da proteção social;<br />

3. Promoção e fortalecimento do diálogo social;<br />

4. Respeito aos princípios e direitos fundamentais no trabalho.<br />

São a adequada remuneração, a liberdade, a equidade e a garantia de uma vida dig<strong>na</strong> para<br />

homens e mulheres que colocam as suas competências e experiências em disponibilidade para<br />

a geração de novos serviços e produtos.<br />

Confirmando os estudos de Safiotti (1997, p. 9), que entre as décadas de 1970 e 1980<br />

apontam um aumento da ordem de 132,7% da mão-de-obra femini<strong>na</strong> no campo, enquanto a<br />

<strong>Áskesis</strong> | v. 1 | n. 1 | jan/jul - 2012 | p. 106 – 122 | 107

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