FOLHA 378 CAPA-ANÚNCIOS PG_01-04-10-15 ... - Folha - Uniban
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muito detalhado, que demanda<br />
horas e horas de ensaio. Eu não<br />
acredito nessa coisa de rapidez,<br />
quantidade, da produção em massa.<br />
O teatro não tem essa produção<br />
em massa porque a gente tá<br />
lidando com o ser humano, com<br />
tudo que é paradoxal. Costumo<br />
brincar com meus atores: “nada<br />
como uma hora de ensaio pra<br />
melhorar”.<br />
F. U. – No Brasil há a crença de<br />
que o teatro é algo extremamente<br />
elitizado. Por quê?<br />
E. V. – Eu acho que essa é uma<br />
visão que nós temos no Brasil justamente<br />
pela falta de hábito de ir<br />
ao teatro. Então, ele acabou ficando<br />
uma coisa pra elite mesmo. É<br />
por isso que um dos nossos objetivos<br />
é fazer um trabalho de formação<br />
de platéia. Acho que, na<br />
verdade, teatro é uma questão de<br />
criar o gosto. E quando isso ocorre,<br />
eu percebo como a arte toca o<br />
coração, a sensibilidade.<br />
F. U. – Paulo Autran dizia que<br />
podemos ver o mesmo filme<br />
duas vezes e ele será o mesmo<br />
filme. Mas nunca assistimos a<br />
mesma representação no teatro.<br />
Você concorda com essa<br />
afirmação?<br />
E. V. - Sim, porque ali, representando,<br />
está o ser humano. No<br />
teatro você tem ser humano ao<br />
vivo, com todas as suas falências,<br />
todas as suas virtudes. O<br />
fato de ser ao vivo é muito<br />
impactante porque o público<br />
consegue ver o esforço daquele<br />
artista para completar aquela<br />
obra. É muito bonito quando<br />
essa comunhão acontece. (...) É<br />
lindo quando a gente consegue<br />
ter essa comunhão com a platéia.<br />
E creio que, na medida em<br />
que você faz rir, você torna os<br />
seres humanos melhores, mais<br />
reflexivos. Pra pessoa rir, dar um<br />
riso gostoso, ela tem que perder<br />
as reservas, estar relaxada.<br />
Quando Luís XlV lia as peças de<br />
Moliére (clássico dramaturgo<br />
francês) dizia que não sabia se<br />
ria ou se chorava, de ver o ser<br />
humano naquela forma, às vezes<br />
tão mesquinho, tão avaro, às<br />
vezes sublime. A gente sempre lê<br />
a gente na obra, não tem jeito.<br />
F. U. – Para muitos, o cinema e a<br />
televisão tiraram o público do<br />
teatro. Outras manifestações<br />
artísticas competem mesmo<br />
com o teatro?<br />
E. V. - A gente precisa dar educação<br />
para as pessoas. Porque o<br />
indivíduo com educação vai reconhecer<br />
que há prazeres diferentes<br />
na vida e vai ter acesso a esse<br />
prazer diferente. E vou dizer uma<br />
coisa pra você: o teatro está<br />
numa fase maravilhosa.<br />
As peças boas estão<br />
lotadas e isso é<br />
uma delícia.<br />
F. U. – Você<br />
sempre faz<br />
questão de<br />
manifestar<br />
seu amor<br />
pelos textos<br />
de Nelson<br />
Rodrigues.<br />
Ele ainda<br />
ocupa a primazia<br />
quando<br />
o assunto é<br />
dramaturgia nacional?<br />
E. V. – (pensativa, como se<br />
olhasse para o nada) Acho que<br />
todo mundo do teatro tem paixão<br />
pelo Nelson. Ele é o nosso maior<br />
dramaturgo, aliando humor, sarcasmo.<br />
Ele ainda consegue ser<br />
polêmico, arrojado, sem se enquadrar<br />
em qualquer sistema óbvio.<br />
Por mim, eu montaria as 17 peças<br />
dele. Quem lê uma primeira<br />
peça do Nelson vai querer ler todas.<br />
Todos esses livros transformam,<br />
te fazem refletir e sonhar.<br />
Eu amo até aquelas crônicas de<br />
futebol. Você vê o jogador sofrendo<br />
na hora de fazer o gol, a comoção<br />
da torcida. Ele é realmente<br />
genial.<br />
F. U. - E onde ele encontrava<br />
tanta gente<br />
ordinária para<br />
montar a galeria<br />
de personagens?<br />
E. V. - (rindo,<br />
quase gargalhando)<br />
Ele observava,<br />
mas<br />
também teve<br />
uma vida bastante<br />
intensa, com conquistas,<br />
tragédias e<br />
perdas. Ele tinha uma<br />
imaginação potente e aliava<br />
isso com seu talento<br />
e muito trabalho. Ele<br />
tem um olhar bacana,<br />
inteligente e muito<br />
bem humorado.<br />
Claro que a mulher dos<br />
anos 70 sofreu uma repressão<br />
sexual, opressão.<br />
Eram muito diferentes da<br />
minha geração. Então, hoje,<br />
quando se olha a frase de<br />
que mulher gosta de apanhar, a<br />
gente ri, acha engraçado.<br />
F. U. - O teatro do Nelson é melhor<br />
que a prosa?<br />
E. V. - Não, eu acho tão boa quanto.<br />
Do Nelson eu gosto até do folhetim.<br />
(rindo) Adoro Meu Destino<br />
Silvana Ribeiro<br />
“Quem lê uma<br />
primeira peça do<br />
Nelson vai querer<br />
ler todas. Todos<br />
esses livros<br />
transformam, te<br />
fazem refletir e<br />
Silvana Ribeiro<br />
sonhar”<br />
Amana Salles<br />
17<br />
é Pecar e O Homem Proibido. Ele<br />
escrevia lá os folhetins no jornal<br />
com pseudônimos de mulher. Maravilhoso.<br />
F. U. - Por isso o grupo GATU<br />
vai encenar Viúva, Porém Honesta?<br />
O título já é muito curioso,<br />
dá muito pano pra manga.<br />
E. V. - (rindo) Isso é muito legal.<br />
Essa peça eu acho uma obra-prima,<br />
original e muito bem<br />
humorada. O escracho que ele<br />
consegue fazer com a sociedade,<br />
a crítica social e ao ser humano é<br />
genial. O texto tem um tempo, um<br />
ritmo que é perfeito. É contestador,<br />
subvertido, genial. Ele denuncia<br />
até a imprensa, dizendo que ela<br />
pode ser do mal.<br />
F. U. – Pode ser do mal? Acho<br />
que o termo mais bem empregado<br />
nesse caso é só o verbo<br />
ser. Salvo raras exceções, a<br />
imprensa é do mal.<br />
E. V. - Acho que existem pessoas<br />
bem intencionadas, mas a imprensa<br />
tem um poder de manipular<br />
que é incrível. Jornais nomeiam<br />
e desnomeiam ministros.<br />
Mandam no Brasil. Nas celebrações<br />
de 07 de setembro, o grupo<br />
GATU foi às ruas para fazer<br />
uma manifestação artística em<br />
protesto contra a corrupção, contra<br />
a fome e contra um rio (Tietê)<br />
podre que corta a cidade e ninguém<br />
vê.(...) Nessa manifestação,<br />
veio a imprensa me questionar<br />
e o repórter me perguntou<br />
assim: “então você está protestando,<br />
dizendo que o exército é<br />
podre?” Respondi: “eu não tô dizendo<br />
isso, quem está dizendo<br />
é você”. Ele queria manipular<br />
a minha<br />
resposta. Eu<br />
acho que<br />
o Nelson<br />
fala de<br />
manipulação<br />
da<br />
mídia.<br />
E ele<br />
denunciava<br />
isso e hoje<br />
a gente<br />
vê que poucas<br />
coisas mudaram<br />
no Brasil.<br />
Não é normal a corrupção<br />
dos governantes,<br />
nem a má conduta<br />
na imprensa,<br />
mas parece que<br />
é. Nelson Rodrigues<br />
enxergou isso lá<br />
atrás. Como seria<br />
maravilhoso se<br />
ele estivesse vivo<br />
hoje. Imagine o que ele não<br />
escreveria?