Televisão - Entre a Metodologia Analítica e o Contexto Cultural
Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.
Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.
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A mistura de gêneros observada em A estrada perdida e descrita<br />
pelo próprio Lynch não é exclusiva dessa obra. Em praticamente todos<br />
os seus filmes e particularmente em Twin Peaks, dada a natureza do<br />
programa televisivo, Lynch trabalha com temas e características de<br />
gêneros variados, adicionando, ainda, elementos intertextuais, como<br />
referências aos seus outros trabalhos e citações a filmes de outros<br />
cineastas e a programas de TV.<br />
A apresentação que Michael Atkinson faz de Veludo azul (mas que<br />
poderia muito bem ser sobre Twin Peaks também) atenta para essa<br />
complexidade das obras de David Lynch:<br />
um filme de estúdio hollywoodiano da década de 80 tão radical,<br />
visionário e cabalístico quanto qualquer produção de vanguarda; um<br />
filme cult misteriosamente simbólico e subterrâneo, que apesar disto<br />
conta com estrelas reconhecíveis e distribuição ampla; um “quadro de<br />
gênero” com a ambiência de um temível e hiper elaborado pesadelo; um<br />
“filme de arte” americano feito pelo único diretor conceituado de “filme<br />
de arte” de Hollywood (ATKINSON, 2002: 11).<br />
É interessante observar que Veludo azul, com frequência, foi apontado<br />
como exemplo de filme pós-moderno. Autores como Arthur Kroker<br />
e Michael Dorland afirmam que “Veludo azul é a imagem cinemática<br />
perfeita para cultura pós-moderna” (KROKER & DORLAND, 1993: 11), 24<br />
apontando ainda que: “Veludo azul é o mundo pós-moderno. Aqui,<br />
apenas os predadores, como Frank [personagem de Dennis Hopper], tem<br />
energia e podem fazer as coisas acontecerem” (KROKER & DORLAND,<br />
1993: 11). 25 Não por acaso, Frank será comparado ao assassino BOB<br />
(Frank Silva) de Twin Peaks por Chris Rodley, no livro de entrevista que<br />
fez com Lynch em 1997 (LYNCH & RODLEY, 1997: 144).<br />
Sobre essas personagens extremadas e complexas (muitas vezes<br />
aproximando-se da fantasmagórica aparição do duplo, o doppelgänger)<br />
que habitam o universo lynchiano, 26 vale ressaltar o que o próprio Lynch<br />
24<br />
Tradução dos autores. Texto original: “Blue Velvet is a perfect cinematic image for a postmodern culture.”<br />
25<br />
Tradução dos autores. Texto original: “Blue Velvet is the postmodern world. Here, only the the predators, like Frank,<br />
have energy and can make things happen.”<br />
26<br />
O caso de BOB e Dale Cooper em Twin Peaks talvez seja o mais intrigante, pois eles são, respectivamente, o vilão<br />
e o herói do programa. No entanto, são opostos que se completam. Nada mais pertinente que a série terminar<br />
com o espírito de BOB se apossando do duplo de Cooper. No trigésimo e último episódio, dirigido por Lynch e<br />
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