Da reserva do possÃvel e da proibição de ... - Revista do TCE
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evista <strong>do</strong> tribunal <strong>de</strong> contas DO ESTADO <strong>de</strong> minas gerais<br />
julho | agosto | setembro 2010 | v. 76 — n. 3 — ano XXVIII<br />
<strong>de</strong> vinculação só po<strong>de</strong> gerar <strong>do</strong>is tipos <strong>de</strong> conclusão: ou o Esta<strong>do</strong> não possui dinheiro em seus<br />
cofres ou esse dinheiro existe, sen<strong>do</strong>, porém, mal-emprega<strong>do</strong>, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que aquilo que é básico<br />
e <strong>de</strong>veria ser concretiza<strong>do</strong> não o está sen<strong>do</strong> (KRELL, 1999, p. 241-242).<br />
Doutrina<br />
A <strong>do</strong>utrina, em geral, quan<strong>do</strong> trata genericamente sobre a <strong>reserva</strong> <strong>do</strong> possível, afirma que<br />
“o i<strong>de</strong>al seria que houvesse disponibili<strong>da</strong><strong>de</strong> financeira para cumprir to<strong>do</strong>s os objetivos <strong>da</strong><br />
Constituição” (MARMELSTEIN, 2008, p. 318). A ver<strong>da</strong><strong>de</strong> é que “um direito não existe se não<br />
houver um maquinário institucional para protegê-lo”, isto é, “se to<strong>do</strong>s os ci<strong>da</strong>dãos <strong>de</strong>vem<br />
gozar <strong>de</strong> um <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> mínimo <strong>de</strong> direito, então esses custos não po<strong>de</strong>m ser individualmente<br />
suporta<strong>do</strong>s” (IMMORDINO e PAGANO, 2004, p. 85). Desta feita, to<strong>do</strong>s aqueles direitos que<br />
<strong>de</strong>pen<strong>da</strong>m <strong>de</strong> uma concretização, como é o caso <strong>do</strong>s direitos sociais, e que se <strong>de</strong>stinem a to<strong>da</strong><br />
a socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, e não apenas a alguns indivíduos, <strong>de</strong>vem ser financia<strong>do</strong>s por to<strong>do</strong>s, conforme as<br />
regras pertinentes ao sistema jurídico <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> país.<br />
O maquinário institucional a que se referem Immordino e Pagano é o governo, que arreca<strong>da</strong> <strong>da</strong><br />
socie<strong>da</strong><strong>de</strong> as verbas <strong>de</strong>stina<strong>da</strong>s ao financiamento <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> direitos e que, na boa expressão<br />
<strong>de</strong> Ronald Coase (1960, p. 17) “é, em certo senti<strong>do</strong>, uma superfirma, <strong>de</strong> um tipo bastante<br />
especial, já que capaz <strong>de</strong> influenciar o uso <strong>de</strong> fatores <strong>de</strong> produção por meio <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões<br />
administrativas”, <strong>de</strong> maneira que fica “claro que o governo tem po<strong>de</strong>res que po<strong>de</strong>m facilitar a<br />
obtenção <strong>de</strong> certas coisas por um menor custo <strong>do</strong> que as empresas priva<strong>da</strong>s”. Portanto, o papel<br />
<strong>do</strong> governo é gerir e aplicar corretamente to<strong>do</strong> o dinheiro arreca<strong>da</strong><strong>do</strong> a título <strong>de</strong> financiamento<br />
<strong>do</strong> aparato estatal e, principalmente, <strong>do</strong>s direitos. Assim, se a <strong>reserva</strong> <strong>do</strong> possível for utiliza<strong>da</strong><br />
apenas com o propósito <strong>de</strong> justificar os erros <strong>de</strong> gestão social <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Público, então é um<br />
postula<strong>do</strong> flagrantemente contrário aos direitos <strong>da</strong> pessoa humana.<br />
A<strong>do</strong>tar-se, portanto, a versão <strong>de</strong> que a <strong>reserva</strong> <strong>do</strong> possível justifica a não efetivação <strong>do</strong>s direitos<br />
sociais <strong>de</strong> aplicabili<strong>da</strong><strong>de</strong> diferi<strong>da</strong> é <strong>da</strong>r a oportuni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> não se <strong>da</strong>r necessária eficácia a esses<br />
direitos, e, por tabela, porque <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong>stes, as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s não possam ser (corretamente)<br />
exerci<strong>da</strong>s por to<strong>do</strong>s os indivíduos. Esse tipo <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong> é irresponsável, porque liga os direitos<br />
sociais “à ditadura <strong>do</strong>s cofres vazios, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-se por isso que a realização <strong>do</strong>s direitos<br />
sociais se dá conforme o equilíbrio econômico-financeiro <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>” (CANOTILHO, 1998, p.<br />
46), o que não tem cunho verídico, compartilhan<strong>do</strong>-se <strong>da</strong> mesma irresignação <strong>de</strong> Américo Bedê<br />
(2005, p. 74): “é possível falar em falta <strong>de</strong> recursos para a saú<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> existem, no mesmo<br />
orçamento, recursos com propagan<strong>da</strong> <strong>do</strong> governo?”. Ao que o próprio autor continua: “se os<br />
recursos não são suficientes para cumprir integralmente a política pública, não significa <strong>de</strong> per<br />
si que são insuficientes para iniciar a política pública”.<br />
4 As exigências mínimas e a proibição <strong>de</strong> retrocesso social<br />
Utilizar os recursos disponíveis para promover as exigências mínimas <strong>da</strong> coletivi<strong>da</strong><strong>de</strong> não<br />
significa dizer que essa promoção tenha <strong>de</strong> ser to<strong>da</strong> ela feita <strong>de</strong> uma só vez, o i<strong>de</strong>al é que<br />
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