17.11.2015 Views

yemag #05

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

: Como você escolheu a arquitetura?<br />

Luciano Bussab: Fui criado praticamente dentro do escritório<br />

de arquitetura do meu pai e via a profissão como um métier divertido.<br />

Para mim, escritório onde todo mundo desenhava era um<br />

espaço onde todo mundo brincava. Comecei muito cedo a me<br />

divertir dentro do escritório, a desenhar, não só livremente, mas<br />

também tecnicamente. Com 13 anos eu já tinha a habilidade de<br />

usar instrumentos, réguas e tudo mais. Foi uma paixão construída<br />

mesmo, eu não diria que foi uma paixão inata.<br />

E como você começou a dançar?<br />

No final da faculdade, fiz um projeto de arquitetura para a Cia.<br />

Cênica Nau de Ícaros, uma companhia de circo contemporâneo<br />

que eu integrava. Era um projeto de centro cultural. A elaboração<br />

do projeto me aproximou ainda mais desse universo artístico. Em<br />

2005, fizemos uma turnê européia, resolvi ficar por lá e conheci<br />

a Sônia Mota, bailarina brasileira que vivia na Alemanha. Foi ela<br />

quem me incentivou a estudar dança contemporânea. A Sônia<br />

escreveu uma carta de recomendação e eu consegui estudar seis<br />

meses, como aluno convidado, na School for New Dance Development<br />

(SNDO), que integra o Conservatório Nacional da Holanda.<br />

Nessa época, atingi um estágio muito legal dentro da dança.<br />

Quando você decidiu que seguiria com ambas atividades?<br />

Antes de viajar, acreditava que, no Brasil, eu teria dois caminhos:<br />

ou seguiria a carreira de arquiteto como meu pai ou eu seria um<br />

artista muito louco. Enquanto que, na Europa, eu acreditava que<br />

seria reconhecido como artista. Tive, porém, várias oportunidades<br />

de trabalhar ao mesmo tempo com arte e arquitetura e foi aí que<br />

eu saquei, ‘pô esse negócio rola’. Eu conseguia levar as duas coisas.<br />

Em Amsterdã fiz um curso de iluminação e desenvolvi com<br />

meu pai, via internet, um projeto para um restaurante no Brasil.<br />

Quando acabou o curso, decidi voltar. E comecei um projeto semelhante,<br />

que marcou minha reentrada no escritório.<br />

E a dança?<br />

No Brasil, encontrei bailarinos que também tinham estudado na<br />

SNDO e formavam o extinto Estúdio Nova Dança, que passei a<br />

integrar. Cheguei no momento em que companhia ressuscitava,<br />

ganhava prêmios. O trabalho crescia e exigia de mim muita disciplina.<br />

Precisei me adaptar para conseguir manter um cotidiano de<br />

alta performance. Hoje, sou tratado como bailarino profissional,<br />

então, não posso pisar num palco e falar que sou arquiteto. Não<br />

tem desculpa, se você está no palco, tem que fazer bem feito.<br />

O que você leva da dança para sua vida?<br />

Nas aulas de improvisação, estudamos muito a questão da presença.<br />

Em cena, é preciso pensar rápido, oferecer algo para o público.<br />

A vida é um pouco assim também. Já não me preocupo tanto em<br />

ir para as reuniões superpreparado; vou com o intuito de resolver.<br />

No escritório, quem assume um trabalho deve resolvê-lo. É claro<br />

que existe a preparação; na dança, é a rotina de ensaios e na arquitetura,<br />

a fundamentação para chegar no escritório e saber resolver.<br />

Outra coisa que levo é a questão da confiança no outro. Nossa<br />

companhia é um grupo heterogêneo de 13 pessoas. Não existe<br />

uma divisão de núcleos. Existe uma célula-base, que são as pessoas<br />

que participam de mais projetos, e as que dedicam menos tempo,<br />

porque dançam em outros lugares ou se dedicam a outros projetos.<br />

É uma relação muito boa. Dessa maneira, a gente consegue<br />

valorizar as ações de cada um dentro da companhia. Eu levei isso<br />

para o escritório. Lá, tem gente que prefere trabalhar com horários<br />

fixos para entrar e sair, mas isso não é obrigatório. O salário de cada<br />

um é estipulado de acordo com a quantidade e a importância das<br />

ações dentro do escritório. Quem tem mais tempo de profissão resolve<br />

questões complexas com um telefonema, por exemplo. Mas<br />

tem toda uma experiência como respaldo para aquela ação.<br />

E do circo?<br />

A cooperação é um dos maiores aprendizados que tive. A estrutura<br />

não pode ser rígida. Em cena, você está manipulando energia. O<br />

lance é como você mantém essa transferência de energia constante.<br />

O segredo é: quanto mais você manda, mais recebe. Quanto<br />

mais liberdade você dá para alguém que trabalha com você, mais<br />

aceitará as suas ideias. Acontece o mesmo com o cliente. No escritório,<br />

não desenvolvemos a partir de um estilo fechado. Você<br />

tem que entrar em contato com a pessoa, entender o que ela quer<br />

e saber como traduzir isso, em parceria. Você pega todo o repertório<br />

de formas e mostra os caminhos. Dá a estrutura para ela e a<br />

deixa passear um pouco nesse universo. Sem querer reter, sem<br />

dizer “isso aqui é meu, é minha criação”. Para qualquer projeto,<br />

a criação passa por uma linha bem pessoal e, como em qualquer<br />

trabalho, a confiança é o verdadeiro contrato. •<br />

magazine 13

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!