no Bairro Alto? - Fonoteca Municipal de Lisboa - Câmara Municipal ...
no Bairro Alto? - Fonoteca Municipal de Lisboa - Câmara Municipal ...
no Bairro Alto? - Fonoteca Municipal de Lisboa - Câmara Municipal ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
BA<br />
Social<br />
Nos a<strong>no</strong>s 80 e 90<br />
as sociabilida<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong>senrolavam-se <strong>no</strong><br />
interior dos bares,<br />
mas na última<br />
década é na rua que<br />
tudo acontece<br />
BA<br />
Comércio<br />
As velhas lojas <strong>de</strong><br />
negócio tradicional<br />
perduram,<br />
convivendo com<br />
mercearias finas,<br />
livrarias e lojas<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>sign<br />
BA<br />
Serviços<br />
A Rua do Norte,<br />
sucessão <strong>de</strong><br />
cabeleireiros, lojas<br />
<strong>de</strong> roupa e <strong>de</strong> discos,<br />
tor<strong>no</strong>u-se na mais<br />
movimentada do<br />
<strong>Bairro</strong> durante o dia<br />
O bairro cultural <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong><br />
Partindo <strong>de</strong> uma reflexão sobre activida<strong>de</strong>s culturais em relação com o <strong>de</strong>senvolvimento dos territórios,<br />
o investigador Pedro Costa analisou o <strong>Bairro</strong> <strong>Alto</strong> <strong>no</strong> livro “A Cultura em <strong>Lisboa</strong>”. Vítor Belancia<strong>no</strong><br />
Há-os em muitas cida<strong>de</strong>s. O<br />
seu mo<strong>de</strong>lo é variável mas, por<br />
<strong>no</strong>rma, são zonas que foram<br />
reconvertidas, com ambiente<br />
criativo e informal, mistura<br />
<strong>de</strong> cafés, bares, galerias ou<br />
salas <strong>de</strong> concertos, on<strong>de</strong><br />
artistas emergentes po<strong>de</strong>m<br />
experimentar. São os bairros<br />
culturais, cada vez mais<br />
enaltecidos por permitirem<br />
um estilo <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> escala<br />
humana e por serem sinónimo<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento económico<br />
sustentável. As suas fronteiras<br />
po<strong>de</strong>m ser in<strong>de</strong>finidas, mas<br />
quando <strong>de</strong>sembocamos num<br />
<strong>de</strong>sses locais sentimos que não<br />
só entrámos numa comunida<strong>de</strong><br />
cultural como po<strong>de</strong>mos<br />
participar <strong>de</strong>la.<br />
Hoje, esse tipo <strong>de</strong> territórios<br />
ganhou <strong>no</strong>va pertinência,<br />
também porque o sentido<br />
<strong>de</strong> cultura foi alterado,<br />
englobando indústrias<br />
culturais tradicionais, <strong>no</strong>vas<br />
indústrias <strong>de</strong> conteúdos,<br />
formas consagradas <strong>de</strong> arte<br />
ou manifestações emergentes<br />
associadas às formas <strong>de</strong><br />
sociabilida<strong>de</strong> urbana juvenis.<br />
Motivado por isto, há quatro<br />
a<strong>no</strong>s, Pedro Costa - professor<br />
do Departamento <strong>de</strong> Eco<strong>no</strong>mia<br />
do ISCTE e investigador do<br />
Dinâmia (Centro Estudos Sobre<br />
a Mudança Socioeconómica),<br />
que li<strong>de</strong>ra o grupo <strong>de</strong> trabalho<br />
para as Estratégias para a<br />
Cultura em <strong>Lisboa</strong> - concluiu<br />
uma tese <strong>de</strong> doutoramento que<br />
parte <strong>de</strong> uma reflexão sobre as<br />
activida<strong>de</strong>s culturais em relação<br />
com o <strong>de</strong>senvolvimento dos<br />
territórios e que inci<strong>de</strong> sobre a<br />
Área Metropolitana <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong>,<br />
em particular o principal bairro<br />
cultural da cida<strong>de</strong>, o <strong>Bairro</strong> <strong>Alto</strong><br />
e Chiado. Uma versão <strong>de</strong>ssa tese<br />
foi lançada em livro: “A Cultura<br />
em <strong>Lisboa</strong> - competitivida<strong>de</strong> e<br />
<strong>de</strong>senvolvimento territorial (edi.<br />
Imprensa <strong>de</strong> Ciências Sociais).”<br />
“Esta é a zona da cida<strong>de</strong> que<br />
mais facilmente se po<strong>de</strong>rá<br />
assemelhar a um bairro<br />
cultural”, diz-<strong>no</strong>s, “não só pela<br />
quantida<strong>de</strong> e diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
agentes que aqui se localizam,<br />
como pelo potencial simbólico<br />
que usufrui na cida<strong>de</strong>, bem<br />
como pelos efeitos exter<strong>no</strong>s<br />
gerados pela conjugação<br />
<strong>de</strong>ssas características. Isso foi<br />
<strong>de</strong>cisivo para me <strong>de</strong>bruçar sobre<br />
este eixo, <strong>de</strong>dicando atenção<br />
à i<strong>no</strong>vação e criativida<strong>de</strong><br />
nas dinâmicas geradas<br />
na zona, bem como na sua<br />
afirmação competitiva e na sua<br />
sustentabilida<strong>de</strong>, não <strong>de</strong>ixando<br />
<strong>de</strong> lado os conflitos existentes.”<br />
Sinergias e diferenças<br />
Entre o <strong>Bairro</strong> <strong>Alto</strong> e o Chiado<br />
existem sinergias, mas<br />
também diferenças. “São dois<br />
sistemas autó<strong>no</strong>mos”, reflecte,<br />
“o lado mais <strong>no</strong>ctur<strong>no</strong> ligado<br />
à transgressão, a activida<strong>de</strong>s<br />
emergentes, <strong>no</strong> <strong>Bairro</strong> <strong>Alto</strong>, e o<br />
lado mais institucional, diur<strong>no</strong>,<br />
<strong>no</strong> Chiado, on<strong>de</strong> existe a maior<br />
concentração <strong>de</strong> livrarias do<br />
país.”<br />
A zona é um dos pólos<br />
principais da cida<strong>de</strong> <strong>no</strong> que<br />
respeita à animação <strong>no</strong>cturna,<br />
às artes performativas, à moda,<br />
ao sector do livro, a segmentos<br />
da produção audiovisual<br />
ou a alguns dos mercados<br />
alternativos das indústrias<br />
culturais. Evi<strong>de</strong>ncia-se pela<br />
quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> activida<strong>de</strong>s<br />
culturais aí implantadas, mas<br />
sobretudo pelo <strong>de</strong>senvolvimento<br />
<strong>de</strong> um meio criativo propício<br />
à circulação da informação, à<br />
difusão da i<strong>no</strong>vação e à maneira<br />
tolerante como são recebidas as<br />
“É um espaço on<strong>de</strong><br />
é necessário estar, ir,<br />
ser visto, encetar<br />
contactos e divulgar<br />
lá coisas”<br />
<strong>de</strong>monstrações culturais mais<br />
alternativas.<br />
“É um espaço on<strong>de</strong> é<br />
necessário estar, ir, ser visto,<br />
encetar contactos e divulgar<br />
lá coisas. É um pólo nesse<br />
sentido, funcionando como<br />
base do sistema produtivo das<br />
activida<strong>de</strong>s culturais. Por outro<br />
lado, possui um sistema <strong>de</strong><br />
(auto)governação específico e<br />
um sistema <strong>de</strong> representações<br />
próprio - os agentes que lá estão<br />
reconhecem o local como um<br />
bairro cultural e, externamente,<br />
é visto <strong>de</strong>ssa forma.”<br />
Mo<strong>de</strong>los<br />
O exemplo do <strong>Bairro</strong> <strong>Alto</strong><br />
difere do <strong>de</strong> outros bairros<br />
NUNO FERREIRA SANTOS<br />
culturais pela sua duração.<br />
Não é comum uma zona com<br />
estas características manter<br />
a centralida<strong>de</strong> durante tantos<br />
a<strong>no</strong>s. “Nos EUA são <strong>no</strong>rmais<br />
fenóme<strong>no</strong>s <strong>de</strong> gentrificação.<br />
Os artistas dão visibilida<strong>de</strong> ao<br />
bairro, criam valor imobiliário,<br />
a zona é apropriada por outras<br />
pessoas e os artistas vão<br />
saindo.”<br />
Em Inglaterra é diferente. “As<br />
operações são conduzidas pelos<br />
po<strong>de</strong>res públicos, promovendo<br />
agências <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />
local, que actuam em zonas<br />
industriais, facilitando o<br />
aparecimento <strong>de</strong> activida<strong>de</strong>s<br />
culturais”, funcionando como<br />
veículo <strong>de</strong> requalificação<br />
urbanística <strong>de</strong> espaços<br />
<strong>de</strong>gradados ou reconvertidos.<br />
Um outro mo<strong>de</strong>lo é aquele<br />
que permite que, através da<br />
iniciativa <strong>de</strong> vários agentes<br />
da mesma área <strong>de</strong> activida<strong>de</strong>,<br />
se tente criar uma área com<br />
motivações comuns. É isso que<br />
tem sido tentado em <strong>Lisboa</strong><br />
com o projecto “Santos Design<br />
District”, em Santos.<br />
No <strong>Bairro</strong> <strong>Alto</strong> ainda<br />
não existe um fenóme<strong>no</strong><br />
<strong>de</strong> gentrificação, mas a<strong>no</strong>s<br />
<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter <strong>de</strong>senvolvido<br />
o seu trabalho, Costa é da<br />
opinião que existe um perigo<br />
<strong>de</strong> massificação. “Não é<br />
compatível ter uma área<br />
criativa e vanguardista sendo<br />
massificada. Já se sente isso,<br />
com pessoas a saírem para<br />
zonas envolventes, da Bica ao<br />
Cais do Sodré. Por outro lado,<br />
socialmente, mais pessoas po<strong>de</strong><br />
ser sinónimo <strong>de</strong> mais conflitos.”<br />
Quando começou a<br />
<strong>de</strong>senvolver o seu trabalho,<br />
o valor estratégico das<br />
activida<strong>de</strong>s culturais<br />
para o <strong>de</strong>senvolvimento<br />
territorial ainda não tinha o<br />
reconhecimento que hoje têm.<br />
Mas <strong>no</strong> último a<strong>no</strong>, <strong>no</strong>ções como<br />
o das “cida<strong>de</strong>s criativas” ou<br />
“indústrias criativas” ganharam<br />
visibilida<strong>de</strong> em Portugal porque<br />
parece existir, por fim, até da<br />
parte do po<strong>de</strong>r político, a <strong>no</strong>ção<br />
que são necessários <strong>no</strong>vos<br />
mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />
que cruzem cultura, urbanismo,<br />
eco<strong>no</strong>mia e questões sociais.<br />
Mas Pedro Costa espera que a<br />
questão não se fique apenas pela<br />
retórica. Até porque se “por um<br />
lado existe esse tipo <strong>de</strong> discurso,<br />
<strong>de</strong>pois reduz-se o orçamento<br />
do estado para a cultura.” Ora,<br />
o que faz sentido quando se<br />
acredita numa área <strong>de</strong> actuação<br />
<strong>no</strong>va é aumentar o orçamento e<br />
não reduzi-lo.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 27 Fevereiro 2009 • 9