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Prefácio do autor<br />

Não existem bons negócios em sociedades falidas. Por enquanto, só a elite dos empresários sabe disso.<br />

Este <strong>livro</strong> quer ajudar a promover uma mudança de atitude, com o objetivo de acelerar a<br />

transição de um mundo baseado num modelo esgotado de relações ambientais, econômicas e sociais para<br />

a nova era da <strong>sustentabilidade</strong>. Trata de temas que interessam a todos os viventes neste mundo, mas<br />

dirige-se principalmente aos empresários, executivos e funcionários de empresas de qualquer porte –<br />

pequenas, médias e grandes – que, de alguma forma, já perceberam ou intuíram o esgotamento do modelo<br />

atual e estão em busca de alternativas. Destina-se aos administradores e empreendedores responsáveis,<br />

capazes de almejar a continuidade de seus negócios para muito além de suas próprias existências<br />

individuais.<br />

Durante algum tempo lutei com a dificuldade de explicar a <strong>sustentabilidade</strong>. Buscava uma<br />

palavra que resumisse todo um conjunto de idéias novas e que pudesse ser entendida da mesma forma por<br />

todos – do grande empresário ao menos graduado de seus empregados, do mais poderoso homem público<br />

ao mais humilde dos cidadãos. Cada vez mais me convenço de que a melhor tradução para a idéia de<br />

<strong>sustentabilidade</strong> está na palavra “sobrevivência”. Seja a do planeta, a da espécie humana, a das sociedades<br />

humanas ou a dos empreendimentos econômicos.<br />

Sobrevivência já era para mim uma palavra-chave desde que, ainda criança, na década de 50,<br />

comecei a perceber o processo de degradação física, biológica e social da Baía de Guanabara e seu<br />

entorno. Fui educado tendo como suporte o modesto salário de uma professora primária, minha mãe, e<br />

observando cavalos-marinhos nas praias da Ilha do Governador. Acompanhei o desaparecimento de<br />

ambos: dos cavalos-marinhos, exterminados pelo crescente lançamento de despejos industriais e de<br />

esgotos nas águas antes límpidas da baía, e do poder de compra dos salários das professoras. Aprendi que<br />

as anomalias e doenças da sociedade contemporânea vêm também do afastamento do ser humano do<br />

contato e troca com a natureza. Foi o que me motivou, ao me tornar engenheiro, a escolher a<br />

especialização em Engenharia Ambiental.<br />

Mais tarde, como técnico, depois diretor e, em seguida, presidente da Feema (Fundação Estadual<br />

de Engenharia do Meio Ambiente), tive oportunidade de observar e enfrentar a arrogância do poder<br />

político e do poder econômico no trato com as coisas da natureza. Mais de uma vez tive que literalmente<br />

chamar a polícia para conseguir entrar numa unidade industrial e avaliar o grau de degradação provocado.<br />

Aconteceu, por exemplo, com a hoje falida Companhia Mercantil e Industrial Ingá, na baía de Sepetiba.<br />

Ou no caso do navio Mineral Star, abandonado na baía da Ilha Grande, com uma grande carga de óleo e<br />

minério que ameaçava vazar. Foi preciso colocar seu comandante na cadeia para criar um impasse<br />

internacional e obrigar os proprietários a retirar a embarcação. Não raro o enfrentamento se dava com o<br />

próprio governo. Nos anos 80, foi preciso interditar, a um grande custo político, o terminal da Petrobras<br />

na baía da Ilha Grande para que a poderosa estatal finalmente aceitasse investir no controle dos freqüentes<br />

vazamentos de óleo que emporcalhavam as praias da região. Às vésperas da Rio-92, a II Conferência<br />

Internacional de Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, uma equipe<br />

da Feema detectou nível de poluição extremamente alto no Túnel Santa Bárbara, uma das principais vias<br />

da cidade. Foi necessário proibir a passagem de ônibus e caminhões no túnel, provocando o caos no<br />

trânsito, para obrigar a prefeitura a investir em obras de ventilação e isolamento das duas pistas.<br />

Por outro lado, a experiência na Feema também me mostrou que as soluções de força, ainda que<br />

a força da lei, têm limitações. Ao deixar a agência de controle ambiental, ainda no começo da década de<br />

90, eu já percebia que o desenvolvimento sustentável só pode se dar no contexto de um mundo em que o<br />

poder é equilibradamente dividido em três pólos: o governo, as empresas, a sociedade. Um mundo<br />

tripolar. Ou, como já bem definiu o World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), um<br />

mundo em que juntemos “a inovação e a prosperidade que os mercados propiciam, a segurança e as<br />

condições básicas que os governos dão e os padrões éticos que a sociedade civil reclama”. 1<br />

Se, de um lado, os cavalos-marinhos da infância me revelaram a importância do respeito à<br />

natureza para garantir a manutenção da vida neste planeta, de outro, a experiência de participar da criação<br />

do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) me revelou a<br />

importância do respeito à sociedade para a sobrevivência dos empreendimentos humanos. Em 1998, um<br />

ano após a criação do CEBDS, fui convidado a participar de um evento na Holanda que viria a<br />

transformar e reorientar a atuação do Conselho e a minha própria visão de mundo. Foi um encontro<br />

1 World Business Council for Sustainable Development. The Business Case for Sustainable Development.<br />

Documento de trabalho. 2001.

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