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S276[online]

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comprometeu o ato de amar a uma lógica

funcionalista, imediata de dependência, no

relacionamento com o outro. Em vez de se

emancipar precipitou-se em vertigem. A

função de educar o outro, enquanto ato de

Amor, não se resume apenas à transmissão

de conhecimento, mas à dotação de ferramentas

e competências humanas, valores

éticos, de consciência moral, que permitam

ao outro ser humano, se tornar melhor pessoa

e só desse modo, ousar sonhar e se

tornar capaz mudar o mundo. Parafraseando

Paulo Freire, “quando a educação não

é libertadora, o sonho do oprimido é ser

opressor.” E este mundo que primeiro nos

seduziu, determinou-nos na sua própria sedução,

como se tratasse de uma estratégia

de autolegitimação dos nossos próprios

erros históricos, que preferimos

esquecer, no encanto da sedução. Voltámos

a ter medo de amar, porque ficou

inculturado o medo de sofrer, o medo

de fracassar. Uma cultura de palimpsesto,

que tem medo de amar, o outro, o diferente,

o até então desconhecido, tantas

vezes tem escolhido semear o ódio,

a vingança, em vez de escolher construir

pontes de encontro entre a diferença,

entre Culturas. «Não tentemos satisfazer

a sede de liberdade bebendo da taça

da amargura e do ódio», apelava Martim

Luther King. Estamos conscientes das

transformações apocalípticas do planeta,

mas nada ousamos fazer. Quisemos

fundamentar uma apologética do Amor,

tratando-a como uma síntese incompleta

da sociologia das emoções, demonstrando

os seus fracassos históricos da

humanidade, como se preferissemos generalizar

o fracasso das utopias de Amor

incondicional, pelo outro ser humano,

para evitarmos sofrer, para não amar,

tão perdidamente. O que faz distar, por

isso, o ser humano das máquinas, é essa

capacidade tão bela de estar disposto a

amar tão irracionalmente, alguém, sem

qualquer contrapartida, matemática ou

natural. Zygmunt Bauman, escreve no

seu ensaio “Amor líquido” que, «aceitar

esse preceito – de Amar - é um ato de fé;

um ato decisivo, pelo qual o ser humano

rompe a couraça dos impulsos, ímpetos

e predileções "naturais" e assume uma

posição que se afasta da natureza, que é

contrária a esta.» O ser humano permanece

assim, pelo Amor, mais distantes

das feras, distinto ainda, dos anjos – na conceção

Aristotélica - mas talvez, mais próximo

deles e do Derradeiro. Mas até as feras,

também nutrem seus momentos de Amor…

faltou coragem, de tirar tantos seres humanos

da solidão que os fez aproximar de feras.

Parafraseando Bauman, «acredite – no

Amor - porque é absurdo» – e por isso, só

pode ser mesmo verdadeiro. Criaram-nos

a ilusão, de que o único modo de estar no

mundo, em sociedade, era corresponder a

tudo o quanto o mundo abstrato nos impele,

levando ao extremo a apócope do Amor

- fundamento contrário à própria natureza

animalesca do humano. Qual será afinal o

fundamento de amar incondicionalmente

O Pensador “Le Penseur” (1904). Auguste Rodin.

Escultura em bronze. Altura: 186.

O Pensador original encontra-se nas 'Rodin Gates'.

o próximo, o desconhecido, o outro como

nós? Sermos diferentes de animais, de máquinas,

ou de anjos, sermos autenticamente

genuínos, verdadeiros humanos, inocentes

como crianças, para que não mais importe

aquilo que somos, mas aquilo que de bom

podemos dar, ao outro, para transformar o

mundo. Somos apenas metade, à espera de

semelhante Amor. s

saber MAIO 2020

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