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Artigo Completo - Um Mundo de Experiências

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“Em 2020 eu ainda vou gostar <strong>de</strong>le”: contribuições da<br />

etnosemântica no estudo <strong>de</strong> vínculos afetivos<br />

“In 2020 I'll still like it”: contributions of ethnosemantics in the study of affective bonds<br />

Cardoso, Cristina Luz; Doutoranda; Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Santa Catarina<br />

crisl.cardoso@hotmail.com<br />

Gontijo, Leila Amaral; Doutora; Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Santa Catarina<br />

leila@<strong>de</strong>ps.ufsc.br<br />

Resumo<br />

O estudo dos vínculos afetivos revela que as características intrínsecas <strong>de</strong> um objeto não são<br />

exclusivamente responsáveis pelas respostas emocionais em sua interação com o homem, pois<br />

também <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m da maneira como ele é significado. Este artigo apresenta o método<br />

etnosemântico na abordagem <strong>de</strong> vínculos afetivos entre usuários e seus produtos em<br />

ambientes domésticos, por meio <strong>de</strong> entrevistas. O método mostrou-se a<strong>de</strong>quado para <strong>de</strong>svelar<br />

o conhecimento <strong>de</strong> micro-culturas e o significado atribuído aos produtos. Nos resultados<br />

parciais dos testes piloto, produtos pelos quais um usuário mantém-se vinculado po<strong>de</strong>m ser<br />

consi<strong>de</strong>rados insubstituíveis, po<strong>de</strong>m atuar como lembretes <strong>de</strong> memórias afetivas, representar<br />

auto-i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e extensões <strong>de</strong> seu proprietário.<br />

Palavras Chave: afeto; vínculos afetivos; etnosemântica.<br />

Abstract<br />

The study of affective bonds shows that intrinsic characteristics of an object is not solely<br />

responsible for emotional responses in their interaction with humans, they also <strong>de</strong>pend on<br />

how it is meant. This paper presents the ethnosemantics method for addressing affective ties<br />

between users and their products in domestic environments through interviews. The method<br />

was a<strong>de</strong>quate to reveal the knowledge of micro-cultures and the meaning attributed to the<br />

products. In partial results of the pilot tests products for which a user remain bound can be<br />

consi<strong>de</strong>red irreplaceable, can act as remin<strong>de</strong>rs of emotional memories, represent self-i<strong>de</strong>ntity<br />

and extensions of their owner.<br />

Keywords: Affect; affective bonds; ethnosemantics.


“Em 2020 eu ainda vou gostar <strong>de</strong>le”: contribuições da etnosemântica no estudo <strong>de</strong> vínculos afetivos<br />

Introdução<br />

O estudo do afeto vinculado aos interesses do marketing, pesquisa do consumidor,<br />

ergonomia, economia e engenharia vem sendo <strong>de</strong>senvolvido <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos 1960. Com o<br />

avanço nos estudos sobre as emoções, observa-se que seu campo <strong>de</strong> conhecimento envolve<br />

várias disciplinas caracterizando-se por uma visão holística do homem e seu ambiente. Após<br />

um longo período em que prevaleceu a abordagem funcionalista e racional, verifica-se que<br />

razão e emoção são inseparáveis e que revelam a mesma importância na significação do<br />

homem.<br />

O cenário do <strong>de</strong>sign na atualida<strong>de</strong> <strong>de</strong>monstra um número crescente <strong>de</strong> pesquisas que<br />

privilegiam fatores emocionais presentes na relação entre usuário e produto. Na visão <strong>de</strong><br />

NIEMEYER (2008), nas últimas décadas do século XX ganha relevância a importância da<br />

significação no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> objetos e sistemas <strong>de</strong> informação. Esse fato estaria<br />

alinhado com o pensamento <strong>de</strong> teóricos da socieda<strong>de</strong> pós-tradicional, para quem a or<strong>de</strong>m<br />

social vigente preenche <strong>de</strong> complexida<strong>de</strong> todos os aspectos da vida social e da cultura. Assim,<br />

os estudos focando os aspectos afetivos po<strong>de</strong>m ser vistos tanto como resultados das tentativas<br />

<strong>de</strong> lidar com essa complexida<strong>de</strong>, quanto no sentido <strong>de</strong> reação a essa mesma nova or<strong>de</strong>m<br />

social.<br />

Nessas pesquisas, várias ferramentas vêm sendo criadas visando mensurar dados<br />

subjetivos, assim como conhecimentos e práticas <strong>de</strong> psicologia, neurociência, sociologia e<br />

antropologia vêm sendo incorporados, contribuindo para o melhor entendimento das relações<br />

do homem com seu mundo material. No entanto, o foco em geral aborda principalmente o<br />

momento <strong>de</strong> compra – aquisição inicial e a escolha entre diferentes alternativas. Aspectos tais<br />

como a relação dos usuários com seus produtos no contexto <strong>de</strong> uso, organização e<br />

hierarquização dos produtos entre si, razões pelas quais o produto é mantido mesmo quando<br />

não funciona mais e as razões pelas quais ele é <strong>de</strong>scartado, são estudados com menos<br />

freqüência.<br />

Ao priorizar o cotidiano, os estudos sobre vínculos afetivos em <strong>de</strong>sign sugerem que o<br />

pesquisador observe o usuário e seu produto no contexto <strong>de</strong> uso. Sob esse mote, a presente<br />

pesquisa <strong>de</strong> Doutorado em andamento aborda, entre outros aspectos, a relação afetiva entre o<br />

usuário e o produto em seu ambiente doméstico, procurando evi<strong>de</strong>nciar os principais fatores<br />

responsáveis pela manutenção do vínculo afetivo.<br />

Foi focalizado o ambiente doméstico, tendo em vista que representa um espaço rico<br />

em referências <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e cultura. Quando entendida no sentido <strong>de</strong> lar, uma casa contém<br />

elementos que fazem lembrar a infância das pessoas, suas raízes e que fornecem segurança,<br />

privacida<strong>de</strong> e liberda<strong>de</strong>. <strong>Um</strong>a casa abriga não somente seus membros e seus objetos – função<br />

prática -, mas é também palco <strong>de</strong> relações sociais, relações afetivas, preferências estéticas,<br />

hábitos e costumes – funções estéticas e simbólicas. Até certo ponto, seus membros<br />

permanecem isolados <strong>de</strong> uma platéia que po<strong>de</strong> fazer julgamentos, exclusões, atribuir valores<br />

estranhos, entre outros. (CSIKSZENTMIHALYI; ROCHBERG-HALTON, 2002, p. 122).<br />

Na visão <strong>de</strong> Baudrillard (1973), os móveis <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um ambiente familiar or<strong>de</strong>nam-se<br />

na casa <strong>de</strong> acordo com sua função e sua dignida<strong>de</strong> simbólica, <strong>de</strong>monstrando a relação afetiva<br />

que liga seus membros. “Os objetos domésticos encarnam no espaço os laços afetivos do<br />

grupo familiar até que uma geração mais mo<strong>de</strong>rna os afaste ou às vezes os reinstaure em uma<br />

atualida<strong>de</strong> nostálgica <strong>de</strong> velhos objetos”.<br />

Utilizando recursos provenientes da etnografia, mais especificamente da<br />

etnosemântica, a pesquisa vem encontrando suporte para a coleta e análise <strong>de</strong> dados<br />

subjetivos capazes <strong>de</strong> propiciar esse entendimento. Baseado em resultados preliminares<br />

provenientes <strong>de</strong> testes piloto, este artigo apresenta as contribuições do método etnosemântico<br />

na <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong> significados presentes nas relações afetivas <strong>de</strong> três informantes com seus<br />

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“Em 2020 eu ainda vou gostar <strong>de</strong>le”: contribuições da etnosemântica no estudo <strong>de</strong> vínculos afetivos<br />

objetos. Alguns resultados parciais são ressaltados, <strong>de</strong>monstrando a a<strong>de</strong>quação do método em<br />

atingir os objetivos <strong>de</strong> pesquisa.<br />

Afeto<br />

Em psicologia, o termo afeto é geralmente usado para se referir a todos os tipos <strong>de</strong><br />

experiências subjetivas que envolvem a percepção <strong>de</strong> uma coisa boa ou ruim, prazerosa e não<br />

prazerosa. (DESMET; HEKKERT, 2007). Apesar das lacunas encontradas para sua<br />

conceituação, o afeto po<strong>de</strong> agrupar as emoções e o humor. (DAMÁSIO, 1998; BIANCHI-<br />

BERTHOUZE; LISETTI, 2002).<br />

A taxonomia apresentada por Bianchi-Berthouze e Lisetti (2002) sugere uma<br />

combinação <strong>de</strong> aspectos encontrados na maioria das correntes teóricas sobre o afeto, humor e<br />

emoção. Neste mo<strong>de</strong>lo, o afeto é consi<strong>de</strong>rado mensurável e é <strong>de</strong>finido em duas dimensões:<br />

valência - positiva ou negativa; e intensida<strong>de</strong> - que varia em diversos níveis. O humor é um<br />

estado afetivo também sujeito à valência e intensida<strong>de</strong>. É caracterizado pelo fato <strong>de</strong> não ser<br />

<strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ado por um estímulo específico e po<strong>de</strong> durar dias. A emoção é um fenômeno mais<br />

refinado, se comparado ao humor, uma vez que contém mais informação e é associado com<br />

estímulos do sistema nervoso autônomo, expressão e experiência subjetiva.<br />

Para Damásio (1998, p. 16), os sentimentos são tão cognitivos como qualquer outra<br />

percepção. No entanto, o autor <strong>de</strong>ixa claro que essa visão não <strong>de</strong>ve diminuir o estatuto dos<br />

sentimentos e emoções como fenômenos humanos, pois “A emoção e os sentimentos<br />

constituem a base daquilo que os seres humanos têm <strong>de</strong>scrito há milênios como alma ou<br />

espírito humano”. Para Ledoux (1998, p. 113), os sentimentos também são processos<br />

conscientes, uma vez que “[...] a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ter sentimentos está diretamente vinculada à<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estar consciente do próprio ser e da relação <strong>de</strong> si mesmo com o resto do<br />

mundo”. No entanto, cada sentimento tem um diferente repertório <strong>de</strong> pensamentos, <strong>de</strong> reações<br />

e mesmo <strong>de</strong> memórias.<br />

Em suas pesquisas, Damásio (1998) concluiu que os sentimentos se tornam<br />

qualificadores – positivos ou negativos - daquilo que é percebido ou recordado. Esse processo<br />

é acompanhado e completado por alterações rápidas e ricas em idéias quando a qualificação é<br />

positiva e por alterações lentas e repetitivas quando a qualificação é negativa.<br />

Sob essa perspectiva, faz sentido ressaltar a afirmativa <strong>de</strong> que “pessoas diferentes, que<br />

<strong>de</strong>terminam significados diferentes para um produto em particular, muito provavelmente têm<br />

respostas emocionais diferentes”. (DESMET; HEKKERT, 2007). Assim, cada evento é<br />

experienciado e traduzido pela lente do próprio sujeito, tornando-se também difícil <strong>de</strong><br />

verbalizar experiências tais como tristeza, alegria, ou melancolia.<br />

Dessa maneira, as características intrínsecas <strong>de</strong> um objeto não são exclusivamente<br />

responsáveis pelas respostas emocionais em sua interação com o indivíduo. Do ponto <strong>de</strong> vista<br />

da emoção, as características <strong>de</strong> um objeto <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> como ele é percebido. Estão<br />

envolvidos nesse processo aspectos relacionados à individualida<strong>de</strong>, ao ambiente em que<br />

ocorre a interação, a experiências passadas e aspectos influenciados pela socieda<strong>de</strong>. Os<br />

estados afetivos, portanto, são bases confiáveis para a pesquisa em <strong>de</strong>sign centrada no<br />

homem, consi<strong>de</strong>rando que a cultura, nesse cenário, é o pano <strong>de</strong> fundo que permeia esses<br />

processos e relações.<br />

Vínculos afetivos e <strong>de</strong>sign<br />

Vínculos afetivos <strong>de</strong>senvolvidos entre usuários e seus produtos po<strong>de</strong>m ser<br />

conceituados como “a união emocional experienciada pelo consumidor com um produto”.<br />

Esse conceito sugere que, quando uma pessoa se vincula a um produto, é porque o produto<br />

tem um significado especial para ela e é capaz <strong>de</strong> <strong>de</strong>spertar reações emocionais. O termo<br />

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“Em 2020 eu ainda vou gostar <strong>de</strong>le”: contribuições da etnosemântica no estudo <strong>de</strong> vínculos afetivos<br />

“consumer-product attachment” vem a significar também o sentimento <strong>de</strong> apego a<br />

<strong>de</strong>terminados produtos. (SCHIFFERSTEIN; ZWARTKRUIS-PELGRIM, 2008).<br />

O vínculo afetivo a <strong>de</strong>terminados produtos não está relacionado necessariamente as<br />

suas funções práticas e utilitárias, pois fatores mais subjetivos exercem maior influência. Os<br />

significados simbólicos apresentam-se como os principais <strong>de</strong>terminantes do vínculo afetivo.<br />

Quando uma pessoa especial toca fisicamente um produto ou o produto foi obtido em um<br />

contexto especial e o tornou exclusivo para seu proprietário, esse produto po<strong>de</strong> ser<br />

consi<strong>de</strong>rado insubstituível. A percepção <strong>de</strong> que um produto é consi<strong>de</strong>rado indispensável, por<br />

exemplo, muitas vezes é assim não por razões práticas, mas por razões emocionais. <strong>Um</strong><br />

produto também po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado como uma extensão do usuário, quando seu<br />

proprietário exerce po<strong>de</strong>r ou controle sobre ele. <strong>Um</strong> carpinteiro po<strong>de</strong> perceber suas<br />

ferramentas como auto-extensões porque ele precisa <strong>de</strong>las para executar seu trabalho, elas são<br />

parte <strong>de</strong> sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. (SCHIFFERSTEIN; ZWARTKRUIS-PELGRIM, 2008).<br />

Para Wallendorf e Arnould (1988), um objeto é consi<strong>de</strong>rado favorito porque é uma<br />

lembrança <strong>de</strong> um amigo ou membro da família, <strong>de</strong> uma viagem <strong>de</strong> férias, ou um evento do<br />

passado. Além disso, a maior parte dos indivíduos da pesquisa empreendida pelos autores<br />

recebeu seus objetos favoritos como um presente. Os indivíduos que selecionaram objetos<br />

funcionais como seus favoritos, tais como relógios ou ca<strong>de</strong>iras, o fizeram porque haviam<br />

compartilhado uma história pessoal com o objeto.<br />

As pessoas experimentam emoções positivas para os produtos a que se sentem<br />

apegadas, tais como felicida<strong>de</strong>, amor, orgulho, segurança e conforto. No entanto, em certos<br />

casos, as emoções também po<strong>de</strong>m ser negativas como a tristeza, por exemplo, quando o<br />

objeto é uma lembrança <strong>de</strong> tempos difíceis. (SCHULTZ; KLEINE; KERNAN, 1989).<br />

A representação <strong>de</strong> vínculos afetivos nos objetos, portanto, po<strong>de</strong> ser análoga a relações<br />

interpessoais, sendo que as pessoas se referem a objetos queridos utilizando, por exemplo, a<br />

palavra amor. A experiência amorosa em relação aos objetos é real e não simplesmente<br />

metafórica, po<strong>de</strong>ndo ser dividida em cinco princípios básicos, <strong>de</strong> acordo com Russo e Hekkert<br />

(2008). No princípio da interação fluída, as pessoas sentem prazer em usar produtos com os<br />

quais interagem fluentemente; no princípio da recordação <strong>de</strong> memórias afetivas as pessoas<br />

gostam <strong>de</strong> usar produtos portadores <strong>de</strong> memórias afetivas que funcionam como lembretes<br />

<strong>de</strong>ssas memórias; no princípio do significado simbólico social, as pessoas gostam <strong>de</strong> usar<br />

produtos que compõem os significados simbólicos que po<strong>de</strong>m ser expostos e/ou percebidos<br />

por outros, em um ambiente social; no princípio <strong>de</strong> valores morais compartilhados, as pessoas<br />

gostam <strong>de</strong> usar produtos por meio dos quais po<strong>de</strong>m compartilhar valores morais e éticos; no<br />

princípio da interação física prazerosa, as pessoas gostam <strong>de</strong> interagir com os produtos que<br />

são fisicamente prazerosos.<br />

As pesquisas apresentadas oferecem guias para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> produtos<br />

capazes <strong>de</strong> <strong>de</strong>spertar afetos intencionalmente em seus usuários, mesmo sabendo-se que não é<br />

possível prever todas as maneiras <strong>de</strong> como um objeto vai ser utilizado, em todos os contextos<br />

e para todas as pessoas. Ao reinserir valores humanos e <strong>de</strong> sensibilida<strong>de</strong> humana no mundo<br />

material, o <strong>de</strong>sign propicia “interações com o produto menos impessoais e estritamente<br />

funcionais, e mais relacionais, agradáveis e confiáveis”. O <strong>de</strong>sign se torna capaz também <strong>de</strong><br />

resolver problemas <strong>de</strong> diálogo do homem com os outros e consigo mesmo, tendo em vista que<br />

estão em jogo questões <strong>de</strong> significação. (NIEMEYER, 2008, p. 52).<br />

No âmbito <strong>de</strong>ssa pesquisa a abordagem do vínculo afetivo entre usuário e produto é<br />

consi<strong>de</strong>rada um <strong>de</strong>safio e uma oportunida<strong>de</strong> para o <strong>de</strong>signer. Ao serem consi<strong>de</strong>radas as várias<br />

possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> estímulos ao vínculo afetivo entre usuário e produto e os resultados que essa<br />

questão suscitará no processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> produtos, esperam-se reflexos positivos<br />

no cotidiano do usuário e no ciclo <strong>de</strong> vida do produto.<br />

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“Em 2020 eu ainda vou gostar <strong>de</strong>le”: contribuições da etnosemântica no estudo <strong>de</strong> vínculos afetivos<br />

Etnosemântica<br />

Proveniente da antropologia, o método etnográfico é caracterizado pela mínima<br />

interpretação e conceitualização, sendo que o pesquisador conta a história não por meio <strong>de</strong><br />

conceitos, mas pela <strong>de</strong>scrição <strong>de</strong> eventos. Na etnografia <strong>de</strong>scritiva, os pesquisadores tentam<br />

pintar um quadro do que as pessoas dizem e como elas atuam em seu cotidiano, <strong>de</strong>scobrindo e<br />

revelando sua cultura. (TAYLOR; BOGDAN, 1998).<br />

<strong>Um</strong>a variação do método etnográfico é a etnosemântica, apresentada por McCurdy,<br />

Spradley e Shandy (2005), baseado em entrevistas e estratégias do discurso para planejar e<br />

realizar um estudo etnográfico <strong>de</strong> campo. A etnosemântica infere o conhecimento cultural a<br />

partir do discurso - consi<strong>de</strong>rado uma forma <strong>de</strong> comportamento - e a partir dos artefatos<br />

culturais. Do ponto <strong>de</strong> vista do <strong>de</strong>sign, o estudo do discurso e <strong>de</strong> categorias culturais<br />

possibilita revelar o viés do usuário, o significado <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>sejos, o significado atribuído a<br />

seu produto e o significado <strong>de</strong> suas relações com o mundo material.<br />

O grupo estudado normalmente se caracteriza como uma micro-cultura que é<br />

encontrada <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>, mas que não <strong>de</strong>fine um estilo <strong>de</strong> vida nas vinte e<br />

quatro horas <strong>de</strong> um informante. Deve se caracterizar por ser pequena, estruturada e marcada<br />

pela rotina; acessível, atual e não extinta; explícita, não i<strong>de</strong>ológica, não familiar e fora do<br />

mundo social do pesquisador.<br />

Para McCurdy, Spradley e Shandy (2005), o significado total <strong>de</strong> uma categoria<br />

cultural consiste no conjunto <strong>de</strong> todas as categorias com as quais está relacionada nas mentes<br />

dos membros da micro-cultura e os relacionamentos que vinculam estas categorias à categoria<br />

que está sendo <strong>de</strong>finida. A confirmação <strong>de</strong> dados com o informante o torna um agente ativo<br />

na obtenção <strong>de</strong> atributos ou categorias relacionadas à micro-cultura e na subseqüente<br />

construção <strong>de</strong> dimensões <strong>de</strong> contrastes e conjuntos contrastantes que fornecerão paradigmas,<br />

ou matrizes, capazes <strong>de</strong> esclarecer os significados culturais atribuídos.<br />

O método mostra-se a<strong>de</strong>quado na <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong> significados culturais com base no<br />

“princípio do contraste”, pois é difícil para os informantes lembrarem o que eles sabem sobre<br />

suas culturas. A geração <strong>de</strong> taxonomias vai relacionar os termos utilizados pelos informantes<br />

(termos nativos).<br />

Coleta e análise <strong>de</strong> dados<br />

Em etnografia, um dos instrumentos mais utilizados para coleta <strong>de</strong> dados é a entrevista<br />

em profundida<strong>de</strong>, direcionada ao aprendizado sobre os eventos e ativida<strong>de</strong>s que não po<strong>de</strong>m<br />

ser observados diretamente. As pessoas que estão sendo entrevistadas são informantes no<br />

sentido mais verda<strong>de</strong>iro da palavra, pois atuam como observadores para o pesquisador.<br />

(TAYLOR; BOGDAN, 1998).<br />

A coleta <strong>de</strong> dados ocorre simultaneamente à análise dos mesmos, promovendo a<br />

formulação da teoria principal ou <strong>de</strong> outras teorias secundárias. Na análise, os dados<br />

<strong>de</strong>scritivos se referem às próprias palavras das pessoas, escritas ou verbalizadas, à <strong>de</strong>scrição<br />

dos seus artefatos e às ativida<strong>de</strong>s possíveis <strong>de</strong> serem observadas. É dada especial importância<br />

às respostas ou afirmações dos informantes solicitadas pelo pesquisador e aquelas que não<br />

foram solicitadas; ao papel do pesquisador no ambiente <strong>de</strong> pesquisa, que po<strong>de</strong> vir a<br />

influenciar o resultado; às pessoas presentes no momento da pesquisa; à natureza dos dados<br />

em relação a sua fonte direta ou indireta e à clara i<strong>de</strong>ntificação das fontes <strong>de</strong> dados ou dos<br />

informantes, em prol <strong>de</strong> evitar uma generalização a partir da perspectiva <strong>de</strong> um informante. A<br />

checagem dos dados pelos informantes possibilita refinar as interpretações e dar credibilida<strong>de</strong><br />

ao estudo, ao mesmo tempo em que permite um enriquecimento da interpretação dos dados.<br />

(TAYLOR; BOGDAN, 1998).<br />

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“Em 2020 eu ainda vou gostar <strong>de</strong>le”: contribuições da etnosemântica no estudo <strong>de</strong> vínculos afetivos<br />

Para a <strong>de</strong>scoberta dos significados atribuídos pelos informantes, são i<strong>de</strong>ntificados<br />

primeiramente os termos nativos que possibilitam a obtenção da estrutura <strong>de</strong> taxonomias. As<br />

taxonomias são geradas a partir <strong>de</strong> uma relação semântica existente entre uma sub-categoria e<br />

o domínio ou categoria. (Quadro I). O objetivo central <strong>de</strong>ssa técnica é exibir visualmente<br />

idéias a partir dos dados como uma ajuda no <strong>de</strong>senvolvimento e teste <strong>de</strong><br />

interpretações. Indiretamente, esclarece os termos do informante e <strong>de</strong>smembra idéias gerais<br />

em idéias específicas.<br />

Quadro I – Relações semânticas entre subcategorias e domínios<br />

Tipo <strong>de</strong> relação Diagrama relacional Declaração relacional<br />

Inclusão X é um tipo <strong>de</strong> Y “tipos <strong>de</strong>”<br />

Sequência X é um passo <strong>de</strong> Y “passos para”<br />

Parte <strong>de</strong> um todo X é uma parte <strong>de</strong> Y “partes <strong>de</strong>”<br />

Modo para uma finalida<strong>de</strong> X é um modo para alcançar Y “modo para”<br />

Fonte: Adaptado <strong>de</strong> McCurdy, Spradley e Shandy (2005).<br />

A partir das taxonomias, são gerados paradigmas que auxiliam na <strong>de</strong>scoberta do<br />

significado atribuído. Os paradigmas são matrizes que agrupam conjuntos contrastantes <strong>de</strong><br />

categorias culturais, as quais são relacionadas a dimensões <strong>de</strong> contraste reveladas nas<br />

entrevistas. Essas dimensões <strong>de</strong> contrastes são culturais, pois os informantes avaliam as<br />

dimensões usando o conhecimento pessoal. (ver Quadro III).<br />

A escrita etnográfica<br />

É importante observar que são construídas várias taxonomias e paradigmas para cada<br />

informante, procurando abranger os temas principais. Na escrita etnográfica, no entanto, não é<br />

obrigatória a apresentação <strong>de</strong> todas as taxonomias e paradigmas, para não tornar o texto<br />

maçante. Seguindo a orientação <strong>de</strong> Goodall (2000), a escrita acadêmica po<strong>de</strong> ser criativa<br />

como uma forma <strong>de</strong> conversação ampliada, por meio <strong>de</strong> um tratamento mais pessoal do que<br />

público e <strong>de</strong> um processo mais interpessoal, progressivo e dialógico. A credibilida<strong>de</strong> na<br />

conversação não é limitada às fontes que são citadas como autorida<strong>de</strong>s, ela é também somada<br />

a quem o pesquisador é como pessoa.<br />

Todas as observações são filtradas pelas lentes seletivas do pesquisador que, por sua vez,<br />

procura transmitir aos leitores um sentido <strong>de</strong> ter estado no local, experienciando as situações<br />

em primeira mão e um sentimento <strong>de</strong> que o leitor po<strong>de</strong> ver as coisas do ponto <strong>de</strong> vista do<br />

informante, respectivamente. Muito embora os pesquisadores em estudos <strong>de</strong>scritivos tentem<br />

levar os leitores a certas conclusões pela qualida<strong>de</strong> do que eles escolhem para reportar e como<br />

eles reportam esses dados, os leitores ficam livres para construir suas próprias interpretações e<br />

generalizações. (TAYLOR; BOGDAN, 1998).<br />

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Resultados preliminares do teste piloto<br />

A aplicação <strong>de</strong> testes piloto teve como objetivo refinar o método a ser empreendido no<br />

trabalho <strong>de</strong> campo da presente pesquisa em andamento. Os testes piloto são apresentados<br />

neste artigo a fim <strong>de</strong> proporcionar melhor entendimento na aplicação do método<br />

etnosemântico nas pesquisas qualitativas em <strong>de</strong>sign, principalmente na construção das<br />

taxonomias e paradigmas.<br />

Foram realizados três testes piloto com três informantes do sexo feminino e ida<strong>de</strong>s<br />

variando entre 49 e 56 anos. As Informantes chamadas I, II e III não possuíam laços <strong>de</strong><br />

parentesco. A Informante I morava em Florianópolis (SC) e as Informante II e III moram em<br />

Salvador (BA).<br />

Foram realizadas duas entrevistas com cada informante, seguindo um roteiro que sofreu<br />

adaptações para cada caso. <strong>Um</strong> dos critérios utilizados foi a seleção <strong>de</strong> móveis e objetos<br />

presentes em seus espaços domésticos, pelos quais as informantes mantinham um vínculo<br />

afetivo. Os móveis e objetos não foram previamente selecionados e tampouco quantificados<br />

pela pesquisadora. As informantes foram incentivadas à <strong>de</strong>scrição <strong>de</strong> objetos ou móveis que<br />

fossem <strong>de</strong> alguma maneira importante para elas.<br />

A cada teste foram corrigidas as distorções na aplicação do método. Posteriormente foi<br />

dado prosseguimento à análise dos dados obtidos nos testes por meio <strong>de</strong> comparações entre os<br />

resultados obtidos, bem como por meio <strong>de</strong> confrontação com a revisão bibliográfica.<br />

Várias taxonomias foram construídas juntamente com as Informantes, empregando mais<br />

<strong>de</strong> uma relação semântica. O Quadro II exemplifica uma taxonomia parcial com relação<br />

semântica “Partes <strong>de</strong>” da Informante III. A leitura da taxonomia segue o seguinte método: “A<br />

espuma é uma parte dos estofados, que é uma parte do sofá, que é uma parte <strong>de</strong> móveis e<br />

objetos que eu já tinha”.<br />

Quadro II:Taxonomia parcial “Partes <strong>de</strong>” da Informante III<br />

Moedas antigas<br />

Mesa<br />

Sentar (substituto <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>ira)<br />

Prancha <strong>de</strong> surf<br />

Aço inoxidável<br />

Banquinho <strong>de</strong> balcão Ma<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> <strong>de</strong>molição<br />

<strong>de</strong> bar<br />

Camurção <strong>de</strong> couro<br />

Estofamento<br />

Estofado por <strong>de</strong>ntro<br />

Alma<br />

Estofados<br />

Espuma<br />

Sofá<br />

Capa por fora<br />

Recosto<br />

Assento<br />

Bancadinha Mini <strong>de</strong>ck <strong>de</strong> piscina<br />

Cepo <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira Pezinhos <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira<br />

Lustre da sala<br />

Partes <strong>de</strong> móveis e objetos que eu já tinha<br />

A taxonomia “Partes <strong>de</strong>” permitiu categorizar os objetos <strong>de</strong>scritos pela Informante III e<br />

<strong>de</strong>smembrar seus componentes, possibilitando a exploração nas entrevistas, por exemplo, do<br />

momento <strong>de</strong> aquisição <strong>de</strong> cada um, dos procedimentos para as reformas, da importância dos<br />

materiais <strong>de</strong> que eram feitos e das ligações afetivas materializadas pelos mesmos. Os termos<br />

adotados foram utilizados pela própria informante – termos nativos.<br />

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“Em 2020 eu ainda vou gostar <strong>de</strong>le”: contribuições da etnosemântica no estudo <strong>de</strong> vínculos afetivos<br />

Quadro III: Taxonomia parcial “Tipos <strong>de</strong>” da Informante III<br />

Tipos <strong>de</strong><br />

composição<br />

da minha<br />

morada<br />

Aproveitamento (sala) Não <strong>de</strong>scartar, não modificar<br />

Alegrada (banquinho <strong>de</strong> bar) Dar um colorido<br />

Transformação (cepo <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira) Vai ficando furadinho<br />

Incrementada (luminária da sl) Vou colocar uns cordões <strong>de</strong> cristal<br />

Upgra<strong>de</strong> (sofá) Reformada<br />

A taxonomia “Tipos <strong>de</strong>” apresentada no Quadro III, permitiu reunir dados a respeito do<br />

hábito da Informante III em empreen<strong>de</strong>r transformações em seus objetos, revelando prazer,<br />

<strong>de</strong>dicação e orgulho nesse empreendimento. A taxonomia é lida da seguinte maneira:<br />

“Reformada é um tipo <strong>de</strong> upgra<strong>de</strong> que é um tipo <strong>de</strong> composição da minha morada”. Assim, o<br />

termo composição envolve ações <strong>de</strong> aproveitar, alegrar, transformar, incrementar, fazer um<br />

upgra<strong>de</strong>, não <strong>de</strong>scartar, dar um colorido, etc.<br />

Quadro IV: Paradigma parcial Informante III<br />

Objeto Origem Data <strong>de</strong> aquisição Lembra o quê<br />

Mesa<br />

Feito para mim;<br />

Man<strong>de</strong>i executar 1988<br />

Momento <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong>; a<br />

família; eu, minhas filha; o surf<br />

Banquinho Man<strong>de</strong>i executar 1981, 1982 Sela <strong>de</strong> cavalo<br />

Sofá Feito por mim<br />

O paradigma parcial da Informante III (Quadro IV) permitiu revelar o significado<br />

atribuído a cada objeto por meio das avaliações das dimensões <strong>de</strong> contrates (objeto, origem,<br />

data <strong>de</strong> aquisição, lembra o quê) pelo próprio informante. Nessa avaliação o informante se<br />

utiliza <strong>de</strong> seu próprio conhecimento cultural e po<strong>de</strong> hierarquizar a importância <strong>de</strong> cada objeto<br />

selecionado. (Figuras 1, 2 e 3).<br />

Figura 1: Mesa Figura 2: Banquinho Figura 3: Sofá<br />

Para <strong>de</strong>monstrar a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> hierarquização das dimensões <strong>de</strong> contraste, foram<br />

resumidos no Quadro V paradigmas obtidos com as Informantes. Cada Informante selecionou<br />

os três objetos mais importantes em or<strong>de</strong>m <strong>de</strong>crescente. Esses objetos foram categorizados <strong>de</strong><br />

acordo com os atributos relacionados aos vínculos afetivos pelas três informantes.<br />

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“Em 2020 eu ainda vou gostar <strong>de</strong>le”: contribuições da etnosemântica no estudo <strong>de</strong> vínculos afetivos<br />

Quadro V – Resumo parcial <strong>de</strong> paradigmas <strong>de</strong> três informantes<br />

Vínculo afetivo Objeto 1 Objeto 2 Objeto 3<br />

Informante I Ciúmes Ciúmes Conexão familiar<br />

Informante II<br />

Eu gosto; Tem a ver<br />

com a mãe<br />

Tem a ver com a<br />

separação da mãe<br />

Eu amo prata; minha<br />

mãe adorava<br />

Informante III<br />

Eu amo minha mesa;<br />

me <strong>de</strong>i <strong>de</strong> presente<br />

Em 2020 eu ainda vou<br />

gostar <strong>de</strong>le<br />

Peça exclusiva<br />

A partir dos paradigmas foi possível revelar que os atributos relacionados aos objetos<br />

selecionados pelas Informantes I e II representam um forte vínculo materno, mesmo após a<br />

morte <strong>de</strong> suas mães. Assim, esses objetos atuam como “lembretes <strong>de</strong> memórias afetivas”.<br />

(RUSSO; HEKKERT, 2007).<br />

Para a Informante III, o vínculo afetivo com os objetos selecionados representa sua autoi<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

e o próprio self, corroborando com os pensamentos <strong>de</strong> Csikszentmihalyi e<br />

Rochberg-Halton (2002), Schultz, Kleine e Kernan (1989) e Wallendorf e Arnould (1988).<br />

Ferramentas <strong>de</strong> trabalho foram selecionadas pelas Informantes I e II, representando uma<br />

“extensão <strong>de</strong> seu ‘Eu’”. (SCHIFFERSTEIN; ZWARTKRUIS-PELGRIM, 2008).<br />

Os atributos <strong>de</strong> ciúmes da Informante I em relação aos Objetos 1 e 2 <strong>de</strong>monstram um<br />

forte apego aos mesmos. O sentimento <strong>de</strong> ciúmes leva a Informante I a escon<strong>de</strong>r e proteger o<br />

Objeto 1 <strong>de</strong> pessoas amigas que freqüentam sua casa, bem como <strong>de</strong> sua faxineira (diarista).<br />

As entrevistas realizadas no local <strong>de</strong> utilização dos produtos possibilitaram a verificação<br />

mais próxima da realida<strong>de</strong> vivida pelas informantes e da importância que cada produto<br />

<strong>de</strong>sempenha em suas vidas. Po<strong>de</strong>-se concluir que as Informantes selecionaram objetos<br />

consi<strong>de</strong>rados insubstituíveis.<br />

Consi<strong>de</strong>rações finais<br />

Os artefatos, além <strong>de</strong> serem elos entre as pessoas, são também elos entre as pessoas e<br />

os lugares que habitam, que visitam, que nascem, estudam e toda sorte <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s vividas,<br />

<strong>de</strong>sempenhadas ou lembradas naquele lugar.<br />

Não se po<strong>de</strong> ignorar, sobretudo, que as relações dos homens com seus objetos são<br />

intensas em afetivida<strong>de</strong>s, negativas ou positivas, sendo que seu estudo vem sedimentar<br />

conhecimento para que a prática do <strong>de</strong>sign possa se <strong>de</strong>senvolver com mais segurança diante<br />

da crescente complexida<strong>de</strong> sócio-cultural. Esse entendimento permitirá o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong><br />

produtos mais integrados aos seus espaços culturais ou universos mercadológicos, abrindo a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma importante evolução na maneira <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver projetos <strong>de</strong> produto.<br />

A vantagem da utilização do método etnosemântico em pesquisas em <strong>de</strong>sign consiste<br />

na obtenção <strong>de</strong> dados em menos tempo do que perguntando questões menos diretas e mais<br />

gerais, como é observado no método etnográfico tradicional. Para a pesquisa <strong>de</strong> Doutorado<br />

em andamento, foi possível verificar com os testes piloto que o método mostra-se a<strong>de</strong>quado<br />

para iniciar o trabalho <strong>de</strong> campo propriamente dito e dar continuida<strong>de</strong> à pesquisa.<br />

Agra<strong>de</strong>cimentos<br />

Agra<strong>de</strong>cemos ao CNPQ por apoiar esta pesquisa.<br />

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Referências<br />

“Em 2020 eu ainda vou gostar <strong>de</strong>le”: contribuições da etnosemântica no estudo <strong>de</strong> vínculos afetivos<br />

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affective subjective experience. User mo<strong>de</strong>ling and user-adapted interaction, v. 12: 1,<br />

2002. p.49-84.<br />

CSIKSZENTMIHALYI, M.; ROCHBERG-HALTON, E. The meaning of things: domestic<br />

symbols and the self. Cambridge: Cambridge University Press, 2002.<br />

DAMÁSIO, A. R. O erro <strong>de</strong> Descartes: emoção, razão e o cérebro humano. São Paulo:<br />

Companhia das Letras, 1998. 330 p.<br />

DESMET, P. M. A.; HEKKERT, P. Framework of product experience. International<br />

Journal of Design, v. 1: 1, 2007. p.57-66.<br />

GOODALL, H. L. Writing the new ethnography. New York & Oxford: Altamira Press,<br />

2000.<br />

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Janeiro: Objetiva, 1998.<br />

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Grover: Waveland Press, 2005.<br />

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DAMAZIO, Vera (Ed.). Design, ergonomia e emoção. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Mauad X Faperj,<br />

2008. p. 49-64.<br />

RUSSO, B.; HEKKERT, P. On the experience of love: the un<strong>de</strong>rlying principles. In:<br />

CONFERENCE ON DESIGNING PLEASURABLE PRODUCTS AND INTERFACES,<br />

2007, Helsinki. Proceedings... 2007.<br />

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Design, ergonomia e emoção. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Mauad X Faperj, 2008. p. 31-48.<br />

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attachment: measurement and <strong>de</strong>sign implications. International Journal of Design, v. 2: 3,<br />

2008. p.1-13.<br />

SCHULTZ, S. E.; KLEINE, R. E.; KERNAN, J. B. "These are a few of my favorite things":<br />

toward an explication of attachment as a consumer behavior construct. In: ADVANCES IN<br />

CONSUMER RESEARCH, 1989, Provo. Proceedings... p.359-366.<br />

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“Em 2020 eu ainda vou gostar <strong>de</strong>le”: contribuições da etnosemântica no estudo <strong>de</strong> vínculos afetivos<br />

WALLENDORF, M.; ARNOULD, E. J. "My favorite things": a cross-cultural inquiry into<br />

object attachment, possessiveness, and social linkage. Journal of Consumer Research, v.<br />

14: 4, 1988. p.531-547.<br />

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