You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
www.nead.unama.br<br />
Chegado à casa, chamou à parte a esposa. E, contou-lhe, sem omitir uma só<br />
particularida<strong>de</strong> da sua vida, a afeição que o prendia à esposa do seu melhor amigo,<br />
e a necessida<strong>de</strong>, que havia, <strong>de</strong> que ela, a sua Cotinha, sua mulher, o perdoasse.<br />
Era uma fatalida<strong>de</strong>; mas, que havia <strong>de</strong> fazer, se era aquele o seu <strong>de</strong>stino?<br />
Fisionomia serena, com a mão no queixo e o cotovelo no espelho da cama,<br />
Dona Cotinha escutava o marido. E quando ele acabou a exposição do seu caso,<br />
indagou, sem raiva:<br />
— Dize-me uma coisa, Luiz: há quanto tempo tu me enganas com a Liloca?<br />
— Eu? Há quatro anos.<br />
— E achas que eu te <strong>de</strong>vo perdoar?<br />
— Acho!<br />
— Então, filho, — fez a moça com ironia, — és tu que <strong>de</strong>ves perdoar a mim.<br />
— Há seis anos que eu sou amante do Gaudêncio, marido <strong>de</strong>la!<br />
CAPÍTULO LXXXVI<br />
O Bordado<br />
Não obstante o sortimento do seu armarinho, o Borges Pedreira não tinha a<br />
freguesia a que o seu negócio fazia jus. E a razão era simples: casado com uma<br />
senhora ciumentíssima, que montava guarda ao balcão, as damas <strong>de</strong> Pedra Branca<br />
evitavam, quanto possível, a sua casa, só indo comprar lá alguma coisa quando,<br />
mesmo, não havia remédio. Alta, magra, olhar inquisitorial, Dona Marocas constituía<br />
um espantalho do belo sexo, olhando cada freguesa como uma rival, que alí ia, não<br />
para fazer compras, mas para conquistar-lhe atrevidamente o marido.<br />
Vigiado assim <strong>de</strong> perto, passando a vida <strong>de</strong> sentinela à vista, o Borges<br />
Pedreira <strong>de</strong>via ser um dos maridos mais honestos, mais castos, mais fiéis, <strong>de</strong> Pedra<br />
Branca. E Dona Marocas estava quase certa <strong>de</strong>ssa verda<strong>de</strong>, quando entrou, um dia,<br />
na loja, uma pequena <strong>de</strong> uns nove anos, muito espevitada, filha <strong>de</strong> uma das<br />
raparigas mais bonitas da cida<strong>de</strong>, e que pediu, logo, entre um cumprimento e um<br />
sorriso:<br />
— Sr. Pedreira, eu queria três metros <strong>de</strong> bordado.<br />
Com Dona Marocas a seu lado, o negociante pôs sobre o balcão algumas<br />
caixas do artigo, para que a menina o escolhesse.<br />
— Despache-me, que mamãe está com pressa! — reclama, com energia, a<br />
pequena.<br />
— Escolha o bordado; pois eu hei <strong>de</strong> saber?<br />
— O senhor sabe, sim! — insiste a menina.<br />
— Eu? — exclama o Pedreira, avermelhando-se <strong>de</strong> repente, a olhar, <strong>de</strong><br />
esguelha, a esposa, que o <strong>de</strong>vora com os olhos. — Posso eu lá adivinhar?!...<br />
— Ora, não sabe!... — retruca a menina, zombeteira.<br />
E com um risinho <strong>de</strong> mofa:<br />
— É aquele, "seu" Pedreira, aquele da camisa da mamãe!...<br />
69