O tom geral do frasear é lento, plano e igual, sem a varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> inflexões, <strong>de</strong> andamentos eesfumaturas que enriquece a expressão das emoções na pronunciação portuguesa.2. Os acentos em que a voz mais <strong>de</strong>moradamente carrega, na prolação total <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong>palavras, não são em geral os mesmos que teria esse grupo na boca <strong>de</strong> um português; e aspausas que divi<strong>de</strong>m tal grupo na linguagem corrente são aqui mais abundantes, além <strong>de</strong>distribuídas <strong>de</strong> modo diverso. Na duração das vogais igualmente difere muito o dialeto: se,proferidas pelos portugueses, as breves duram um tempo e as longas dois, po<strong>de</strong>-se dizer,comparativamente, que no falar caipira duram as primeiras dois tempos e as segundas quatro.Este fenômeno está estreitamente ligado à lentidão da fala, ou, antes, se resolve num simplesaspecto <strong>de</strong>la, pois a linguagem vagarosa, cantada, se caracteriza justamente por umestiramento mais ou menos excessivo das vogais (2),3. Também <strong>de</strong>corre <strong>de</strong>ssa mesma lentidão, como um resultado natural, o fato <strong>de</strong> que oadoçamento e elisão das vogais átonas, coisas comuns na pronunciação portuguesa, são aquifenômenos relativamente raros. Com efeito, compreen<strong>de</strong>-se bem que o português, na suapronunciação vigorosa e rápida, torture muito mais os vocábulos, abreviando-os peloenfraquecimento e supressão das vozes átonas internas, ligando-os uns aos outros pelaabsorção das átonas finais nas vogais que se lhes seguem: subrádu, p'dáçu, c'rôa, 'sp'rança,tiátru, d'hoj'em diante, um'august'assemblêia. Da mesma forma, compreen<strong>de</strong>-se que o caipirapaulista, no seu pausado falar, que por força há <strong>de</strong> apoiar-se mais <strong>de</strong>moradamente nas vogais,não pratique em tão larga escala essas mutações e elisões.O caipira (como, em geral, todos os paulistas) pronuncia, em regra, claramente as vogaisátonas, qualquer que seja a posição das mesmas no vocábulo: esperança, sobrado, pedaço,coroa, e recorre poucas vezes a sinalefa. Nos próprios monossílabos átonos me, te, se, <strong>de</strong>, o,que, etc., as vogais conservam o seu valor típico bem distinto, ao contrário do que suce<strong>de</strong> comos portugueses, em cuja pronunciação normal elas se ensur<strong>de</strong>ceram, assumindo tonalida<strong>de</strong>sespeciais.Po<strong>de</strong> dizer-se que no dialeto não lia vogais surdas: todas soam distintamente, salvos os casos<strong>de</strong> queda ou <strong>de</strong> sinalefa. Dai provém o dizer-se que os caipiras acentuam todas as vogais, o queé falso, mas explica-se. E que não se leva em conta a duração relativa das átonas e tônicas, aque atrás nos referimos.4. Não po<strong>de</strong>mos, porém, atribuir inteiramente à influência da lentidão e pausa da fala essamelhor prolação das vogais átonas, no dialeto. Haverá também causas históricas, por orapressentidas apenas.O fenômeno é, naturalmente, complexo, e são complexas as suas causas; mas é impossívelnegar que existe pelo menos uma estreita correlação entre um e outro fato.5. Seria, aliás, muito interessante um estudo acurado das feições especiais da prosódia caipira,com o objetivo <strong>de</strong> discriminar a parte que lhe toca na evolução dos diferentes <strong>de</strong>partamentos dodialeto. Chegar-se-ia <strong>de</strong> certo a <strong>de</strong>scobertas muito curiosas, até no domínio dos fatos sintáticos.A diferenciação relativa à colocação dos pronomes oblíquos, no Brasil, <strong>de</strong>ve explicar-se, emparte, pelo ritmo da fala e pelo alongamento das vogais (3), Esses pronomes, no português
europeu, se antepõem ou pospõem a outras palavras, que os atraem, incorporando-os.Prosodicamente, não têm existência autônoma: são sons ou grupos <strong>de</strong> sons, <strong>de</strong>stinados aadicionarem-se aos vocábulos acentuados, segundo leis naturais inconscientementeobe<strong>de</strong>cidas (ênclise, próclise). Passando para o Brasil, a língua teve que submeter-se a outroritmo, <strong>de</strong>terminado por condições fisiológicas e psicológicas diversas: era o suficiente paraquebrar a continuida<strong>de</strong> das leis <strong>de</strong> atração que agiam em Portugal. O alongamento das vogais,dando maior amplitu<strong>de</strong> aos pronomes na pronúncia, tornando mais sensível a suaindividualida<strong>de</strong>, veio acentuar, <strong>de</strong> certo, aquele efeito.2.º OS FONEMAS E SUAS ALTERAÇÕES NORMAIS6. Os fonemas do dialeto são em geral os mesmos do português, se não levarmos em contaligeiras variantes fisiológicas, que sempre existem entre povos diversos e até entre frações <strong>de</strong>um mesmo povo; variantes essas <strong>de</strong> que, pela maior parte, só a fonética experimental po<strong>de</strong>riadar uma notação precisa. Cumpre, entretanto, observar o seguinte:a) s post-vocálico tem sempre o mesmo valor: é uma linguo-<strong>de</strong>ntal ciciante, não se notandojamais as outras modalida<strong>de</strong>s conhecidas entre portugueses e mesmo entre brasileiros <strong>de</strong>outras regiões; s propriamente sibilante, assobiado, e bem assim chiante, são aqui<strong>de</strong>sconhecidos. Para produzir este som a língua projeta a sua ponta contra os <strong>de</strong>ntes da arcadainferior e encurva-se <strong>de</strong> modo que os bordos laterais toquem os <strong>de</strong>ntes da arcada superior, só<strong>de</strong>ixando uma pequena abertura sob os incisivos: modo <strong>de</strong> formação perfeitamente igual ao <strong>de</strong>c em cedo. (4)b) r inter e post-vocálico (arara, carta) possui um valor peculiar: é linguo-palatal e guturalizado.Na sua prolação, em vez <strong>de</strong> projetar a ponta contra a arcada <strong>de</strong>ntária superior, movimento esteque produz a modalida<strong>de</strong> portuguesa, a língua leva os bordos laterais mais ou menos até ospequenos molares da arcada superior e vira a extremida<strong>de</strong> para cima, sem tocá-la na abóbadapalatal. Não há quase nenhuma vibração tremulante. Para o ouvido, este r caipira assemelha-sebastante ao r inglês post-vocálico. É, muito provavelmente, o mesmo r brando dos autóctones.Estes não possuíam o rr forte ou vibrante, sendo <strong>de</strong> notar que com o modo <strong>de</strong> produção acima<strong>de</strong>scrito é impossível obter a vibração <strong>de</strong>sse último fonema. (5)c) A explosiva gutural gh tem uma tonalida<strong>de</strong> especial, sobretudo antes dos semiditongos cujaprepositiva é u, casos em que freqüentemente se vocaliza: áu-ua = água, léu-ua = légua).d) ch e j palatais são explosivos, como ainda se conservam entre o povo em certas regiões <strong>de</strong>Portugal (6), no inglês (chief, majesty) e no italiano (ciclo, genere).e) A consonância palatal molhada lh não existe no dialeto, como na maioria dos dialetos port. <strong>de</strong>África e Ásia, e como em vários dialetos castelhanos da América. (7)7. Os fenômenos <strong>de</strong> diferenciação fonética que caracterizam o dial. resumem-se <strong>de</strong>sta forma:VOGAIS
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