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Boletim Informativo AcervaPR Abril 2017

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Cervejeiro de<br />

Nascimento<br />

Pense em alguém que é calmo, com um tom de voz levemente tímido e com sotaque<br />

do interior, de sorriso fácil e com um olhar bastante analítico quando o assunto<br />

é cerveja. Eis que esse é Paulo Sérgio Matulle, 44, cuja relação com<br />

a bebida o revela como um grande professor no assunto, transcendo até mesmo<br />

aprendizados técnicos, ensinados em dezenas de cursos afora.<br />

fotos e entrevista de adriane baldini<br />

feita em 2 de fevereiro de <strong>2017</strong><br />

ORIGEM<br />

Descendente de ucranianos, poloneses, alemães e<br />

romenos, Matulle, como é conhecido, é nascido na<br />

pequena Palmital, no interior do Paraná. As figuras dos<br />

avôs – em especial da avó polaca, Angelina, por parte<br />

de pai, é a que mais teve influência em sua formação<br />

cervejeira. A matriarca tinha pequenas plantações de<br />

trigo e de centeio nos arredores da casa; ela ensinou o<br />

pequeno Paulo da importância ao saber quando o grão<br />

estava maduro o suficiente para colheita, feita a mão<br />

por ele e por toda a família.<br />

Depois dos grãos separados, ele observava a<br />

avó fazer malteação de modo primitivo; ela<br />

colocava os grãos em uma grande gamela<br />

e os deixava de molho até germinarem.<br />

Durava de cinco a sete dias, dependendo da<br />

estação. Depois que apareciam as radículas,<br />

ela escoava os grãos e os deixava secando no<br />

sol, sobre sacos de estopa. De lá, os grãos<br />

beiravam o lado de dentro de um forno a<br />

lenha, no qual, mais tarde, presenteava o<br />

malte com um toque de aroma defumado.<br />

Como naquela época não havia moedor pessoal, o<br />

malte era moído em um moinho coletivo feito de pedras<br />

sobrepostas. De volta para casa, a avó esquentava a<br />

água e nele colocava todo o malte moído, no qual o<br />

termômetro da brassagem era até onde o dedo dela<br />

aguentava — naquela época, ela e nenhum outro<br />

cervejeiro caseiro imigrante usufruíam de qualquer<br />

tecnologia cervejeira; lembrando de que quando viu a<br />

avó fazer procedimento pela primeira vez, a casa sequer<br />

tinha energia elétrica. O calor das pedras do fogão a<br />

lenha controlavam a temperatura da panela, mesmo<br />

quando o fogo se apagava. No outro dia, o mosto<br />

era coado em um pano de algodão grosso limpo; um<br />

pouco antes, ela colhia algumas flores de lúpulo —<br />

segundo ele, alguém se lembrou de trazer uma muda<br />

da trepadeira durante a imigração, que foi plantada ao<br />

mesmo tempo em que a cevada e o trigo — e, depois<br />

disso, a fermentação era feita com tabletes de fermento<br />

de pão ou de batata.<br />

A cerveja fabricada era consumida por toda a família<br />

(crianças, como ele na época, inclusive) e era produzida<br />

apenas em grandes festividades de Ano Novo, Páscoa<br />

e Natal. Ele até hoje não imagina de onde vinham as<br />

garrafas e tampinhas, tampouco de como elas eram<br />

fechadas. Mas elas eram servidas na mesa com tantos<br />

outros primores fabricados também pelas mãos da<br />

matriarca, como massas caseiras e mais uma infinidade<br />

de pães, bolos, roscas e conservas, além do hidromel<br />

(que o avô chamava de “vinho de mel”).<br />

Da “cervejada” da avó, ele tem na memória das<br />

informações da bebida a turbidez, de coloração<br />

amarelo-escuro, do aroma de fermento e defumado,<br />

do paladar adocicado, do corpo leve e de carbonatação<br />

adequada o suficiente para não incomodar o paladar de<br />

uma criança.<br />

A limpeza do “equipamento cervejeiro” na época<br />

constava apenas no uso de uma colher de soda cáustica<br />

com água quente, e pronto. Não havia sequer o<br />

conhecimento de uma possível contaminação cruzada<br />

— e isso, tavez, é que tenha o tornado tão destemido.<br />

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<strong>Boletim</strong> <strong>Informativo</strong> da Acerva Paranaense n.º01 abril/<strong>2017</strong>

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