O Eu e o Outro na Escola - Ministério do Esporte
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O JOGO DO TEMPO DA CRIANÇA EM MERURI<br />
A corporalidade, como afi rma Lopes da Silva a partir <strong>do</strong>s estu<strong>do</strong>s de Seeger et<br />
al. (1987), deve ser “ [...] entendida também como um <strong>do</strong>s mecanismos centrais <strong>do</strong>s<br />
processos de aprendizagem e transmissão de conhecimentos, habilidades, técnicas e<br />
concepções próprias à educação das crianças indíge<strong>na</strong>s.” (2002, p. 40).<br />
Em Meruri, a imagem de crianças brincan<strong>do</strong> faz parte <strong>do</strong> cotidiano da aldeia.<br />
Muitas se reúnem fora <strong>do</strong> horário de aulas, em espaços longe de suas casas, como <strong>na</strong><br />
área que circunda a Igreja e a Missão e que fi ca num espaço aberto com uma área<br />
cimentada onde podem jogar bola-de-gude, rouba-bandeira (chinelo), pega-pega,<br />
desenhar, riscan<strong>do</strong> com uma pedrinha, etc. Durante esses momentos de reunião de<br />
crianças, é comum que uma delas traga consigo uma criança menor que está sen<strong>do</strong><br />
cuidada. Para que participe <strong>do</strong> jogo, as outras se revezam no cuida<strong>do</strong> da criança de<br />
colo.<br />
Desde peque<strong>na</strong>s, as crianças são cuidadas pelo pai, pela mãe, pela avó ou por<br />
uma criança maior que pode ser irmã ou tia (de ambos os sexos). Algumas mães<br />
trabalham <strong>na</strong> Missão e estudam, sem tempo durante o dia, a responsabilidade sobre<br />
os menores é dividida entre os irmãos mais novos ou tios, que devem alimentá-<br />
-los, dar-lhes banho, passear e brincar com elas. Como afi rma Nunes (2002, p.<br />
73), acompanhan<strong>do</strong> outras crianças, irmãos e parentes mais novos ou mais velhos,<br />
a criança estará desenvolven<strong>do</strong> “[...] suas habilidades, suas invenções, seus confl itos,<br />
suas descobertas, seus me<strong>do</strong>s, seus mo<strong>do</strong>s de perceber, sentir e reagir aos outros.”<br />
Os diversos tempos da vida não se separam uns <strong>do</strong>s outros, mas, pelo contrário,<br />
integram-se assumin<strong>do</strong> as características de fenômeno totais, apresentam-se,<br />
sempre, com signifi ca<strong>do</strong> (CRESPO, [ca. 1990]). Nos diferentes tempos da criança,<br />
ela assume responsabilidades perante a família e a comunidade/escola, descobrin<strong>do</strong><br />
seu tempo de brincar e aprender com outras crianças. As crianças participam de todas<br />
as atividades <strong>do</strong>s adultos, sempre acompanhan<strong>do</strong> os pais (geralmente a mãe) ou uma<br />
parenta mais velha. Nessas atividades, encontram sempre maneiras de se divertir com<br />
o que há de disponível no espaço.<br />
No cotidiano da aldeia, quan<strong>do</strong> não há práticas coletivas, no fi <strong>na</strong>l da tarde,<br />
como as ligadas à tradição cultural, horário em que a comunidade faz suas danças<br />
no bororo (pátio ritualístico), as crianças de diferentes idades e de ambos os sexos se<br />
reúnem para jogar bola. Brincam em to<strong>do</strong>s os momentos, acompanhan<strong>do</strong> os adultos,<br />
de outras crianças, <strong>na</strong> aldeia ou <strong>na</strong> escola.<br />
[...] as crianças vivem uma permissividade quase sem limites,<br />
são onipresentes <strong>na</strong> aldeia e <strong>na</strong>s áreas circundantes, e punições<br />
quase não acontecem [...]. E é exatamente essa aparente desordem<br />
ou falta de ordem, ou antes, uma ordem vivida de outro<br />
mo<strong>do</strong>, imersa num espírito lúdico, espontânea e sem compromisso,<br />
que pode estar no cerne de to<strong>do</strong> um processo educacio<strong>na</strong>l.<br />
[...] o que pode parecer caótico e sem regras, obedece a<br />
110 O EU E O OUTRO NA ESCOLA: Contribuições para incluir a história e a cultura <strong>do</strong>s povos indíge<strong>na</strong>s <strong>na</strong> escola