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Quisemos saber como, ou de que
forma, os dias da pandemia afetaram
autores e escritores, e assim
surgiu esta conversa em jeito de análise
à atualidade a que muito amavelmente
Francisco Fernandes nos respondeu via
email a partir da sua casa, no Funchal.
Os livros e a atualidade na análise deste
antigo professor que se formou em
Economia, Mestre em Gestão do Desporto,
Doutor em Motricidade Humana na
especialidade de Ciências do Desporto e
Doutor ‘Honoris Causa’ em Administração
Pública. A sua bibliografia conta três
dezenas de obras nas áreas da investigação
em Gestão do Desporto, biografia,
dramaturgia (narrativa e romance)
e literatura infanto-juvenil.
Como é que a pandemia afetou a produção
literária, de uma forma geral?
- Para os que se dedicam à escrita, creio
que tem sido um momento de inspiração e
criatividade. No que a mim diz respeito, fui
desafiado a produzir um conto passado no
Porto Santo, e o contexto não foge à pandemia
e às restrições e mobilidade. Na área
de escrita para um público infantojuvenil
têm mesmo surgido inéditos aos quais o
tema da pandemia não é alheio. Mas há,
efetivamente um reflexo ao nível do mercado
livreiro que se tem procurado adaptar
às vendas online, os alfarrabistas mostram-
-se mais ativos e com sites ou blogues mais
atrativos. Claro que, a atividade editorial foi
reduzida, as Feiras do Livro adiadas, as atividades
das bibliotecas escolares suspensas,
mas é, espero, apenas uma pausa que
se resolverá com a retoma... Adiei várias
idas às escolas, algo que faço com frequência
e que espero retomar no próximo ano
letivo, no âmbito das iniciativas à volta do
livro, da leitura e da escrita criativa. O que é
necessário, por agora, é que se reforcem os
hábitos de leitura, que se dê lugar ao conto
junto dos mais novos, que se ocupe o tempo
com livros, que se estabeleçam diálogos
entre o autor e o leitor. Recentemente desafiei
com conjunto de autores que publicaram
na Madeira e vários contadores de
histórias, a gravarem vídeos com os seus
contos, e criámos em conjunto um canal
no youtube, o Canal Contos, https://www.
youtube.com/channel/UCBoRkoUBON_
xdNL2DFhvDZw/videos que já reuniu mais
de vinte vídeos que ajudam as crianças e
as famílias a preencher esta pausa social e
escolar.
Será mais complicado para os artistas,
escritores, agentes culturais, retomarem
a sua atividade do que outros setores?
- Creio que sim. Quando se fala na atividade
económica e no emprego, o trabalho na
área artística e cultural raramente aparece
na lista das preocupações mas os seus
agentes têm experiência de se fazer ouvir
e vão marcar a sua presença. Se há algo
que a pandemia traz é uma maior atenção
aos outros e ao que nos rodeia. O distanciamento,
que quanto a mim erradamente
se vem chamando de social, é apenas distanciamento
de contacto físico. As pessoas
não se distanciaram nem se esqueceram
umas das outras, pelo contrário, desejam
ardentemente aproximar-se. Vamos com
calma! Imagino que os agentes culturais se
vão transformar num mecanismo privilegiado
de aproximação das pessoas.
Como é que será o regresso à “normalidade”?
- Temo que possa ser “explosivo” num primeiro
momento, e até que haja um “sobressalto
pandémico” que nos leve a assumir
coletivamente que o problema não
acabou. Mesmo que haja um passo atrás,
e que voltem a ser impostas restrições,
terá o efeito benéfico de ajudar à assunção
coletiva do problema e à sua verdadeira
dimensão. Com a minha experiência de
proximidade ao desporto de competição,
permito-me comparar esta situação àquela
de uma equipa que ganha sempre e, no
dia que perde um jogo, o treinador, diz: “estávamos
mesmo a precisar disto!”. Espero
que não seja necessário “perder um jogo”, e
que todas as campanhas e recomendações
surtam o efeito desejado. Normalidade,
mesmo, só depois da vacina e, ainda assim,
tardará a chegar a todos, nunca será 100%
eficaz e será preciso lidar com os “anti-vacina”
… Basta olhar para o que se passa com
outras doenças, designadamente a gripe
comum, muito mais devastadora do que o
Covid19, e para a qual já existe, desde há
muito, vacina, e continua a ser menosprezada
e desconsiderada por muitos.
Para os que se dedicam à
escrita, creio que tem sido
um momento de inspiração
e criatividade
saber maio 2020
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