18.04.2013 Views

zonte habitual dos antropólogos bra - Mariza Peirano

zonte habitual dos antropólogos bra - Mariza Peirano

zonte habitual dos antropólogos bra - Mariza Peirano

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Uma antropologia no plural 41<br />

Mas depois de um tempo, agora, depois de velho, estou<br />

voltando, de novo, a uma crítica, penso eu, ligada à sociologia.<br />

Os franceses dizem que se a gente expulsa aquilo que<br />

é a nossa tendência natural, ela volta correndo: "Chassez le<br />

nature!, il revient tout alors."<br />

Um exemplo bem ilustrativo é a discussão sobre a fonna como<br />

a arte retrata a alimentação e a nutrição. Analisando como o tema<br />

sugere em diferentes sociedades- entre os Nuer, na poesia francesa<br />

e alemã, e em alguns romances clássicos <strong>bra</strong>sileiros (:56-70) -, Antonio<br />

Candido vê que o ato de se alimentar, uma das necessidades<br />

básicas humanas, mostra como manifestações de emoção e de elaboração<br />

estética variam em diferentes contextos sociais.<br />

Entre os 'primitivos', comer pode ter conotações mágicas. A<br />

sacralização do alimento é comum nas sociedades estudadas por Audrey<br />

Richards, Evans-Pritchard e Boas. Antonio Candido chega a<br />

analisar uma canção Nuer para mostrar como o gado, tão importante<br />

nesta sociedade, é usado para expressar o desconforto pela presença<br />

<strong>dos</strong> ingleses (:58-60), fato despercebido por Evans-Pritchard. Entre<br />

os 'civiliza<strong>dos</strong>', no entanto, o quadro é diferente. Poemas de Victor<br />

Hugo, Shelley e Rilke (:61-66) exemplificam como as associações<br />

poéticas relacionadas ao alimento são dilufdas a tal ponto que elas,<br />

virtualmente, desaparecem. Estes poemas eliminam to<strong>dos</strong> os vestfgios<br />

da dimensão fisiológica, desta maneira contrastando com a forma<br />

'primitiva', que expõe livre e de maneira direta a base orgânica<br />

da nutrição e sua relação com o dornfnio da arte. Antonio Candido<br />

postula, numa veia durkheimiana, que nas sociedades 'primitivas' o<br />

contexto social está mais aparente nas formas artfsticas. A emoção<br />

orgânica da nutrição, por exemplo, não é submetida às numerosas<br />

mediações como acontece entre os 'civiliza<strong>dos</strong>'. Desta forma, Antonio<br />

Candido pretende ligar a estrutura à história ou, em suas palavras,<br />

"fundir texto e contexto".<br />

No momento em que a antropologia contemporânea sente como<br />

um <strong>dos</strong> desafios pós-estruturalistas mais sérios a incorporação da<br />

dimensão temporal em seus estu<strong>dos</strong>, é interessante, como exemplo<br />

final, ver como Antonio Candido analisou o poema Caramuru em<br />

dois momentos históricos: no final do século xvm, em Portugal, e<br />

no início do XIX, no Brasil.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!