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no Bairro Alto? - Fonoteca Municipal de Lisboa - Câmara Municipal ...

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Discos<br />

Pop<br />

Os U2 pelos U2, um par <strong>de</strong> belos singles<br />

Os U2 explicados<br />

pelos<br />

próprios<br />

Compêndio <strong>de</strong> carreira<br />

<strong>de</strong>vidamente vitaminado por<br />

uma louvável dose <strong>de</strong> autoconfiança.<br />

Mário Lopes<br />

U2<br />

No Line On The Horizon<br />

Island; distri. Universal Music<br />

mmmnn<br />

Os U2 po<strong>de</strong>m viajar<br />

até Fez, anunciar<br />

uma mudança<br />

so<strong>no</strong>ra que<br />

implicará transe<br />

africa<strong>no</strong>, prometer<br />

mil surpresas e reconversões que,<br />

chegados a este ponto (três décadas<br />

<strong>de</strong> carreira e estatuto <strong>de</strong> maior<br />

banda do mundo), a certeza é uma e<br />

apenas uma: po<strong>de</strong>mos tirar os U2 do<br />

seu habitat, mas os U2 nunca<br />

abandonam os U2.<br />

Quer isto dizer que “No Line On<br />

The Horizon”, 12º álbum e aquele que<br />

põe fim ao maior hiato entre edições<br />

da banda irlan<strong>de</strong>sa, não é a surpresa<br />

que os autores <strong>de</strong> “Boy” anunciavam.<br />

Isso será problemático quando<br />

confrontado com a “bouta<strong>de</strong>” recente<br />

<strong>de</strong> Bo<strong>no</strong>: “Se este não for o <strong>no</strong>sso<br />

melhor álbum, então somos<br />

irrelevantes.” Se o amigo põe as coisas<br />

nesses termos, vemo-<strong>no</strong>s obrigados a<br />

assinar o seu atestado <strong>de</strong> irrelevância,<br />

o que é injusto, tendo em conta o seu<br />

peso <strong>no</strong> pa<strong>no</strong>rama musical da<br />

actualida<strong>de</strong>, e <strong>de</strong>veras aborrecido,<br />

consi<strong>de</strong>rando o mediatismo que<br />

envolve toda e qualquer activida<strong>de</strong><br />

relacionada com a sua banda.<br />

Porém, ig<strong>no</strong>rando as altas<br />

ANTON CORBIJN<br />

expectativas <strong>de</strong>positadas pelos<br />

próprios em “No Line On The<br />

Horizon”, a inexistência <strong>de</strong> uma<br />

metamorfose ao nível <strong>de</strong> “Achtung<br />

Baby” não é propriamente uma<br />

<strong>de</strong>silusão. O <strong>no</strong>vo álbum dos U2 é um<br />

compêndio <strong>de</strong> carreira <strong>de</strong>vidamente<br />

vitaminado por uma louvável dose <strong>de</strong><br />

auto-confiança.<br />

Temos, portanto, a produção <strong>de</strong><br />

Brian E<strong>no</strong> e Daniel La<strong>no</strong>is a empregar<br />

um tom etéreo, orgânico-digital, ao<br />

entorpecente tema-título - os<br />

sintetizadores, um groove<br />

serpenteante e Bo<strong>no</strong> a ce<strong>de</strong>r, como<br />

habitualmente, aos “oh oh oh” que<br />

põem estádios em ebulição. Temos a<br />

abordagem soul <strong>de</strong> “Moment of<br />

surren<strong>de</strong>r”, canção <strong>no</strong>cturna, canção<br />

<strong>de</strong> solidão na metrópole, com sons<br />

borbulhantes como pa<strong>no</strong> <strong>de</strong> fundo e<br />

um solo guitarra Floydia<strong>no</strong> a acentuar<br />

a serenida<strong>de</strong> épica dos sete minutos<br />

<strong>de</strong> música. Temos um riff pedido<br />

emprestado aos Led Zeppelin a<br />

originar a auto-sátira <strong>de</strong> “Stand up<br />

comedy” e o muito dançante<br />

hedonismo do primeiro single “Get on<br />

your boots” - ligação directa a<br />

“Achtung baby” e espaço para os U2<br />

flirtarem com a luxúria: “I don’t want<br />

to talk about wars between nation /<br />

Not right <strong>no</strong>w / Hey sexy boots.”<br />

Entre os U2 em piloto automático<br />

(conferir a festa para yuppie <strong>de</strong>lirar<br />

<strong>de</strong> “I’ll go crazy if I don’t go crazy<br />

tonight”), os U2 da guitarra<br />

reverberante <strong>de</strong> Edge (“Unk<strong>no</strong>w<br />

caller” tem força congregadora e é<br />

bem vinda canção <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong><br />

vintage) e os U2 enquanto pais <strong>de</strong><br />

Killers e afins (tudo explicado pelo<br />

músculo rock, perfeição asséptica,<br />

<strong>de</strong> “Breathe”), “No Line On The<br />

Horizon” tem um pouco <strong>de</strong> tudo o<br />

que fez a história da banda. Tem o<br />

jogo entre o conservadorismo rock e<br />

o experimentalismo da produção; o<br />

tom confessional, eternamente<br />

optimista, e o abrir as goelas ao<br />

mundo para todo o mundo ouvir (e<br />

replicar); o tom ambiental <strong>de</strong><br />

“Unforgettable Fire”, a Americana<br />

polida <strong>de</strong> “Joshua Tree” e a tentação<br />

épica que se tor<strong>no</strong>u componente<br />

essencial do código genético da<br />

banda.<br />

Resumindo: “No Line On The<br />

Horizon” são os U2 pelos U2. Tem um<br />

par <strong>de</strong> bons singles, como eles sempre<br />

tiveram, e os tiques que já se tornaram<br />

cliché. Os fãs entusiasmam-se e<br />

acrescentam um volume à discografia,<br />

os restantes assobiam para o lado e<br />

seguem com a sua vidinha.<br />

Chango Spasiuk<br />

Pynandí<br />

World Village, distri. Harmonia<br />

Mundi<br />

mmmmn<br />

Chango<br />

Spasiuk, um dos<br />

<strong>no</strong>mes maiores<br />

da música<br />

lati<strong>no</strong>-americana<br />

O chamamé é o som<br />

do <strong>no</strong>r<strong>de</strong>ste remoto<br />

da Argentina, na<br />

fronteira com o<br />

Brasil. Uma música<br />

centrada na polka e<br />

<strong>no</strong> acor<strong>de</strong>ão, o “pia<strong>no</strong> dos pobres”<br />

trazido pelos emigrantes europeus<br />

que assentaram na região ao longo do<br />

século XIX. Mas é também uma<br />

Simone e Zélia Duncan, tributo à música e à amiza<strong>de</strong><br />

música mestiça, que foi ganhando<br />

<strong>no</strong>vas colorações <strong>no</strong> convívio com as<br />

percussões dos escravos africa<strong>no</strong>s e as<br />

tradições musicais dos indígenas<br />

Guaraní. Nunca <strong>de</strong>ixou, porém, <strong>de</strong> ser<br />

uma música <strong>de</strong> camponeses, ig<strong>no</strong>rada<br />

ou <strong>de</strong>squalificada pelas elites culturais<br />

<strong>de</strong> Bue<strong>no</strong>s Aires.<br />

Chango Spasiuk assume esse legado<br />

musical e as causas das comunida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> que proce<strong>de</strong>, como <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo<br />

indica o título do <strong>no</strong>vo álbum: chamase<br />

“Pynandí”, o que em Guarani<br />

significa pés <strong>de</strong>scalços e por extensão<br />

<strong>de</strong>signa os camponeses que vivem <strong>no</strong><br />

limiar da pobreza. Mas se a música<br />

que produz se enraíza nessa música<br />

rural, a sua aproximação <strong>de</strong><strong>no</strong>ta uma<br />

complexida<strong>de</strong> e requinte totalmente à<br />

margem das suas tradições.<br />

Salvaguardadas as <strong>de</strong>vidas<br />

distâncias, Chango Spasiuk está para o<br />

chamamé como Astor Piazzola para o<br />

tango. Ou seja, é o artista que marca o<br />

ponto <strong>de</strong> viragem, que revoluciona<br />

um som popular e marginal,<br />

elevando-o à dignida<strong>de</strong> <strong>de</strong> música <strong>de</strong><br />

concerto. É essa via <strong>de</strong><br />

experimentação que o acor<strong>de</strong>onista<br />

escolheu e que agora, aos 40 a<strong>no</strong>s,<br />

atinge a plena maturida<strong>de</strong>, num disco<br />

na maior parte instrumental, que<br />

ensaia subtilmente a aproximação à<br />

música <strong>de</strong> câmara. Instrumentos da<br />

tradição clássica oci<strong>de</strong>ntal, como o<br />

violi<strong>no</strong> e o violoncelo, inclusive um<br />

violi<strong>no</strong> barroco, cruzam-se com tamtams<br />

africa<strong>no</strong>s, docemente<br />

tamborilados em caixas <strong>de</strong> percussão,<br />

sustentando um acor<strong>de</strong>ão que se<br />

<strong>de</strong>sdobra entre melodias populares e<br />

improvisos virtuosos.<br />

É uma música ao mesmo tempo<br />

aérea e telúrica, feita <strong>de</strong> mudanças <strong>de</strong><br />

humores e <strong>de</strong> paisagens, ora<br />

<strong>no</strong>stálgicas e românticas, ora efusivas<br />

e radiosas, mas sempre elegante e<br />

sofisticada. Tem essa aura <strong>de</strong> magia<br />

que se reconhece, por exemplo, <strong>no</strong>s<br />

melhores Daniel La<strong>no</strong>is e Penguin<br />

Cafe Orchestra, certificando Chango<br />

Spasiuk como um dos <strong>no</strong>mes maiores<br />

da música lati<strong>no</strong>-americana da<br />

actualida<strong>de</strong>. Luís Maio<br />

Simone & Zélia Duncan<br />

Amigo é Casa - Ao Vivo<br />

CD ou DVD Biscoito Fi<strong>no</strong>, distri. IPlay<br />

mmmmn<br />

Há duplas que não<br />

resultam ou nada<br />

acrescentam à<br />

simples soma das<br />

partes. Mas a que<br />

juntou as cantoras<br />

brasileiras Simone e Zélia Duncan,<br />

num espectáculo em 2008, é das<br />

mais felizes dos últimos a<strong>no</strong>s. Me<strong>no</strong>s<br />

visceral mas também me<strong>no</strong>s<br />

superficial do que a <strong>de</strong> Seu Jorge com<br />

Ana Carolina (um êxito), esta assenta<br />

na exploração hábil <strong>de</strong> laços e dotes<br />

comuns, do timbre vocal (diferente,<br />

mas incrivelmente harmónico <strong>no</strong>s<br />

unísso<strong>no</strong>s) à partilha do reportório,<br />

muito bem escolhido e igualmente<br />

bem interpretado. Do lírico “Alguém<br />

cantando” (Caeta<strong>no</strong> Veloso) ao<br />

ragtime “Agito e uso” (Ângela Ro Ro),<br />

passando pelo rock “Petúnia resedá”<br />

(Gonzaga Jr.) ou pelo quase rap<br />

The (International) Noise Conspiracy:<br />

fingirem que tudo continua como<br />

dantes, neste contexto, é uma <strong>de</strong>silusão<br />

“Kitnet” (Alzira E/Arruda), Simone e<br />

Zélia empenham-se a fundo num<br />

espectáculo que, <strong>no</strong> CD, chega quase<br />

aos 65 minutos (18 temas) e <strong>no</strong> DVD<br />

ultrapassa hora e meia (26 temas, 98<br />

minutos). Sendo a mesma gravação,<br />

captada ao vivo, a do DVD permite<br />

mergulhar mais profundamente na<br />

essência do espectáculo e perceber<br />

com porme<strong>no</strong>r as subtilezas dos<br />

muitos duetos (até por tirar bom<br />

partido do movimento das câmaras,<br />

o que nem sempre suce<strong>de</strong>). Além<br />

disso, <strong>no</strong> único extra, gravado em<br />

casa <strong>de</strong> Simone, ouve-se a canção<br />

que dá título ao trabalho: “Amigo é<br />

Casa”. Um tributo à música e à<br />

amiza<strong>de</strong>. Nu<strong>no</strong> Pacheco<br />

The (International) Noise<br />

Conspiracy<br />

The Cross Of My Calling<br />

American Recordings; distri. E<strong>de</strong>l<br />

mmmnn<br />

Os The<br />

(International) Noise<br />

Conspiracy foram<br />

das melhores coisas<br />

que este início <strong>de</strong><br />

século XXI <strong>no</strong>s<br />

ofereceu <strong>no</strong> binómio rock’n’roll /<br />

salvação do mundo. Música que servia<br />

o corpo, violentamente sensual, e que<br />

se erguia sobre tradições activistas (<strong>de</strong><br />

esquerda, provi<strong>de</strong>ncialmente).<br />

Basicamente, sexo e revolução:<br />

canções obrigando ao mui cool<br />

menear <strong>de</strong> ancas, enquanto o<br />

vocalista Dennis Lyxzén disparava<br />

panfletos revolucionários portáteis.<br />

Pois agora, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> um confuso<br />

“Armed Love” (álbum negligenciável<br />

<strong>de</strong> 2004), tinham tudo a seu favor: o<br />

capitalismo mo<strong>de</strong>r<strong>no</strong> em cacos,<br />

Fukuyama, corado <strong>de</strong> vergonha, a<br />

fingir que aquela tirada do “fim da<br />

História” foi apenas reflexo <strong>de</strong> um<br />

<strong>de</strong>slumbramento infantil e o mundo à<br />

procura <strong>de</strong> acertar passo com uma<br />

<strong>no</strong>va era. E que fazem eles? O mesmo<br />

<strong>de</strong> sempre, com duas nuances: abrem<br />

espaço para a revolução individual<br />

(“The assassination of myself”) e<br />

investem na negritu<strong>de</strong> (“The Cross Of<br />

My Calling” é todo o funk possível em<br />

garage-rockers e tem Funka<strong>de</strong>lic e Sly<br />

Stone por todo o lado). Isso até resulta<br />

em coisas magníficas como o refrão<br />

contagiante <strong>de</strong> “Hiroshima mon<br />

amour” ou a bamboleante “I am<br />

dynamite”, que tem congas e órgão<br />

Hammond a trabalhar o “boogie”<br />

como se <strong>de</strong>seja. Com as erupções<br />

44 • Ípsilon • Sexta-feira 27 Fevereiro 2009

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