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O Mulato, de Aluísio de Azevedo Fonte - Canal do Estudante

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— Em to<strong>do</strong> caso... arriscou Manuel, é por pouco tempo... Talvez coisa <strong>de</strong> um mês...<br />

E sopean<strong>do</strong> a voz discretamente com me<strong>do</strong>: Além disso... não me convinha <strong>de</strong>sagradar o rapaz... Sim!<br />

tenho <strong>de</strong> entrar em negócio com ele, e... isto cá para nós... seria uma fineza, que me ficava a <strong>de</strong>ver... porque<br />

enfim... você sabe que...<br />

— Ah! interrompeu o cônego, toman<strong>do</strong> uma nova atitu<strong>de</strong>. Isso é outro cantar!... Por ai é que você <strong>de</strong>via<br />

ter principia<strong>do</strong>!<br />

— Sim tornou Manuel. com mais animo. Você bem sabe que não tenho obrigação <strong>de</strong> estar a moer-me<br />

com o nhonhô Mundico... e, se bem que...<br />

— Pchio!... fez o padre, cortan<strong>do</strong> a conversa, e disse: - Hóspe<strong>de</strong> o homem!<br />

E saiu da saleta, revestin<strong>do</strong> logo o seu pachorrento e estuda<strong>do</strong> ar <strong>de</strong> santarrão.<br />

Ao chegarem à varanda Ana Rosa, já em trajes <strong>de</strong> passeio, os esperava para sair toda <strong>de</strong>bruçada no<br />

parapeito da janela e <strong>de</strong>rraman<strong>do</strong> sobre o Bacanga um olhar mole e cheio <strong>de</strong> incertezas.<br />

— Então, sempre te resolveste, minha caprichosa?... disse o pai.<br />

E contemplava a filha, com um risinho <strong>de</strong> orgulho. Ela estava realmente boa com o seu vesti<strong>do</strong> muito<br />

alvo <strong>de</strong> fustão, alegre, to<strong>do</strong> cheiran<strong>do</strong> aos jasmins da gaveta: com o seu chapéu <strong>de</strong> palhinha <strong>de</strong> Itália<br />

emolduran<strong>do</strong> o rosto oval, fresco e bem feito com o seu cabelo castanho, farto e se<strong>do</strong>so, que aparecia em<br />

bandós no alto da cabeça e reaparecia no pescoço enrodilha<strong>do</strong> <strong>de</strong>spretensiosamente.<br />

— Tinhas dito que não ias...<br />

— Vá se vestir, papai.<br />

E assentou-se.<br />

— Lá vou! Lá vou!<br />

Manuel bateu no ombro <strong>do</strong> cônego:<br />

— Meto-lhe inveja, hein, compadre?.. Olhe como o diacho da pequena esta faceira, não é?<br />

— Ne insultes miseris!<br />

— Quê?... interjeicionou o negociante, olhan<strong>do</strong> para o relógio da varanda. Quatro e meia! E eu que ainda<br />

tinha <strong>de</strong> ir hoje tratar <strong>do</strong> <strong>de</strong>spacho <strong>de</strong> um açúcar!...<br />

E foi entran<strong>do</strong> apressa<strong>do</strong> no quarto, a gritar para o Benedito “que lhe levasse água morna para banhar o<br />

rosto”.<br />

O cônego assentou-se <strong>de</strong>fronte <strong>de</strong> Ana Rosa.<br />

— Então on<strong>de</strong> é hoje o passeio minha rica afilhada?<br />

— À casa <strong>do</strong> Freitas. Não se lembra? Lin<strong>do</strong>ca faz anos hoje.<br />

— Cáspite! Temos então peru <strong>de</strong> forno!..<br />

— Papai fica para o jantar... vossemecê não vai dindinho?<br />

— Talvez apareça à noite... Com certeza há dança...<br />

— Hum-hum... mas creio que o Freitas conta com uma surpresa da Filarmônica.. disse Ana Rosa,<br />

entretida a endireitar os folhos <strong>de</strong> seu vesti<strong>do</strong> com a biqueira da sombrinha.<br />

Nisto ouviram-se bater embaixo as portas <strong>do</strong> armazém, que se fechavam com gran<strong>de</strong> n i<strong>do</strong> <strong>de</strong> fechaduras,<br />

e logo em seguida o som pesa<strong>do</strong> <strong>de</strong> passos repeti<strong>do</strong>s na escada. Eram os caixeiros que subiam para jantar.<br />

Entrou primeiro na varanda o Bento Cor<strong>de</strong>iro. Português <strong>do</strong>s seus trinta e tantos anos arruiva<strong>do</strong>, feio <strong>de</strong><br />

bigo<strong>de</strong> e barba a cavanhaque Gabava-se <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> prática <strong>de</strong> balcão chamavam-lhe “Um alho”. Para aviar<br />

encomendas <strong>do</strong> interior não havia outro! Cor<strong>de</strong>iro “metia no bolso o capurreiro mais sabi<strong>do</strong>”.

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