Apostila 2 o passo História de Quem Conta - Portal SME
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Bia Bedran<br />
Bia por ela mesma - O quintal – Memórias <strong>de</strong> uma contadora <strong>de</strong> histórias...<br />
Equipe <strong>de</strong> Leitura – <strong>SME</strong>/ D.C.<br />
Junho <strong>de</strong> 2012<br />
Um quintal é o primeiro palco que uma criança pisa.<br />
Po<strong>de</strong> ser uma área ou um pequeno pedaço qualquer<br />
on<strong>de</strong> ela se exteriorizará, largará sua imaginação e<br />
<strong>de</strong>senvolverá sua criativida<strong>de</strong>.<br />
Wanda Bedran<br />
Durante os anos 1970, minha mãe, Wanda Martini Bedran, e suas<br />
irmãs e primas, Wilma Martini Brandão, Wandirce Martini Wörhle, Maria <strong>de</strong><br />
Lour<strong>de</strong>s Martini, Maria José Martini Quintas e eu fundamos, ao lado <strong>de</strong> uma<br />
gran<strong>de</strong> parte da família, o Quintal Teatro Infantil, inaugurado em 16 <strong>de</strong><br />
setembro <strong>de</strong> 1973, numa agradável rua do bairro <strong>de</strong> São Francisco, em<br />
Niterói, no estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro. O teatro Quintal, <strong>de</strong> duzentos lugares, foi<br />
erguido literalmente no quintal da casa <strong>de</strong> umas das irmãs, Wandirce, com<br />
projeto arquitetônico <strong>de</strong> Junir Brandão, marido da outra irmã, Wilma. <strong>Quem</strong><br />
passava pela rua General Rondon, 15, voltava sua atenção para uma casa <strong>de</strong><br />
esquina sombreada por enormes amendoeiras com um toque especial no<br />
muro branco: uma gran<strong>de</strong> margarida pintada no lugar no buraco on<strong>de</strong> era a<br />
bilheteria. Participavam do grupo 23 membros da família, pais, mães, irmãos,<br />
avós, primos, tias e tios, que, através da arte, conseguiram a façanha <strong>de</strong><br />
viabilizar a convivência entre as três gerações. A i<strong>de</strong>ia da fundação <strong>de</strong> um<br />
teatro para crianças surgiu com Wanda, Wandirce, Wilma e Maria José, que<br />
quando jovens realizavam apresentações <strong>de</strong> teatro <strong>de</strong> bonecos nos morros.<br />
Com o casamento <strong>de</strong> cada uma <strong>de</strong>las, o trabalho foi interrompido até 1973,<br />
quando <strong>de</strong>sejaram a volta do grupo e mobilizaram toda a família, já na segunda geração.<br />
Ali no nosso Quintal, pu<strong>de</strong>mos experimentar linguagens cênicas diversas sempre buscando falar à infância, e<br />
nos revezávamos nas inúmeras funções pertinentes ao mundo das artes cênicas, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a construção do próprio teatro<br />
em formato <strong>de</strong> arena até a confecção <strong>de</strong> figurinos, cenário, bonecos e a<strong>de</strong>reços, criação dos textos, músicas, direção,<br />
produção, iluminação, controle <strong>de</strong> bor<strong>de</strong>raux, organização da cantina (que se chamava A Casa do Sapo Guloso), enfim,<br />
todos os <strong>passo</strong>s que pertencem a uma trupe teatral.<br />
Eu, então com <strong>de</strong>zessete para <strong>de</strong>zoito anos, tratava da direção musical<br />
dos espetáculos, e todos tocávamos instrumentos <strong>de</strong> percussão, violão,<br />
acor<strong>de</strong>om, flautas, e objetos sonoros como bacia com areia para obtermos o som<br />
da água, ou conchas e chaves enredadas por um fio, que produziam um efeito<br />
mágico diante dos olhos encantados das crianças e dos adultos.<br />
Os textos das peças infantis do Quintal eram <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> Maria <strong>de</strong><br />
Lour<strong>de</strong>s Martini (também diretora-geral do grupo), Wanda Martini Bedran,<br />
Maria Mazzeti e Maria Arminda Aguiar. Dotados <strong>de</strong> uma enorme brasilida<strong>de</strong>,<br />
evocavam situações rurais às vezes datadas <strong>de</strong> outras épocas, o que favorecia a<br />
minha pesquisa <strong>de</strong>ntro do cancioneiro do Brasil para que as nossas<br />
interpretações tivessem maior vigor e mostrassem às crianças e a seus pais um<br />
mundo sonoro rico e diferenciado. Já aí se fazia presente aquela memória das<br />
modinhas, cordéis, romances, e das estrofes rimadas e ritmadas cantadas por<br />
minha mãe durante a infância, e toda criação das canções para os espetáculos <strong>de</strong>sabrochava fertilmente, embebida da<br />
água daquela fonte inicial. Também o modo como <strong>de</strong>scobrimos juntos a força das narrativas em contraponto com a<br />
interpretação e a caracterização dos personagens foi fundamental durante todo o processo <strong>de</strong> amadurecimento<br />
profissional do grupo. Nossa pesquisa <strong>de</strong> linguagem, utilizando bonecos e a<strong>de</strong>reços que se mesclavam com nossas<br />
atuações, acontecia atrás e na frente da “tapa<strong>de</strong>ira” ou “empanada”, como era chamado o palco dos bonecos. Eles eram<br />
criados e manipulados com primor pelas nossas mestras: mães, avós e tias. Elas eram verda<strong>de</strong>iras artesãs na criação e<br />
manipulação dos bonecos, que surgiam dos mais variados materiais e adquiriam formas surpreen<strong>de</strong>ntes, nada<br />
convencionais enquanto fantoches, mamulengos ou a<strong>de</strong>reços que se transformavam em personagens. Sua sabedoria<br />
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