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primeiro número na íntegra - Áskesis

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Considerações Introdutórias<br />

o mais recente processo de reestruturação produtiva da agroindústria ca<strong>na</strong>vieira de alago-<br />

as – iniciado a partir dos anos 1990 (CaRvalho, 2009) – alterou profundamente os critérios<br />

de recrutamento dos trabalhadores, o processo de trabalho e as formas de gestão do mesmo<br />

(PaDRão, 1997; mello, 2002). essas mudanças, além de acarretarem novas configurações no<br />

mundo do trabalho ca<strong>na</strong>vieiro, resultaram em grande diminuição no <strong>número</strong> de empregos, em<br />

intensificação do ritmo de trabalho e elevação de sua produtividade.<br />

entretanto, é importante sublinhar que essas novas feições do trabalho nos ca<strong>na</strong>viais alagoanos<br />

foram construídas sobre as bases de um processo de modernização anterior (iniciado<br />

embrio<strong>na</strong>riamente <strong>na</strong> década de 1950) que possibilitou uma vertiginosa expansão do plantio<br />

de ca<strong>na</strong>-de-açúcar por meio da ocupação dos tabuleiros (áreas pla<strong>na</strong>s que eram consideradas<br />

impróprias para o cultivo da ca<strong>na</strong>) 3 (aNDRaDe, 1959 e 1994; heReDIa, 1988). Foi no bojo<br />

dessas mudanças no espaço geográfico e social ocupado pela lavoura de ca<strong>na</strong>, que, paulati<strong>na</strong>mente,<br />

ocorreu o colapso do sistema de morada, característico das relações de trabalho dos<br />

engenhos de açúcar e que, <strong>na</strong>quele período (1950-1980), ainda predomi<strong>na</strong>va <strong>na</strong>s usi<strong>na</strong>s.<br />

a modernização da agroindústria ca<strong>na</strong>vieira alagoa<strong>na</strong> engendrou um violento processo<br />

de expropriação, sofrido tanto pelos moradores das usi<strong>na</strong>s e das fazendas de ca<strong>na</strong> – que perderam<br />

o acesso ao roçado –, quanto pelos posseiros e sitiantes – que ocupavam, sobretudo,<br />

áreas dos tabuleiros. esse processo foi fundamental para a formatação dos trabalhadores “da<br />

rua” 4 , que hoje representam, junto com aqueles que migram do sertão para o corte da ca<strong>na</strong>, a<br />

esmagadora maioria dos trabalhadores dos ca<strong>na</strong>viais. a expropriação dessas extensas faixas<br />

de terra possibilitou, de um só golpe, abrupta expansão das lavouras de ca<strong>na</strong> para áreas pla<strong>na</strong>s<br />

e intensificação da proletarização da força de trabalho, sendo ambos os aspectos basilares<br />

para a construção da mais recente reestruturação desse setor produtivo.<br />

Para a<strong>na</strong>lisar os sentidos dessas transformações, num <strong>primeiro</strong> plano, deter-nos-emos em<br />

como se constituía a domi<strong>na</strong>ção-exploração do trabalho no sistema de morada (pois este foi<br />

durante muitos anos a forma predomi<strong>na</strong>nte de relação de trabalho nos engenhos e usi<strong>na</strong>s).<br />

Num segundo momento, abordaremos a temática da resistência dos trabalhadores no período<br />

em que essa relação de trabalho era hegemônica. Por fim, a<strong>na</strong>lisaremos as mediações necessárias<br />

para compreendermos o processo de expropriação das terras dos tabuleiros e o declínio<br />

do sistema de morada.<br />

Breves considerações sobre o sistema de morada<br />

a figura do morador <strong>na</strong>s lavouras ca<strong>na</strong>vieiras do Nordeste precede a abolição da escravatura.<br />

Sua “institucio<strong>na</strong>lização como forma predomi<strong>na</strong>nte de relações de trabalho é, no entanto, um<br />

fenômeno característico do fi<strong>na</strong>l do século XIX e começo do século XX” (SUaReZ, 1977). Para<br />

a mesma autora, o uso do trabalho escravo e do trabalho do morador foi fundamental para o<br />

modelo de produção de ca<strong>na</strong>-de-açúcar do Nordeste por<br />

[...] possibilitar à grande propriedade voltar-se para o seu auto-sustento<br />

sempre que as condições para produção comercial não eram favorecidas pelo<br />

mercado inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, ocasio<strong>na</strong>ndo o fechamento da propriedade em torno<br />

3 Adiante descreveremos os tabuleiros de forma mais detalhada.<br />

4 “Da rua”, ou “os da rua”, é como são denomi<strong>na</strong>dos localmente os trabalhadores rurais que residem <strong>na</strong>s áreas<br />

urba<strong>na</strong>s.<br />

<strong>Áskesis</strong> | v. 1 | n. 1 | jan/jul - 2012 | p. 82 – 104 | 83

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