No. 2 ? 2003
No. 2 ? 2003
No. 2 ? 2003
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
GILBERTO FREYRE E A IMAGEM DO BRASIL NO MUNDO 51<br />
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○<br />
○ Hugo Rogélio Suppo<br />
Bobbio nos parece adequada, pois supera essa clivagem entre intelectuais servis e rebeldes,<br />
ao questionar essa posição antinômica de considerar que “na medida em que se faz político,<br />
o intelectual trai a cultura; na medida em que se recusa a fazer-se político, a inutiliza. Ou<br />
traidor ou inutilizador”. 48<br />
Segundo Bobbio, existe uma “autonomia relativa da cultura com respeito à política”,<br />
a relação dos intelectuais com o poder é, em consequência, complexa e dinâmica. Para isso,<br />
elabora uma tipologia que não é mais baseada no grau de dependência ou independência dos<br />
intelectuais com respeito às classes sociais em luta pela hegemonia mas no papel destes<br />
como “criadores” ou “transmissores de idéias ou conhecimentos politicamente relevantes”<br />
no contexto político. Dessa forma, os ideólogos são aqueles que fornecem “princípios-guia”<br />
(ideologias) aos detentores do poder e “experts” são aqueles que fornecem “conhecimentosmeio”<br />
(técnicas). Nesse sentido, poderíamos considerar Gilberto Freyre como um ideólogo<br />
da independência cultural brasileira e da diplomacia cultural brasileira. 49 .<br />
A construção de uma política brasileira para a África nos anos 1940 e 1950, e,<br />
sobretudo, mais tarde, no marco da Política Externa Independente, está alicerceada no<br />
discurso culturalista baseado nas idéias de Freyre. Estudando a política do Brasil para a<br />
África, José Flávio Sombra Saraiva afirma:<br />
A diplomacia leu e encontrou em Freyre sustentação intelectual para a política de colaboração<br />
com Portugal em sua “missão civilizatória” na África.Para a diplomacia, o Brasil tinha a missão<br />
de ser o mediador entre a Europa e as civilizações tropicais. 50<br />
Dessa forma, o Itamaraty finalmente recupera a herança deixada pelo barão do Rio<br />
Branco, considerado por Gilberto Freyre um “gênio de propaganda, ao sentido exato da<br />
importância política da publicidade”. 51 Gilberto Freyre fala de um “fenômeno”, no início do<br />
século XX, de “idealização do Itamaraty” como “órgão supremo de irradiação ou afirmação<br />
do prestígio do Brasil no continente”. O Itamaraty teria sido “uma espécie de Ministério<br />
como que de Educação e Cultura, concorrendo para que viessem ao Rio de Janeiro intelectuais<br />
europeus eminentes, artistas, médicos de renome; e Ministério também de Informação e<br />
Propaganda, de certo modo responsável pela bonne presse francesa; e às vezes inglesa em<br />
torno de valores brasileiros.” 52<br />
Fizeram parte dessa “propaganda romanticamente patriótica”, orientada pelo Barão<br />
do Rio Branco e destinada principalmente aos Estados Unidos e à Europa, a instrumentalização<br />
da imensa popularidade na França de Alberto Santos Dumont e dos sucessos alcançados no<br />
Brasil por Osvaldo Cruz, na luta contra a febre amarela; Pereira Passos, na modernização da<br />
capital da República; Marechal Hermes da Fonseca, na reorganização do Exército; Almirante<br />
Alexandrino de Alencar, na modernização da Marinha de Guerra. “O mito Santos Dumont,<br />
tornou-se como nenhum outro, no Brasil do começo do século XX, parte do mito maior: o do