18.04.2013 Views

Edição completa - Revista de Ciências Sociais

Edição completa - Revista de Ciências Sociais

Edição completa - Revista de Ciências Sociais

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

pela expansão náutica luso-espanhola, foi realizado o Concílio <strong>de</strong> Trento (1545-1563), <strong>de</strong>pois ina<strong>de</strong>quadamente<br />

chamado <strong>de</strong> Contra-Reforma, e cujas recomendações contidas em seus documentos<br />

fi nais tiveram larga aplicação e ampla infl uência sobre a arte sacra. Por outro lado, o crescimento<br />

urbano no Renascimento e a conseqüente crise agrícola faziam aumentar entre camponeses o apelo<br />

às seitas e à magia; essa instabilida<strong>de</strong> socioeconômica propiciava o pano <strong>de</strong> fundo do combate <strong>de</strong><br />

Lutero contra o papado, preconizando a volta às fontes do cristianismo original, a exaltação da Bíblia,<br />

a luta contra a intercessão dos santos e da Virgem, etc., pressupondo uma arquitetura <strong>de</strong>spojada <strong>de</strong><br />

ornamentos e imagens. Além disso, expandia-se a época do realismo político (Maquiavel, Loyola). E<br />

a Igreja reagiu exaltando as formas do culto tradicional, o primado do Papa, o uso da arte a serviço<br />

da propagação religiosa, a criação <strong>de</strong> instrumentos <strong>de</strong> controle e censura (Inquisição), e o estímulo<br />

às gran<strong>de</strong>s or<strong>de</strong>ns missionárias, em especial a atuação da Companhia <strong>de</strong> Jesus na América Latina e<br />

noutros territórios. Eis por que o Barroco levado para aí foi chamado <strong>de</strong> arte jesuítica.<br />

Todavia, se Werner Weisbach, um dos principais responsáveis pela tese do Barroco como arte da<br />

Contra-Reforma, tinha algum fundamento ao consi<strong>de</strong>rá-lo como expressão da cultura católica em seus valores,<br />

contradições e veemência militante, esse vínculo suposto em sua concepção passou a ser contestado <strong>de</strong><br />

algum tempo aos nossos dias. Ressaltou-se que o Barroco que ele estudara estava iconografi camente limitado<br />

a obras <strong>de</strong> temática religiosa. E ele <strong>de</strong>fi nia o Barroco como heróico, místico, erótico, ascético e cruel; e falava<br />

<strong>de</strong> uma sensibilida<strong>de</strong> poética e mórbida, que <strong>de</strong> fato existe em boa parte da produção pictórica e escultórica<br />

da arte colonial. Ora, essa fusão <strong>de</strong> êxtase e erotismo era a tarefa primordial do naturalismo barroco. Em<br />

sua crítica a Weisbach, Hatzfeld consi<strong>de</strong>ra discutível a suposição <strong>de</strong> um misticismo que se confun<strong>de</strong> com<br />

erotismo, <strong>de</strong> um ascetismo relacionado à cruelda<strong>de</strong>. Por sua vez, Tapié exige cuidado para não i<strong>de</strong>ntifi car<br />

Barroco e Contra-Reforma tri<strong>de</strong>ntina como se fossem fatores estáveis e interligados. Sem esquecer a ampla<br />

proliferação do estilo em países protestantes e burgueses; nem <strong>de</strong>sprezar o fato <strong>de</strong> que facetas dominantes<br />

do Maneirismo estão presentes no espírito da Contra-Reforma.<br />

• Barroco & Formas que voam. – Ao se contrapor às «pretensas <strong>de</strong>terminações geográfi cas e sociológicas»,<br />

Eugenio D’Ors aponta dois aspectos formais inconfundíveis no Barroco: a multipolarida<strong>de</strong>,<br />

traduzida pela pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> centros tectônicos, e a continuida<strong>de</strong>, que estabelece uma corrente <strong>de</strong><br />

sentido na sucessão das partes <strong>de</strong> sua composição. Mas insiste antes em dois <strong>de</strong> seus aspectos culturais<br />

que constituem para ele a própria essência do Barroco: o panteísmo e o dinamismo.<br />

No que concerne à primeira <strong>de</strong>ssas características, tentarei resumir aqui suas ousadas especulações,<br />

porque suscitam por certo discussões e estimulam refl exões. Que a Contra-Reforma, diz ele, se traduz em<br />

estilo barroco isso é inegável; porém, a Weltanschauung luterana se exprime também, estilisticamente, em<br />

barroquismo, assim como aquela que presidiu às <strong>de</strong>scobertas geográfi cas dos Portugueses, cuja inspiração era<br />

<strong>de</strong> origem basicamente franciscana [Jaime Cortesão e o próprio D’Ors indicaram isso em muitas ocasiões].<br />

Franciscanismo, luteranismo, Contra-Reforma coinci<strong>de</strong>m, em certa medida, por sua morfologia. Todavia, é<br />

impossível que uma coincidência na forma não corresponda a uma coincidência no espírito. Em face disso,<br />

ele indaga e respon<strong>de</strong>: Qual será, então, essa coincidência espiritual, qual será o caráter comum da Contra-<br />

Reforma, du luteranismo, do franciscanismo? – Este ponto esclarecido, estaremos mui próximo <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir<br />

o segredo da tendência geral a que obe<strong>de</strong>ce o Barroco em todas as suas manifestações, em todos os países,<br />

em todas as épocas. Todos aqueles que, na história das idéias, admitem a existências <strong>de</strong> «constantes», ou pelo<br />

menos <strong>de</strong> relações, admitirão sem difi culda<strong>de</strong> que, no que tange ao problema das relações entre o homem e a<br />

natureza, franciscanismo e luteranismo adotam ao mesmo tempo, com as inevitáveis diferenças, uma atitu<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> reconciliação, espécie <strong>de</strong> absolvição da natureza pelo homem: visto que este começa por <strong>de</strong>clará-la boa,<br />

BEZERRA DE MENEZES, E. D. O Barroco como cosmovisão matricial... p. 49 - 77<br />

<strong>Revista</strong> CIENCIAS SOCIAIS 39-1 ufc 2008.indd 55 16/10/2008 12:45:57<br />

55

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!