Boletim Informativo AcervaPR Abril 2017
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artigo<br />
Os obstáculos<br />
das pequenas<br />
cervejarias no<br />
século XX<br />
artigo de<br />
Paulo Procópio Burian<br />
revolucaoartesanal.blogspot.com<br />
16<br />
<strong>Boletim</strong> <strong>Informativo</strong> da Acerva Paranaense n.º01 abril/<strong>2017</strong><br />
Nos últimos anos o mercado de cervejas artesanais<br />
tem experimentado um forte crescimento. De acordo<br />
com reportagem do jornal “Valor”, de fevereiro de<br />
2016, o mercado de cervejas artesanais no Brasil<br />
vem apresentando um forte crescimento anual, da<br />
ordem de 30% a 40%¹. Esse cenário pode<br />
ser facilmente constatado nas principais<br />
cidades brasileiras nos últimos 10 anos,<br />
período em que o número de cervejarias<br />
e bares destinados às artesanais cresceu<br />
bastante e agora encontra um público<br />
cada vez maior.<br />
Se por um lado esse cenário favorável tem sido motivo<br />
para celebrar, por outro lado nos leva a perguntar porque<br />
durante todo o século XX o Brasil passou basicamente<br />
sob o domínio da grande indústria cervejeira com suas<br />
American Standard Lagers, feitas em grande parte com<br />
cereais não malteados, sem preocupação maior com<br />
a qualidade. Por que teria demorado tanto para que<br />
as artesanais surgissem como uma opção de melhor<br />
qualidade?<br />
Na verdade, nem sempre o mercado cervejeiro<br />
brasileiro foi dominado pela grande indústria. No (bem<br />
documentado) livro A Cerveja e a Cidade do Rio de<br />
Janeiro - de 1888 ao início dos anos 30², a historiadora<br />
Teresa C. de Novaes Marques ilustra como as pequenas<br />
cervejarias de alta fermentação no Rio de Janeiro<br />
disputavam mercado com a Brahma até o início do<br />
século XX e quais os obstáculos enfrentados por elas.<br />
Para fazer frente às dificuldades para<br />
obtenção de vasilhames e ampliar o<br />
alcance de seus produtos, sobrevivendo às<br />
recorrentes crises cambiais, até o início<br />
do século XX as pequenas cervejarias<br />
no Rio de Janeiro, como a Guarda Velha<br />
e a Santa Maria, disponibilizavam suas<br />
cervejas em um espaço integrado onde se<br />
fabricava, bebia, comia e jogava, além de<br />
eventualmente contar com alguma atração<br />
musical. Esses ambientes eram frequentados por<br />
operários, pobres imigrantes e trabalhadores negros,<br />
todos pertencentes ao conceito do cidadão típico<br />
brasileiro, cenário que torna mais fácil a compreensão<br />
do preconceito que enfrentavam por parte de uma<br />
parcela da sociedade.<br />
Um dos obstáculos enfrentados por essas cervejarias<br />
menores de alta fermentação era a forte campanha de<br />
jornais de grande circulação, como a Gazeta de Notícias.<br />
Em 1912, sob o título “A fábrica de cerveja Santa Maria:<br />
horrorosa imundice nos domínios das ratazanas”, o<br />
periódico publicou reportagem criticando as condições<br />
de higiene do local e o perfil dos frequentadores,<br />
desdenhando inclusive do seu paladar e do gosto por<br />
tremoços ³.