r e v i s t a t j d f t m a i o - j u n h o - j u l h o - a g o s t o - 2 0 0 8
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14<br />
d e c i s õ e s h i s t ó r i c a s<br />
r e v i s t a t j d f t<br />
Sentença autoriza<br />
mudança de nome e sexo de<br />
transexual<br />
a s e g u n d a d e C i s ã o s e d e s Ta C a P e l a i n o va ç ã o . e r a m o s ú lT i m o s d i a s d e n o v e m b r o d e 2 0 0 2 q u a n d o m o a C i r<br />
Pa s s o u a s e C h a m a r b i a n C a . o s d o i s n o m e s s ã o F i C T í C i o s , m a s a h i s T ó r i a d e v i d a d e s s e T r a n s e x u a l n ã o . e l e<br />
n a s C e u h e r m a F r o d i Ta , F o i r e g i s T r a d o C o m o h o m e m , m a s T i n h a T r a ç o s F e m i n i n o s e s e s e n T i a C o m o m u l h e r .<br />
F e z a C i r u r g i a d e m u d a n ç a d e s e x o , m a s C o n T i n u ava h o m e m e m T o d o s o s s e u s r e g i s T r o s d e v i d a . a s e n T e n ç a<br />
q u e m u d o u Pa r a s e m P r e a v i d a d e s s e P e r s o n a g e m d o m u n d o r e a l F o i d o J u i z C a r l o s F r e d e r i C o m a r o J a d e m e -<br />
d e i r o s , s u b s T i T u T o n a 1 ª va r a d e F a m í l i a d e b r a s í l i a à é P o C a d o s F aT o s e aT u a l T i T u l a r d a 3 ª va r a d e F a m í l i a<br />
ó r F ã o s e s u C e s s õ e s d e C e i l â n d i a .<br />
n a d e C i s ã o , o m a g i s T r a d o a F i r m a q u e o n o m e é u m d o s m a i s P o d e r o s o s s i g n o s s o C i a i s e , P o r i s s o , T o d o<br />
i n d i v í d u o T e m o d i r e i T o d e T e r u m n o m e q u e n ã o l h e C a u s e C o n s T r a n g i m e n T o s o u o e x P o n h a a o r i d í C u l o . e m<br />
o u T r o T r e C h o d a s e n T e n ç a , C a r l o s F r e d e r i C o e n u m e r a o u T r o s a s P e C T o s , q u e n ã o o s F í s i C o s , Pa r a d e F i n i r o<br />
s e x o h u m a n o . d e a C o r d o C o m o J u i z , n ã o s e P o d e e s q u e C e r q u e a s e x u a l i d a d e P o s s u i u m a d i m e n s ã o P l u r a l ,<br />
q u e va i a l é m d o a s P e C T o b i o l ó g i C o , a P r e s e n Ta n d o a s P e C T o s s o C i a i s , P s í q u i C o s , C o m P o r Ta m e n Ta i s e C u lT u r a i s .<br />
l e i a a s e n T e n ç a n a í n T e g r a n a P á g i n a s e g u i n T e .<br />
n o v e m b r o d e 2 0 0 2<br />
“ A l g u é m q u e t e n h a a a p a r ê n c i a<br />
d e m u l h e r , s i n t a - s e m u l h e r , s e j a<br />
v i s t a e t r a t a d a s o c i a l m e n t e<br />
c o m o m u l h e r , m a s q u e o s t e n t e<br />
u m n o m e d e h o m e m , d e p a r a - s e<br />
c o m e v i d e n t e c o n f l i t o e n t r e s u a<br />
p e r s o n a l i d a d e s o c i a l e j u r í d i c a ” .<br />
J u i z C a r l o s F r e d e r i c o M a r o j a d e M e d e i r o s .<br />
Reconhecimento nas Forças Armada<br />
o m i l i Ta r J . C . a . P o s s u í a i d e n T i F i -<br />
C a ç ã o d e h o m e m aT é o a n o 2 0 0 0 ,<br />
q u a n d o T e v e o P e d i d o d e m u d a n -<br />
ç a d e s e x o J u l g a d o P r o C e d e n T e .<br />
d a a lT e r a ç ã o n o r e g i s T r o C i v i l<br />
aT é a g o r a , n o e n Ta n T o , v e m e n -<br />
F r e n Ta n d o u m a v e r d a d e i r a b a -<br />
Ta l h a s o C i a l . o m a i o r r e F l e x o<br />
d i s s o é q u e aT é a b r i l d e s T e a n o<br />
e l e a i n d a n ã o h av i a s i d o r e i n -<br />
T e g r a d o à s F o r ç a s a r m a d a s , d e<br />
o n d e T e v e d e s a i r P e l a s i m P l e s r a -<br />
z ã o d e s e r T r a n s e x u a l . m a s a Pa r -<br />
T e m a i s i m P o r Ta n T e d a g u e r r a e l e<br />
J á C o n s e g u i u v e n C e r : a a e r o n á u T i -<br />
C a r e C o n h e C e u o n o v o r e g i s T r o e<br />
J á e x P e d i u u m a C a r T e i r a C o m s e u<br />
n o v o n o m e , m a r i a l u i z a d a s i lva .<br />
o r e C o n h e C i m e n T o d a m u d a n ç a<br />
d e s e x o F o i o P r i m e i r o n a h i s T ó r i a<br />
d a s F o r ç a s a r m a d a s b r a s i l e i r a s .<br />
m a s i s s o é s ó o C o m e ç o . q u a n d o s e<br />
P r e Pa r ava Pa r a a C i r u r g i a , o e n T ã o<br />
C a b o r e C e b e u a n o T í C i a d e q u e s e -<br />
r i a r e F o r m a d o . o m o T i v o , s e g u n d o<br />
a s F i l e i r a s d a a e r o n á u T i C a , s e r i a<br />
i n C a Pa C i d a d e Pa r a o s s e rv i ç o s m i -<br />
l i Ta r e s . d e P o s s e d o n o v o d o C u -<br />
m e n T o , e a P ó s o i T o a n o s d e T r â m i T e<br />
P r o C e s s u a l , e l e a g u a r d a d e C i s ã o<br />
d a J u s T i ç a F e d e r a l Pa r a s e r r e i n -<br />
T e g r a d o a o C a r g o . a s e n T e n ç a d e v e<br />
s a i r aT é o F i n a l d o a n o .<br />
m a i o - j u n h o - j u l h o - a g o s t o - 2 0 0 8<br />
a u T o s n . 4 2 6 5 0 / 9 7<br />
a ç ã o d e r e T i F i C a ç ã o<br />
d e r e g i s T r o C i v i l<br />
a u T o r :<br />
r o d o l F o r o d r i g u e s g o n ç a lv e s<br />
sEntEnça<br />
Cuida-se de ação de retificação de<br />
registro civil, movida por Rodolfo Rodrigues<br />
Gonçalves. Alegou a parte autora<br />
que nasceu em 21-8-71, nesta capital;<br />
que foi registrada como sendo do sexo<br />
masculino, malgrado ser portadora de<br />
hermafroditismo; que ao desenvolver-se,<br />
percebeu que o sexo feminino predominava<br />
em suas funções físicas e psicológicas;<br />
que, tendo se desenvolvido como<br />
mulher, vem atravessando inúmeras dificuldades<br />
e constrangimentos, em razão<br />
de sua identidade civil masculina; que<br />
desde a infância adotou informalmente o<br />
nome de Vittória, sendo por este nome<br />
conhecida; que se submeteu a cirurgia<br />
para a extirpação do órgão genital masculino,<br />
de modo a permitir o conveniente<br />
ajuste do órgão feminino. Requereu a<br />
retificação do registro civil, para passar<br />
a chamar-se Vittória Venturini. Instruiu<br />
com os documentos de fls. 7-10 e 14.<br />
Às fls. 17-19, laudo médico, onde se<br />
certifica e comprova que a parte autora<br />
ostenta "órgãos genitais externos Meato<br />
Uretral de bom calibre e lábios maiores<br />
semelhantes aos femininos, tal qual ao<br />
Certificado Médico Oficial do Colégio de<br />
Barcelona".<br />
Às fls. 25-26, certidões dos cartórios<br />
distribuidores do Distrito Federal relativamente<br />
à parte autora.<br />
Em audiência de justificação, retratada<br />
às fls. 28-30, foram colhidos testemunhos.<br />
A parte autora foi submetida a novo<br />
exame pericial, estando o laudo acostado<br />
às fls.124-130.<br />
Às fls. 144-145, audiência destinada<br />
à oitiva do depoimento pessoal do requerente<br />
e esclarecimentos do perito.<br />
Manifestou-se a Exma. Curadoria de<br />
Família às fls. 149-157, opinando pela<br />
procedência do pedido.<br />
É o relatório.<br />
m a i o - j u n h o - j u l h o - a g o s t o - 2 0 0 8<br />
Decido.<br />
d e c i s õ e s h i s t ó r i c a s<br />
r e v i s t a t j d f t<br />
Tendo em vista a excelência das razões tecidas no estudo do caso proposto pela<br />
douta representante do Ministério Público, peço vênia para adotá-las como motivações<br />
da decisão, transcrevendo a seguir:<br />
"Submetido à perícia médica nestes autos, constatou-se que o Requerente/Interessado<br />
encontra-se à ‘ectoscopia, anatomicamente compatível com o pós-operatório<br />
tardio de transgenitalização, ou seja, vulva e neovagina e, portanto, apto a atividade<br />
sexual. Por outro lado, o mesmo é portador de próstata (glândula masculina) e não<br />
tem ovários, trompas e útero... conseqüentemente inapto à capacidade reprodutiva’.<br />
Ao quesito referente se o indivíduo pode ser considerado do sexo feminino, respondeu<br />
o perito:<br />
‘A cirurgia de transgenitalização somente dá a aparência da genitália externa com<br />
do sexo feminino, onde a vagina construída permite atividade sexual. Como o paciente<br />
em questão é portador de cariótipo 46 XY e, conforme exames complementares,<br />
não é portador de útero, ovários e trompas e nem poderá tê-los, não há portanto,<br />
possibilidade de procriação...ValE rEssaltar quE a conclusão sE um paciEntE<br />
é portador dE transExualismo ou outros transtornos dE idEntidadE ou<br />
prEfErência sExual é dEfinitiVamEntE uma quEstão da EsfEra psiquiátrica’<br />
– grifou-se.<br />
Esclareceu, ainda, o expert que:<br />
A resolução do CFM...número 1482/97 estabelece que ‘A definição de transexualismo<br />
deve obedecer no mínimo aos critérios abaixo enumerados: desconforto com<br />
o sexo anatômico natural; desejo expresso de eliminar os genitais , perder as características<br />
primárias e secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto; permanência<br />
desse distúrbio de forma contínua e consistente por, no mínimo, dois anos;<br />
ausência de outros transtornos mentais’(...) Logo, à luz da ciência atual o diagnóstico<br />
de transexualismo é da esfera psicológica e psiquiátrica’ – fl. 130.<br />
O que busca o requerente, indubitavelmente, é o reconhecimento jurídico da redesignação<br />
do seu estado sexual. Ou seja, que o Estado acate a sua identidade sexual e<br />
as conseqüências jurígenas de tal situação, em especial, o status feminino e a adoção<br />
de prenome a ele correspondente.<br />
Na literatura científica, colhe-se opiniões de que a ‘sexualidade humana ultrapassa<br />
os limites do círculo biológico’, sendo revelada por aspectos biológicos – características<br />
genitais, gonádicas, cromossômicas e outras - , e a ´parte psíquica e<br />
as atitudes comportamentais do indivíduo, que se integram umas nas outras . Essa<br />
integração de aspectos, que constituem a sexualidade humana, é denominada status<br />
sexual ou, vulgarmente, de sexo’ 1 .<br />
Dessa forma, quanto a esses aspectos, fala-se em sExo biológico - o decorrente<br />
das características corporais do indivíduo, pelo entrelaçamento do sexo genético<br />
(combinação dos cromossomos X e Y) com o endócrino (glândulas sexuais: testículos<br />
e ovários) - ; sExo psíquico - reação psicológica do indivíduo a determinados estímulos<br />
em razão do sexo ao qual ele pertence - e; sExo ciVil – o que inicial com assento<br />
de nascimento da criança, quando ocorre a designação do seu sexo2 .<br />
Assim, pode ocorrer que a pessoa, biologicamente, pertença ´a um sexo, mas,<br />
psiquicamente, viva ‘o sexo oposto ao biológico. Todas essas situações são denominadas<br />
de anomalias sexuais e acabam por trazer reflexos ao Direito, em especial ao<br />
Direito Civil’, sendo o principal a ‘possibilidade, ou não, de se alterar no assento de<br />
nascimento a determinação do sexo, bem como mudar o prenome da pessoa, quando<br />
este não corresponde ao sexo do indivíduo’ 3 .<br />
Desse modo, não há dúvida de que o Interessado submeteu-se à operação de<br />
mudança de sexo, como restou consignado pelo perito, não podendo afirmar o expert,<br />
pelos elementos de que dispunha, se em decorrência de um quadro de hermafrodi-<br />
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