livro-fernando-almeida-sustentabilidade
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Prefácio do autor<br />
Não existem bons negócios em sociedades falidas. Por enquanto, só a elite dos empresários sabe disso.<br />
Este <strong>livro</strong> quer ajudar a promover uma mudança de atitude, com o objetivo de acelerar a<br />
transição de um mundo baseado num modelo esgotado de relações ambientais, econômicas e sociais para<br />
a nova era da <strong>sustentabilidade</strong>. Trata de temas que interessam a todos os viventes neste mundo, mas<br />
dirige-se principalmente aos empresários, executivos e funcionários de empresas de qualquer porte –<br />
pequenas, médias e grandes – que, de alguma forma, já perceberam ou intuíram o esgotamento do modelo<br />
atual e estão em busca de alternativas. Destina-se aos administradores e empreendedores responsáveis,<br />
capazes de almejar a continuidade de seus negócios para muito além de suas próprias existências<br />
individuais.<br />
Durante algum tempo lutei com a dificuldade de explicar a <strong>sustentabilidade</strong>. Buscava uma<br />
palavra que resumisse todo um conjunto de idéias novas e que pudesse ser entendida da mesma forma por<br />
todos – do grande empresário ao menos graduado de seus empregados, do mais poderoso homem público<br />
ao mais humilde dos cidadãos. Cada vez mais me convenço de que a melhor tradução para a idéia de<br />
<strong>sustentabilidade</strong> está na palavra “sobrevivência”. Seja a do planeta, a da espécie humana, a das sociedades<br />
humanas ou a dos empreendimentos econômicos.<br />
Sobrevivência já era para mim uma palavra-chave desde que, ainda criança, na década de 50,<br />
comecei a perceber o processo de degradação física, biológica e social da Baía de Guanabara e seu<br />
entorno. Fui educado tendo como suporte o modesto salário de uma professora primária, minha mãe, e<br />
observando cavalos-marinhos nas praias da Ilha do Governador. Acompanhei o desaparecimento de<br />
ambos: dos cavalos-marinhos, exterminados pelo crescente lançamento de despejos industriais e de<br />
esgotos nas águas antes límpidas da baía, e do poder de compra dos salários das professoras. Aprendi que<br />
as anomalias e doenças da sociedade contemporânea vêm também do afastamento do ser humano do<br />
contato e troca com a natureza. Foi o que me motivou, ao me tornar engenheiro, a escolher a<br />
especialização em Engenharia Ambiental.<br />
Mais tarde, como técnico, depois diretor e, em seguida, presidente da Feema (Fundação Estadual<br />
de Engenharia do Meio Ambiente), tive oportunidade de observar e enfrentar a arrogância do poder<br />
político e do poder econômico no trato com as coisas da natureza. Mais de uma vez tive que literalmente<br />
chamar a polícia para conseguir entrar numa unidade industrial e avaliar o grau de degradação provocado.<br />
Aconteceu, por exemplo, com a hoje falida Companhia Mercantil e Industrial Ingá, na baía de Sepetiba.<br />
Ou no caso do navio Mineral Star, abandonado na baía da Ilha Grande, com uma grande carga de óleo e<br />
minério que ameaçava vazar. Foi preciso colocar seu comandante na cadeia para criar um impasse<br />
internacional e obrigar os proprietários a retirar a embarcação. Não raro o enfrentamento se dava com o<br />
próprio governo. Nos anos 80, foi preciso interditar, a um grande custo político, o terminal da Petrobras<br />
na baía da Ilha Grande para que a poderosa estatal finalmente aceitasse investir no controle dos freqüentes<br />
vazamentos de óleo que emporcalhavam as praias da região. Às vésperas da Rio-92, a II Conferência<br />
Internacional de Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, uma equipe<br />
da Feema detectou nível de poluição extremamente alto no Túnel Santa Bárbara, uma das principais vias<br />
da cidade. Foi necessário proibir a passagem de ônibus e caminhões no túnel, provocando o caos no<br />
trânsito, para obrigar a prefeitura a investir em obras de ventilação e isolamento das duas pistas.<br />
Por outro lado, a experiência na Feema também me mostrou que as soluções de força, ainda que<br />
a força da lei, têm limitações. Ao deixar a agência de controle ambiental, ainda no começo da década de<br />
90, eu já percebia que o desenvolvimento sustentável só pode se dar no contexto de um mundo em que o<br />
poder é equilibradamente dividido em três pólos: o governo, as empresas, a sociedade. Um mundo<br />
tripolar. Ou, como já bem definiu o World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), um<br />
mundo em que juntemos “a inovação e a prosperidade que os mercados propiciam, a segurança e as<br />
condições básicas que os governos dão e os padrões éticos que a sociedade civil reclama”. 1<br />
Se, de um lado, os cavalos-marinhos da infância me revelaram a importância do respeito à<br />
natureza para garantir a manutenção da vida neste planeta, de outro, a experiência de participar da criação<br />
do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) me revelou a<br />
importância do respeito à sociedade para a sobrevivência dos empreendimentos humanos. Em 1998, um<br />
ano após a criação do CEBDS, fui convidado a participar de um evento na Holanda que viria a<br />
transformar e reorientar a atuação do Conselho e a minha própria visão de mundo. Foi um encontro<br />
1 World Business Council for Sustainable Development. The Business Case for Sustainable Development.<br />
Documento de trabalho. 2001.