Publicação da Associação Mineira - AMP
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Psiquiatrias: de onde viemos, quem somos<br />
e para que uma associação?<br />
Não tem como falar sobre a<br />
história <strong>da</strong> Psiquiatria sem injustiça,<br />
privilegiando um momento,<br />
ou um autor e esquecendo outros<br />
tantos. Somos filhos de nosso<br />
tempo e de nossa perspectiva<br />
para olhar o mundo.<br />
Foi muito grande a evolução<br />
<strong>da</strong> Psiquiatria nos séculos XIX e<br />
XX. Com os recursos para diagnóstico<br />
por imagem que existem<br />
atualmente, se torna desejável<br />
que também façamos um registro<br />
do interior de nós mesmos e<br />
de nossa prática.<br />
No cenário atual, vemos médicos<br />
que atendem pacientes<br />
psiquiátricos com condutas que<br />
nos remetem a uma viagem no<br />
tempo: existem os repetidores<br />
de mantras institucionais<br />
paralisantes que permanecem<br />
imersos em sombrias cavernas<br />
anacrônicas, com conceitos e<br />
terapêuticas sem qualquer respeitabili<strong>da</strong>de<br />
científica, voltando<br />
a um saber de posição marginal<br />
em relação à medicina.<br />
Em sua infância, a Psiquiatria<br />
manifestou-se pelo cui<strong>da</strong>do em<br />
humanizar o tratamento, com os<br />
trabalhos e práticas de Philippe<br />
Pinel (17451826). Os achados<br />
de substratos orgânicos em<br />
muitas doenças mentais, tendo<br />
a Paralisia Geral Progressiva<br />
como para digma, introduziram<br />
a Psiquiatria no campo <strong>da</strong>s disciplinas<br />
médicas.<br />
Na adolescência, como uma<br />
colecionadora, iniciou a organização<br />
nosológica com Kraepelin,<br />
a fenomenologia de Jaspers e a<br />
formulação do inconsciente com<br />
Freud, em 1900. Rebelde, a corrente<br />
Antipsiquiatria, na déca<strong>da</strong><br />
de 1960 valeu pela irreverência,<br />
resultando na popularização do<br />
tema com a ven<strong>da</strong>gem de livros<br />
verborrágicos: na Inglaterra,<br />
Ronald D. Laing, com a obra “O<br />
eu dividido” (1960), e David G.<br />
Cooper, autor de “Psiquiatría<br />
Luís Carlos Calil<br />
e antipsiquiatria” (1967) e “A<br />
morte <strong>da</strong> familia” (1971). Questionando<br />
e culpando a família e<br />
o Estado, que estariam, segundo<br />
os autores, convertendo a enfermi<strong>da</strong>de<br />
mental em um mito,<br />
sendo os psiquiatras, instrumentos<br />
do poder opressor.<br />
Nasce “O eu dividido” dentro<br />
de alguns psiquiatras, que não<br />
encontram uma identi<strong>da</strong>de clara,<br />
ora não são ninguém, ora querem<br />
ser todos. Os psiquiatras<br />
pré-genitais, que não atingiram<br />
a fase, na qual meninos e meninas<br />
percebem suas diferenças<br />
e se assustam por não serem<br />
totipotentes. Psiquiatras não<br />
são neurologistas, não são psicólogos,<br />
quando têm clara sua<br />
identi<strong>da</strong>de, são somente Psiquiatras.<br />
Que bom ser diferente<br />
e no encontro poder se completar.<br />
A Antipsiquiatria, como todo<br />
movimento <strong>da</strong> contracultura, foi<br />
efêmera.<br />
A derruba<strong>da</strong> literal de hospitais<br />
psiquiátricos, por Basaglia,<br />
além de gerar empregos na<br />
área de construção civil, que os<br />
reconstruiu, ajudou a relembrar<br />
as lições de Pinel que quase dois<br />
séculos antes, alertara na direção<br />
de um tratamento humanístico<br />
nos hospitais psiquiátricos.<br />
Impulsionado pelo mapeamen<br />
to genético, a identificação<br />
de mais gens relacionados aos<br />
transtornos mentais, em breve,<br />
deve trazer avanços comparáveis<br />
ao <strong>da</strong> Clorpromazina, na<br />
déca<strong>da</strong> de 1950.<br />
Saindo <strong>da</strong> caverna, olhando<br />
para além <strong>da</strong>s sombras, neste<br />
início de século XXI, a Psiquiatria,<br />
sabendo de sua identi<strong>da</strong>de,<br />
pode atingir a i<strong>da</strong>de adulta e<br />
maturi<strong>da</strong>de. Fazendo revisão<br />
crítica em sua história, rejeitando<br />
concepções mágicas e<br />
místicas, o discurso panfletário,<br />
a pseudologia fantástica, pode<br />
assimilar o que produziu de me-<br />
lhor e concentrar-se na busca<br />
<strong>da</strong> superação de suas deficiências.<br />
Retomar um caminho que<br />
nunca deveria ter abandonado,<br />
um modelo claramente médico<br />
para tratamento e pesquisas em<br />
Psiquiatria.<br />
Dado este panorama <strong>da</strong><br />
Psiquiatria, um dos papéis associativos<br />
mais relevantes, no<br />
momento, será o de manter a<br />
identi<strong>da</strong>de do médico psiquiatra,<br />
estar próxima a residentes de<br />
Psiquiatria, psiquiatras e pesquisadores<br />
<strong>da</strong> área, para levar<br />
aos seus associados o que há de<br />
melhor em suas áreas de conhecimento.<br />
É um papel educativo<br />
que se refletirá em um corpo<br />
profissional e de assistência<br />
qualifica<strong>da</strong> ao paciente.<br />
Está em vias de se concretizar<br />
a norma <strong>da</strong> <strong>Associação</strong> Médica<br />
Brasileira, em que o Título de<br />
Especialista deverá ser revali<strong>da</strong>do<br />
a ca<strong>da</strong> cinco anos. Uma<br />
iniciativa que pode ser vista<br />
com pouca simpatia por alguns,<br />
que se verão obrigados a viajar<br />
no tempo, saindo <strong>da</strong> bruxaria<br />
medieval para os dias atuais,<br />
se quiserem ter a denominação<br />
de Especialistas em Psiquiatria.<br />
Com os meios eletrônicos<br />
disponíveis, a educação continua<strong>da</strong><br />
médico-psiquiátrica deve<br />
ser permanente, ir além dos<br />
Congressos, que são o encontro<br />
maior dos especialistas.<br />
Atualizar conhecimentos que<br />
subsidiem habili<strong>da</strong>des. Sendo<br />
representante de especialistas,<br />
assegurar que estes mantenham<br />
vivo o cui<strong>da</strong>do com a profissão.<br />
Sabendo que somos, poderemos<br />
saber para onde queremos<br />
ir, neste percurso, nossa associação<br />
pode ser de grande aju<strong>da</strong>.<br />
Psiquiatra pela AMB-ABP. Professor de Psiquiatria<br />
<strong>da</strong> FMTM. Membro <strong>da</strong> Comissão de Revali<strong>da</strong>ção de<br />
TE e <strong>da</strong> Comissão de Residência Médica <strong>da</strong> ABP.<br />
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