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Publicação da Associação Mineira - AMP

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A proposta de discussão sobre<br />

uma nova clínica, sobre novas<br />

instituições e sobres novas intervenções,<br />

tema escolhido para o<br />

próximo Congresso Brasileiro de<br />

Psiquiatria a realizar-se em Belo<br />

Horizonte, em outubro de 2005 não<br />

me parece tarefa fácil. Vivemos em<br />

um mundo insanamente moderno,<br />

com uma valorização absoluta dos<br />

resultados imediatos, somando-se<br />

a progressiva desvalorização dos<br />

contatos humanos. Como então<br />

articular o conceito <strong>da</strong>s novas diretrizes<br />

psiquiátricas se o novo se<br />

renova a ca<strong>da</strong> dia? A Psiquiatria não<br />

se salvou, pelo contrário, arrastase<br />

na degra<strong>da</strong>ção progressiva <strong>da</strong>s<br />

relações médico-paciente e assiste<br />

ain<strong>da</strong>, com alguma distância, a luta<br />

de sobrevivência de colegas médicos<br />

de outras especiali<strong>da</strong>des com os<br />

gestores dos planos de saúde. Infelizmente,<br />

muitas vezes pensa-se o<br />

novo em detrimento do velho, como<br />

se o renovar fosse algo totalmente<br />

desvencilhado do antigo. De acordo<br />

com o Dicionário Aurélio, o novo<br />

poderia ser conceituado como “o<br />

que tem pouco tempo de existência,<br />

o de pouca i<strong>da</strong>de, o que ain<strong>da</strong> não<br />

foi posto em uso, o recente, o original”.<br />

É neste ultimo que poderíamos<br />

ancorar os objetivos em relação às<br />

novas diretrizes determina<strong>da</strong>s pelo<br />

tema. Nos interessa e muito discutir<br />

com diferentes especialistas, aprender<br />

com eles, trocar experiências<br />

sem, entretanto, nos esquecermos<br />

do engano <strong>da</strong>s ver<strong>da</strong>des absolutas,<br />

váli<strong>da</strong>s para todos, aquelas que desconsideram<br />

o particular <strong>da</strong> clínica<br />

do caso a caso, onde o original, o<br />

peculiar de ca<strong>da</strong> um está falseado ou<br />

mesmo completamente encoberto.<br />

O mundo globalizado tornou-se<br />

pequeno, rápido, de fácil acesso, o<br />

outro, o diferente, as outras culturas<br />

nos chegam quase instantaneamente<br />

via Internet. As conseqüências<br />

desta rapidez on-line, maravilhosa<br />

do ponto de vista científico e tecnológico,<br />

já se apresenta com efeitos<br />

desastrosos na clínica. Como exemplo,<br />

cito a cruel<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s conversas<br />

via internet e a exposição posterior<br />

destas mesmas falas em salas de<br />

aula por adolescentes, tema já de<br />

diversos trabalhos e reportagens ou<br />

ain<strong>da</strong> e talvez mais desumano as<br />

dicas de adolescentes em como se<br />

tornar anorética ou como se suici<strong>da</strong>r,<br />

As novas e as falsas diretrizes<br />

Luciana Carvalho<br />

encontra<strong>da</strong>s em vários sites. Aqui,<br />

o novo é o novo mesmo, entendido<br />

como aprender a li<strong>da</strong>r com situações<br />

antes inexistentes.<br />

A nova clínica, lugar privilegiado<br />

para o embate com a dura reali<strong>da</strong>de<br />

do exercício profissional, marca<strong>da</strong><br />

por situações inespera<strong>da</strong>s, situações<br />

de risco, melhoras importantes na<br />

quali<strong>da</strong>de de vi<strong>da</strong> de nossos pacientes,<br />

nos dá credibili<strong>da</strong>de, nos salva<br />

<strong>da</strong> banali<strong>da</strong>de contemporânea,<br />

nos aproxima do ideal hipo crático<br />

(“onde existir amor pelo ho mem,<br />

existirá amor pela arte mé dica”). Na<br />

apresentação de casos clínicos, nas<br />

conferências, nas discussões <strong>da</strong>s<br />

mesas redon<strong>da</strong>s, na apresentação<br />

de trabalhos realizados, nas sessões<br />

de pôsteres, o Psiquiatra, jovem ou<br />

velho, se renova, se atualiza, se<br />

alimenta <strong>da</strong>queles que valorizam a<br />

cena do atendimento.<br />

Nunca se pesquisou tanto o funcionamento<br />

cerebral, as técnicas<br />

de neuroimagem, a neurobiologia<br />

molecular, os estudos poligênicos,<br />

cujas descobertas devemos utilizar<br />

sempre que possível, pois cumprem<br />

o papel de uma ciência promissora<br />

que aposta na melhoria <strong>da</strong> saúde<br />

e desmistifica antigas culpas antes<br />

outorga<strong>da</strong>s as famílias e ao próprio<br />

paciente “não melhora porque<br />

não quer”, é assim por causa <strong>da</strong><br />

maneira que foi criado “etc. Estes<br />

novos conhecimentos são bastante<br />

promissores, alguns ain<strong>da</strong> só ao<br />

nível de pesquisas e outros tais<br />

como os novos psicofármacos já<br />

nos permitem melhoras altamente<br />

significativas no controle dos<br />

sintomas e minimização de efeitos<br />

colaterais, aumentando a tolerabili<strong>da</strong>de<br />

e a adesão dos pacientes<br />

aos tratamentos. Várias áreas do<br />

cérebro, antes pouco conheci<strong>da</strong>s<br />

tornaram-se importantes com os<br />

avanços decorrentes dos métodos<br />

de imagem. Assim, pela primeira vez<br />

foi possível estu<strong>da</strong>r em um indivíduo<br />

vivo a anatomia do seu sistema<br />

nervoso central. Estas técnicas<br />

vêm se desenvolvendo e a ca<strong>da</strong><br />

dia se tornam mais sofistica<strong>da</strong>s.<br />

A tomografia computadoriza<strong>da</strong>, a<br />

ressonância nuclear magnética e a<br />

tomografia por emissão de pósitrons<br />

revolucionaram a propedêutica<br />

neurológica, uma importante área<br />

de diagnóstico diferencial com a<br />

Psiquiatria. As técnicas recentes<br />

de ativação, onde a captação de<br />

glicose pelo neurônio é proporcional<br />

a sua ativi<strong>da</strong>de nos aponta como<br />

uma <strong>da</strong>s mais promissoras áreas<br />

de compreensão <strong>da</strong> fisiopatologia<br />

do sistema nervoso. Espera-se um<br />

amplo debate tanto em nível de<br />

métodos de investigação diagnóstica<br />

como de recursos terapêuticos<br />

com o rigor necessário ao exercício<br />

de uma clínica ética, limita<strong>da</strong> pelos<br />

altos custos dos procedimentos<br />

técnicos em um país marcado pelo<br />

descrédito e insensibili<strong>da</strong>de dos<br />

governantes em relação à saúde<br />

<strong>da</strong> população”.<br />

Na era pós reforma psiquiátrica,<br />

temos de garantir o local <strong>da</strong> assistência,<br />

já amplamente problema tiza<br />

do anteriormente. Sabemos que<br />

a opção pelos tratamentos ambu latoriais<br />

é sempre menos traumática e<br />

onerosa, mas nem sempre possí vel.<br />

As situações de emergência<br />

variam caso a caso, deman<strong>da</strong>m<br />

intervenções diferentes. O idoso<br />

sempre deverá ser avaliado clinicamente,<br />

as crianças quase sempre<br />

ficam mais calmas na presença dos<br />

pais, os adolescentes pelo contrário,<br />

agitam e agridem os familiares. As<br />

situações são diversas e as soluções<br />

nem sempre muito complica<strong>da</strong>s.<br />

Uma boa equipe, um local seguro<br />

e disponibili<strong>da</strong>de de medicamentos<br />

é sinônimo de um bom manejo.<br />

Entretanto, não é só o paciente<br />

que está em crise, pois há uma<br />

ruptura do equilíbrio doméstico.<br />

Sabendo-se que o fracasso ou o<br />

sucesso do tratamento depende<br />

<strong>da</strong> adesão familiar, esta deverá ser<br />

acolhi<strong>da</strong> com a mesma prontidão<br />

sempre que estiver presente. Mas<br />

tratar a crise não basta, já que a<br />

aceitação dos sintomas residuais e<br />

<strong>da</strong> tolerância dos efeitos colaterais<br />

medicamentosos constitui ain<strong>da</strong><br />

um grande desafio. Como reabilitar<br />

para a produtivi<strong>da</strong>de, para a manutenção<br />

dos antigos laços sociais e a<br />

construção dos novos? Talvez aqui<br />

o novo se imponha, no sentido <strong>da</strong><br />

invenção de estratégias criativas,<br />

econômicas e lúdicas, que possam<br />

garantir o exercício pleno <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de<br />

de se viver dignamente, apesar<br />

do transtorno mental.<br />

Psiquiatra infantil, Prof. <strong>da</strong> Residência de Psiquiatria<br />

Infantil <strong>da</strong> FHEMIG; Membro <strong>da</strong> Comissão<br />

Científica <strong>da</strong> XXIII CDP.<br />

PÁGINA 7

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