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Coletânea Digital Cinema e Memória

O Projeto Cineclube nas Escolas promoveu uma coletânea de textos de Profissionais da Secretaria Municipal de Educação da Cidade do Rio de Janeiro. A coletânea trazem memórias afetivas surgidas através de filmes e telas de cinema.

O Projeto Cineclube nas Escolas promoveu uma coletânea de textos de Profissionais da Secretaria Municipal de Educação da Cidade do Rio de Janeiro.
A coletânea trazem memórias afetivas surgidas através de filmes e telas de cinema.

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Cinema e Memória: Meu

Filme de Afeto


MARCELO CRIVELLA

PREFEITURA DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO

TALMA ROMERO SUANE

SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

REJANE PEREIRA FARIA DA COSTA

SUBSECRETARIA DE ENSINO

CARLA ANDREA DIAS CELESTINO

GERÊNCIA DE LEITURA

Aline Scalercio

Fátima França

Gisele Azevedo

Gustavo Castro

Janaina Nascimento

Lilian Jacques

Márcia Romualdo

Marcello Andriotti

Marize Celestino

Martha Rocha

Nádia Ziade

Priscilla Almeida

Rita Vaz

Rosiane de Souza

Silvana Huguenin

Valéria Preza

---------------

ELABORAÇÃO

EQUIPE E/SUBE/GEL


Carta ao Leitor

Estimados Profissionais da Educação da Cidade do Rio de Janeiro,

A E/SUBE/Gerência de Leitura (GEL) da Secretaria Municipal de Educação (SME), promoveu

em 2020, a Seleção de Textos de Profissionais da Rede Pública Municipal de Ensino, sobre o tema

Cinema e Memória: Meu Filme de Afeto!

Para a abordagem temática, considerou-se que, dentre os diversos aspectos da identidade

contemporânea, é a memória o mecanismo principal para a construção dessa identidade, social e local,

reconhecendo-se a importância da produção escrita como expressão do pensamento e da arte, na

difusão da cultura literária nas escolas e bibliotecas. Diante do cenário de isolamento social, face à

pandemia do corona vírus, fez-se ainda mais importante resgatar memórias afetivas e propor a seleção

de registros contemporâneos, o que se constituiu na organização de uma coletânea de textos inéditos,

acerca da linguagem do cinema, do gênero memória, com embasamento subjetivo e ideário coletivo,

em toque de afeto e engajamento.

Participaram do concurso, professores, bibliotecários, profissionais de apoio, agentes

administrativos e gestores, oportunizando-se, assim, um processo democrático, por meio de uma ação

do Projeto Cineclube nas Escolas, lançado para todos os profissionais lotados na SME.

Objetivamos reconhecer a importância dos textos memorialísticos como expressão cultural,

estimular a produção escrita de profissionais da Rede, valorizar o papel da construção do autor, instigar

a criatividade e a imaginação, resgatar a memória afetiva através da linguagem audiovisual, refletir

sobre o tema proposto e diversificar a prática profissional, incentivando os participantes à leitura, à

escrita e à criação, fortalecendo-se e evidenciando-se competências socioemocionais através do

visionamento de obras cinematográficas.

Estamos felizes em entregar valorosa coletânea, patrimônio literário da cidade, memória afetiva

de profissionais de um Rio em prosa, luz, câmera e ação!

Carla Andréa Dias Celestino

Gerência de Leitura/SME


“Memória é algo curioso. Um aroma, um acorde, uma cor pode ter o poder mágico de nos

transportar a um mundo que, muitas vezes, flutua em meio às brumas do passado”. (Amanda Pereira)

“Filmes são, tecnicamente, o resultado do sequenciamento rápido de fotografias e a ilusão de

movimento. Eles são, simbolicamente, muito mais do que isso. Desde o primeiro momento que

conseguimos capturar e reproduzir eventos, utilizamos esta tecnologia para contar histórias... Somos

contadores de histórias por natureza. Bons filmes nos fazem rir, chorar e questionar, mas também nos

fazem conectar, dialogar e compartilhar a experiência com outro”. (Bruno Costa)

“Tinha eu duas horas e quarenta minutos, o tempo do épico, para conseguir um beijo e um

carinho no escurinho do cinema. Caprichei no visual, no perfume, comprei uns chocolates, separei

meus parcos tostões para pagar as entradas. No cinema, quando a luz apagou e as primeiras cenas

da guerreira de Domrémy surgiram na tela, iniciei minhas investidas”.

(Fábio de Jesus)

“Sou professora de língua portuguesa e assistir a um filme nacional, em que uma professora

aposentada escreve cartas para pessoas que não sabem ler nem escrever, desperta em mim fascínio e

angústia”. (Helena Correia)

“As músicas, então... Que sensações determinadas trilhas sonoras nos dão! Medo, alegria,

angústia, compaixão, êxtase... Acabamos criando uma tal relação imagética entre a trilha sonora e

determinadas cenas preferidas, que tornam-se indissociáveis. Basta o toque duma pequena cifra

melódica para a cena toda voltar à mente, e nos fazer rir, chorar, amar, vibrar novamente”... (Karine

Dull)

“...Manoela convenceu-me a comprar um peixinho para que ela cuidasse. Fomos a uma loja

especializada e levamos o nosso Nemo para casa. Era como se para ela, ali estivesse alguém como

ela, com suas particularidades e suas delícias também. Assim como o peixinho do filme, Manoela

sempre foi muito corajosa e forte, nunca se sentiu diferente, nem mesmo se lamentou...

impressionante como a ficção se aproximara tanto da nossa realidade”. (Mônica Alves)

“Encerro esse texto citando nosso ilustre brasileiro Ariano Suassuna: “Tenho duas armas para

lutar contra o desespero, a tristeza e até a morte: o riso a cavalo e o galope do sonho. É com isso que

enfrento essa dura e fascinante tarefa de viver.” (Paula Burkardt)

“Eu era muito pequena, não sei dizer ao certo quantos anos eu tinha, mas ainda me lembro de

ver cartazes espalhados pela cidade que anunciavam o filme E.T.: O Extraterrestre. Ir ao cinema

naquela época não era algo barato, mas uma tia, que tinha uma melhor condição financeira, decidiu


levar todos os sobrinhos ao cinema. Foi uma tremenda aventura! Lembro-me das filas imensas, do

cheiro de pipoca, da bagunça com os primos e daquela ansiedade de entrar pela primeira vez naquela

sala tão escura para assistir a um filme”. (Roberta Salim)

“Saíamos da Travessa João de Matos, no bairro de Quintino Bocaiúva, seguíamos pela antiga

Avenida Suburbana até o início da Padre Nóbrega, que era onde ficava o cinema Bruni Piedade (com

galeria e tudo!). Cinema de rua na minha infância era uma das maiores diversões. Tinha sala para

tudo que é lado da cidade. E Seu Fernando só levava a gente por dois motivos: porque os filmes eram

lançados nas nossas férias e porque tinha preço popular, mão de vaca que só ele. Nem lembro se ele

pagava de todo mundo”... (Suely Bastos)

“Hoje, depois de muitos anos de vida e, podendo revisitar este filme, vejo que nem sempre

temos respostas certas ou positivas para as propostas que a vida nos traz. E, às vezes, como Kelton,

também precisamos derreter e nos misturar até renascermos como nuvem para regar a terra que nos

embrutece”. (Tania Regina)

Porque é afetiva e mágica, a memória não se acomoda a detalhes que a confortam; ela se alimenta de

lembranças vagas, telescópicas, globais ou flutuantes, particulares ou simbólicas, sensível a todas as

transferências, cenas, censuras ou projeções (...) A memória se enraíza no concreto, no espaço, no gesto, na

imagem, no objeto. NORA, Pierre Between. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Projeto

histórica, nº 10. São Paulo: PUC, 1993

Fellini. Grande talento, diretor e roteirista do cinema italiano. Capturou a mente

das pessoas com a televisão, na verdade entre o que se contou e a memória de como

realmente foi, na tensão entre o homem moderno e os rudimentos do passado.

Fundou uma nova maneira de contar o mundo - a partir de sonhos e memórias,

lembranças mágicas e poéticas que conseguia compilar de sua querida Itália. Fellini

é reconhecido como um dos maiores e mais influentes cineastas de todos os tempos!

Frederico Fellini completaria 100 anos em 2020. Em seu centenário, nossa

homenagem, nossa inspiração!

Forte abraço,

Equipe E/SUBE/GEL

28 de outubro de 2020


SUMÁRIO

TEXTOS PREMIADOS:

Amanda Pereira da Silva Ribeiro ----------------------------------------------------------------------------- 12

Bruno Costa Guimarães-----------------------------------------------------------------------------------------14

Fábio de Jesus de Carvalho------------------------------------------------------------------------------------ 16

Helena Correia de Faria---------------------------------------------------------------------------------------- 18

Karine Dull Sampaio Madureira Barbosa-------------------------------------------------------------------- 20

Monica Alves de Lima------------------------------------------------------------------------------------------ 22

Paula Burkardt Moreira----------------------------------------------------------------------------------------- 24

Roberta Salim Rodrigues Seabra de Andrade---------------------------------------------------------------- 26

Suely Alvarenga da Silva Bastos---------------------------------------------------------------------------------- 28

Tânia Regina Pinto de Almeida-------------------------------------------------------------------------------- 30

TEXTOS SELECIONADOS:

1ª CRE

1) Juliana Figueiredo Gomes de Oliveira -------------------------------------------------------------- 33

2) Laerte Cardoso Mourão-------------------------------------------------------------------------------- 35

3) Monique D’Oliveira Mendes de Queiroz------------------------------------------------------------ 37

2ª CRE

4) Adriana Soares Magdaleno --------------------------------------------------------------------------- 40

5) Andréa Lúcia Cavalcanti ------------------------------------------------------------------------------ 42

6) Ângela Moreira de Melo------------------------------------------------------------------------------- 44

7) Carolina Maria de Sales ------------------------------------------------------------------------------- 46

8) Lauriene Silva Mól Dutra ----------------------------------------------------------------------------- 48

9) Lúcia Maria Santos Maciel --------------------------------------------------------------------------- 50


10) Maria Aparecida de Castro Souza ------------------------------------------------------------------- 52

11) Silvana Florentina da Cunha ------------------------------------------------------------------------- 54

12) Thamyres Ribeiro Dalethese ------------------------------------------------------------------------- 56

3ª CRE

13) Beatriz da Silva Fraga Nunes-------------------------------------------------------------------------- 59

14) Camilla Marques de Barros Oliveira ---------------------------------------------------------------- 61

15) Fabiane Leal de Sampaio Nunes---------------------------------------------------------------------- 63

16) Glória Regina Carvalho de Sousa -------------------------------------------------------------------- 65

17) Luiz Paulo Ribeiro de Lima --------------------------------------------------------------------------- 67

18) Marcia Ramos de Oliveira ---------------------------------------------------------------------------- 69

19) Marilene Calado----------------------------------------------------------------------------------------- 71

20) Waldyr Salles Filho ------------------------------------------------------------------------------------ 73

4ª CRE

21) Danubia Souza Marques da Silva -------------------------------------------------------------------- 76

22) Douglas Eduardo da Conceição Diógenes---------------------------------------------------------- 78

23) Hélio Novaes------------------------------------------------------------------------------------------- 80

24) Luiz Claudio Motta Lima ---------------------------------------------------------------------------- 82

25) Priscila Azeredo da Silva ----------------------------------------------------------------------------- 84

26) Rogério Cesar Ornellas Cardoso -------------------------------------------------------------------- 86


5ª CRE

27) Amanda Mitke Maria de Lacerda Rocha Hoppe Rocha ------------------------------------------ 89

28) Andréa Moutinho da Costa Santos------------------------------------------------------------------- 91

29) Evaldo Lemos Rodrigues Júnior --------------------------------------------------------------------- 93

30) Leonardo Silva Torres--------------------------------------------------------------------------------- 95

31) Marcelo Ferreira de Assis----------------------------------------------------------------------------- 97

32) Maria Aparecida Ramos da Silva ------------------------------------------------------------------- 99

33) Patricia de Andrade dos Santos--------------------------------------------------------------------- 101

34) Patricia Maria dos Santos Santana----------------------------------------------------------------- 103

35) Roberta Batista Pereira------------------------------------------------------------------------------ 105

36) Rosana de Souza Pereira Carvalho----------------------------------------------------------------- 107

37) Vanessa Rodrigues dos Santos --------------------------------------------------------------------- 109

6ª CRE

38) Aline Melo de Carvalho de Macedo Amaral ------------------------------------------------------ 112

39) Cícero César Sotero Batista ------------------------------------------------------------------------- 114

40) Fatima do Socorro Feitosa Ferreira ---------------------------------------------------------------- 116

41) Flávia de Oliveira Narciso Peixoto ---------------------------------------------------------------- 118

42) Giovanna Silva Fernandes--------------------------------------------------------------------------- 120

43) Ilceia de Oliveira Pinheiro--------------------------------------------------------------------------- 122

44) Marcelo Alves Teixeira ------------------------------------------------------------------------------124

45) Queila de Castro Martins Memoria ---------------------------------------------------------------- 126


7ª CRE

46) Clarice Maria Silva Campos------------------------------------------------------------------------- 129

47) Eliana Maria Lopes dos Santos de Andrade ------------------------------------------------------ 131

48) Felipe Mello Campos -------------------------------------------------------------------------------- 133

49) Gustavo da Motta Silva ----------------------------------------------------------------------------- 135

50) Jeferson Lima de Carvalho Junior ----------------------------------------------------------------- 137

51) Silvania Alves dos Santos--------------------------------------------------------------------------- 139

52) Zelma Candido de Souza ---------------------------------------------------------------------------- 141

53) Zeyla Victória Conceição Brandão Duarte ------------------------------------------------------- 143

8ª CRE

54) Aline de Barros Nunes de França ------------------------------------------------------------------- 146

55) David Borges Berkowicz --------------------------------------------------------------------------- 148

56) Erika Brasil de Oliveira Barreto------------------------------------------------------------------- 150

57) Isabella Martins Dias Ferreira ---------------------------------------------------------------------- 152

58) Katia Zandomingo Soares -------------------------------------------------------------------------- 154

59) Mônica Andréa dos Santos-------------------------------------------------------------------------- 156

60) Nádia Maria Monroy Garcez ----------------------------------------------------------------------- 158

61) Taíse Nascimento Paraná --------------------------------------------------------------------------- 160


9ª CRE

62) Ricardo Chagas Ferreira------------------------------------------------------------------------------ 163

10ª CRE

63) Camilla Sousa de Mello ------------------------------------------------------------------------------ 166

64) Cássio Luis Veríssimo------------------------------------------------------------------------------- 168

65) Luana de Fatima Machado Ignacio Rodrigues---------------------------------------------------- 170

11ª CRE

66) Elisabete da Silva Toledo---------------------------------------------------------------------------- 173

67) Fabiola Guimarães Estima Paiva ------------------------------------------------------------------- 175

68) Maria Lucia de Oliveira Amaral-------------------------------------------------------------------- 177

69) Vera Lúcia Bulhões Góes Bastos ------------------------------------------------------------------ 179

ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

70) Tadeu Goulart de Almeida Costa ------------------------------------------------------------------ 182


TEXTOS

PREMIADOS


Nome: Amanda Pereira da Silva Ribeiro.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (06.22.201) CIEP Poeta Fernando Pessoa

Título do Filme: ... E o Vento Levou

Memória é algo curioso. Um aroma, um acorde, uma cor pode ter o poder mágico de nos

transportar a um mundo que, muitas vezes, flutua em meio às brumas do passado. Quando eu tinha uns

sete anos, ouvi uma música na televisão e tive uma sensação que, até aquele momento, era

desconhecida para mim: a garganta se apertou, os olhos marejaram e algo dentro de mim parecia que

estava se dissolvendo. Lembro ter-me escondido no banheiro para deixar correr aquela tímida lágrima

enquanto o coração voltava ao seu compasso normal. Era a primeira vez que eu ouvia o tema de “... E

o vento levou.”

Segundo Carl Jung, a humanidade possui uma herança psicológica que é compartilhada com

todos os membros da espécie e, desse modo, cada indivíduo tem acesso a uma memória desligada de

experiência. Talvez, o inconsciente coletivo de Jung explique o motivo pelo qual “...E o vento levou”

me emociona há mais de trinta anos: a lembrança de um tempo em que a guerra e a fome devastavam

uma terra próspera sustentada pela cruel escravidão, onde a vida humana estava abaixo dos valores

fraternos fundamentais.

Mas, possivelmente, essa conversa toda se resuma a algo muito mais simples e pessoal: minha

saudosa avó Jurema, mãe da minha mãe, era uma filha de imigrantes que havia provado na vida o lado

não muito doce da laranja. Começou a trabalhar cedo em fábricas e, como muitas moças do seu tempo

− ela era de 1933 − não teve oportunidade para ir à escola. Lia muito pouco, porém sabia calcular

muito bem e, em pouco tempo, casou-se, teve seus filhos. Cozinhava maravilhosamente, tanto que todo

Natal me aflora à mente o cheirinho de comida de vó. Mas e então? Onde o filme entra nessa história?

Meu filme favorito era também o filme favorito dela.

Não descobri isso logo, todavia eu conversava fácil com minha avó. A senhorazinha sentada

em sua poltrona me contava altas histórias de seus pais que vieram para o Brasil escondidos em um

navio. Falava-me de um namorado que teve, o qual ficou rico e era dono de um mercado; contava

como veio se casar com seu vizinho − meu vô − e de como os quatro filhos, levados como só, lhe

12


fizeram nascer mais cabelos brancos do que ela podia contar. Até que um dia, minha avó me contou

um desejo não realizado: ela gostaria de aprender a ler fluentemente. Queria ler para entender histórias

da Bíblia e para ver filmes legendados. Eu estava, então, cursando o Normal. Diariamente, ia até sua

casa para lhe dar as lições. Mostrava as letras, explicava os fonemas, contudo a melhor parte era quando

a conversa tomava outro rumo e a gente começava a falar dos filmes! Ahhh! Os filmes... Eram uma

fonte inesgotável de deleite para nós duas. A velhinha sabia de cór os nomes dos atores, as falas dos

personagens, o ano em que viu no cinema. Ela adorava e eu, que tinha ido até lá para ensinar, ficava

encantada de aprender tanto.

Toda aula começava com uma letra e acabava com a gente falando como o Clark Gable era

charmoso: “Aquilo que era homem bonito”... ela sempre dizia isso. Falávamos dos vestidos da Scarlett

O’Hara e de como ela era boba em não perceber que o amor estava bem ali, em sua frente. Minha avó

também se lembrava das épocas em que ela mesma passou fome, da Segunda Guerra e de como era,

assim como Scarlett, uma sobrevivente.

Eu sempre dizia à minha avó que gostaria de herdar suas fotografias. Em uma das minhas

incursões em seu acervo, encontrei diversas fotos suas com aquele penteado elaborado de fitinhas,

idênticas às modelos do filme. Assim como encontrei fotos do meu avô com o “bigodinho de canalha”

do Rhett Butler...tudo explicado. Minha avó nos deixou em um dia dos namorados há pouco mais de

dez anos. Eu herdei suas fotografias, seu amor pelos filmes e, ainda hoje, apesar de não haver mais a

dor da perda, a lagrimazinha solitária sempre escapa quando escuto o tema de abertura de “...E o vento

levou”. Sinto falta de nossas conversas, do olhar de cumplicidade, do seu perfuminho de vovó, mas

agora tudo isso está guardado em um lugar especial, de onde o vento jamais poderá levar.

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Nome: Bruno Costa Guimarães.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (03.12.002) Escola Municipal Alcide de Gasperi

Título do Filme: Blade Runner – O Caçador de Androides

Filmes são, tecnicamente, o resultado do sequenciamento rápido de fotografias e a ilusão de

movimento. Eles são, simbolicamente, muito mais do que isso. Desde o primeiro momento que

conseguimos capturar e reproduzir eventos, utilizamos esta tecnologia para contar histórias. Este é um

paradigma comum de nossa espécie: pinturas nas paredes, desenhos no solo arenoso, escrituras na

pedra, tinta no papel, etc. Somos contadores de histórias por natureza. Bons filmes nos fazem rir, chorar

e questionar, mas também nos fazem conectar, dialogar e compartilhar a experiência com outro. São

ao mesmo tempo uma experiência individual e coletiva.

Para essa redação eu escolhi falar do filme “Blade Runner: o caçador de androides”, não apenas

por ser um excelente filme em seu próprio mérito, mas por carregar um grande peso na minha relação

afetiva com meu pai. Crescer na década de 90 significava que você, o espectador, tinha que saber

quando o filme seria exibido na televisão e ligar no canal e na hora certa para não perder. Alguns filmes

ocupavam horários tardios demais para uma criança assistir, outros filmes nem chegavam à TV aberta

porque não geravam audiência suficiente. Esse é o caso de Blade Runner, filmado em 1982, um filme

já antigo na minha infância e que não conquistou espaço nas emissoras.

Eu vi o filme somente depois de adulto, mas já era um fã da obra do diretor Ridley Scott décadas

antes. Como isto é possível? Simples: meu pai. Sempre que ele vinha para o Rio de Janeiro nos finais

de semana, eu ansiava para ouvir suas histórias. Eu ficava em silêncio, atento aos detalhes das tramas

de filmes antigos que ele narrava. Foi dessa forma que eu fui transportado do banco de trás do seu

Santana para uma futurista e decadente Los Angeles, onde prédios enegrecidos pela fuligem de

chaminés industriais sombreavam a cidade, pirâmides opressoras de mega corporações e ruas sujas

com sinais de neon brotavam na minha imaginação com fascinação e, simultaneamente, desgosto.

Assim eu me envolvi no suspense noir de Rick Deckard, um detetive aposentado que é levado de volta

à ativa para caçar um grupo replicantes, humanos artificialmente produzidos para trabalho escravo que

se revoltaram contra seus mestres, a corporação Tyrell.

O filme é muito mais do que um típico thriller de detetives, é uma jornada que desafia e provoca

o espectador a questionar a natureza humana. “Mas replicantes são humanos?”, eu perguntei.

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“Depende, o que te faz humano?”, respondeu meu pai. “Eu nasci, eles foram criados.”. “Você foi criado

por mim, assim como eles nasceram em uma fábrica.”, ele disse. Estas conversas profundas entre filho

e pai sobre a essência da natureza humana são o que eu mais lembro do filme.

Por isso que, uma década depois, descansando anonimamente em uma prateleira da locadora do bairro,

eu avistei a caixa de DVD do filme. Naquela noite eu vi, pela primeira vez, a história que eu já conhecia

tão bem. Ter a imaginação transformada em cenas de altíssimo valor de produção me transportaram

novamente, dessa vez não para Los Angeles, mas para o banco de trás do Santana. A minha história

com o filme finalmente se completara, imaginação e arte se juntaram em uma experiência que me

reconectou com um momento de minha infância. Essa é a mágica dos filmes, eles nos apresentam

mundos fantásticos, mas também nos marcam com uma experiência íntima e pessoal, que carregamos

conosco para sempre. Ou talvez não, talvez sejam experiências feitas para carregarmos somente o

suficiente, como os replicantes. Arte é o produto de uma geração, eventualmente fadada a ser esquecida

para dar espaço ao novo, vivendo apenas enquanto duram as memórias de seus apreciadores. Citando

o último monólogo do androide Roy, as palavras expressam meus sentimentos pelo filme

perfeitamente: “Eu vi coisas que vocês não imaginariam. Naves de ataque em chamas ao largo de

Órion. Eu vi raios-c brilharem na escuridão próximos ao Portal de Tannhäuser. Todos esses momentos

se perderão no tempo, como lágrimas na chuva.”. Mas até se perderem, sempre estarão guardados em

minhas memórias.

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Nome: Fábio de Jesus de Carvalho.

Função: Professor I - História

Unidade de Lotação: (03.13.042) Escola Municipal Goiás

Título do Filme: Joana D`Arc de Luc Besson

Em 1999 o mundo trazia muitas novidades. Vivia-se a expectativa da chegada dos anos 2000,

a virada do milênio e suas previsões de apocalipses futuros. Falava-se no bug do milênio, por exemplo,

que poderia causar colapso tecnológico por conta das falhas em sistemas e softwares. Jornais eram

inundados por informações sobre isso. Em termos econômicos, os países se organizavam em blocos

comerciais em suas regiões. A Europa começava a testar uma moeda única, inclusive.

Como bom garoto, de 15 anos, nada disso me dizia respeito. Vivia eu para duas coisas: a

primeira delas era o futebol. Atuava como goleiro em escolinhas de futsal e times amadores. Caçava

testes para atuar em grandes clubes do país. Ao mesmo tempo que tentava conciliar isso com as

exigências do Ensino Médio. A segunda força motriz de minha vida, enquanto jovem mancebo

imberbe, era a conquista das meninas. Nisso não era tão melhor que ser goleiro. Considero que era

mediano nas duas atividades. Mas eu tentava com afinco. A timidez, no caso das meninas, me fazia

falhar muito. Enfim...

Conheci Marieta em um curso que fazia. Acho que de inglês. Era uma menina muito bonita.

Era negra, cabelos encaracolados e usava uns óculos de aros arredondados. Sempre de batom rosa

claro. Ela se sentava ao meu lado. Tinha um perfume que parecia uma das maravilhas do mundo.

Superando o cheio do empadão domingueiro da minha mãe. Sim, o melhor cheiro para mim era o do

empadão de minha mãe. Julguem-me! Ela lia bastante de tudo. Dentre os diversos papos havia o

cinema! Ela era cinéfila. Eu não.

Conversa vai e conversa vem. Decidi chamá-la para ver um filme novo. Nada sabia de cinema,

mas fui procurar ler para ter o que dizer. Soube que saiu a produção Joana D`Arc, de Luc Besson.

Passei a semana lendo sobre o filme para no sábado convidá-la ao cinema. Aceitou! Ficou marcada a

sessão para o domingo, dia seguinte, 18 horas.

Claro que a história da guerreira francesa imaculada pouco me interessava. Não sabia quem era

Luc Besson, não tinha ideia do tamanho de Dustin Hoffman e nem sabia que o papel principal cabia a

atriz Milla Jovovich. Mari, a chamava assim pois já éramos íntimos, sabia tudo e me dizia tudo.

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Tinha eu duas horas e quarenta minutos, o tempo do épico, para conseguir um beijo e um

carinho no escurinho do cinema. Caprichei no visual, no perfume, comprei uns chocolates, separei

meus parcos tostões para pagar as entradas. No cinema, quando a luz apagou e as primeiras cenas da

guerreira de Domrémy surgiram na tela, iniciei minhas investidas.

Ar-condicionado forte. Mari estava com frio. Ela foi se chegando. E eu cercava aquele castelo,

chamado Marieta, como os ingleses nas batalhas do filme, cercavam os exércitos franceses do século

XV. Mas o beijo, o grande objetivo, não saía. E eu não queria fazer papel de idiota e mantive um cerco

respeitoso.

Bem, as coisas não iam evoluindo além do aconchego. Era bom, mas faltava algo. Sei que a

temperatura das cenas foram subindo e meu interesse em Marieta foi esfriando. Daquele mato não saía

coelho. Fui me interessando mais por Joana que pelo meu par. Especialmente pelos papos da Santa

Guerreira na prisão com sua consciência. Achei isso uma enorme sacada do roteiro.

Acabou o filme. A esperada morte na fogueira da protagonista. Marieta e eu saímos do cinema.

Na despedida veio o beijo. Mas foi sem graça. Parecia o cumprimento de um protocolo. Fomos

estranhamente nos afastando e Mari saiu do curso e nunca mais a vi. Mais tarde fui saber que voltara

com um namorado naquela tarde, antes de me encontrar, e ficou constrangida de me beijar na porta do

cinema. Ela se foi, mas meu gosto por cinema e o carinho por esse filme ficaram. No fim das contas,

valeu. Joana D`Arc não era mesmo o melhor filme para iniciar um romance.

17


Nome: Helena Correia de Faria.

Função: Professor I - Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (06.22.002) Escola Municipal Antonio Maceo

Título do Filme: Central do Brasil

Com todo meu afeto: Central do Brasil

Era um sábado de 1998. Eu caminhava ansiosa para a grande sala de cinema. Central do Brasil

me aguardava. A ideia de conhecer a história da professora que “vendia palavras”, escrevendo cartas,

me encantava. Saber ler e escrever era o superpoder de Dora, vivida por Fernanda Montenegro,

protagonista da história.

Sou professora de língua portuguesa e assistir a um filme nacional, em que uma professora

aposentada escreve cartas para pessoas que não sabem ler nem escrever, desperta em mim fascínio e

angústia. Parece contraditório a princípio, mas é possível se encantar com o poder de ser letrado, e se

entristecer com a situação da professora, que precisa se sustentar, e a vida ainda mais sofrida de quem

está nos índices de analfabetismo do país.

Em um Brasil ainda no período pré-internet, não são apenas as cartas escritas por Dora que

viajam levando boas notícias ou tristes relatos. Em um determinado momento do filme, é a professora

que viaja do Rio de Janeiro, acompanhando o menino Josué, vivido por Vinícius de Oliveira, para o

nordeste, região tão carente do país. O menino havia acabado de perder a mãe e viaja com Dora para

ficar com o pai. É esse o momento que mais guardo em minhas lembranças. Apesar de uma viagem

tão cheia de atribulações, a protagonista volta a acreditar na bondade e passa a ver o lado bom da vida.

E essa transformação foi a escrita de cartas que lhe proporcionou.

O filme Central do Brasil e a atriz Fernanda Montenegro foram indicados ao Oscar de melhor

filme estrangeiro e melhor atriz. E mesmo não tendo conquistado a estatueta, o filme, em nada, perde

a beleza da vida apresentada em sua narrativa. ( A vida é bela, de Roberto Benigni, foi o escolhido.)

Assim como a Primeira Dama do cinema, da televisão e do teatro segue enaltecida.

Depois de vinte anos de seu lançamento, tive a oportunidade de rever o filme. E me transportei

para aquele sábado de 1998. Era uma nova primeira vez. Central do Brasil, dirigido por Walter Salles,

ainda guarda o encanto da simplicidade mesmo com as transformações tecnológicas ocorridas durante

esse período. Afinal, já não se escrevem tantas cartas assim...

18


E em uma carta, assim me despediria: Central do Brasil, com muito afeto, você me acompanha

em casa e nas escolas por onde vou. Levo palavras que se espalham e se multiplicam... Ah! Continuo

escrevendo cartas.

19


Nome: Karine Dull Sampaio Madureira Barbosa.

Função: Professor I - História

Unidade de Lotação: (11.20.007) Escola Municipal Rotary

Título do Filme: Flashdance – Em Ritmo de Embalo

Cinema e Memória, meu filme de afeto

Assistir a um bom filme é um grande prazer, uma aventura sem limites.

Entregar-se emocionalmente às cenas de seus filmes favoritos, acreditando na possibilidade de

ser partícipe daqueles momentos, é algo mágico, uma verdadeira viagem a outras realidades e épocas.

Pode-se retroceder ou avançar no tempo através das cenas e dos personagens de um bom filme.

A ambientação perfeita, as vestimentas escolhidas com cuidadosa pesquisa histórica, a arrumação dos

cabelos, a maquiagem, os chapéus, sapatos, enfeites... Tudo é espetáculo, verdadeira manifestação da

Arte.

As músicas, então... Que sensações determinadas trilhas sonoras nos dão! Medo, alegria,

angústia, compaixão, êxtase... Acabamos criando uma tal relação imagética entre a trilha sonora e

determinadas cenas preferidas, que tornam-se indissociáveis. Basta o toque duma pequena cifra

melódica para a cena toda voltar à mente, e nos fazer rir, chorar, amar, vibrar novamente...

A década de 1980 foi bastante rica em filmes com movimento e dança. Um deles, “Flashdance:

Em ritmo de Embalo”, para mim foi especial.

Narra a história de Alex, uma dançarina autodidata, extremamente talentosa, que apresentava

suas coreografias em um bar noturno, e trabalhava de dia como soldadora, duas situações que

representavam uma quebra de tabus em minha perspectiva familiar tradicional.

Após idas e vindas de incertezas e inseguranças, e com o apoio de amigos e de um amor

verdadeiro, Alex se inscreve para uma audição no Conservatório da região. Apesar de muito concorrido

e totalmente diferente de tudo o que ela vivenciara até então, consegue a vaga, pois, na “escola da

vida”, reunira uma bagagem de estilos artísticos diferentes que lhe propiciaram criar uma coreografia

única, autêntica e contagiante.

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“Flashdance” tornou-se um filme de afeto em minha adolescência porque também era

bailarina, e buscava minha afirmação na Dança.

Incontáveis vezes senti e vivi a história de Alex, imaginando se um dia poderia dançar assim...

A música tema até hoje me faz reviver a experiência de subir ao palco do Teatro, enxergar a

platéia e... já não enxergar mais nada...

Bons filmes, como este, nos deixam pensando, imersos em seu universo próprio, e neste

constate imaginar, reinventamos e mergulhamos nos personagens, a ponto de nos tornarmos

protagonistas também. Essa emoção persiste muitos anos depois, quando revisitamos as memórias

afetivas e assistimos as cenas outra vez.

A vida toma rumos diversos, nem todos os sonhos se realizam exatamente do modo como os

idealizamos.

Hoje, me dedico à Arte de Educar, mas o amor pela Dança me leva a participar de projetos que

envolvam a expressão corporal de diferentes formas.

A emoção que sentia ao ver as cortinas do palco se abrirem, deu lugar à emoção de entrar na

sala de aula, diante de um público totalmente desafiador, e buscar chamar atenção para as minhas

“Histórias”, de todas as maneiras diferentes e atraentes que puder.

Assim como a protagonista do meu Filme de Afeto, também preciso estar disposta a aprender

com os outros e reconhecer as ajudas que recebo, numa constante troca de vivências. Esta, para mim,

é a razão de ser do professor, e a de um grande artista.

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Nome: Monica Alves de Lima.

Função: Professor I – Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (02.09.025) Escola Municipal Francisco Campos

Título do Filme: Procurando Nemo

Procurando Nemo, achei a mim mesma

Em 2003, foi lançado o filme Finding Nemo, mais conhecido como Procurando Nemo, uma

belíssima produção da Disney. O personagem principal é um peixe-palhaço, Nemo, que é capturado

por um mergulhador, quando está na escolinha, naquele que seria seu primeiro dia de aula. Longe de

seu pai, que tanto o advertiu quanto aos perigos dos mares, Nemo se torna amigo dos companheiros de

“cativeiro”, um aquário no consultório de um dentista. Marlin, o pai de Nemo, então, começa uma

busca incansável por seu filho.

Bem, todas as crianças queriam ver esse filme, e a minha filha não era diferente. Manoela, nesta

época, tinha 6 anos. Preciso contemplar que minha filha nascera com uma doença rara: Epidermólise

Bolhosa. Uma doença genética que provoca a formação de bolhas na pele e se manifesta já no

nascimento. As crianças com Epidermólise Bolhosa são conhecidas como “Crianças Borboletas”,

pois a pele é tão fina e frágil como as asas de uma borboleta.

Dito isso, voltemos à sala de cinema. Naquele dia, estávamos ansiosas, ela mais ainda, pois

não era sempre que podíamos sair, não só pelas bolhas, mas também porque financeiramente era

inviável, uma vez que os curativos eram bastante caros. Assim que começou a história, fui

surpreendida pela excitação da minha borboletinha, pois ela percebeu que Nemo possuía uma

nadadeira menor do que a outra, o que o fazia diferente dos demais peixinhos. Ela gritou: “Mamãe,

eu tenho um pé menor igual ao dele!!!!!! Também poderei nadar!!!!!!!!!!

Durante alguns segundos, emudeci. Minha filha ficou com o pé direito atrofiado, pois àquela

época, os curativos formavam botas que apesar de protetoras, impediam o correto crescimento dos

pés. As lágrimas caíam sem que eu conseguisse me controlar. Manoela me abraçava como se

tivéssemos ganhado um prêmio e repetia aquela frase várias vezes. Foi inesquecível. Conversamos

sobre o filme durante alguns dias e pudemos absorver dele tantas lições de amor e cumplicidade nas

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relações interpessoais, lições de amizade, e sobretudo, a certeza de que ser diferente é absolutamente

normal.

Por fim, Manoela convenceu-me a comprar um peixinho para que ela cuidasse. Fomos a uma

loja especializada e levamos o nosso Nemo para casa. Era como se para ela, ali estivesse alguém

como ela, com suas particularidades e suas delícias também. Assim como o peixinho do filme,

Manoela sempre foi muito corajosa e forte, nunca se sentiu diferente, nem mesmo se lamentou. Era

impressionante como a ficção se aproximara tanto da nossa realidade.

E como não falar da natação!!! Tão logo a natação da escola começou, matriculei a minha

borboleta para realizar o desejo de alcançar mais essa meta. Manoela, assim como o Nemo do filme,

nunca gostou muito de ouvir que ela não conseguiria fazer algo por consequência da doença, e assim

foi feito. Hoje, com 23 anos, nada em qualquer mar, independente das marés, se é que me entendem...

Como não amar esse filme?

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Nome: Paula Burkardt Moreira.

Função: Professor II

Unidade de Lotação: (07.24.011) Escola Municipal Vice-Almirante Álvaro Alberto da Motta e

Silva

Título do Filme: O Auto da Compadecida

O DIA DO JUÍZO FINAL

“A morte é a única certeza de que temos na vida”. Quem nunca ouviu essa frase?

Independentemente de crença ou religião, essa é uma verdade incontestável, é uma ideia com a qual

somos todos obrigados a conviver durante a nossa breve existência na Terra. Mesmo assim, muitos de

nós levamos a vida como se fôssemos eternos, deuses imortais.

Ariano Suassuna, paraibano, dramaturgo, professor, romancista, ensaísta e poeta, escreveu em

1955, uma peça de teatro intitulada “O Auto da Compadecida”. Essa obra repleta de referências e

tradições regionais nordestinas foi adaptada para o cinema em 2000, sob a direção de Guel Arraes. A

versão cinematográfica, sofreu algumas modificações em relação ao livro, mas a essência da obra foi

apresentada de forma linda e impecável a milhares de brasileiros que tiveram a oportunidade de

conhecer um pouco da obra de Suassuna.

Não me cabe narrar o filme nessas poucas linhas, mas sim comentar o porquê dessa obra receber

o título de “meu filme de afeto”. O desfecho do filme é apresentado diante de um tribunal. É o dia do

juízo final. Os réus são: o padeiro e a mulher dele, o padre e o bispo, um cangaceiro sanguinário

chamado Severino e, por fim, João Grilo, que durante sua vida toda agiu enganando as pessoas e

mentindo para alcançar seus objetivos, se é que podemos dizer que “sobrevivência” pode ser

considerado um “objetivo”. Os pecados que estão sendo julgados são os mais conhecidos entre nós,

aqueles que estão presentes no nosso dia-a-dia, nos noticiários e em nossas vidas de meros mortais –

embora muitas vezes não percebamos isso, como já foi escrito no primeiro parágrafo. Adultério, roubo,

cobiça, ganância, assassinato são alguns dos crimes em questão, julgados por uma tríade composta por

Jesus Cristo, o Diabo, ou o Encourado e pela Virgem Maria, invocada por João Grilo na esperança de

remissão daquelas almas perdidas. Assim segue o julgamento, o Diabo com seus argumentos rígidos,

seguindo ideias predeterminadas e descontextualizadas e a Virgem Maria justificando tais erros,

baseando suas defesas em sentimentos que são inerentes ao ser humano, o medo do sofrimento, da

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solidão e da morte. Jesus Cristo tem a última palavra, a João Grilo é dada uma nova chance de continuar

a vida na Terra, enquanto os outros são enviados ao purgatório.

O filme nos leva a refletir sobre a qualidade de nossos julgamentos. Paramos para pensar antes

de julgar alguém? Certamente é mais fácil acusar o outro do que olharmos para nós mesmos, assim

nos livramos de nossas culpas e fraquezas. “Empatia”, a palavra da moda, deve ser menos falada e

mais praticada. Viver não é fácil, a vida não é uma estrada em linha reta, e sim o caminho que traçamos

ao percorrê-la.

Encerro esse texto citando nosso ilustre brasileiro Ariano Suassuna: “Tenho duas armas para

lutar contra o desespero, a tristeza e até a morte: o riso a cavalo e o galope do sonho. É com isso que

enfrento essa dura e fascinante tarefa de viver.”

Que assim seja.

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Nome: Roberta Salim Rodrigues Seabra de Andrade.

Função: Professor I - Inglês

Unidade de Lotação: (03.13.014) Escola Municipal Medeiros e Albuquerque

Título do Filme: E.T.: O Extraterrestre

Meu Filme de Afeto

Tenho poucas memórias da minha primeira infância. Apenas alguns flashes passam pela minha

mente – a maioria em família ou na escola. Lembro-me de alguns momentos muito felizes e de outros

em que senti medo. De todas as experiências, aquilo que me tocou de forma especial - seja por um

motivo bom ou ruim - é o que pareço reter na minha memória de longo prazo. Assim aconteceu com a

minha primeira experiência no cinema.

Eu era muito pequena, não sei dizer ao certo quantos anos eu tinha, mas ainda me lembro de

ver cartazes espalhados pela cidade que anunciavam o filme E.T.: O Extraterrestre. Ir ao cinema

naquela época não era algo barato, mas uma tia, que tinha uma melhor condição financeira, decidiu

levar todos os sobrinhos ao cinema. Foi uma tremenda aventura! Lembro-me das filas imensas, do

cheiro de pipoca, da bagunça com os primos e daquela ansiedade de entrar pela primeira vez naquela

sala tão escura para assistir a um filme.

Quando entramos na sala, me deparei com aquela tela gigantesca cheia de luzes; o trailer já

havia começado. Então percebemos que a sala de cinema estava extremamente cheia e que não

conseguiríamos nos sentar juntos. Minha tia me pegou pela mão e me disse: - Não me solte e olhe para

o chão para não cair; as luzes vão te guiar. Eu estava fascinada com tudo aquilo que os meus sentidos

me permitiam experimentar e ansiosa ao tentar enxergar aquela multidão no escuro. Senti uma mistura

de alegria, medo e falta da minha mãe naquele momento. Afinal de contas, eu era apenas uma criança

pequena. No entanto, resolvi ser corajosa e enfrentar aquele mundo até então desconhecido. Não

conseguíamos achar um lugar para todos e o filme estava prestes a começar. Foi então que decidimos

nos sentar pelo chão - nos degraus do cinema - para assistir o tão esperado filme. Foram nessas

condições que me fascinei ao ver o meu primeiro filme: E.T. de Steven Spielberg. Foi realmente um

momento memorável.

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Nos sentamos ao chão e, logo que me concentrei, esqueci a multidão ao meu redor e mergulhei

naquela aventura. Não obstante minha pouca idade, não dormi em qualquer momento. Aproveitei todas

as sensações que o filme me proporcionava e vivi cada momento daquela história que fazia parte do

meu círculo mágico, onde ficção e realidade se confundiam. A cena do E.T. voando de bicicleta foi

certamente a mais marcante. O filme foi simplesmente maravilhoso e, para mim e para os meus primos,

ele não terminou quando a sessão foi encerrada.

Na saída do cinema, ainda estava atônita com aquela experiência e com a história que acabara

de assistir. Minha tia comprou sanduíches e chocolates para todos e meu primo mais velho comprou o

boneco do E. T. que estava à venda nos arredores do cinema.

Quando chegamos em casa, ainda extasiados, brincamos até ao anoitecer. Demos lugar à nossa

criatividade, assumimos o papel de personagens e escrevemos a nossa própria história. Nossa casa

virou um grande cenário, roupas e lençóis viraram figurinos e protagonizamos as nossas próprias cenas.

Não podia faltar a famosa cena do E.T. voando de bicicleta e a famosa frase: E.T., telefone, minha

casa. Dirigimos, atuamos, improvisamos e nos divertimos muito.

Aquele dia foi certamente inesquecível. A experiência que o filme nos trouxe, bem como todo

aquele aprendizado, nos ajudou a desenvolver habilidades de vida e outras competências que são

construídas desde a infância e que são utilizadas durante toda a nossa vida. Hoje em dia meus primos

e eu somos todos adultos, mas ainda nos lembramos com muito carinho daqueles momentos em família

que E.T nos proporcionou. O filme foi muito mais que uma simples história de ficção, mas uma

oportunidade de aprendizado e crescimento.

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Nome: Suely Alvarenga da Silva Bastos.

Função: Professor I - Matemática

Unidade de Lotação: (06.22.019) Escola Municipal Emílio Carlos

Título do Filme: Cinderelo Trapalhão (1979)

Lily-Dedé com Lu casaria

Eu morava no 46. Marcávamos todos na porta lá de casa, porque era o Seu Fernando, meu pai,

que ia nos levar pra passear. Também ia o meu irmão Nando, que desde pequeno me chamava de Dedé

– porque não sabia falar Suely! Lembro da Nete, da Rosa, mas essa não sei se ia sempre não. Faz muito

tempo e a memória falha. Tinha as duas Fátimas, uma branquinha-branquinha e outra pretinhapretinha.

E tinha o Luiz Antonio, que morava no 42. Meu vizinho de muro.

Saíamos da Travessa João de Matos, no bairro de Quintino Bocaiúva, seguíamos pela antiga

Avenida Suburbana até o início da Padre Nóbrega, que era onde ficava o cinema Bruni Piedade (com

galeria e tudo!). Cinema de rua na minha infância era uma das maiores diversões. Tinha sala para tudo

que é lado da cidade. E Seu Fernando só levava a gente por dois motivos: porque os filmes eram

lançados nas nossas férias e porque tinha preço popular, mão de vaca que só ele. Nem lembro se ele

pagava de todo mundo...

Todos os filmes dos Trapalhões que estreavam, a gente estava lá. Eles eram a galera favorita

da minha galera. E de muita gente, porque as salas ficavam lotadas, o que era ótimo pra eu sempre

sentar do lado do Luiz Antonio sem meu pai perceber. Quando apagava a luz, era como se pulássemos

o muro. O menino do 42 vinha se chegando com o dedo mindinho na minha mão e ficávamos de mãos

dadas rindo das palhaçadas do Didi, Dedé, Mussum e Zacarias. Milhões de espectadores no Brasil

olhavam para as telas e ninguém assistia ao começo da minha primeira paixão atrapalhada.

Eram paródias anuais, e a gente lá: em 1972, “Ali Babá e os 40 ladrões” e Luiz nem beijo me

roubava. Em 73, “Aladim e a Lâmpada Maravilhosa” e eu só tinha o desejo do filme não acabar. Vai

ver por isso lançaram outro filme no mesmo ano: “Robin Hood”. Veio a “Ilha do Tesouro”, o “Planeta

dos Macacos” e dentro das “Minas do Rei Salomão” a gente ainda namorava escondido. Em janeiro

de 78, com os “Trapalhões na Guerra dos Planetas”, estava lá o Luiz vencendo o Seu Fernando na lábia

pra poder me namorar. Os Trapalhões não tinham concorrência. O Luiz também não, esse Cinderelo

Trapalhão.

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O Cine Bruni Piedade era pra nós como o único filme dos anos 70 que não assistimos: era a

nossa “Ilha dos Paqueras”. O namoro durou sete anos. O casamento mais trinta e seis. Nosso primeiro

filho se formou em Cinema e a mais nova foi quem estrelou o seu primeiro filme.

Até hoje amamos todos os gêneros, mas dá para perceber por que sempre preferimos uma boa

comédia.

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Nome: Tânia Regina Pinto de Almeida.

Função: Professor I – Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (01.23.004) EMOC II Juan Antonio Samaranch

Título do Filme: A Família de DIONTI

A Família Dionti

“E, se a gente pudesse pedalar para trás?”. Um filme sensível e verdadeiro sobre a vida e nossas

escolhas. Com roteiro e direção de Alan Minas, o filme “A Família Dionti”, do gênero realismo

fantástico, nos conta a história de um pai que cria seus filhos sozinho depois que a mãe, de forma

misteriosa, abandona-os. O cenário se confunde com a própria narrativa e as inferências estão presentes

a todo momento na trama.

O pai, que trabalha em uma olaria, transformando barro em tijolo, espera pelo retorno da esposa

todas as noites vestido de branco e olhando a lua. O filho mais velho Serino, castigado pela triste

realidade da vida e pela ausência da mãe, não consegue sonhar “sonhos bonitos” e, quando chora, suas

lágrimas são transformadas em areia barrenta. Mesma areia que forma o cenário de “Angustura” lugar

onde vive a família Dionti. O irmão caçula, vive a idade da descoberta do amor pela decidida Sofia.

Ela vive em um circo que chega à cidade e acampa em “Dores da Vitória”. “Angustura” e “Dores da

Vitória” são placas do cruzamento da cidade que separa o casal.

Kelton, o personagem principal da trama, é um menino criativo, sonhador e questionador que

desde o início da narrativa, derrete de amor pela jovem Sofia. Os dois se encontram na escola, local

em que sentam lado a lado. Muitas aventuras e histórias os dois vivem juntos. Desde o estranho

derretimento de Kelton, que o suposto “médico” da cidade não consegue resolver, até a notícia da

partida de Sofia, que acaba, literalmente, por derretê-lo.

As duas cenas finais afetaram-me bastante. São intensas e muito emocionantes. A primeira é a

que Serino ao ver o irmão derretido, tira sua blusa e tentar revivê-lo juntando o barro (da terra) e a água

que estão rodeando a bicicleta e seus pertences. Já a segunda, é a nuvem de chuva que acompanha

Sofia no caminho de volta para o circo e faz com que a menina sinta a presença de Kelton na chuva

que cai só sobre ela.

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Neste filme, pude reviver meu passado, no qual muitas vezes, assim como o protagonista,

também quis emprestar meus sonhos a meu pai. Não porque fosse órfã de mãe ou porque tivesse um

irmão mais velho que não conseguisse “sonhar bonito”, mas para poder entender suas atitudes tão duras

diante da vida e do novo. Hoje, depois de muitos anos de vida e, podendo revisitar este filme, vejo que

nem sempre temos respostas certas ou positivas para as propostas que a vida nos traz. E, às vezes,

como Kelton, também precisamos derreter e nos misturar até renascermos como nuvem para regar a

terra que nos embrutece.

Algumas falas das personagens ainda soam vivas, mesmo depois do término do filme em minha

memória: “Nem todo barro vira tijolo, meu amigo.”, “Todo mundo é feito de água!”, “O destino da

mãe é o do menino. Isso é coisa de família.”; “Menino gigante, o que quer sonhar?”; “Eu queria ser rio

cheio de barco com gente dentro”; “E se o mundo todo estivesse dormindo?” e “O que poderia

acontecer se a gente pedalasse para trás?". Falas que não só impactaram a mim, como fazem até hoje,

mas também a todos os alunos e professores que estiveram presentes a uma sessão “cineclubista”, no

Cine Joia, em Copacabana, Rio de Janeiro, há quatro anos.

Foi um encontro muito importante a todos os alunos que levei. Os menores ficaram curiosos de

como o menino tinha derretido e os adolescentes pareciam que entendiam o que era derreter de amor.

Já na escola, pudemos reviver algumas cenas do filme, realizar debates e confeccionar placas que

ilustravam os cruzamentos de nossas histórias de vida.

Assim como o pequeno Kelton, posso dizer que “se eu pudesse pedalar para trás”, não

esqueceria as marcas de afeto deixadas em mim pelo filme "A família Dionti”, que são cada vez mais

necessárias e “presentes” em minha memória de vida.

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Nome: Juliana Figueiredo Gomes de Oliveira.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (01.03.502) Escola Municipal Canadá

Título do Filme: Escritores da Liberdade

Escritores da Liberdade: Meu Filme de Afeto

O cinema costuma ser meu preferido lugar de entretenimento, de pesquisa, de ensino e

aprendizagem e até mesmo de autoanálise. Sempre encontro nas histórias e nas imagens que se

apresentam, os personagens, as falas, as reflexões e os contextos que me inspiram e mesmo me

deslocam, de onde quer que eu esteja, para um local mais inteligente, mais criativo, onde a ilusão

ensina a realidade e a realidade segue mais esperançosa. Há um filme especial que sempre me socorre

em minhas desilusões pedagógicas e me leva ao meu lugar favorito: a escola e tudo que eu sonho que

ela possa ser - com aquele toque clássico de “baseado em fatos reais” para chorar ainda mais ao pensar

que essa história fantástica aconteceu de verdade. Assim, o longa “Escritores da Liberdade”, de 2007,

é o meu filme de afeto.

A história se passa na cidade de Los Angeles, nos anos 90, onde, nos bairros mais

desfavorecidos, se vive uma verdadeira guerra movida por tensões étnico-raciais e a professora, Erin

Gruwell, se depara com os desafios de uma turma numa escola pública que sobrevive nesse contexto

de violência e exclusões. Ela está diante de jovens vistos como problemáticos e incapazes de aprender.

Além da resistência dos estudantes, a professora não percebe nessa escola nenhum movimento de

aproximação com esses jovens tratados como criminosos por educadores que alegam ser praticamente

impossível ensinar alguma coisa a eles e se conseguirem “passar” um pouco de “disciplina”, já será

um grande feito.

Infelizmente, não somente nesse filme, mas em muitas escolas onde já atuei, é comum ver

professores culpando a “pobreza” de seus alunos pelo fracasso escolar; culpam a desestrutura familiar,

a violência no entorno escolar, etc. Raramente, escola e docentes questionam as estratégias de ensino,

as temáticas escolhidas, os projetos, as relações que estabelecem com as crianças e jovens, a

distribuição dos espaços na escola – não associam o que observam como “fracasso” com as questões

curriculares escolhidas. Estas e tantas questões são trazidas pela Sra. Gruwell, como o ponto de partida

na construção de um processo altamente autêntico e eficaz de aprendizagem.

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O que mais me atrai nesse filme é a inquietação incessante da professora, que não aceita as

incoerências administrativas da escola e enfrenta o que tiver de enfrentar para afetar seus alunos. Para

isso, a Sra. G. joga fora alguns planejamentos, ideias preconcebidas e se abre ao novo, ao que ela

mesma desconhece, mas sensivelmente entende que precisa se reinventar e criar para esses jovens,

com eles, a partir deles. Ela se assume como educadora de sucesso na sua arte e aventura apaixonada

de educar, edificando uma teia de empatias que deve ser a base desse lugar tão diversamente especial

que é uma sala de aula em uma escola.

Quando se fala em atuação pedagógica em locais de baixo poder aquisitivo, comumente a

associamos à supressão de carências, no sentido de estar ligada a “pessoas carentes”. Percebo que, se

partirmos desse pressuposto, ao apenas enumerar as faltas desses estudantes, acabamos por ignorar a

riqueza de suas experiências e potencialidades. O papel dos educadores deve estar voltado a educar

indivíduos para refletirem sobre sua realidade, convidando-os a transformá-la ao invés de negá-la - e

é exatamente isso que brilhantemente a Sra. G. faz! Ao valorizar as tocantes narrativas daqueles jovens,

com suas reais trajetórias, a professora não só destrói esse estigma de carência, como eleva seus alunos

a protagonistas de suas histórias, que, mesmo dolorosas, podem ser contadas, escritas e ainda reescritas

- que poder!

“Escritores da Liberdade” ilustra e exemplifica com louvor qualquer reflexão sobre Educação.

Sou professora recém-chegada à rede pública e sempre recorro a esse filme para, pedagogicamente,

me animar, quando quero pensar na escola e em seu poder de transformar as realidades. Esta é uma

história de sucesso porque, a meu ver, possui uma sensível proposta curricular que vai muito além do

próprio currículo, por se tratar de um processo sensível e original, absolutamente conectado com a

realidade e os corações dos estudantes. A Sra. G. é real e mostra a potência imensurável de uma prática

pedagógica viva na construção do mundo que queremos.

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Nome: Laerte Cardoso Mourão.

Função: Professor I - Espanhol

Unidade de Lotação: (01.07.012) Escola Municipal Gonzaga da Gama Filho

Título do Filme: Blade Runner – O Caçador de Androides

Cinema e memória, meu filme de afeto - Memórias, lágrimas e chuva

Ano 1982, tarde chuvosa e eu, um adolescente de 16 anos, tinha um encontro, no cinema!

Depois de uns desentendimentos, o romance parecia se firmar. Pena que o tempo não...

Sim! O encontro era naquele dia e o cinema se chamava Tamoio, o mais badalado e concorrido

da cidade de São Gonçalo. As estreias eram de fazer fila e, nem sempre se tinha a sorte de encontrar

ingressos pra uma sessão. Naquela época, não se imaginava comprar as entradas e a pipoca antes, por

aplicativo, direto de um aparelho que estivesse na palma de nossas mãos. Isso pareceria coisa de ficção,

viagem futurista.

Assim como futurista era o enredo de um filme que prometia ser a sensação da temporada:

Blade Runner- “O Caçador de Androides”, direção: Ridley Scott (que já tinha dirigido Alien- o 8º

passageiro) e era estrelado por ninguém menos que Harrison Ford. Esse filme e a situação que agora

narro marcaram minha vida por um bom tempo. Parecia que não tinha como dar errado o encontro,

parecia cena de cinema.

Na história do filme, o ano era 2019 e a cidade era Los Angeles. Androides se rebelaram contra

os cientistas que os criaram para servir aos humanos, mas morriam precocemente. A tecnologia tinha

evoluído tanto que os carros podiam planar pelo ar, faziam-se conversas por vídeo, os outdoors tinham

alta definição e passavam propagandas até mesmo nas janelas dos arranha-céus. Tudo isso dava algum

movimento e colorido àquele ambiente sujo e soturno da cidade que jazia lá embaixo.

E, no alto da telona, se via uma cidade e uma sociedade perdida, onde tudo parecia não ter mais

sentido ou valor: as relações humanas, o afeto e até mesmo o respeito à vida. Isso era o que se previa

no roteiro do filme. Imagina se de 2019 em diante a vida seria assim!

Estávamos na década de 80 e a ditadura militar dava os primeiros sinais de enfraquecimento.

Parecia que era permitido sonhar. E, como em um sonho, na hora marcada, a minha linda veio de jeans

e blusa branca, toda molhada e despenteada. Meu coração deu uma descompassada quando a vi saltar

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do ônibus, no ponto próximo ao cinema. Eu era amador nessa coisa de romance. Um selinho, uma

tentativa de abraço que virou um seguir de mãos dadas sem muito calor,... um sorriso sem mostrar os

dentes... algo parecia diferente do imaginado.

E o clima de sonho também foi quebrado quando chegamos à bilheteria. Não havia fila. Na

verdade, não havia ninguém. Antes de entrar, me certifiquei de que o filme era aquele mesmo e de que

a sessão iria acontecer. No saguão, ela não quis pipoca, um drops, um chiclete, nada. A sala estava

praticamente vazia. Sentamos lado a lado, mas, entre nós, parecia haver uma poltrona gigantesca,

ocupada por silêncios.

Às vezes ruidoso, mas muito impactante, o filme nos fez esquecer por tempos a realidade

estranha que se delineava entre nós dois. Um olhar fixo na tela como fuga, uma mão que fugia à carícia.

Até que, em um dos momentos de silêncio, durante a perseguição do herói ao líder dos replicantes, ela

se volta pra mim e diz que o problema não era comigo, mas que para nós era o fim. Ainda me deu

uma última olhada, se levantou e saiu.

Eu fiquei ali sozinho, sem entender, sem reação, esperando o outro final. Quando, de repente,

notei que também no filme o jogo virou. O caçador virou a caça. O líder dos replicantes, em seus

instantes finais de vida, diz para o herói, após salvá-lo da morte e contar coisas que viu e viveu: “Todos

esses momentos vão se perder no tempo... como lágrimas na chuva.”. Curiosamente, tudo o que os

androides queriam era mais tempo de vida e tudo o que eu queria era mais tempo pra viver aquela

paixão adolescente que se acabava ao entrar naquela sala.

Na saída, as portas se abriam direto pra rua. Já era noite. E o tapa do real, após aqueles instantes

na sala de sonhar, era sempre dolorido. A chuva tinha parado e iria ser mais difícil disfarçar as lágrimas.

Olhei para o céu e vi que o tempo firmou. Pena que o romance... não.

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Nome: Monique D’Oliveira Mendes de Queiroz.

Função: Professor de Educação Infantil

Unidade de Lotação: (01.02.502) CIEP Avenida dos Desfiles I

Título do Filme: Escritores da Liberdade

Indubitavelmente, filmes podem nos impactar de forma positiva ou negativa, além do mero

entretenimento, podem nos proporcionar novas reflexões e apresentar novos olhares sobre diferentes

perspectivas, algumas vezes conseguem nos melhorar enquanto seres humanos e profissionais, dentro

dessa ótica, trago o filme “Escritores da Liberdade”, que influenciou e influencia até hoje minha vida

pessoal e profissional.

“Escritores da Liberdade” lançado em 2007, teve como atriz principal Hilary Swank e foi

escrito e dirigido por Richard LaGravenese, que nos traz uma linda história baseada em fatos que

ocorreram sobre uma docente recém-formada (Erin), que possuía uma ideia de escola e alunos

totalmente diferente da que ela irá vivenciar em seu primeiro emprego como professora.

Erin recebe uma turma de alunos problemáticos, que vivia em constantes conflitos e não

acreditava em uma mudança de vida através da educação, visão essa que também é compartilhada

pelos outros educadores.

Inicialmente, Erin e a turma não possuíam uma boa relação, mas o empenho da professora vai

mudando aos poucos este cenário, pois ela acredita que pode fazer algo por eles e se empenha para

isso. A professora percebe que seus alunos não recebem os mesmos benefícios de recursos que os

outros educandos da escola e procura mudar isso junto aos seus superiores, inicialmente não consegue,

mas por acreditar neles e que esses, com os recursos iguais, seriam capazes de ampliar suas

experiências acadêmicas e desenvolver seu aprendizado, ela começa, com recursos próprios, a

promover o acesso a livros e passeios.

O sistema educacional praticamente já havia abandonado esses educandos, mas Erin não os

abandona e procura uma aproximação afetiva com eles por meio de diálogos e de conhecer suas vidas

em um projeto de leitura baseado no livro "O diário de Anne Frank". Ela estimula os alunos a escrita

sobre suas vidas ou o que quisessem e que poderiam ser compartilhados com ela, com isso, aos poucos,

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vai conhecendo a realidade de cada um, promovendo na sala momentos de desabafo e resolução de

conflitos, criando assim, um elo entre ela e os discentes, além disso, os alunos vão correlacionando

suas experiências e as experiências que viram no livro, levando-os a novos conhecimentos e

proporcionando uma contextualização da prática escolar com a vida.

A turma vai mudando, começa a se destacar na escola e a ganhar novos olhares. Após todas as

mudanças, a escola planeja que seus discentes sejam de outro docente no próximo ano, mas ela e seus

alunos batalham para permanecerem juntos.

Erin foi alguém que acreditou em seus alunos, na possibilidade de mudanças, promoveu a

inclusão e a comunicação. Levo com esse filme a reflexão de que mudanças são possíveis se nos

empenharmos para isso, destaco que aprendi ainda mais a importância do diálogo e do afeto nas

relações, mudei paradigmas, cresci pessoal e profissionalmente com esse lindo relato.

O que a docente do filme realiza em sua prática educacional é o que nos propõe Paulo Freire

em seu livro “Pedagogia do Oprimido”, uma educação não “bancária”, que seja libertária e que

dialogue com a experiência de vida dos alunos para promover a aprendizagem.

Sou professora e esse filme promoveu afetivamente um novo olhar para os meus educandos,

para o ser humano que está ali comigo aprendendo, que tem experiências que são diferentes das minhas

e que preciso conhecer, ter empatia e relacionar às minhas propostas pedagógicas, se efetivamente

quero o melhor para eles.

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Nome: Adriana Soares Magdaleno.

Função: Professor I - História

Unidade de Lotação: (02.06.024) Escola Municipal Sérgio Vieira de Mello

Título do Filme: O Garoto

“O Garoto” entre Choros e Risos

Para falar do meu filme de afeto, recorro à memória mais profunda, a imagens fortuitas de um

inconsciente, mas reveladas pelas palavras do mais próximo dos familiares: minha mãe.

Segundo relato materno, certo dia, uma pequena criança estava de pé em frente ao aparelho de

televisão com as mãozinhas esticadas para cima emitindo palavras aparentemente incompreensíveis.

Essa pessoinha com aproximadamente um ano e meio de idade, postava-se muito aflita e mãe tinha

dificuldades para entender o seu estranho enunciado: “xai xá pen.” A frase fora repetida inúmeras

vezes, no dia a dia, mas nenhum habitante daquela casa conseguia decifrá-la.

Eis que um dia, o incompreendido “xai xá pen” aparecera figurando nas telas da televisão,

arrancando sorrisos e gargalhadas do bebê que o assistia. O mistério estaria resolvido: era o filme do

Charles Chaplin que despertava momentos de alegria e contentamento ao resoluto ser. Porém, uma

pergunta pairava no ar: como um filme em preto e branco com um personagem que não fora projetado

especificamente para crianças poderia despertar tanto interesse em um bebê? Como uma obra podia

sobrepor as fronteiras da idade e despertar emoção e sentimento em uma criança que ainda estava

aprendendo a falar?

Ah...são mistérios do cinema, meus caros, mais precisamente, mistérios do gênio mundial do

cinema, Charles Chaplin.

As obras cinematográficas do nosso gênio despertam no sentir e no vivenciar a cada gesto, a

cada movimentação corporal, sentimentos conflitantes e díspares, encaixando elementos da tragédia e

da comédia, ampliando uma carga emocional em que a dor e o amor, a felicidade e a tristeza caminham

juntas nesse grande espetáculo humano. Chaplin nos faz refletir sobre as injustiças e, simultaneamente,

nos humaniza pela empatia de como sentimos em nós, a dor do outro. Destaco, então, o filme “O

Garoto”, que faz vibrar as profundezas de minha alma, que me faz sonhar e acreditar que o humano

pode se aperfeiçoar a cada gesto, a cada olhar, a cada emoção dividida.

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Quando me deparo com aquele pequeno garoto de mãos estendidas a chorar, vejo a todas as

crianças que foram abandonadas e que esperam um destino melhor. Fruto de uma relação proibida para

a época, o garoto é encontrado por um homem sem aparente importância social, marginalizado e

chamado de vagabundo. Quantos garotos são abandonados hoje em dia? Quantas mães choram por

filhos perdidos? Quantos de nós vivem e se deparam com situações de carência e abandono? São

perguntas, são sentimentos, aos quais esse filme nos remete...

Há algum tempo, vivi a experiência de propiciar o acesso ao filme “O Garoto” para diversas

crianças da nossa rede pública municipal de ensino, quando fui coordenadora pedagógica de uma

escola. A experiência foi impactante: novamente, ouvi altas gargalhadas e vi lágrimas vertidas entre o

público participante, “O Garoto” ganhou textos escritos, desenhos, cartazes e o famoso gênio do

cinema teve a sua história estudada.

Chaplin talvez em vida, não tenha tido o reconhecimento merecido. Criticado e às vezes,

incompreendido passou seus últimos dias na Suíça ao lado de sua amada. Mas, o seu legado é imenso.

O filme “O Garoto”, é uma obra que não pode faltar em nossas vidas, despertando o que há de melhor

em nós, ampliando o mais genuíno sentimento de amor. Ele demonstra que o cinema é muito mais do

que uma indústria, é uma arte da máxima importância no processo de “humanização da humanidade.”

Thank you, Sir Charles Chaplin!

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Nome: Andréa Lúcia Cavalcanti.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (02.06.005) Escola Municipal Georg Pfisterer

Título do Filme: Retratos da Vida

No ano de 1982, cursando a 8ª série, no alto dos meus 13 anos, lembro-me de um passeio

especial promovido pela escola ao Cinema Rio Grande, no centro da cidade de Natal, para assistirmos

a uma sessão extraordinária do longa - metragem: “Retratos da Vida”, dirigido por Claude Lelouche,

com a atriz Geraldine Chaplin, com a música fascinante “Bolero”, de Maurice Ravel e da apresentação

primorosa do bailarino argentino Jorge Donn.

O enredo se passa na época da Segunda Guerra Mundial, período de muitos retratos de vidas

da história, dentre elas as de famílias de países diferentes que se identificavam através da música.

Apesar de ser um filme longo, tínhamos que prestar atenção em todos os pormenores, pois seríamos

cobrados através de atividades pelo ilustríssimo professor de História, Paulino. Porém, mesmo

considerando que éramos uma plateia lotada de adolescentes, estávamos extasiados, inebriados com a

atmosfera da manhã ensolarada que fazia lá fora. Sou capaz de sentir todos os cheiros deste evento

memorável: das cadeiras da sala de projeção ao cheiro da pipoca que comíamos como se fosse uma

iguaria requintada, tamanha era a euforia de estarmos ali, numa manhã de domingo, ao lado dos

amigos, circunscritos numa aura encantadora.

Fiquei fascinada pela música, pela dança (a veia artística me percorre desde cedo), e foi a partir

desta produção que começou meu interesse pela música erudita, foi o pontapé inicial para que

aprimorasse meus ouvidos escutando Bach, Mozart, Beethoven, Chopin entre outros.

Por esta razão que a cada dia percebo o quão a Arte é vital nas nossas vidas, o quanto ela é

transformadora e, como educadora que sou, sei o tamanho da responsabilidade em apresentar pros

meus alunos conhecimentos através da música, da literatura, da pintura, para que, em alguns deles,

algo também os toque e os transformem tão profundamente ao ponto deles sentirem necessidade de

descortinar esse mundo para alguém, de passar adiante...

Neste momento de isolamento social, em meio à pandemia mundial, também estou retratando

a minha vida através da escrita e fotografias. O momento também nos faz repensar sobre a vida que

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levamos e o que, em verdade, levaremos dela daqui por diante quando tudo isso passar, mas que,

quando passar, com certeza teceremos filmes enraizados nas nossas mentes sobre um tempo em que,

mesmo cerceados de ir e vir, não deixamos de nos utilizar da Arte para reviver, viver e sobreviver.

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Nome: Ângela Moreira de Melo.

Função: Agente de Educação Infantil

Unidade de Lotação: (02.09.601) Creche Municipal Pipa no Céu

Título do Filme: Coração Valente

Com uma história de resistência, coragem e fé, "Coração valente", lançado em 1995, é o filme

mais marcante da minha vida. Um dos motivos que o tornam tão especial é que, apesar de a trama se

passar há milhares de anos, ela aborda questões que continuam extremamente atuais.

Ao ver aquele plebeu se rebelar contra a opressão dos poderosos, acabei fazendo um paralelo

com a minha história. Tudo o que conquistei na vida foi por meio de muita luta. Não me conformei

com a realidade que me foi apresentada e decidi que a mudaria, mesmo que isso significasse ter de

enfrentar caminhos difíceis e improváveis.

Como educadora da rede pública de ensino, senti, ainda, uma grande identificação com o poder

transformador do protagonista em sua comunidade, que ao despertar o desejo de mudança no seu povo,

joga luz sobre aquelas mentes que cresceram propositalmente ofuscadas. E assim como ele, o meu

trabalho é diariamente entrar na sala de aula e, mais do que ensinar lições de livros didáticos, é propiciar

condições para que o aluno desenvolva o seu próprio senso crítico no mundo. Educar é um gesto

revolucionário e, por isso, tão essencial. Mas não é possível, se não existir um componente fundamental

na Educação: o afeto.

O pensador Lev Vygotsky diz que “todo trabalho deve partir da emoção, o afeto intercambia

sonhos e ideais”. O sonho é vital. É o elemento que fará semear no educando o desejo de descobrir e

aprender. Exemplos de inspiração, como ocorre na história, são absolutamente relevantes e podem

mudar o destino de uma pessoa. É isso o que me motiva.

O personagem, interpretado por Mel Gibson, tem outra característica inspiradora. Ele não abre

mão da sua liberdade e da sua honra, ainda que tenha que morrer em nome delas. Penso em liberdade

não só como o princípio de escolha entre alternativas possíveis, mas também como o poder de escolha

entre as alternativas aparentemente impossíveis. Liberdade é sonho, é luta, é glória. Liberdade é se

permitir ir mais longe do que acreditavam que podíamos. Liberdade é se permitir e não se limitar.

Liberdade é a capacidade de agir por si mesmo, é ter autonomia. Assim, creio que, seja no século XIII

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- época em que o filme é retratado - ou em 2020, esses são valores que continuam sendo inegociáveis.

Nesse âmbito, a educação é libertadora, e toda pessoa merece gozar de liberdade plena.

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Nome: Carolina Maria de Sales.

Função: Professor de Educação Infantil

Unidade de Lotação: (02.09.802) EDI Aníbal Machado

Título do Filme: “O Rei Leão”

Quando recebi o e-mail sobre o Projeto “Cinema e Memória”, na mesma hora me veio a

lembrança de um dos momentos mais marcantes da minha infância, a primeira vez que fui ao cinema.

Toda a história começou quando eu tinha 6 anos e estudava na Escola Municipal Friedenreich.

Todos estavam empenhados em conseguir um passeio para que toda a escola pudesse assistir ao filme

“O Rei Leão” no cinema. Quando penso neste momento, todos os sentimentos vêm à tona, a

expectativa pelo passeio, pela experiência nunca antes vivida, que era conhecer uma sala de cinema.

Lembro daquele dia como se fosse hoje. Estava nublado, o combinado era que todos os

estudantes estivessem na porta do antigo cinema de rua da Praça Saens Peña, Cinema América (onde

atualmente funciona uma farmácia) com um representante da família que também participaria da

sessão. Eu aguardava na porta com a minha mãe e minhas duas irmãs que também estudavam na

Friedenreich. Estava tão animada que não conseguia parar de falar. As outras crianças igualmente

animadas também não conseguiam parar de falar e sorrir. A alegria era tão grande que não dava para

conter.

Quando finalmente se abriram as portas, fomos entrando devagar e com cuidado. Passar por

aquele corredor escurecido fez o meu coração acelerar e isso ia aumentando com a expectativa do que

ia acontecer. Conseguimos bons lugares, bem no meio da sala. As luzes se apagaram, nesse momento

senti um pouco de medo pois não gostava do escuro, e logo uma música bem alta e um silêncio enorme,

por parte das pessoas, tomou conta de toda a sala de cinema. Nunca tinha visto nada daquele jeito. Um

nascer do sol ao som da música “O ciclo sem fim”, entoada inicialmente pelo cantor africano Lebo M,

que diz “Nants ingonyama bagithi baba”, significa “aí vem um leão, meu pai, sim é um leão”, tomou

conta da tela. Foi uma experiência inesquecível!

Em 2019, a Disney lançou o live action do filme. Assim que chegou aos cinemas, fui assistir

com minhas irmãs, meu cunhado e minha sobrinha. Os mesmos sentimentos e a lembrança da primeira

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experiência com esse filme, voltaram à tona vinte e cinco anos depois. A cena do nascer do sol

acompanhada daquela música tão emblemática fez com que a emoção transbordasse, mas dessa vez

em forma de lágrimas e não de palavras. Lembrei que a cada cena embalada pela história do pequeno

Simba, que mais tarde se mostrara tão forte e corajoso quanto o pai Mufasa, diferentes sentimentos

tomavam conta do meu coração; que as cenas de ação provocavam pequenos sustos que faziam com

que eu segurasse o braço da minha mãe com mais força; as cenas no Cemitério dos Elefantes e do Scar

também me davam um pouco de medo por serem mais escuras. Diferente das cenas com Simba, Timão

e Pumba que eram de pura alegria com o hit “Hakuna Matata”. E, por fim, as cenas com Rafiki que

fizeram com que Simba se reconectasse com sua própria história de vida. História inspiradora que nos

leva a reconectarmos com nossas histórias também. Mais uma vez vivi uma experiência inesquecível.

Neste texto tentei mostrar, significar, explicar um pouco do que senti e sinto todas as vezes em

que assisto “O Rei Leão”. Para além de toda a história tão significativa que ele traz, as experiências

provocadas por ele também nos afetam e nos deixam marcas felizes de um tempo bom.

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Nome: Lauriene Silva Mól Dutra.

Função: Professor II

Unidade de Lotação: (02.04.501) CIEP Presidente Tancredo Neves

Título do Filme: Uma Professora Muito Maluquinha

Eu, Maluquinha?

Sempre gostei muito de filmes! Filmes são encantadores, pois abrem as portas do mundo da

imaginação, podem abrir fantásticas discussões de temas difíceis de serem conversados.

Um filme que mexeu muito com minha história de vida foi “Uma professora muito

maluquinha”, adaptação do livro de Ziraldo. Em 2013, estava dando aula para uma turma de 3º ano,

quando uma aluna me disse que eu parecia com a professora maluquinha. Confesso que na hora não

consegui entender o que ela queria me dizer. Eu, maluquinha? Apesar de conhecer algumas obras de

Ziraldo na época, não conhecia essa obra e ainda não havia assistido a esse filme! Então, fui correndo

assistir, pois queria muito entender em que parecia com essa professora maluquinha!

Naquele mesmo dia, procurei o filme para assistir e consegui o filme com uma amiga, que me

emprestou e logo foi dizendo que minha aluna estava certa, que eu assistisse ao filme que eu iria

entender!

Ao assistir ao filme, fui logo gostando da professora maluquinha: uma professora cheia de vida,

que transformava suas aulas em verdadeiras aventuras felizes! O filme é muito encantador e valeu

muito a pena assistir!

Assim que estive com minha aluna novamente, contei a ela que assisti ao filme e perguntei

porque ela disse que eu parecia com a professora maluquinha. Ela, muito tímida, sentou comigo e

conversamos por muito tempo! Foi uma conversa linda e emocionante, em que ela abriu seu pequeno

coraçãozinho. Contou-me que não gostava de ir para a escola porque não conseguia aprender a ler,

sempre teve muita dificuldade. Mas, que naquele ano ela estava feliz porque encontrou uma professora

maluquinha que, de forma divertida, trazia os conteúdos e a fazia vencer suas dificuldades. Ela disse

que amava as pequenas histórias ou trechos de livros que eram lidos ao final das aulas. Que essas

histórias ou trechos a faziam querer aprender a ler e que ela estava feliz porque estava conseguindo

aprender!

Conversar com aquela aluna foi uma experiência incrível, que nunca me esqueci e guardei em

meu coração com muito carinho! Como são importantes pequenas atitudes que temos na sala de aula

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com nossos alunos! Toda vez que lembro desse filme, lembro dela, com muito amor, pois foi ela quem

me apresentou!

Esse ano, nossa escola escolheu trabalhar em nossa Feira Literária os livros do Ziraldo. Fiquei

muito feliz com a escolha da equipe e por relembrar essa memória tão querida em meu coração! Apesar

de estarmos trabalhando à distância, tenho procurado levar as obras do Ziraldo aos meus alunos e

intensificarei muito mais o trabalho quando voltarmos presencialmente. Quero trabalhar com eles esse

filme e trazer várias reflexões e construções coletivas!

Desejo que nós, professores, sejamos sempre assim, maluquinhos, e que, desta forma, ajudemos

a transformar sempre para melhor o caminho de nossos alunos!

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Nome: Lúcia Maria Santos Maciel.

Função: Professor I – Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (02.05.003) Escola Municipal DR. Cícero Penna

Título do Filme: Orfeu

Um sonho de carnaval

Uma das coisas mais difíceis da vida é a escolha, porque implica em abrir mão, em perder. O

filme que habita minha memória com mais graciosidade e doçura é Orfeu, de Cacá Diegues. Para fazer

essa escolha, tive que abdicar de todos os outros maravilhosos a que assisti, mas Orfeu merece o título.

Confesso, porém, que meu coração balançou um pouco para o lado do Drácula de Bram Stoker, de

Coppola. Já Zeffirelli, o diretor de Romeu e Julieta (olha o meu coração balançando de novo...)

apresenta histórias de amores que desafiam a morte e, assim como Drácula, ambos atravessam os

séculos; apesar da indumentária e cenários magníficos desses dois filmes, que insistem em roubar a

cena; Orfeu conseguiu falar mais alto ao meu coração carnavalesco e libertário, pois o filme, tal qual

o carnaval, é um grito pela liberdade.

Se analisarmos bem a trajetória de Orfeu no mito grego, podemos dizer que ele é um

personagem com esse viés libertário, pois o que mais desejam os amantes se não libertarem-se da

solidão que acompanha o fim, seja ele por ruptura ou por morte? Quem ama clama pela eternidade do

amor e é isso que Orfeu faz: desafia os limites do Hades para reaver Eurídice e assim se libertar do fim

do amor.

Mas o enredo vai além do mito e da questão transcendental do amor e se arrisca bravamente

pela dureza da vida no cenário escolhido: uma comunidade do Rio de Janeiro. Denuncia seus

problemas sociais, toda a sua realidade dolorosa, que revolta não só Eurídice, mas também o meu

coração solidário, sonhador de um Rio mais humano, com uma polícia mais preparada e consciente,

com uma cidade tal qual o filme: de beleza para além do cenário, para além do mito de ser maravilhosa.

O Rio merece essa libertação e o filme aponta o caminho ao mostrar as correntes da desigualdade e

suas consequências nefastas.

Essa denúncia é, porém, adornada pelo belo. Sem perder sua natureza de clamor, ela nos é

entregue embalada na poesia de Vinícius e na música de Caetano, tão belamente interpretada por Toni

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Garrido. Aliás, devo ressaltar que talvez nunca um ator tenha sido tão bem escolhido para um papel,

pois Toni, com sua voz de anjo, tem o poder de harmonizar e tornar sublime qualquer canção, assim

como Orfeu diviniza qualquer tema em sua lira.

Entretanto confesso que toda essa reflexão fica em segundo plano no momento do desfile. Ali

meu coração carnavalesco rouba a cena e vibra com a escola de samba na avenida. Eu estava na

Sapucaí, na noite em que Joãozinho Trinta nos apresentou Orfeu vestido de fantasia. Eu estava lá, na

plateia do desfile. Talvez por isso também me sinta tão pertinente a tudo que o filme simboliza na sua

dor e na sua beleza. Vi Orfeu passar vestido com todo o esplendor do carnaval. Esse nosso querido

carnaval, que traz um alento, uma pausa que subverte a realidade, para reinventá-la numa forma mais

adequada a nós, seres humanos que somos, no fundo, feitos de sonhos.

É assim que me sinto nas tantas vezes que assisto Orfeu: despertada de um sonho bom, onde os

problemas ainda existem, mas há uma promessa de felicidade, como no carnaval e no encontro final

dos amantes em outro plano, no tempo do encanto, da beleza, do mito, da eternidade do amor.

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Nome: Maria Aparecida de Castro Souza.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (02.04.501) CIEP Presidente Tancredo Neves

Título do Filme: E o Vento Levou

É difícil escolher um filme que nos enlaçou afetivamente; como num redemoinho, a

cinematografia nos encobre totalmente, mais aos sensíveis às suas magias e transcendências, mas

nunca deixa ninguém sem um resquício de sua fabulosa formação humana.

Tão poderosa a sétima arte, que tirada de sua áurea e transportada como meio para fins

educacionais promove diálogos que afetam a formação acadêmica; foi assim na minha experiência, já

que os filmes, mesmos animados, eram incomuns na educação de 1º e 2º graus, hoje, Educação

Fundamental e Ensino Médio. Muitos trabalhos já consagraram o lugar do cinema e deixam os

refletores para iluminar a cena dos pequenos e adolescentes, inclusive com idas ao próprio cenário,

que apesar de ter deixado sua beleza perdida do momento, quando anos 2000 acenam outros pontos de

encontro, como shoppings, mas é emocionante ver o brilho dos alunos sob suas telas, ou seja, alguma

coisa se mantém no século XXI.

Mas, “E o vento levou” em minha alma cristalizou a imagem da mulher romântica, que na

memória de uma menina lá pelos seus quatorze anos, em meados da década de 80, também se via

forjada ao destino do casamento, mas ao mesmo tempo capaz de uma explosão da faceta de uma

guerreira, assim, Scarlett O’Hara encarna em mim um deixar de estar no lugar destinado para si, numa

sociedade machista. Há tanto que poderia ser falado dessa mulher, de outras mulheres determinadas,

que o cinema levou-me ao encontro. Na minha memória era tão translúcida a Scarlett, a imagem de

alguém que transbordava aquilo que eu era, ou que ajudava a irromper, parece mais apropriado, sem

saber ser, encantadora, inocente, determinada no seu amor, sem saber que o amor ainda estava a ser

descoberto e sentido, por isso confuso os sentimentos, as dores sentidas, sem que dessem um jeito de

amenizar a sua existência.

Quis trocar de filme dos afetos, quando graças a esta louca internet, fui revigorar-me com a

cena mais marcante quando Scarlett promete a si mesma: “nunca mais passarei fome, nem eu e nem

minha família”. Na minha memória era isso, e somente isso que Scarlett dizia, mas fui quebrada ao

ouvir que incluía a qualquer custo, mesmo que precisasse enganar, trair e matar. Não sei onde se perdeu

esta parte em minha memória, mas me vi forjada novamente pela cena, que apesar da trama ter trazido

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as traições, quando a personagem casa com o noivo da irmã, traindo-a, para que desta forma garantisse

a subsistência da família, para não correr o risco da irmã após o seu casamento ir embora e deixar a

família para trás, entre outras possibilidades juradas que faria, para garantir o juramento feito a si

mesma, já que estavam numa situação de calamidade social, devido à guerra civil, parece justificado.

Diante da decepção de agora, pois como deixei de lembrar? Ou a figura da personagem na época não

passava pelo meu crivo de julgamento, com isso fui percebendo que o tempo não estaciona e o filme

ainda assopra sua magia, e mesmo que considere que não se valha a pena nada a qualquer custo,

reforçando princípios tão caros a mim, nunca estive no lugar de Scarlett, não sou, e por isso não posso

deixá-la escorrer de minhas memórias, mas guardá-la mais viva ainda, por nos mostrar que o limite

não é único e não é melhor, pois pessoas maravilhosas que conheço já me confessaram que passariam

limites que no seu cotidiano não aceitam. Então, sigo “E o Vento Levou” e a brisa trouxe Scarlett para

ficar de novo no meu coração, afinal é uma mulher assim que talhou caminhos para que, hoje, ainda,

possa pensar nos atos e caminhos traçados, sendo que o maior é o do amor possível de ser vivido. Já

que graças aos tempos atuais podemos rever, com muito mais facilidade, devido a tecnologia digital,

será o compromisso, para rememorar um longa-metragem, que hoje seria uma série, sem dúvida

alguma.

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Nome: Silvana Florentina da Cunha.

Função: Professor I – Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (02.09.025) Escola Municipal Francisco Campos

Título do Filme: Em Algum Lugar do Passado

“Em Algum Lugar do Passado” e do Presente

Não, não foi na sala escura de um cinema. Devo ter assistido ao filme “Em Algum Lugar do

Passado” na sala pequena de minha casa da adolescência, provavelmente numa tarde quente de algum

longo verão e durante as férias. Certamente, numa Sessão da Tarde, daquelas que se aguardava

ansiosamente pelo filme preferido ou desconhecido, pois dinheiro para cinema de verdade não havia.

Luxo fora do horizonte dos adolescentes pobres das periferias deste nosso país na década de oitenta.

Mas o que importa é que era possível reproduzir, mesmo em ambiente aparentemente desfavorável,

a atmosfera mágica do cinema. E, quando a história nos envolvia pela imaginação, essa mágica se

tornava mais poderosa e imprimia para sempre na lembrança suas imagens, seus sons, sua atmosfera

e seus dramas...

“Em algum Lugar do Passado” imprimiu sua marca em minha memória de adolescente pela

história de amor quase impossível, pela época retratada e pelo aceno às viagens no tempo.

O casal, Richard e Elise, forma-se de um modo inusitado: Richard recebe de uma senhora idosa

e desconhecida um relógio que se torna o enigma de sua identidade a ser decifrada, pois ao entregálo,

ela lhe diz também “volte pra mim”. Richard consegue descobrir que o relógio pertencera à Elise,

uma atriz do início do século passado, e se vê completamente apaixonado por ela ao descobrir uma

foto dela no salão histórico do hotel onde ela apresentara uma peça teatral em 1912.

A partir da descoberta da identidade da dona do relógio e de sua paixão por ela, Richard

empreende ações para descobrir um modo de ir até Elise. Através de um professor de Filosofia, ele

toma conhecimento de um método de auto-hipnose que poderia transportá-lo àquele tempo passado.

Para tanto, ele que já se achava no mesmo hotel onde Elise se hospedara, isola-se num quarto,

retirando do lugar tudo o que lembrasse o seu tempo presente e, vestido em roupas do passado, inicia

o processo de auto-hipnose que o levará até seu amor.

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Encontrando-se no mesmo tempo passado, os dois se aproximam e, depois de superarem

alguns obstáculos, finalmente, vivem momentos de felicidade e de amor. Mas acontece algo trágico

com eles. Em um dos momentos de descontração e intimidade, os dois conversam alegremente.

Richard num gesto desatento, mete a mão no bolso de sua casaca e pega uma moeda de 1972. Ao vêla,

desfaz-se imediatamente a hipnose e ele é arrastado de volta ao seu tempo presente. Inutilmente,

ele tenta refazer a viagem ao passado. Daí, seguem-se o desespero e a depressão. O desfecho de

Richard é a morte. Entretanto, a cena final sugere que eles se reencontram então.

Quase impossível esquecer a trilha sonora pungente, a beleza dos figurinos do início do século

XX, a beleza física do casal de atores, o ambiente de cidade pequena americana. Richard era

interpretado por Christopher Reeve, o Superman da década de 80, o que tornava seu personagem

irresistível para mim.

Quase impossível não sofrer com este casal fictício e com a dor da sua separação temporal e

física. Por mais absurdo que pudesse me parecer este encontro além do tempo, o amor ali pintado

encantou meu coração adolescente. A narrativa meio fantástica, mas cheia de ternura, capturou minha

emoção para “aceitar” a ideia de ser possível a existência desse amor capaz de romper tempo, espaço

e lógica para se realizar. Um amor tão arrebatador que nem a morte o impede de continuar a existir!

Impossível esquecer esse amor comum e paradoxalmente inusitado, cuja história formatada para a

“telona”, quase nada perdeu de encanto narrativo ao ser vista na tela de uma televisão por uma

menina-moça da década de oitenta.

”Em Algum Lugar do Passado” ficou na minha memória como aquela rosa que se guarda

dentro de livros antigos e de vez em quando, ao folheá-los podemos nos deparar com ela: ainda bela,

ainda significativa e surpreendentemente cheia do perfume do tempo passado em que nos foi

ofertada.

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Nome: Thamyres Ribeiro Dalethese.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (02.04.501) CIEP Presidente Tancredo Neves

Título do Filme: Delicatessen

Qual o seu filme preferido? Sempre tive dificuldade em responder a essa pergunta. Sem

dúvidas, há muitos filmes que gostei, que me divertiram, que me emocionaram, que revi inúmeras

vezes... Em qual dessas categorias se elege um favorito?

Tomando essa reflexão, minha memória cinematográfica é atravessada pelo filme francês

“Delicatessen” (1991), dos diretores Jean-Pierre Jeunet e Marc Caro. Junto com toda lembrança vem

uma história. Na pré-adolescência, eu e um grupo de amigos e amigas costumávamos alugar um filme

toda semana para assistirmos juntos. Em geral, escolhíamos uma comédia “besteirol” ou terror. Um

dia, acabamos levando o citado filme, julgando pela capa e sinopse ser desse último gênero. Foi uma

grande decepção, o maior fiasco das nossas sessões de cinema. No lugar de sustos e adrenalina que

esperávamos, vivenciamos o tédio de um filme muito cansativo e confuso para nossas expectativas

fílmicas.

Anos mais tarde, durante a graduação de Pedagogia, atuei em um cineclube dentro da

universidade. O trabalho cineclubista abarcava, além das exibições e debates de filmes, reuniões de

planejamento, leituras e pesquisas de filmes, técnicas e teorias relacionadas à arte do cinema. Em uma

dessas tarefas, descobri que o diretor do aclamado “O fabuloso destino de Amélie Poulain” também

assinava a autoria daquele filme que havia arrasado nossas tardes cineclubistas juvenis. Aquele filme

com cenas escatológicas, com uma história sem sentido não pode ter saído da mesma cabeça do criador

de Amélie Poulain!

Havia o DVD de “Delicatessen” na extinta e saudosa locadora de filmes do Estação Botafogo.

Eu precisava revê-lo, rememorar, comparar e entender.

De fato, é um filme estranhíssimo. Mas que filme MARAVILHOSO! Sequências de cenas que

não permitem piscar de tão magistralmente costuradas em meio a um visual sombrio e narrativa

inusitada. De uma maneira improvável e contraditória, o filme me incomoda e me afeta. As mesmas

cenas que haviam me causado desconforto, ganharam um novo contorno, outro sabor e passam a me

encantar.

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É compreensível a estranheza e rejeição provocadas no primeiro contato com “Delicatessen”.

A história se situa num contexto pós-apocalíptico fantasioso e retrata de maneira surrealista a vida de

moradores de um edifício. O filme traz situações que transitam entre o cômico e o grotesco como o

consumo de carne humana, uma mulher que é sempre frustrada em suas tentativas de se matar e um

homem que vive em um apartamento cheio de sapos e caramujos. São cenas que provocam agonia e

incômodo numa atmosfera que beira ao absurdo e poético.

Não afirmo que este é meu filme preferido, mas, certamente, é o que mais assisti e recomendo

quando o assunto é cinema. Criei uma relação tão afetuosa com ele que me aprofundei nos demais

trabalhos do diretor Jeunet, virei uma verdadeira seguidora de suas produções e cheguei a participar

de um seminário com o próprio em 2014 na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

É interessante quando o olhar imaturo e habituado a produções comerciais e previsíveis da

primeira vez em que o assisti se entrelaça ao olhar mais crítico e com mais repertório fílmico recente.

Na medida em que assisto “Delicatessen” na atualidade, vejo uma possibilidade de me debruçar sobre

os sentidos, valores e experiências que construí nessa trajetória com o cinema. Esse filme me afeta

porque me levou e ainda me leva a revisitar não apenas as sensações e olhares que construí com a obra

quando mais jovem, mas, sobretudo, resgatar as perspectivas de mundo que me constituíam. E nesse

exercício é que percebo o valor formativo do cinema em que, ao tecer outros modos de ver, pensar e

me relacionar com os filmes, potencializo transformações com a realidade enquanto também me

transformo.

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Nome: Beatriz da Silva Fraga Nunes.

Função: Professor II

Unidade de Lotação: (03.12.032) Escola Municipal Reverendo Alvaro Reis

Título do Filme: A Bela e a Fera

Faz tempo, mas parece que foi ontem. Momentos bons, vividos com pessoas queridas, ficam

guardados para sempre. Era uma época em que ainda não existiam celulares, a tecnologia ainda estava

começando a despontar, fazíamos pesquisas em Bibliotecas, idas ao shopping, somente duas ou três

vezes por ano, geralmente aniversário ou compras para o Natal, isso quando era possível. A terceira

vez, lembro disso com muito carinho e um sorriso no rosto, era por mérito escolar e bom

comportamento. Início da década de noventa, precisamente no ano de 1992, eu estava com dez anos,

estudando numa escola muito diferente, onde passei por várias dificuldades de adaptação, porém,

sempre contando com o apoio e o carinho da minha mãe. Sempre fui reservada e tímida por natureza,

preferia ficar lendo num canto do que conversando ou brincando, fato que não era visto com bons

olhos por muitas pessoas, inclusive adultos. Ninguém conseguia acreditar na quantidade de livros e

gibis que eu lia por mês. E foi num gibi do Pato Donald que eu vi o anúncio do filme “A Bela e a

Fera”. Simplesmente, meu coração disparou! Fiquei ansiosa, mas consciente dos problemas

financeiros pelos quais minha família passava, preferi não comentar nada.

Qual não foi a minha surpresa quando minha mãe, num fim de semana, disse que iríamos

passear? Fiquei feliz, embora não soubesse o que me aguardava. Sempre tive autoestima baixa,

imagina minha mãe me levando para um salão e, sorrindo, afirmando: você merece um dia de princesa!

Chorei emocionada, disse que não precisava, mesmo assim, ela me levou. Vi outra pessoa no espelho.

E, para completar, passamos em Madureira para ver um filme que até hoje, tantos anos depois, me

emociona: “A Bela e a Fera”.

Meu filme preferido foi baseado no conto de fadas de Jeanne-Marie Le Prince de Beaumont e

era riquíssimo em ensinamentos morais. A verdadeira essência de uma pessoa está em seu interior,

preste atenção em quem está do seu lado! "Quem seria capaz de amar um monstro?" é a pergunta que

ouvimos nos primeiros minutos do filme. Aprendi que devemos ter o coração leve, valorizar os

aspectos positivos da vida, ser gentil, ter comprometimento com nossos objetivos e que, às vezes, as

aparências enganam. Ver uma menina que morava numa cidade do interior, pobre, mas que possuía

uma determinação fora do comum, fez toda a diferença. Um filme que já abordava um tema tão atual,

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como o Feminismo, a independência das mulheres. Eu quase pulei da cadeira quando Bela afirma para

Gastão, um pretendente, que um livro não precisa ter figuras, basta usar a imaginação. Ela valorizava

a cultura, o saber que estava nos livros, a liberdade de expressão, não esperava pelo tal príncipe

encantado; seu relacionamento com a Fera foi baseado no respeito e na admiração mútua entre ambos.

Lembro de cada fala, de cada cena com muito carinho e sinto que esse filme mudou muito a minha

vida: continuei mais interessada em Literatura, fiquei mais próxima dos meus pais e comecei a falar

mais com todos ao meu redor. Há quase trinta anos, esse filme me proporcionou muitos sonhos e,

principalmente, esperança.

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Nome: Camilla Marques de Barros Oliveira.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (03.12.035) Escola Municipal Antônio Pereira

Título do Filme: Dumbo

A proposta deste ano feita pelo Cineclube foi curiosa e desafiadora para mim, porém ao

iniciar a busca de uma memória afetiva com algum filme, rapidamente veio a minha mente o filme

“Dumbo”, e a maravilhosa experiência que o mesmo me trouxe enquanto professora da Secretaria

Municipal de Educação do Rio de Janeiro e aos meus alunos moradores da comunidade do Antares.

Desde muito pequena, meus pais sempre me proporcionaram estar em contato com filmes, fosse

me levando ao cinema ou alugando fitas de VHS nas locadoras nos fins de semana. Desde essa época,

anos se passaram, muitos filmes eu assisti, me formei em Pedagogia, e me tornei professora dos Anos

iniciais em uma escola na comunidade do Antares. No ano de 2019, eu lecionava para uma turma de

3º ano e, em uma conversa com a turma, pude perceber que pelo menos 80% dos meus alunos nunca

havia ido a um cinema. Por mais que os professores na escola se esforçassem e fizessem “cineminhas”

projetando filmes e distribuindo pipoca em determinados dias da semana a fim de promover

experiências lúdicas para as crianças, não alterava o fato de que poucos alunos já haviam entrado em

um cinema de verdade. A constatação daquela informação começou a me causar uma inquietação e

fez com que eu buscasse contatos e meios para conseguir levar, não só a minha turma, mas as quatro

turmas de 3º ano do CIEP para o cinema.

Por se tratar de um projeto da rede de cinema para escolas, não podíamos escolher filmes que

haviam estreado há pouco tempo, havia também a preocupação com a faixa etária dos alunos, e por

esse motivo, o filme sugerido foi o “Dumbo”, que na época estava saindo de cartaz. Isso não foi

problema para os alunos que estavam eufóricos para ir ao cinema, em sua grande maioria, pela primeira

vez. Saímos então da comunidade do Antares, em dois ônibus com noventa crianças, quatro

professoras e cinco funcionários de apoio rumo ao cinema do Shopping de Campo Grande. Chegamos

bem cedo ao Shopping, antes mesmo do horário de abertura, fomos os primeiros a entrar, e a caminhada

até as salas de cinema foi recheada de novidades, descobertas e emoções.

Após a euforia de ter passado por duas escadas rolantes, outra grande novidade para eles,

chegamos ao cinema! O cheiro delicioso da pipoca nos deu as boas-vindas. Nos organizamos, e

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precisamos aguardar por alguns minutos, que pareceram horas, até que a pipoca ficasse pronta para

todos os alunos. Tudo pronto, a fila começou a andar! Um por um os alunos pegavam seus copos de

refrigerantes e suas pipocas e se direcionavam aos seus assentos dentro da sala de cinema com os olhos

brilhando e atentos a todos os detalhes. Após todos estarem acomodados, uma funcionária do cinema

veio conversar com eles e dar as boas-vindas. Perguntou então quantos estavam ali pela primeira vez.

Muitas pequenas mãos se ergueram e isso fez, automaticamente, com que eu sentisse um nó na

garganta e ao mesmo tempo uma felicidade enorme de poder estar de alguma forma proporcionando

essa experiência a eles.

O filme começou, e eu confesso que não consegui prestar atenção nele, pois as reações à minha

volta a todo tempo eram maravilhosas. A cada cena triste que acontecia eles se entristeciam juntos e

também gritavam frases motivacionais para o Dumbo não desistir e não ficar triste. E quando o

personagem conseguiu voar, parecia que estávamos assistindo a uma final do Brasil na Copa do

Mundo, todos eles se levantaram, gritaram e aplaudiram. Tenho certeza que este filme não marcou

apenas a mim enquanto professora da rede municipal do Rio de Janeiro, ele também conseguiu garantir

um lugar especial dentro do meu coração e dentro das memórias de muitos desses alunos da nossa rede

de ensino.

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Nome: Fabiane Leal de Sampaio Nunes.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (03.13.012) Escola Municipal Senador João Lyra Tavares

Título do Filme: Em Busca do Vale Encantado

O meu filme de afeto é de um tempo onde eu não tinha obrigações, medos, preocupações

e tão pouco entendia sobre perdas e amizades.

Eu me recordo de ter assistido ao filme “Em busca do Vale encantado”, no mínimo,

umas dez vezes.

A lembrança do enredo do filme, das personagens, dos sentimentos envolvidos não veio

só com a lembrança de um simples filme. Lembrar do filme me proporcionou uma viagem ao passado,

perambulando pelas memórias da minha infância e me fazendo sentir os mesmos sentimentos daqueles

dias.

A história conta a trajetória de um dinossauro que se vê sozinho no mundo. Havia

acontecido um terremoto, ele e sua mãe se separaram de seus avós e logo em seguida a mãe briga com

um Tiranossauro e acaba morrendo, dando início a aventura de um filhote de dinossauro à procura do

Vale Encantado que seria o lugar para onde os seus avós estariam indo.

No caminho até encontrar o Vale, o dinossauro conhece alguns amigos e então sua busca

deixa de ser solitária. O pequeno dinossauro se torna um líder do grupo, traçando os melhores caminhos

e elaborando planos para se livrarem do perigoso Tiranossauro.

A minha vida não tem tiranossauros, não procuro o vale encantado, e não tenho

dinossauros como amigos, mas traçando um paralelo com a personalidade do dinossauro, identifico

em mim algumas características da personagem, tais como: o senso crítico, a moralidade, a tendência

a liderar uma equipe e saber identificar as melhores características de cada um para exercer a melhor

função dentro de uma atividade.

A vida real entra em confronto com o filme e, hoje, posso identificar na vida

semelhanças com o filme. As perdas de pessoas queridas, os amigos que conhecemos ao longo da vida,

os problemas da vida, que no filme é apresentado pelo risco do Tiranossauro, e a incessante busca pela

felicidade marcada pelo vale encantado, são os exemplos mais evidentes de que a arte imita a vida e

de que, na minha vida, identifico o “Em busca do Vale Encantado”.

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Meu filme de afeto hoje se tornou o meu filme de vida, que fez com que aquela

menininha se tornasse uma profissional responsável, preocupada com os seus, determinada a alcançar

seus objetivos e partilhar de seus sonhos com os seus pares.

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Nome: Glória Regina Carvalho de Sousa.

Função: Professor I – Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (03.12.008) Escola Municipal Delfim Moreira

Título do Filme: A Sociedade Literária e a Torta de Casca de Batata

Mais do que Afeto

O filme A Sociedade Literária e a Torta de Casca de Batata, desde a leitura de seu título

atraente e curioso, já me desafiou a decifrar seus possíveis significados. Eu só não podia imaginar que

a obra me afetaria tão profundamente. Contextualizado historicamente no pós-guerra, a obra se

ambienta em Londres e na ilha de Guernsay, e oferece paisagens deslumbrantes que conflitam com a

dramaticidade do enredo. A narrativa é repleta de símbolos que emocionam pela natureza do que

representam.

As reuniões da sociedade e as acaloradas discussões sobre as obras literárias me remetem às

prazerosas tertúlias e saraus literários, tão presentes em nossas vidas. A torta de casca de batata,

descrita como intragável, mas presente em todas as reuniões da sociedade, destaca-se como

representante legítima da força de resistência de um povo aos horrores da ocupação alemã na Segunda

Guerra Mundial. A literatura se transforma em refúgio para as tensões extremas e possibilidade de

lidar com os traumas da guerra. Em meio a toda angústia do drama, como não sentir o alívio de viver

em outro contexto histórico, no qual a literatura é fruição do pensamento criativo e simples prazer de

ler? Outro símbolo que muito me afeta é a medalha que a criança acreditava ser capaz de dar coragem

a quem a esfregasse para enfrentar os perigos – que não poupavam nem os mais inocentes. É

extremamente doloroso imaginar o pavor das crianças e o desespero dos familiares separados pela

guerra e a incerteza do futuro e dos perigos que enfrentariam. A beleza estética da cena da medalha

muito gasta, contextualizada anos após, e a justificativa da criança de que precisou de muita coragem

me emocionaram até as lágrimas.

O filme também me afeta pelo desafio representado pela personagem da escritora que se coloca

frente a uma folha de papel e necessita da escrita para aliviar toda a angústia que vivencia e para

expressar toda a sua afetividade. As cenas dramatizam a emoção de escrever e o receio da escrita não

estar à altura dos intensos sentimentos que a inspiram. Muitas vezes, também necessitamos da escrita

para expressar nossos sentimentos e nem sempre isso é tarefa fácil.

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O filme também emociona pelo drama de carregar o peso de uma bandeira, mesmo quando não

nos identificamos com o que ela representa. Isso me sensibiliza muito, pois não podemos generalizar

seres individuais, criando estereótipos e construindo preconceitos. As cenas chocam porque, ainda na

atualidade, assistimos a cenas de preconceito e diversas formas de discriminação ao redor do mundo.

Bate dolorosamente no peito, a certeza de que todos aqueles horrores foram criados por seres humanos,

mesmo que desprovidos de qualquer humanidade. Em contrapartida, cenas se desenvolvem

representando a culpa por não dominar os próprios sentimentos, por nutrir o ódio reativo que cega e

também alimenta o preconceito, ainda que por parte da vítima. As cenas impulsionam ao combate a

todas as formas de intolerância e à certeza da necessidade de valorizar as diferenças e a compreensão

da complexidade do ser humano, essenciais em nossa profissão.

Como se não bastasse tanta emoção, ainda há o clima de romance que aquece meus sentimentos

e as lágrimas dos personagens transbordam em meus olhos, prendendo-me às cenas como refém das

emoções expressas. O drama demonstra que, apesar do conflito e do horror, bons sentimentos, como

o amor e a solidariedade, podem emergir.

O filme me afetou a tal ponto que precisei fazer o movimento normalmente inverso de procurar

a obra literária após assistir ao filme. A narrativa rápida, típica dos filmes baseados em obras literárias,

em nada perde quanto aos detalhes e estética. Sinto que preciso buscar nas páginas do livro mais

passagens e impressões que acalmem meus sentimentos de querer vivenciar ainda mais essa obra

maravilhosamente sensível, histórica e bela.

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Nome: Luiz Paulo Ribeiro de Lima.

Função: Professor I - História

Unidade de Lotação: (03.12.016) Escola Municipal Ceará

Título do Filme: Retratos da Vida (Les uns et les autre)

Quando penso em filme de afeto, entendo que há inúmeros, pois a arte tem o poder de nos

transportar a tempos, espaços e sentimentos muito diferenciados. Com a arte do cinema, nos

revoltamos com o personagem, somos capazes de reescrever um novo final, mas algumas películas

vão além, elas se tornam parte de nós, e agora passo a contar sobre uma delas.

Ainda adolescente, assisti por várias vezes no cinema ao longa-metragem “Retratos da Vida”,

que me deixava encantado todas as vezes, pois sempre me revelava algo novo.

Confesso que este filme fez despertar em mim - não de forma tão clara como agora posso

perceber - a ideia de que o tempo se faz no instante. Sim, passado, presente e futuro se realizam no

instante em que vivemos.

Como assim, me pergunta o leitor? Explico.

O longa-metragem de Claude Lelouch contando a história de quatro famílias de diferentes

espaços e tempos, termina num show beneficente embaixo da Torre Eifel, com a apresentação do

Bolero de Ravel sendo orquestrado, coreografado e cantado.

Essa cena final que sintetizava toda a história, fez nascer em mim a vontade de, no futuro, estar

naquele local para poder reconstruir, de alguma maneira, aquela história.

Meu projeto de futuro – um deles é claro – estava traçado: iria a Paris para vivenciar de alguma

forma este filme. Francis Lee que me aguardasse, pois iria entoar as canções do filme em pleno

Trocadero.

Difícil? Sim. Impossível? Não. E para não deixar o sonho morrer, tomei como parte de minha

inspiração as próprias lutas e dificuldades de alguns personagens do filme.

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A realização deste projeto foi sendo construído com o fluxo da existência, que a vida me impôs

ao longo do tempo. O francês foi aprendido, os recursos materiais foram sendo adquiridos e o jovem

chegou a Paris, não tão moço como antes, mas com o mesmo ideal.

Confesso que, ao me deparar com o local imaginado, as lágrimas fluíram, pois palavras não

definiriam aquele momento. O futuro tão sonhado se transformava em presente, um presente tão belo

como aqueles deixados por Papai Noel na árvore de natal.

As lembranças do filme vinham. Eu podia ver Geraldine Chaplim cantando no alto da Torre,

podia ver Jorge Donn dançando e a orquestra tocando o Bolero de Ravel.

Eu adolescente e eu adulto, naquele instante, nos reencontramos. Sentei-me num banco da

praça, e fiquei ali a me encantar com o que agora era real.

Sim meus caros, há filmes que simplesmente vemos e esquecemos, já outros nos afetam de tal

forma, que nos fazem criar diferentes histórias a partir deles. Aliás, mais do que isso, eles nos fazem

existir.

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Nome: Marcia Ramos de Oliveira.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (03.12.035) Escola Municipal Antônio Pereira

Título do Filme: As Pontes de Madison

O cinema é um veículo fascinante para viagens sem sair do lugar, seja animação, filmes de

longa ou curta-metragem, preto e branco ou colorido, nos estilos aventura, comédia, terror, guerra,

drama, ficção, romance etc. Enfim são muitos ingredientes pra alimentar nossa fome de encantamento.

São histórias e mais histórias, algumas parecidas com as nossas e outras completamente diferentes de

qualquer realidade. Viver o cinema é poder ser espectador e personagem ao mesmo tempo.

De todos os estilos, o romance é o que mais me agrada, até porque a realidade às vezes é tão

violenta que precisamos de amor para uma catarse e acreditar que a vida é para ser bonita. O meu filme

de afeto chama-se “As Pontes de Madison”, uma produção de 1995, estrelada por Maryl Streep e Clint

Eastwood, entre outros, baseado no livro de mesmo nome do autor Robert James Waller. Ele é antigo,

mas atemporal, geralmente é reapresentado nas TVs fechadas na semana do Dia dos Namorados,

devido ao seu teor dramático, cheio de romantismo, como pede a data. Também pode ser visto na

internet e eu recomendo. O livro “As Pontes de Madison”, além de adaptado para o cinema, também

foi peça de teatro e tem uma belíssima trilha sonora em CD.

O que me afeta principalmente neste filme é a difícil decisão de uma escolha que mudaria

completamente a vida de uma dona de casa simplória. Ela teve a oportunidade de viver uma paixão

avassaladora, abrindo mão de sua vida comum e rotineira, onde ela não era valorizada por tudo que

fazia pela família. E tudo se passa ao longo de cinco dias em que esteve sozinha em casa e recebeu a

visita de um fotógrafo que estava a trabalho da revista National Geographic, clicando as pontes

cobertas, próximas de sua propriedade.

O espectador deste filme se torna automaticamente um juiz a julgar a atitude da protagonista

em sua difícil decisão e as opiniões, com certeza, se divergem, Eu não gostaria de estar na pele dela.

Foi um drama muito digno, surpreendente do começo ao fim.

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Tudo começa com a leitura de uma carta da mãe para o seu casal de filhos, que desconheciam

esta parte da vida da mãe que, de tão comovente, veio a influenciar significativamente o destino de

ambos após o relato dela.

Por trabalhar com Sala de Leitura, admiro filmes baseados em livros, gosto de ler e ver para

analisar se foram bem adaptados, se houve falhas e qual veículo melhor promoveu a história. Ler é

sonhar, ver é viver.

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Nome: Marilene Calado.

Função: Professor II

Unidade de Lotação: (03.13.015) EMAC República do Peru

Título do Filme: Como água para Chocolate

Meu filme de afeto é um filme mexicano chamado “Como água para Chocolate”. Um

filme que marcou a minha vida porque fala de um amor que exala pelas fumaças quentes das panelas

com suas iguarias e que, ao sair do cinema, me proporcionou uma enorme vontade de cozinhar coisas

inusitadas, misturando esse desejo aos meus mais profundos sentimentos. A história conta a vida de

Tita, a filha mais nova de uma matriarca que impõe que Tita tome conta dela até a sua morte e onde

um livro de receitas é a memória de uma família.

Por ironia do destino, Pedro, o amado escolhido, acaba se casando com a irmã mais velha

de Tita. O amor dos protagonistas atravessa as regras sociais nas suas entrelinhas. Meus olhos fecham

de emoção quando me lembro da cena do jantar que Tita prepara especialmente para a família,

codornas com pétalas de rosas, onde no momento em que degustam a refeição, o fogo da paixão

perpassa por todos os presentes.

É o amor que faz a mágica da comida envolvida em lágrimas e sabores! Todo o coração

de Tita é colocado em cada receita feita com infinita emoção. Os obstáculos são inúteis, pois o

sentimento não mede a razão, misturados ao sabor da sensualidade e da sexualidade. Tita e Pedro

estavam definitivamente destinados um ao outro e sua mãe não conseguiu acabar com tamanho

sentimento e não conseguiu apagar com a determinação de Tita.

Enchendo copos com lágrimas açucaradas, entre o aroma de temperos e sabores

inusitados, me emocionei com uma enorme saudade das receitas de minha mãe, que como uma Tita,

fazia bolos de laranja inesquecíveis para comermos no agradável café da tarde. O fogo que arde nas

panelas do fogão é o mesmo que incendeia os corações de dois amantes apaixonados, que conseguem

sua liberdade na mais tenra maturidade.

Ao fazer minhas receitas preferidas, me recordo de Tita, que passava toda sua emoção,

paixão, frustrações e determinações, muitas vezes contidas em um simples bolo. Teimava em contar

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histórias de um amor impossível e que se tornou possível, assim podem ser os destinos. Nada é

impossível quando se ama de verdade.

Assim é a vida, as comidas gostosas das mães, tias e avós são inesquecíveis e todas têm

histórias de família, onde todos se reuniam ao redor de uma mesa para confraternizar a vida. Um filme

marcante que leva uma mensagem de que o amor ultrapassa todos os limites, mesmo através da

culinária. Em minhas memórias vejo acesos fósforos incandescentes, corpos unidos eternamente, de

uma história contada num livro de receitas onde o ingrediente principal foi o amor.

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Nome: Waldyr Salles Filho.

Função: Professor I - Educação Física

Unidade de Lotação: (03.12.031) Escola Municipal Eurico Salles

Título do Filme: E.T. O Extraterrestre

O Filme dos Sonhos

Era um bairro pobre, em uma comunidade mais pobre ainda, onde ter o que comer, beber e

vestir já era tudo ou quase tudo na vida daquelas pessoas. Jogos e brincadeiras de rua eram a única

distração que as crianças poderiam ter. Logo, cinema, circo e praias não fizeram parte da minha

primeira infância, salvo alguns raros filmes dos “Trapalhões”. Ir ao cinema não era comum, mesmo

com todo encantamento que aquela tela gigante proporcionava, principalmente para quem não tinha

nem a tela pequena em casa, o sufoco que se passava nas filas gigantescas nos Cines Madureira 1 e 2

causava pânico.

Por outro lado, a partir da minha segunda infância, já na década de 1980, o lançamento do filme

“E.T. O Extraterrestre” foi um marco do cinema mundial, uma obra prima que posso chamar de

atemporal. Assim, a mesma obra que tanto me encantou, seja pela associação do personagem principal

à minha infância, seja por ser usada em nossa escola, quando transformo nossa sala de leitura em uma

sala de cinema, com direito a pipoca e suco, onde todos os nossos alunos saem encantados com a

exibição do filme.

Além disso, o filme E.T. quebrou vários paradigmas, um deles é de que os Extraterrestres são

seres maus e que são nossos inimigos. No filme, a amizade entre as crianças e o extraterrestre, a forma

singela como se relacionam, o respeito e a solidariedade com os “diferentes”, foi uma lição, que para

minha formação teve muita importância, ou seja, hoje também por ter adquirido o que o filme passa,

sou um ser humano que ajudo ao próximo e não guardo distância para pessoas social ou

economicamente diferentes de mim. Ajudar ao próximo por mais que seja diferente foi uma das

melhores heranças que o filme deixou para uma geração.

Desse modo, imaginação infantil simples e bela foi retratada de forma perfeita num dos

melhores filmes, dirigido por um dos melhores diretores de cinema, com uma trilha sonora espetacular.

Conseguiram juntar emoção, aventura, humor e suspense nas cenas que ficaram guardadas na minha

memória. Alguns efeitos visuais, levando em consideração a época, e uma produção precursora, são

maravilhosos. A cena em que os personagens conseguem - de bicicleta - levar o E.T. para a sua nave,

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que o levará de volta ao seu planeta, com a lua no fundo, estando as bicicletas voando, certamente se

você leitor assistiu ao filme, nesse momento pode lembrar facilmente dessa cena. Os espectadores nas

salas de cinema aplaudindo e vibrando com o sucesso do plano dos personagens, que cena, que

momento!

O diretor norte-americano Steven Spielberg, portanto, foi muito feliz nessa obra, trouxe de

experiências anteriores o que tinha de melhor. E.T, o Extraterrestre mudou a visão do mundo sobre os

alienígenas, nos passando o lado doce do ser interplanetário. A mensagem passada é muito mais do

que um simples filme, a criação de um laço de amizade entre o menino e o extraterrestre é fantástica,

principalmente quando retratada nos dias atuais, quando ter em quem confiar é algo imprescindível.

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Nome: Danubia Souza Marques da Silva.

Função: Atendimento Educacional Especializado – Sala de Recursos

Unidade de Lotação: (04.10.501) CIEP Juscelino Kubitschek

Título do Filme: Um Chamado Especial

QUAL É O MEU LUGAR NO MUNDO?

Quando pensei no filme que provocou maior impacto em mim, imediatamente veio à minha

mente “Um chamado especial” (direção de Donald Leow). Vi pela primeira vez em julho de 2017,

como sugestão automática de uma plataforma de filmes e séries. Revisitei-o recentemente por

ocasião da escrita deste memorial. Incrivelmente, a provocação emocional foi exatamente a mesma.

Não é difícil entender o afeto a partir dos efeitos...

Em primeiro lugar, o desafio da escrita subjetiva. O enredo em muitos momentos entrelaçouse

com minha própria vida, provocando reflexões sobre diversas dimensões do meu ser. Posto que,

eu mesma fiquei surpresa com o quanto tenho identificações com a temática retratada na tela. Logo,

escrever sobre algo desta natureza vem ao encontro de uma necessidade de lucidez emergente neste

tempo: identificar, reconhecer e expressar as próprias emoções.

Além disso, na prática docente, lido com os mais diversos gêneros e produções textuais como

objeto de ensino e aprendizagem, mas considero um privilégio lidar com a literatura memorialística

quando minha subjetividade está em questão. Eu, autora/narradora/personagem?

Em segundo lugar, a trama do filme. Cabe ressaltar que “Um chamado especial” é uma

produção audiovisual simples, com atores de atuação questionável, porém aborda uma temática

sensível e profunda sobre diversidade e adversidades nas relações humanas: a inclusão social de

pessoas com deficiência. Este público tem sofrido com o distanciamento social muito antes de este

fato ser uma medida protetiva contra o avanço da pandemia causada pelo novo vírus COVID-19.

Não só isso, mas também é necessário esclarecer que o contexto do filme é o cotidiano de uma

escola e seus desafios, tais como: bullying, as influências das amizades sobre o comportamento dos

adolescentes, antipatias, simpatias, as dinâmicas familiares reverberando no cotidiano escolar, entre

outros. Isto posto, penso que para alcançar o ponto central do paradigma inclusivo, uma proposta

pedagógica efetiva será a que contemple o trabalho com as habilidades e competências

socioemocionais.

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Em terceiro lugar, a educação especial em 3D. É certo que a maior das identificações que fiz

da minha própria vida com o filme seja o fato da personagem principal, Grace, ser uma menina com

síndrome de down, tanto quanto é minha filha, Elisa Elena. Ela foi o gatilho que me levou à luta pela

educação especial e inclusiva: tornei-me professora do Atendimento Educacional Especializado desta

secretaria de educação e ingressei no mestrado para investigar o tema da inclusão escolar e a relação

família-escola. É justamente aqui o ponto de encontro entre vida pessoal, carreira profissional e

percurso formativo. Portanto, o resumo do meu chamado especial.

Em quarto lugar, valores e princípios urgentes. A cosmovisão defendida no filme, da qual

compartilho integralmente, é que todos (independente da condição física, cognitiva e sensorial)

nasceram e vivem para cumprir um propósito. Para fazê-lo, se faz necessário agir sobre a sociedade de

forma intencional e consciente do aspecto do mundo que deseja transformar. Quer dizer, fazer valer a

pena a própria vida e a do outro. Os trechos a seguir comprovam tal cosmovisão, a saber: “Ninguém

deveria rir de uma pessoa pelo que ela é.” (Cara) “Elas são lagartas. É a parte exterior, mas se você for

muito, muito paciente, vai ver que dentro tem uma linda borboleta.” (Grace)

Tal qual a linda e plena borboleta, Grace cumpriu o chamado especial da sua existência, ponhome

a pensar sobre o meu lugar no mundo. Este lugar diz respeito a um alinhamento coerente entre

valores e atitudes em prol da transformação da realidade da qual faço parte, afetando positivamente

aqueles que nela comigo convivem.

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Nome: Douglas Eduardo da Conceição Diógenes.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (04.11.063) Escola Municipal Ministro Plínio Casado

Título do Filme: Cores e Botas

Abayomi Preciosos Encontros Pedagógicos

O título deste texto é o nome do Projeto de leitura desenvolvido por mim e pela professora

Fabiana Diógenes em nossas salas de aula das Escolas Municipais do Rio de Janeiro nos quais somos

lotados. O objetivo do projeto é apresentar para nossos alunos a beleza em ser negro por meio de

protagonistas na literatura infantil.

Contribuindo para reflexões, tivemos um precioso encontro ao assistir o filme “Cores e Botas”,

pelo qual nós temos muito afeto, pois dialoga com nosso projeto de leitura ao promover o pensar sobre

um problema que assola nossa sociedade contemporânea: o racismo.

Produzido em 2011 e dirigido por Juliana Vicente, “Cores e Botas” é ambientado nos anos 80

e traz Joana, vivida pela atriz Jhenyfer Lauren, uma menina que tem um sonho de virar Paquita, uma

das assistentes de palco do Show da Xuxa, programa infantil de maior audiência da televisão brasileira

da década de 80. Um detalhe: Joana é negra e não existiam Paquitas negras logo, ela não tinha o prérequisito

para se tornar uma.

Ao assistir o filme com meus filhos, tivemos um precioso encontro com a própria temática do

nosso projeto de leitura. O sonho de Joana, nossa protagonista, tinha um impeditivo pautado no racismo

estrutural para ele ser realizado. Nascida em uma família negra de classe média alta, Joana mora em

uma casa bem estruturada, frequenta bons restaurantes e estuda em um bom colégio. Todavia, parece

que algo não se encaixa.

Cores & Botas é um curta-metragem que apresenta um debate sobre uniformização do fenótipo

racial branco sendo natural e a afirmação deste como padrão de beleza difundido em massa para as

crianças do Brasil através da grande mídia. As Paquitas destoavam da grande maioria da população

brasileira por apresentar um perfil europeu de meninas de cabelos loiros, pele e olhos claros.

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Meu filme de afeto não poderia ser outro. Meus filhos, que são negros, estão sendo educados

para valorizar seus traços, seus cabelos, sua história. E, este filme nos mostra de forma direta a

importância de se quebrar paradigmas raciais preestabelecidas. Vê-los assistir “Cores e Botas” é sentir

que estou municiando-os para enfrentar uma sociedade racista e esta percepção contribui

consideravelmente para minha formação enquanto professor. O filme se tornou precioso porque não

só ilustra de forma clara o racismo estrutural como nos armou, enquanto professores da rede pública,

de instrumentos para lutar contra uma cultura racista.

Precisamos de uma educação antirracista que não somente denuncie, mas que combata o

racismo. De uma educação contrária a educação escolar mostrada no filme onde uma das professoras

juradas no concurso que Joana participa para virar Paquita diz: “Será que teremos uma Paquita

‘Exótica’?”. Essa é a cultura estereotipada em sua construção histórica que temos de combater em

nossos bancos escolares. Por isso, a importância da referência, da representatividade em espaços

públicos e de inclusão de protagonistas negros. Este filme aponta que o projeto de leitura com foco em

protagonistas negros para nossas crianças da rede pública municipal do Rio de Janeiro é um caminho

que contribuirá para a construção de uma educação antirracista.

Com tudo isso, percebemos que os negros, mesmo em um país miscigenado em sua formação

étnica como o nosso, têm suas demandas e necessidades diminuídas em nossa sociedade; “Cores e

Botas” não só aquece nosso coração como nos faz refletir da necessidade de uma educação

diferenciada em nossas salas de aula para que possamos proporcionar preciosos encontros. Encontros

dos alunos com sua história. Encontros dos alunos com sua cultura, com sua essência. É importante

proporcionar encontros dos alunos com a beleza que existe em ser negro.

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Nome: Hélio Novaes.

Função: Professor I - História

Unidade de Lotação: (04.11.010) Escola Municipal Brant Horta

Título do Filme: Forrest Gump – O Contador de Histórias

Como contar uma história? Você está dentro da história ou apenas assistindo-a passivamente

passar por ti?

Essas são essas as principais questões que o filme de Robert Zemeckis, “Forrest Gump – O

contador de Histórias” (1994), procura debater. O filme apresenta dois caminhos no sentido de viver

o presente: Existe um destino para todos nós ou estamos “flutuando” como uma pena no ar (o acaso)?

Atravessando praticamente quatro décadas da História Americana (anos 50, 60, 70 e 80), Forrest Gump

(Tom Hanks) procura viver com a simplicidade de quem apenas vive o presente, não de forma intensa

como Janny (Robin Wright), seu grande amor, mas cada dia de uma vez.

Tratado como um idiota, justamente por parecer não entender o presente e pela sua postura de

uma pessoa “autista”, Forrest Gump não se deixa levar pelas dificuldades da vida que lhe são

apresentadas. Para ele, o movimento da vida tem uma lógica simples: “A vida é como uma caixa de

bombons; você nunca sabe o que vai encontrar”.

Impregnado de fatos relevantes para a História Americana e mundial (o racismo e as

intolerâncias; Elvis Presley e os movimentos sensuais em uma América conservadora; os Irmãos

Kenedy e a difícil política de uma América branca; o Vietnã e a falta de sentido das mortes dos

saldados; os Hippies e sua busca por viver intensamente seu tempo; os anos 70 e as drogas; o escândalo

Watergate; a Aids e os limites impostos por ela; o conservadorismo de Reagan; etc.) o filme nos faz

questionamentos sobre a felicidade, o amor, companheirismo, preconceitos e a própria realidade.

Devido ao seu estilo único, tanto na fala como nos gestos, Forrest Gump está fadado a viver –

sem amigos e amores – em uma sociedade cruel com os chamados “diferentes”. Mas o filme nos revela

como isso foi driblado pelo simples fato de Forrest Gump ser quem ele é. Nada mais que isso.

O grande amor de toda sua vida, Janny (Robin Wright), foi a primeira pessoa que, depois de

sua mãe, lhe deu atenção na infância quando ele entra na fase de socialização na escola. Seu grande

amigo, Buba (Mykrlti Willianson), é um negro que, como Janny, lhe dá atenção quando ele inicia a

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fase adulta. No fim, seu outro grande amigo, Tenente Dan (Gery Sinise), fecha esse quadro de amigos

que o aceitam como ele é. Uma mulher ferida pelos abusos de uma sociedade machista; um negro com

herança da escravidão, do racismo e que sonha; e um homem branco de uma família guerreira que se

vê dependente de ajuda para se locomover e viver – nada mais nada menos que uma pessoa com

dificuldade de mobilidade.

Forrest Gump, por não perceber a história de forma tão “séria” no seu presente, é destituído de

preconceitos raciais, religioso e de gênero. Ele não leva o peso de ter que lutar para provar quem é:

“Idiota é quem faz idiotice”.

Assim, o filme é uma verdadeira aula sobre a busca humana em tornar a vida mais simples e o

grande desejo de todos pela tolerância com o próximo.

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Nome: Luiz Claudio Motta Lima.

Função: Professor I - Geografia

Unidade de Lotação: (04.11.020) Escola Municipal Grécia

Título do Filme: Terra em Transe

O Drama Político “Terra em Transe”, dirigido por Glauber Rocha no ano de 1967, é o meu

filme de afeto. A sequência da coroação de Porfírio Diaz é um dos momentos mais impactantes do

nosso cinema, e também uma imagem recorrente em um país injusto com a maior parte da população.

Retornar ao tema deste filme é também percorrer um pouco da minha trajetória. São memórias, mas

também são vivências, e voltar atrás é também seguir em frente.

A primeira vez que vi esta obra-prima do cinema brasileiro, dirigido pelo genial artista Glauber

Rocha, foi em uma cabine de vídeo da Biblioteca Pública do estado do Rio de Janeiro. A biblioteca

sofreu um incêndio em 1984, e em 1987 foi realizada uma reforma, em que passou a promover

atividades educativas. Com isso, cabines de vídeos foram instaladas para que as pessoas pudessem ver

os filmes em videocassetes. Havia apenas um problema: o som se espalhava pelo espaço da biblioteca,

se misturando com os outros ruídos do local, e provocando uma dispersão de sentidos.

Foi neste cenário que comecei a ver “Terra em Transe”, entretanto, lá por volta do momento

da coroação de Porfírio Diaz, o som de “Fuga de Nova York” (1981), de John Carpenter, vindo de

outra cabine, desviou a minha atenção e logo me dei conta de que já estava sendo afetado por outras

sensações.

Entre o som furioso, de uma produção de ficção científica com muitos tiros e a imagem

hipnótica de Porfírio Diaz, acabei me dispersando e não vi filme algum. Saí da biblioteca com os sons

e as imagens de dois cinemas distintos que me completavam em seus fragmentos. Andei pelas ruas da

Central do Brasil como o personagem de Antônio Pitanga em “A grande Cidade’, de Cacá Diegues,

que vi anos depois.

A verdade é que “Terra em Transe” me abalou de uma forma tão profunda, que anos depois,

na mostra sobre Glauber Rocha no Centro Cultural Banco do Brasil, localizado na rua Primeiro de

Março, no Centro do Rio de Janeiro, pude ver, sentir e entender toda a complexidade proposta pelo

cineasta e tentar decifrar os temas do filme, que permaneceram para sempre em minha memória.

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Na pequena sala de cinema, com o farnel repleto de chocolates, que ficaram para depois da

exibição, fiz uma imersão afetiva através das imagens, sons e sensações diversas inseridas nesta

magnífica obra artística. Ao projetar meu corpo para frente na intenção de me aproximar daquele

mundo projetado na tela do cinema, me deixei levar através do furacão audiovisual, que até hoje está

comigo.

Nesta semana em que finalizo este texto, o cineclube Subúrbio em Transe, fundado por mim

em conjunto com meus alunos, completa 13 anos de existência. Não foi por acaso que o cineclube foi

batizado com este nome. Aí está a prova da influência de “Terra em Transe” e de como este importante

filme está presente em minha vida.

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Nome: Priscila Azeredo da Silva.

Função: Professor I – História

Unidade de Lotação: (04.11.018) Professor Ary Quintella

Título do Filme: O Fabuloso Destino de Amélie Poulain

“No meu destino, uma fábula”

Era um sábado muito quente de primavera do ano de 2002. Eu estava sentada na sala do meu

cursinho de francês, exausta, quando a professora falou:

— Hoje vamos assistir a um filme que é sucesso na França!

Respirei fundo num quase desânimo. Havia corrido tanto, tinha até deixado de almoçar para

chegar a tempo, e para quê? Para ver um filme? Sim, Priscila. Não seria qualquer filme. Seria o filme

da sua vida. Daqueles que quando as pessoas te perguntam, “Qual o seu filme preferido?”, você

responde sem pestanejar. Ou nem precisam perguntar. Eles já respondem por você de tanto que você

fala, veste, escuta trilha sonora, compra bibelô...

Não assisti a “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain” no cinema. Foi numa salinha pequena,

apertada, sem ar-condicionado, numa televisão simples, mas o seu impacto foi tão arrebatador que

imagino como teria sido se tivesse visto na telona. Talvez tivesse voltado flutuando para casa.

A sensação de leveza era indescritível. Algo que nunca havia sentido com filme algum. Não

sei se foi o roteiro, a fotografia, a trilha sonora, os atores — mas acho que foi tudo isso junto — que

saí daquela exibição atravessada. Algo me golpeara profundamente a alma, mas era uma coisa tão boa

que eu agradecia. Eu sentia uma profunda conexão comigo mesma e com o universo. Eu sentia que a

vida poderia ter beleza nas suas coisas mais triviais. Eu me sentia exatamente como o cego do filme

que finalmente “enxergou” porque seu caminho foi iluminado pela forma de Amélie observar e fabular

sobre o mundo.

Graças à Amélie, passei a observar (e a sentir) melhor os pequenos prazeres da vida. Passei a

me permitir sentir mais aquela sensação prazerosa de caminhar despreocupadamente pelas ruas cheias

do centro da cidade, olhando para o alto, vendo os prédios antigos que os apressados não notam mais

e imaginar: “Como deveriam viver as pessoas aqui no Rio antigo?”. Dei-me o direito de comer coisas

com gosto de infância, sem culpa, sem pensar em dieta, como a esfirra com caldo de cana daquelas

pastelarias com o típico sotaque chinês. Passei a sentar com mais frequência nas varandas das barcas

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a caminho de Niterói para sentir a sensação do vento no rosto e do cheiro de maresia. Eu me sentia

viva. Como se tudo estivesse no seu devido lugar. Inclusive eu.

As cenas do filme ficaram passando na minha cabeça por muitos dias, meses, até que consegui

comprar o DVD — numa versão luxo, de colecionador, da qual me orgulho. Passei a assistir

incontáveis vezes. Se estava triste, se estava alegre, se estava normal. Amélie sempre me levantava a

moral e me inspirava. Mais do que isso: Amélie me salvou. Amélie me salvou de um término de

relacionamento muito doloroso, em 2004. Ela me ensinou a “amar a mim mesma”, lembrando-me

quantas vezes fossem necessárias (ou quantas vezes eu conseguisse reproduzir o DVD) de que a

felicidade está nos pequenos prazeres da vida.

Em 2018, evoquei novamente Amélie. Estava em tratamento de depressão pós-parto e

comemorei meu aniversário em casa, com a temática do seu filme. Com direito a gnomo de jardim e

outras referências. Era preciso resgatar a leveza. Era preciso me reconectar comigo mesma, como

naquele dia quente, exaustivo e fabuloso em que vi o filme pela primeira vez.

Em 2020, durante o isolamento forçado pela Covid-19, Amélie está novamente comigo. Agora,

no meu corte de cabelo. Mas olhando mais de perto, ela me acompanha o tempo todo. É no chaveiro,

na caneca, na boneca sentada na minha estante. Talvez para que eu nunca me esqueça da importância

de manter a leveza, e do quão fabulosas podem ser as coisas mais rotineiras, inclusive as que mais

exigem de nós, seja qual for o nosso destino.

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Nome: Rogério Cesar Ornellas Cardoso.

Função: Professor I - Matemática

Unidade de Lotação: (04.30.016) Escola Municipal Ginásio Olimpíadas Rio 2016

Título do Filme: Perfume de Mulher

Meu Filme de Afeto

Peter Pan, Wolverine, Don Diego de la Vega, Sancho Pança, Capitão Jack Sparrow, Sherlock

Holmes, Forrest Gump, Darth Vader, Harry Potter, Henry Jones, Jr…. Sabem sobre o que estou

escrevendo? E se eu escrevesse assim para vocês: A Terra do Nunca, X Man, A lenda do Zorro, Piratas

do Caribe, Star Wars… E agora? O que passa pela tua cabeça? Agora você tem certeza que eu escrevia

sobre filmes e seus personagens marcantes. É muito comum ver crianças brincando de ser o Homem

de Ferro, Homem Aranha, Zorro e tantos outros super-heróis... O cinema para essas crianças é algo

real, e elas trazem essas histórias e os seus personagens para o mundo real. Mas não é só com as

crianças que isso acontece não. Com os adultos isso também acontece, com menos entusiasmo, eu

diria. Você deve estar se perguntando: - “Acontece com os adultos? Como assim?”

-- Calma! Você já vai concordar comigo! Apenas vou te perguntar, se você lembra de algum

filme que te trouxe uma história, ou personagem que você nunca esqueceu? Agora te peguei, né!

-- Calma! Calma! Você já me falou mais de cinco! Não quero quantidades! Quero só um filme,

o seu filme de afeto e o porquê ele se tornou o de afeto entre tantos outros?

Bom, pra facilitar para você, vou dizer o meu filme de afeto entre tantos outros que ainda guardo

em minha memória. Esse filme é um drama, foi lançado nos EUA em 23/12/1992 e exibido aqui no

Brasil no ano de 1993. Conta a história de um estudante pobre, Charlie (Chris O'Donnell) que, para

ajudar a pagar seus estudos, aceita trabalhar como acompanhante do tenente-coronel aposentado e

cego, Frank Slade (Al Pacino).

A história dos dois se entrelaça de uma forma dura, mas muito envolvente e emocionante. O

tenente coronel ensina ao jovem o valor da coragem diante da vida. E o jovem ensina ao coronel que

os valores éticos e morais têm seu valor diante dos homens e da sociedade, e que sempre vale a pena

segui-los. Aquele menino, com sua conduta sempre correta, conquista o coração daquele homem duro

e amargurado.

O filme traz à baila o tema sobre conduta e ética, contrastando com os valores de uma burguesia

vendida e cheia de falsos moralismos, algo que continuamos a ver nos dias de hoje. E, ainda somos

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brindados com uma excepcional exibição de tango, muitíssimo bem dançado pelo Coronel e uma linda

menina, que se encontrava solitária em uma das mesas de um restaurante luxuoso. Essa dança faz a

gente se transportar para a cena, naquele local sofisticado, onde ninguém se atrevia a levantar para

dançar.

Este filme nos ensina, também, que não há sonho impossível, que qualquer pessoa pode ser, na

vida, o que quiser. E que a idade não põe fim aos nossos sonhos e projetos. É esse o meu filme de

afeto. Tenho uma cópia deste, guardada como uma joia de raro valor. O seu título é “Perfume de

Mulher”.

E agora, é a sua vez: Conta para mim, qual é seu filme de afeto e explique-me o porquê.

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Nome: Amanda Mitke Maria de Lacerda Rocha Hoppe Rocha.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (05.14.025) Escola Municipal Conde Pereira Carneiro

Título do Filme: O Concunda de Notre Dame

Cinema e Memória: Meu Filme de Afeto

Dentre os vários filmes que me impactaram ao longo da vida, aqueles que saltaram

imediatamente à memória no instante em que li na proposta de produção as palavras “Meu Filme de

Afeto” foram justamente aqueles aos quais eu assisti na infância, na companhia da maravilhosa bisavó

que me criou, minha amada “vó” Glória.

Nasci e fui criada em uma cidade do interior do estado do Rio de Janeiro, que só deixei quando

fui aprovada no concurso público para a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, chamada Vassouras.

Lá não havia cinema quando eu era criança. Portanto, o acesso que tínhamos a filmes se limitava

àqueles que passassem na televisão ou aos que alugávamos na locadora.

A ida semanal à locadora constituía um dos mais importantes rituais da minha infância: vovó

buscava minha irmã e eu na escola às sextas-feiras e nos levava até a loja de corredores apertados,

ladeados de fitas. Ainda hoje consigo sentir a ansiedade e alegria que sentia naquele tempo ao perceber

que estava na hora de arrumar meu material para sair da escola na sexta-feira, sabendo que vovó me

aguardava no portão para nos levar até lá. Minha imensa saudade (e afeto) em relação ao filme “O

Corcunda de Notre Dame” começa aí: com a alegria de saber que, ao final de uma semana escolar,

dividiria com minha bisa e minha irmã a experiência de assistir a ele em família. Ao chegar à locadora,

escolhíamos filmes dentre a fascinante coleção de fitas VHS verdes que guardava nossos personagens

favoritos. Com três ou quatro fitas em mãos, íamos para casa e passávamos o fim de semana assistindo

repetidamente àquelas histórias, uma após a outra, e vovó as assistia conosco sem demonstrar

enfadamento, pacientemente assistindo também a nossas atrapalhadas representações de nossas cenas

favoritas.

Dentre todas as histórias a que assistimos assim, em família, “O Corcunda de Notre Dame” tem

destaque em minha memória por ser a que vovó demonstrava mais gostar de assistir conosco. Além

disso, a cada exibição dele em nossa casa explorávamos o filme mais e mais: o que era uma catedral,

onde ficava a Catedral de Notre Dame, a arquitetura, a história, a existência de maldade no mundo, a

necessidade de nos colocarmos contra o mal que encontraríamos no mundo, a beleza além daquilo que

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os olhos podem ver, compaixão... Muitos temas importantíssimos para a formação da minha visão de

mundo e do meu caráter foram introduzidos em minha vida através de conversas mediadas pela minha

bisavó durante e após assistirmos ao Corcunda, aumentando meu carinho pelo enredo e ampliando

minha compreensão dele a cada exibição.

Por tudo que o filme me ensinou, pelas queridas memórias da minha infância que foram

construídas em torno das vezes em que pude assistir a ele com minha família de origem e pela imensa

saudade de fazer qualquer coisa ao lado da maravilhosa mulher que mais me amou na vida inteira, esse

é o primeiro filme que me vem à cabeça quando penso na relação entre cinema, memória e afeto.

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Nome: Andréa Moutinho da Costa Santos.

Função: Professor I - História

Unidade de Lotação: (05.15.021) Escola Municipal Mozart Lago

Título do Filme: Hotel Ruanda

As luzes se apagando, o telão iluminado, coração batendo forte e a expectativa de ser transportada

para mais uma história. Cinema é, para mim, um lugar de encontros e, principalmente, de descobertas.

Confesso ter sido uma missão difícil escolher um filme, mas tem um que me marcou: “Hotel

Ruanda”.

O filme, baseado em fatos reais, se passa no ano de 1994, na capital de Ruanda, Kigali. Este

ano foi marcado por um conflito étnico entre os tutsi e os hutus, causando um genocídio no país,

com mais de 800.000 mortos.

Paul Rusesabagina, da etnia hutu, era um elogiado e respeitável gerente do Hotel des Mille

Collines, de propriedade da companhia aérea Belga, Sabena, estava perfeitamente enquadrado no

perfil que seu patrão branco, europeu, aprovava, sentindo-se orgulhoso e seguro de pertencer a uma

elite privilegiada em Ruanda.

A vida de Paul começa a mudar quando o presidente de Ruanda morre em um atentado,

agravando a guerra civil já em curso no país. Os hutus tomam o poder e começam a exterminar a

população tutsi. A preocupação de Paul, a princípio, é proteger seus filhos e sua mulher, de origem

tutsi, tentando levá-los em segurança para o hotel. Utilizando toda sua diplomacia, negociando e

comprando favores dos militares e da milícia Interahamwe, no poder, ele consegue sobreviver e

abrigar além de sua família, alguns vizinhos que pediram ajuda.

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Com a continuidade do conflito, muitos turistas hospedados no Mille Collines retornam aos

seus países de origem e Paul começa nesse momento, a receber refugiados. As forças da ONU se

encarregaram de fazer a segurança do local até que todos pudessem ser levados para um campo de

refugiados. No total, foram protegidas 1.268 vidas.

O que mais me chamou atenção no filme foi justamente a transformação do protagonista.

À princípio, Paul não se identificava com seu povo, não se reconhecia como africano,

distanciando-se de sua origem. No decorrer do filme, suas roupas, seus hábitos e atitudes

revelam um outro olhar, um outro homem mais consciente de sua identidade. Um negro

africano, vivendo em um país que ficou abandonado, invisível aos olhos do mundo. Nesse

momento ele resgata sua história, sua ancestralidade, despertando um sentimento de

pertencimento, de solidariedade e também de resistência.

A desigualdade, o racismo, a exploração que se reveste de tantas formas, são temas que

permeiam este filme, infelizmente ainda tão atual. Muitos no mundo ainda buscam, como Paul, se

encaixar em um modelo ditado por uma elite, contudo, permanecem silenciados, marginalizados,

descartados por uma sociedade que fala bonito, “abraça” campanhas de solidariedade e amor ao

próximo, mas em suas raízes ainda pulsam o racismo, a intolerância e o preconceito. O caminho

ainda é longo, muitas vozes ainda precisam ser ouvidas.

O filme também traz uma mensagem de esperança, especialmente em uma cena na piscina

do hotel, onde as crianças dançam livremente, lembrando que se pode ter alegria mesmo diante da

dor e fé em dias melhores. Com este sentimento de esperança me uno a Paul e a todos que acreditam

em um mundo verdadeiramente mais solidário.

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Nome: Evaldo Lemos Rodrigues Júnior.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (05.14.012) Escola Municipal J. Carlos

Título do Filme: Central do Brasil

O ano era 1999, eu era apenas um garoto de 11 anos, assustado pelas transformações que

estavam por vir, seria um ano de grandes mudanças. Um novo bairro, uma nova escola para onde iria

pela primeira vez sozinho, o que despertava em mim uma sensação de autonomia e grande

responsabilidade. Chegar a quinta série significava não ter mais a “tia” que ficaria comigo no momento

da entrada até a hora da saída. Era ter um cuidado muito maior com meu material e principalmente

aprender a administrar melhor o meu tempo, já que os professores mudavam a cada toque do sinal.

Lembro-me que a primeira pesquisa proposta naquele ano, foi apresentada pela professora de

português, uma senhora baixinha de cabelos vermelhos, muito bem arrumada e de óculos bastante

estilosos para a época. Ela explicava sobre tipos de texto e o assunto daquela aula era notícia. Depois

de toda a explicação, a pesquisa consistia numa busca por notícias de jornal que achássemos

importantes e nos chamassem a atenção. Voltei para casa com um novo desafio, já que em minha casa

raramente comprávamos jornal, visto que sou extremamente alérgico ao cheiro exalado pelo simples

folhear das páginas.

Para realizar o trabalho, me dirigi a banca de jornal próxima a minha casa, onde avistei

praticamente o mesmo assunto em todos jornais. O que eu vi foi a imagem da atriz Fernanda

Montenegro, que ocupava quase a capa inteira, e o assunto era as indicações do filme Central do Brasil

ao Oscar. Sem dúvida essa seria a minha notícia importante.

Levei para casa e li toda a matéria de uma vez só. Mesmo não sendo muito conhecedor de

cinema e, principalmente, do cinema nacional, aquelas informações mexeram comigo. Me sentia

orgulhoso e até mesmo feliz por saber que pela primeira vez na história, uma atriz latino-americana e

a única brasileira tinha sido indicada a maior honraria dada a uma artista da indústria cinematográfica

mundial.

No entanto, uma questão me incomodava bastante; eu não tinha assistido ao filme e isso não

me saía da cabeça, já que o assusto mais comentado do momento em todos os meios de comunicação

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era exatamente esse. Um país inteiro falando de um filme que foi gravado em minha cidade e eu

simplesmente não vi. Isso se resolveria no primeiro fim de semana, quando fui a uma locadora de

vídeos, um lugar mágico onde antigamente me fazia um bem enorme; minha mãe era sócia e alugamos

para eu assistir em casa.

Confesso que o início do filme me deixou bastante impactado, já que logo nos primeiros

minutos, o menino que desejava encontrar o pai após a morte trágica e prematura da mãe, me fez sentir

uma empatia por alguém que eu simplesmente esqueci naquele momento que não existia e era apenas

um personagem. Hoje compreendo que em partes éramos muito parecidos, pois não só a idade nos

aproximava, mas também o fato de no mundo termos a figura da mãe como a única pessoa com quem

poderíamos contar.

Todo o desenrolar da história, marcada por uma enorme “falta de sorte” ou “armadilhas do

destino”, me fez viajar por um mundo que eu não conhecia. Conheci um Brasil habitado por um povo

tão humilde, trabalhador e principalmente esperançoso. Me deparei com as mazelas do povo nordestino

e com a falta de políticas públicas e educacionais. Me impressionou bastante saber que pessoas adultas

não sabiam fazer o que eu mais gostava, escrever cartas. Numa época onde as tecnologias tão

necessárias ao nosso dia a dia não existiam, eram as cartas que me aproximavam dos amigos e parentes.

Um hábito que mantenho vivo dentro de mim em meio a um mundo de redes sociais e mensagens

eletrônicas.

Ao final da história, o momento onde “Dora” deixa o menino com a família do pai e os dois

pegam o monóculo para ver a única lembrança que ficou de toda aquela aventura, eu simplesmente,

pela primeira vez, chorei vendo um filme. Um choro que até hoje, me deixa com um nó na garganta e

um sentimento de nostalgia. A memória deixada por esse filme me fez tomar a principal decisão da

minha vida, ser professor e atuante na Educação de Jovens e Adultos. É praticamente impossível não

me emocionar todos os dias ao ver os rostos que surgem diante de mim.

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Nome: Leonardo Silva Torres.

Função: Professor I - Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (05.15.021) Escola Municipal Mozart Lago

Título do Filme: Escola de Rock

Meu filme de afeto: Escola de Rock

O filme é do ano de 2003 e tem como personagem principal Dewey Finn (Jack Black), que é cantor

e guitarrista de uma banda de rock e está tentando ser uma estrela do rock, entretanto o roqueiro é

demitido da banda e fica sem emprego, às véspera de um festival chamado “Batalha das Bandas”.

Dewey mora com um amigo que sofre pressão e influência de sua noiva pela falta de emprego do

roqueiro, já que ele passa a não ajudar nas despesas da casa, após ser demitido da banda. Dewey resolve

se disfarçar de professor e consegue um emprego numa escola de ensino tradicional. Lá, ele percebe

que os alunos têm aulas de música clássica e, burlando o sistema da escola, apresenta aos alunos as

várias vertentes do rock and roll, fazendo com que as crianças criem interesse pelo gênero musical,

por fim, Dewey monta uma banda de rock com seus alunos para que eles possam disputar a batalha

das bandas.

Desde minha adolescência sempre fui ligado à música, tive diversas bandas de rock, pois sempre

fui fã do rock dos anos 90. “Escola de Rock” é um filme que me marcou muito e despertou o desejo

de trabalhar, para além da Língua Portuguesa, a musicalidade nas salas de aula. Por ser um filme que

tende a ser agradável, quase sempre levo para as minhas aulas.

A prefeitura do Rio de Janeiro tem um festival de música das escolas da rede, o FECEM. Os alunos

precisam montar um grupo musical e apresentar uma canção de autoria própria, de acordo com o tema

do festival. Os professores podem tocar na banda também, e foi assim que consegui transformar a

ficção do filme numa realidade. Montei bandas com meus alunos, ensaiávamos no contraturno e pude

participar do FECEM representando as duas escolas em que eu era regente de turma. Foi uma

experiência inigualável e que ficará para sempre no meu coração, e acredito que no coração dos alunos

também, visto que, nos contatos que temos, os festivais são sempre lembrados.

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Ter subido ao palco para tocar canções com meus alunos foi um episódio ímpar da minha vida

docente. Os ensaios, a produção do texto-canção, as idas ao estúdio e o grande dia da apresentação

com toda certeza ficarão marcados na nossa memória. Vale dizer também, que a partir dessa

experiência, alguns alunos seguiram cantando e tocando seus instrumentos, mesmo depois de terem

saído das escolas. A semente foi plantada e muitos deles deram continuidade. É por isso que “Escola

de Rock” é o meu filme de afeto.

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Nome: Marcelo Ferreira de Assis.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (05.15.038) Escola Municipal França

Título do Filme: Asas do Desejo

Entre Desejos e Asas

Pensar em um filme de afeto me parece pouco. Um filme apenas? Escolhido, há ainda um

problema tanto igual ou maior que escolhê-lo. Longa-metragem analisado por inúmeros especialistas

e acadêmicos. Portanto, alçado ao lugar de clássico. Aqui, tentarei mostrar os efeitos em mim

provocados por “Asas do Desejo”, título em português. Dirigida por Wim Wenders, a obra desperta

em mim algo maior que a racionalidade intelectual e o olhar aguçado do espectador apaixonado.

Vontade mesmo de entender a decisão de um anjo que se apaixona por uma trapezista circense.

Os anjos pairam sobre a cidade de Berlim acalentando seres humanos transeuntes em sua agonia

diária, acalmando acidentados à hora da morte, tranquilizando-os em suas leituras e estudos,

inspirando-os na produção artística, pondo-se ao lado, emanando energia. O homem, sem saber, é

cuidado por esses seres. Do alto, em voos, guardiãs ou atentos dos altos prédios observam as gentes

absortas. Na película, dois desses anjos são observados de perto, não podem ser vistos por olhos

humanos, à exceção das crianças.

Os anjos Damiel e Cassiel percorrem uma cidade à época dividida em uma parte capitalista,

liberal e burguesa, onde o comércio e consumo são livres; e outra parte (o lado oriental da cidade)

então controlada pela antiga U.R.S.S., opressora, vigilante e punitiva. Um país inteiro dividido por

dois outros, cujos sistemas socioeconômicos eram opostos e conflitantes. Mas, na trama, é um outro

tipo de conflito que absorve a alma.

Damiel, um dos anjos, vagueia em sua missão e se depara com uma artista, uma bailarina

circense a qual ele guarda e inspira. É nesse momento que a poesia transborda a tela de cinema. Damiel

é lançado para fora de seu conforto etéreo, imortal, imune, assexuado, sem gustação ou olfação.

Percorrendo bibliotecas e palcos, acaba por sofrer do desejo.

O paradoxo, para concretizar sua fantasia, precisará cortar suas asas, terá que desistir de ser

anjo, de ser imortal. Tonar-se-á mortal, com os dissabores e sabores que a vida lhe oferecerá, todos

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efêmeros, como o gosto do café e o sorver a fumaça de um cigarro. Prazeres absolutamente mundanos.

Tanto que o filme se torna colorido após a decisão de Damiel. Um estudioso escreveu que a decisão

de Damiel o torna histórico, antes ele era um agente que passeava pela história sem vivê-la 1 .

Talvez seja esse o motivo pelo qual me ligo a esse filme e pela decisão de me tornar historiador

e professor de história. A mim se mostrava, da mesma forma como ao anjo apaixonado, a vida. Saía

da adolescência para a juventude e precisava encarar a minha mortalidade, o tempo que se iniciava,

que me parecia muito, mas que eu intuía passar rápido. Wenders iniciava em mim a admiração pela

sua lente; daí para a frente, seria automática a minha entrada em qualquer cinema, ao saber que o filme

era seu. Ainda hoje, quando assisto aos anjos voarem sobre Berlim, as cores da vida respingam da tela

em mim.

1

VAZ, Alexandre Fernandez. Elogio do anacronismo: afetos, memórias, experiências, em Asas do Desejo, de Wim

Wenders. Educ. rev., Curitiba , v. 35, n. 73, p. 117-134, Feb. 2019 . Available from

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010440602019000100117&lng=en&nrm=iso>. access

on 10 July 2020. Epub May 02, 2019. https://doi.org/10.1590/0104-4060.62755.

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Nome: Maria Aparecida Ramos da Silva.

Função: Professor I – Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (05.15.021) Escola Municipal Mozart Lago

Título do Filme: Romeu e Julieta, Suplício de uma Saudade e Nasce uma Estrela

Trilogia dos afetos

Não haveria espaço para indicar os filmes que marcaram minha vida, meu coração.

Amores possíveis, impossíveis, traições, intrigas, suspense, um cenário histórico, século

passado, século atual, personagens envolventes, contraditórios...Tudo isso são elementos que me

fazem mergulhar totalmente no mundo cinematográfico e eleger aquele filme como meu preferido.

ROMEU e JULIETA, SUPLÍCIO de UMA SAUDADE, NASCE UMA ESTRELA (2009) são

filmes que vêm à minha mente, pois contam histórias acontecidas em séculos diferentes, mas tendo

como tema comum a não concretização plena de um grande amor.

O primeiro se passa em Verona (Itália), século XVI, dois jovens de famílias rivais, Montechio

e Capuleto, se apaixonam e eles têm um final trágico.

O segundo acontece em Hong Kong, nos anos 40, uma doutora chinesa e um correspondente

de guerra se apaixonam e sofrem uma série de discriminações da sociedade chinesa, aliada a isso há a

Guerra da Coreia. Nessa guerra, ele acaba morrendo.

O terceiro, em versão atual, nos conta o amor entre dois jovens cantores, ela em ascensão, ele

em decadência devido ao vício. E, foram as drogas e o álcool os complicadores da história.

Os três filmes nos mostram que a intolerância, o preconceito, a guerra e o vício às drogas e ao

álcool trazem tragédias, sofrimentos para nossa vida.

As histórias abordadas em cada um, não importa se no século XVI, século XX ou século XXI,

mexem muito com meus sentimentos, fazem-me pensar que toda tristeza vivida naqueles momentos

poderia dar lugar à felicidade, aos grandes amores realizados, tanto no mundo da ficção como no

mundo real. Mas, os conflitos existentes na ficção são retratos do nosso dia a dia que, cada vez mais,

nos coloca frente a frente aos dissabores assistidos nas películas.

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Assim como esses filmes afloram em minha mente, outros do mesmo estilo também e todos

me sensibilizam profundamente, portanto não poderia escolher só um filme de afeto.

Enfim, meu filme de afeto é todo aquele que consegue tocar meu coração, levar-me a lugares

belos e desconhecidos, fazer-me conhecer outras culturas, sonhar, aprofundar e melhorar minha visão

de mundo e de relações interpessoais.

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Nome: Patricia de Andrade dos Santos.

Função: Professor I - História

Unidade de Lotação: (05.14.002) Escola Municipal Cecília Meireles

Título do Filme: Ilha das Flores

Tributo Dialógico

Eu, um ser mamífero, bípede, com telencéfalo altamente desenvolvido e polegar opositor, tenho

várias recordações registradas na memória. Ainda assim, este complexo organismo é falho e, por um

lapso neural, não consigo recordar ao certo quando te assisti pela primeira vez. Deve ter sido em um

curso de extensão, talvez... Mas o que importa isso? Importante é o legado.

Você é uma obra que, com boa dose de ironia e ousadia, revolve os mais diversos sentimentos

na audiência. As negativas iniciais dão a centelha do porvir, gerando tanto desconforto que não deixa

o espectador entediar.

É bem verdade a máxima de que “a arte não envelhece” com o passar do tempo cronológico.

O tempo histórico prova isso. Você carrega a marca de sua época, mas sua atualidade é indiscutível.

Tendo nascido há trinta e um anos, no Brasil pós-redemocratização, e com a pueril Constituição Cidadã

pulsante, vem embebido de um discurso de denúncia. Desabafa o que estava engasgado há mais de

duas décadas e, ao mesmo tempo, exala uma atmosfera primaveril irradiando esperança em tempos

melhores, de transformação.

Impactante, por assim dizer, proporciona um choque de realidade, nos obrigando a pensar sobre

assuntos da ordem do dia, como as desigualdades, a questão ambiental, protagonismo – ou indiferença

– na sociedade, estruturas, Educação etc. As aulas com sua participação são tão envolventes.... Você

conduz o processo pedagógico por nós. Não sei se foi por querer, mas você ainda é inclusivo.

Deficientes visuais ou auditivos entendem a essência de sua mensagem. Que genial você é! Benditos

sejam seus genitores! Só um adendo: Duas doses de sua exibição por ocasião são o ideal para nossa

assimilação básica, tamanha é a sua bagagem informacional. Ufa! E a tal liberdade, o que fazer com

ela? Sua proposta é nos fazer filósofos? Santas provocações!

Pois então, documentário Ilha das Flores, você é revolucionário, independente dos prêmios

conquistados. Pequeno-grande filme, com seu jeito lancinante, afetou e me afeta a cada vez que te

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assisto. Você incomoda, faz refletir paradigmas e atitudes. Ainda assim, mostra que a vida floresce, no

lixão ou no conforto da casa de Dona Anete. Você nos aponta que a Educação é a trilha para a liberdade,

para a autonomia, para a humanidade discernir que está acima dos porcos e dos tomates.

Enfim, ficam as lições... O desafio está em florir e perfumar nossa biografia, individual e

coletiva, apesar de todos os esgotos impostos. Há um sutil chamado para retomarmos o tempo da

esperança! Que não só o lixo, mas também as pessoas sejam consideradas extraordinárias. Que as vidas

não sejam cinzas, mas carregadas de cor e frescor. Fé, empatia e luta diária é o que nos resta. Que não

sejamos ilhas no jardim da vida!

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Nome: Patricia Maria dos Santos Santana.

Função: Professor I - Língua Portuguesa e Língua Inglesa

Unidade de Lotação: (05.15.021) Escola Municipal Mozart Lago e

(05.14.025) Escola Municipal Conde Pereira Carneiro

Título do Filme: Sociedade dos Poetas Mortos

UMA VIDA EXTRAORDINÁRIA PARA ESCOLHERMOS: DIALOGANDO COM O

FILME “SOCIEDADE DOS POETAS MORTOS”

“Que verso básico você escreveria em sua vida?” - Com esta pergunta, o novo professor John

Keating, interpretado pelo saudoso Robin Williams, praticamente apresenta a sua filosofia didática e

de vida aos alunos da escola para rapazes no filme “Sociedade dos Poetas Mortos”. Esta frase de

impacto marcou-me intimamente. O professor, novato na escola, era esperado pelo grupo e, ao chegar

em sala de aula, ele logo conduz os meninos à sala de memória do colégio, repleta de fotos de exalunos

que por ali passaram ao longo dos anos. Keating indaga se os pupilos conseguiam adivinhar se

aqueles garotos, eternizados nas fotos com seus rostos pueris, conseguiram alcançar os sonhos que

tinham para suas vidas na juventude. Naquele momento apresenta-se a necessidade de constantemente

nos refazermos e nos repensarmos, citando a Literatura e o Carpe diem como ferramentas poderosas

no processo de desfazimento de um Status Quo. E Carpe Diem, “aproveite o dia”, foi melhor

empregado e belamente traduzido no filme como “torne a sua vida extraordinária”.

Em 1989, ano que assisti ao filme pela primeira vez, eu estava com 16 anos de idade e fazia

parte de um grupo experimental de pré-vestibular perto de minha residência. Nosso então professor de

Literatura nos conduziu ao cinema e nos apresentou este que, para sempre, seria o filme de meu afeto.

Como eu não me apaixonaria pelo jeito de enxergar o mundo mostrado nas palavras do professor

Keating? Como não amaria a Literatura abrindo portas para um olhar diferenciado da vida, sempre tão

imposta como imutável e regrada em seus padrões? Lembro-me que na época eu era pressionada em

família para cursar Direito e tomar os rumos da advocacia. Todavia, após o filme, enveredei-me pelos

caminhos da Literatura e prestei vestibular para Letras na UFRJ, inflada de todos os argumentos

necessários que eu precisava para sustentar a minha nova escolha no seio familiar. Na clássica cena

em que Keating sobe em sua mesa na sala de aula, ele profere que “precisamos ver as coisas de forma

diferente, às vezes. Precisamos procurar as nossas próprias vozes”. Apenas com muita convicção e

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confiança é que podemos abraçar as nossas escolhas. Sem medo, eu me enveredei pelo caminho do

magistério e vi a importante missão do professor em despertar indivíduos que pensam e arriscam. O

papel que a memória apresenta na construção do indivíduo é demasiadamente marcante e mereceu

estudos aprofundados do pesquisador Jacques LeGoff em seu excelente livro “História e Memória”,

onde ressalta que a memória, coletiva ou individual, é a mola capaz de propiciar mudanças enfáticas

em relações e em comportamentos. E como professora, com duas matrículas na rede municipal, eu

procuro tornar as minhas aulas pontes de sabedoria e autoconhecimento de meus alunos nessa trajetória

envolvente do ser humano com o mundo, baseada nessa experiência memorialística de renovação que

tive no passado. Assim como ocorre no filme, a Literatura em minha vida abriu caminhos de

consciência para a minha própria busca. Minha escolha pela graduação em Letras instigou meu

interesse em cursar mestrado e doutorado em Literatura Comparada na mesma instituição. Foi “a

salvação pela arte” tomando diferentes formas. Hoje, eu posso, literalmente, afirmar que a arte

combativa do filme Sociedade dos Poetas Mortos e a própria arte literária se fizeram salvadoras em

minha vida, a começar por minha adolescência deveras oprimida que ganhou novos contornos.

Retomo, pois, a pergunta inicial vista por nós no início desta composição e que fora a pergunta

marcante feita pelo professor Keating em sua primeira aparição aos alunos do colégio de rapazes,

acerca do verso que você escreveria para a sua vida inteira. Eu optei por escrever o verso que me faz

tomar as rédeas de minha vida de modo que eu a torne inesquecível. Decidi pelo Carpe Diem como é

lindamente traduzido no filme. Escolhi tornar a minha vida extraordinária do meu jeito. E ela se tornou

extraordinariamente minha. Somente minha. Tornou-se uma vida repleta dos meus desejos e das

minhas próprias escolhas porque é assim que se deve ser. Sempre.

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Nome: Roberta Batista Pereira.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (05.15.026) Escola Municipal Paraguai

Título do Filme: Dirty Dancing – Ritmo Quente

Esse filme foi lançado em 1987 e eu tinha apenas seis anos de idade, mas provavelmente assisti

pela primeira vez com quinze ou dezesseis anos. Depois que assisti a primeira vez, não parei mais,

talvez tenha assistido umas mil vezes (por baixo). Conheço todas as músicas, falas, danças, inclusive,

recentemente, lançaram um Remake, embora não chegue aos pés do clássico de 1987, gostei muito de

reviver a história nos anos atuais, o diretor teve o cuidado de ser fiel à história original, no entanto

baseado com nossa realidade, as mulheres do filme são empoderadas, por exemplo, o divórcio é tratado

sem culpa e as mulheres são ouvidas e vistas.

O filme conta a história de “Baby”, uma adolescente idealista, rica e estudiosa que nunca

desapontou seus pais. Em uma viagem com sua família para um resort, ela conhece uma nova realidade

e percebe que seus problemas são mínimos diante dos problemas das pessoas mais humildes. Ela tenta

ajudar uma das dançarinas financiando um aborto e aprendendo a dançar para ficar no lugar dela.

“Dirty Dancing” marcou minha adolescência e fez com que eu me apaixonasse pela dança,

quem assiste a esse filme fica com vontade de dançar e viver um romance com o maravilhoso Patrick

Swayze, infelizmente o ator perdeu a luta contra o câncer em 2009.

Durante o ensino médio, tive a oportunidade de estudar em uma escola pública que tinha entre

muitas outras atividades, aula de dança de salão. Eu tinha quinze anos e fazer dança de salão não fazia

muito sentido para adolescentes naquela época, mas o filme mexeu demais comigo, por isso deixei o

preconceito de lado e me joguei na dança de salão, aparentemente, uma atividade para pessoas da

terceira idade. Incentivei muitos dos meus amigos e grande parte resolveu também fazer dança de

salão.

O professor de dança de salão gostava tanto do nosso grupo que nos levava para “bailes” de

dança de salão. Éramos os únicos com idade entre 15 e 18 anos, os frequentadores tinham em média

50/60 anos de idade. Nos divertíamos tanto que nem percebíamos que estávamos no meio de gente

totalmente diferente da nossa realidade. Enquanto os adolescentes curtiam: pagode, funk, charme, nós

curtíamos bolero, salsa, soltinho, forró.

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Como pode um simples filme afetar tanto você? Esse filme me afetou e me afeta até hoje. Eu

sou uma pessoa muito emotiva, sonhadora e romântica, amo assistir filmes. Assim como eu sou afetada

pelos filmes, tenho certeza que muitas pessoas também são. Eu, como professora, tento afetar de muitas

formas meus alunos, inclusive com os filmes. Todo mundo tem um filme que marcou a vida, o meu

foi “Dirty Dancing”.

Escrever sobre isso me fez reviver um momento lindo da minha vida. “Dirty Dancing” me

afetou e me transformou em quem eu sou hoje, sou grata!

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Nome: Rosana de Souza Pereira Carvalho.

Função: Professor I – Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (05.14.021) Escola Municipal Nun’Álvares Pereira

Título do Filme: O Sorriso de Mona Lisa

O SORRISO DE MONA LISA

Sou apaixonada pela sétima arte, mas não chego a ser cinéfila. Inclusive, tenho preferência

por um tipo de filme que não tem muitos adeptos: os que tematizam a Educação (por que será?).

Sempre que um filme retrata a escola e tudo que a ela se relaciona, eu procuro assistir.

Com eles aprendo, me retroalimento de esperança e também faço minhas catarses. Foi

assim que elegi “O Sorriso de Mona Lisa” como meu filme de afeto.

Como a maioria das mulheres com mais de meio século, tive uma educação repressora e

muito traumática. Já era mal vista socialmente por ser filha de pais separados e ter uma mãe que

trabalhava fora, coisa incomum na época.

Em decorrência disso, procurei o meio termo. Comecei a trabalhar com quinze anos, caseime

aos vinte e um com o primeiro namorado, tive dois filhos e parei de trabalhar. Virei, “do lar”,

cuidava da casa, do marido e dos filhos, sonho de consumo das mulheres dos anos cinquenta (mas já

estávamos nos anos noventa).

Óbvio que pulsou em mim o modelo que tive da mãe independente financeiramente, mas

também emergiu o trauma de ter crescido sem a presença materna. E eu não queria abrir mão de ser

uma mãe presente e atuante. Solução: ser professora e tentar conciliar o trabalho e a maternidade. Foi

assim que escolhi o magistério e ele escolheu- me. Hoje somos felizes com nossas escolhas.

Quis o destino que eu fosse lecionar em uma escola de Formação de Professores, onde

oitenta por cento da clientela era feminina. Daí a identidade com o filme: a professora de História da

Arte, Catherine, foi dar aulas em uma escola só para mulheres. O filme retratava os anos cinquenta, e

elas não estavam ali para se formarem em professoras, e sim para se aprimorarem como esposas e

mães, rótulos sociais para as mulheres naqueles tempos. Quem saísse dessa “caixinha” era considerada

subversiva.

Catherine escolheu não se casar, nem ter filhos. Sua visão era de que as mulheres não

nasceram para desempenhar papéis pré-estabelecidos socialmente, mas para decidirem, por si mesmas,

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o que quisessem fazer de suas vidas. E eu concordo com ela, entretanto, por conta disso, algumas vezes

fui mal interpretada e tive várias frustrações nesse sentido.

A experiência de ver jovens mulheres, intelectualmente brilhantes, abrindo mão de suas

carreiras por um homem, era decepcionante pra mim, como fora para Catherine (com uma aluna em

particular). Entretanto, paradoxalmente, isso nos liberou de bloqueios emocionais em relação a um

certo preconceito: é possível escolher o casamento em detrimento da carreira profissional, e, ainda

assim, ser realizada e feliz, mesmo que hoje isso pareça improvável.

Como Catherine, na maioria das vezes, eu também acabo inspirando muitas alunas, quando

procuro aconselhar, orientar, esclarecer, mas aprendi (assim como ela) que minha experiência de vida

não é parâmetro para as mulheres desses tempos.

Há ocasiões em que vejo algumas jovens tomando aquele caminho que tem tudo para dar

errado, e ele dá certo. Difícil entender a dinâmica da vida!

O fato é que eu e Catherine ficamos livres para aceitar nossas limitações e acreditar que

existem sim, muitas escolhas diferentes das nossas, que podem ser bem-sucedidas.

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Nome: Vanessa Rodrigues dos Santos.

Função: Professor II

Unidade de Lotação: (05.14.007) Escola Municipal Albert Sabin

Título do Filme: Day-o, Um Amigo de Infância

Há tantos filmes que carregamos na memória, os quais nos apresentaram histórias de pessoas

desconhecidas com realidades tão distintas da nossa ou até mesmo parecidas, que fica difícil selecionar

aquele que mais profundamente nos toca e dialoga com o sujeito que nos tornamos. Mas,

intuitivamente, recordo-me de um filme que assisti na infância e que hoje me parece ainda mais

significativo. Trata-se de uma dessas “sessões da tarde”, que agradavam ao grande público, com

produções norte-americanas dubladas e repetidamente transmitidas.

Ao recordar a história que me cativou há mais de 20 anos, não posso deixar de descrever a

criança que assistia, uma versão mais sonhadora da professora que vos fala. Naquela época, eu

estudava pela manhã em uma escolinha municipal próxima à minha casa e passava as tardes em frente

à televisão, encantada com os programas infantis e filmes. Nas poucas vezes que brincava de boneca

com a vizinha, imitava os personagens que assistira. pois bem, a primeira vez que vi o ator Elijah

Wood atuando foi neste meu filme de afeto, “Day-o, um amigo de infância”. Depois o reconheci em

grandes superproduções, como “O Senhor dos Anéis”, por exemplo. Na película que apresento aqui,

vemos uma menininha que, ao lidar com a falta de atenção de seus pais, inventa uma companhia para

si como forma de enfrentar uma infância solitária. Só um adendo, em minha concepção de criança na

década de 90, o amigo imaginário era bastante real e desejei muito ter o meu próprio, mas minha

imaginação tinha lá seus limites.

A personagem principal, Grace, cresce sendo ignorada pelo pai, o qual desejava ter um filho

ao invés de filha. O tempo passa, seu amigo, que recebera o nome do carro do sorvete, Day-o,

desaparece tão subitamente quanto surgira. Isso porque a menina, já crescida, aparentemente já

amadureceu o suficiente para enfrentar seus problemas. Há um salto no tempo e a versão adulta de

Grace aparece, uma mulher workaholic e séria, que pouco lembra sua versão pueril. Nesse ponto,

acredito que todos nós podemos nos identificar com ela, pois a vida adulta nos cobra um

posicionamento diferente, quase que nos tornamos outra pessoa, para lidar com a nova realidade que

se apresenta. Não há tempo para brincadeiras, nem faz de conta. Até que o inesperado acontece: a

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descoberta de sua primeira gravidez não planejada em meio a uma vida conturbada acaba

desencadeando o retorno do amigo esquecido. Mais uma vez sua imaginação lhe prega uma peça e ela,

que antes acreditava no que seus olhos viam, agora duvida de sua sanidade mental.

Fazendo um paralelo com a vida real, quantos de nós não sentimos falta de pensar como uma

criança, de encarar a vida com o olhar cheio de esperança? Quantos de nós já não esquecemos como

fazer isso e hoje necessitamos de terapia para reaprender? Quantos gurus ensinam técnicas de

mindfulness (atenção plena) para empresários fazerem melhor uso de seu tempo quando, na verdade,

já dominamos essa técnica quando crianças? Sim, pense na época em que você brincava de bolinha de

gude ou de esconde-esconde e sua mente não vagueava em nenhuma outra parte, pois você estava

concentrado exclusivamente no que estava fazendo. Sem falar na capacidade de viver um dia inteirinho

sem se preocupar com o próximo. Parece tão simples, mas quem pode se dar ao luxo de conseguir

fazer isso hoje, ainda mais agora em meio a uma pandemia?

Retomando ao roteiro do filme, Grace acaba constatando que não está louca, mas sim que

recebeu uma oportunidade única de repensar suas atitudes e desacelerar a sua própria vida. O amigo

novamente cumpre seu papel, tal como um anjo da guarda, e dessa vez, se despede antes de partir para

ajudar outras pessoas. Grace dá a luz ao seu filho e faz as pazes com seu passado familiar. E um

detalhe que torna essa história ainda mais significativa para mim: descobri que estou grávida em meio

a esta pandemia e rever esse filme me fez perceber que a vida pode ser mais leve e doce, apesar das

dores e dos percalços e que a criança dentro de mim virá pra me ensinar o que já esqueci.

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Nome: Aline Melo de Carvalho de Macedo Amaral.

Função: Professor I – Educação Física

Unidade de Lotação: (06.22.009) EMAC Coelho Neto

Título do Filme: Dirty Dancing – Ritmo Quente

Quando recebi o e-mail desse concurso, um carrossel de lembranças rodou na minha cabeça. Quantos

filmes já assisti nesses 43 anos de vida... Filmes bons, muito bons, ruins, desagradáveis. Uns fazem

passar o tempo, distrair a mente, outros com conteúdo de conhecimento ou mensagem de vida. Ah,

realmente foram vários! Sempre gostei muito de assistir a filmes, posso dizer que era meu hobby

preferido.

Aos 18 anos passei no vestibular para a universidade. Porém só começaria no segundo semestre

do ano de 1995 e, como teria um bom tempo livre até recomeçar os estudos, arrumei um emprego em

uma locadora de vídeos. Que maravilha! Além de estar empregada e ganhar um dinheiro para começar

a faculdade, ainda teria a difícil tarefa de assistir aos filmes do catálogo para indicar aos clientes.

E assim, descobri o filme que marcou a minha vida: “Dirty Dancing – Ritmo Quente”. Sempre

adorei filmes de romance e como uma adolescente se tornando adulta, ficava me imaginando como a

protagonista do filme. Vivencio até hoje os filmes me colocando no lugar do personagem principal,

seja qual for o gênero, mas quando é um romance, ah o romance eu realmente encarno, nas horas de

exibição da película, a mocinha geralmente sofredora, mas com um final feliz emocionante.

Na videolocadora, os filmes ficavam separados por gênero. Com certeza, minha sessão

preferida era a de romance. “Dirty Dancing” estava lá há algum tempo, sem que eu me importasse com

ele. Naquele dia, resolvi levá-lo para casa. Algumas vezes, meu pai assistia aos filmes junto comigo e

aquele resolvemos assistir em família. Ah, como eram bons esses momentos em família.

O filme começou e logo a mocinha se apresentou. A história foi se desenrolando e muito além de um

filme água com açúcar, havia uma mensagem de respeito, amizade, companheirismo e romance, além

de algo que mexe muito com as minhas emoções, a música. A família continuava reunida à frente da

TV e o romance me envolvia com o decorrer do filme e algumas lições que carrego comigo até hoje.

Aliás, muitos dos filmes que assisto, deixam marcas na minha história. Perdi as contas de quantas vezes

assisti a esse filme. Ele pertencia tanto a minha vida, que ganhei uma fita VHS e só parei de assisti

quando ele foi emprestado e não devolvido. Para minha sorte, hoje ele está no catálogo de uma

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plataforma de filmes streaming.

Com certeza ao longo dos anos já assisti filmes com roteiros, produção, fotografia, até mesmo

mensagens melhores, mas esse filme, além de ter o que até hoje me encanta, o romance e o final feliz,

contém uma mensagem de superação do personagem principal, de quebra dos paradigmas da sociedade

e o principal, memórias afetivas de uma infância feliz, de uma família que se reunia não só para assistir

filmes juntos, mas que firmou pilares que carrego ao longo da minha vida. Por todos esses motivos,

“Dirty Dancing – Ritmo Quente” é o meu filme de afeto.

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Nome: Cícero César Sotero Batista.

Função: Professor I - Inglês

Unidade de Lotação: (06.25.004) Escola Municipal General Osório

Título do Filme: Eu, Daniel Blake

Passaram-se quatro anos e ainda não me esqueci. Certo dia, fui ao cinema assistir a “Eu, Daniel

Blake”, do diretor Ken Loach. Valeu a pena e muito, pois o filme contribui para uma reflexão sobre

estes tempos sombrios que são os nossos!

É um filme que mostra sem rodeios alguns efeitos do capitalismo recente que foram

naturalizados, sem a devida crítica: terceirização, migração forçada, subemprego, burocracia. Na

lógica do filme, desponta a solidariedade entre os mais pobres como um poderoso antídoto contra o

egoísmo e o interesse calculista, marcas da sociedade atual. Tal solidariedade não é mítica nem

idealizada, não pertence a nenhum programa de partido político, mas é uma prática de resistência para

diversos homens e mulheres.

Daniel Blake, o protagonista do filme, reúne as qualidades que existem nos solidários, inclusive

a discrição, mas que talvez estejam espalhadas em muitas pessoas.

Ele é um carpinteiro de Newcastle, cidade da Inglaterra. Pagador de impostos, trabalhador,

digno e honesto, um dia adoece, dá entrada na aposentaria e não consegue se aposentar por questões

burocráticas. Em suma, o filme é a saga de um homem que precisa provar que tem direito ao benefício

para o qual contribuiu rigorosamente ano após ano. Suas dificuldades seriam cômicas se não

refletissem, pelo viés do absurdo, a tragédia de muitos.

Tendo seu benefício negado, Daniel Blake tem que se reintegrar ao mercado de trabalho. Ele,

que não sabe usar um computador, se sente perdido. Não poderia ser diferente, uma vez que seu

trabalho, muito próximo do artesanal, não lhe exigia tais conhecimentos. Como, então, de uma hora

para outra, se adaptar à nova realidade tecnológica? É tão comum quanto equivocado apontar soluções

individuais para problemas estruturais ou responsabilizar as vítimas pelo seu destino. É um credo que

precisa ser revisto.

Em suma, ele quer se aposentar, já chegou a hora, o corpo não aguenta mais a rotina estafante.

Mas o sistema parece ter dúvidas e ordena retorno para o mercado de trabalho. É contra esta

indiferença, este descaso, este desrespeito que Daniel Blake se levanta.

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Por que é tão bonito assistir à cena em que um homem velho grafita um muro com seu nome?

Por que a adesão dos transeuntes àquela revolta solitária é feita de longe, embora seja nitidamente

simpática à causa? Resposta para a segunda pergunta: porque ainda não chegou a vez deles de enfrentar

o dragão da burocracia. Resposta para a primeira: porque é assim que Daniel Blake reage às

humilhações a que é submetido pela burocracia. Porque, mais que um número, ele é um nome. Embora

ilegal, torcemos por ele porque a manifestação, se não é legítima, é justa.

Há algo de Chaplin em Daniel Blake. Algo que tem a ver com a teimosia de quem continua

lutando pelo que é justo mesmo quando é mais fácil ceder. Afinal, ele é uma pessoa não tão diferente

de mim ou de você.

A solidariedade é um dos afetos mais poderosos à nossa disposição. É quando se faz o bem

sem o menor interesse, sem nem mesmo se dar ao luxo de sentir satisfação pelo dever cumprido.

Simplesmente ajuda-se aos que necessitam e pronto.

“Eu, Daniel Blake” nos faz pensar que a empatia e a solidariedade devem servir de modelos

para a vida, mais do que o sucesso individual. Por fim, se pudéssemos, gostaríamos de propor apenas

uma leve modificação no título: em vez de “Eu, Daniel Blake”, deveríamos dizer: “Nós, Daniel Blake”.

Pois, se não somos ainda, gostaríamos de ser um pouco como ele, em memória dele, que morre de

ataque cardíaco, no filme, sem receber o benefício.

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Nome: Fatima do Socorro Feitosa Ferreira.

Função: Professor I – Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (06.25.019) EMAC Escultor Leão Velloso

Título do Filme: Austrália

A MAGIA DO CINEMA

Sou apaixonada por cinema. Dessas que assiste no “telão”, e depois na TV quantas vezes

forem necessárias para o entendimento de todas as “entrelinhas”. O interessante é que, a cada sessão,

sempre tem algum detalhe que não foi observado anteriormente.

Costumo ver todos os tipos de filmes, nem que seja para dizer: “não gostei”. Mas na verdade,

prefiro os que têm conteúdos históricos de época. Por isso, “Austrália” é um dos meus preferidos.

Nele pude contemplar o encanto de pessoas fortes, pioneiras, que lutaram por seus objetivos

e romperam barreiras. É ambiente australiano, onde os aborígenes, povo nativo, massacrado pelos

ingleses colonizadores, sofrem discriminação até mesmo da população de seu próprio país. Neste

quadro, chega da Inglaterra a viúva Sarah (Nicole Kidman), numa época em que o mundo dos negócios

é dominado por homens, para tomar posse da fazenda que herdou. Precisando salvar seu gado, une

forças a um vaqueiro mestiço conhecido na cidade (Hugh Jackman), por quem se apaixona. Ela luta

pelo respeito aos aborígenes, impõe seus direitos como mulher na sociedade, e assume seu amor

enfrentando os preconceitos. Tudo isso, num quadro às margens da segunda guerra mundial, sofrendo

a invasão dos japoneses.

Realmente é uma aventura vibrante temperada com muita ação e uma forte paixão. Uma

história que traz memórias das origens de um país, que podem também ser comparadas às memórias

do nosso e de outros que passaram por processos de colonização e sofreram as mesmas discriminações:

tiveram seus nativos, sua cultura e origens desrespeitados, invadidos, tendo que absorver os costumes

do opressor. Todos passamos pela longa jornada da mulher para conquistar liberdade e direitos sociais.

E os efeitos colaterais ocorridos pela guerra? Estes temas surgem neste longa-metragem e levam-me a

analisar e questionar o que conquistamos até agora, e o que ainda falta. Quantos debates podem ser

feitos com estes assuntos!

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Gosto de imaginar que esta obra, ao ser assistida, pode contribuir como exemplo da beleza

daqueles que lutaram no passado e fazer com que pessoas compactuem dessa emoção ou até mesmo,

quem sabe, através das visões obtidas, possam reformular alguns pontos de vista em opiniões e

sentimentos melhores, construindo novos ideais.

Empolgante é perceber como cada produção cinematográfica nos fornece dados da cultura

local que a produziu, como as relações familiares, hábitos alimentares, condutas, valores. É a arte do

cinema assumindo seu papel, além dos livros de história e em parceria com a Literatura.

Este é o meu jeito de assistir a um filme: observando, sentindo, degustando seus detalhes

técnicos e histórico-sociais. Mas sei que cada um tem sua forma ideal e particular de fazê-lo. O

importante é mergulhar no enredo e deixar-se seduzir, envolvendo-se em toda magia que ele pode

oferecer. Cinema, mais que diversão, é também uma excelente ferramenta de relato literário. Uma

forma atraente de contar e tornar memoráveis, ocasiões guardadas na “janela do tempo”. Recurso

enriquecedor que podemos explorar de formas diversificadas, seja no lar, na escola, na vida. Além

disso, complementando com uma “pipoquinha”, amigos e família, une o útil ao agradável: bom

demais! Fica o convite. Vem pra tela você também!

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Nome: Flávia de Oliveira Narciso Peixoto.

Função: Professor II

Unidade de Lotação: (06.25.033) Escola Municipal Zilda Nunes da Costa

Título do Filme: Os Saltimbancos Trapalhões

Quando fiquei sabendo dessa seleção de textos, me emocionei e me interessei bastante, porque

embora não seja tão fissurada em assistir filmes, seja em casa ou no cinema, me veio logo na memória

afetiva o início da minha trajetória de frequentar cinemas... Foi para assistir o primeiro e único filme

que fui com a maravilhosa e especial companhia da minha mãe, na antiga sala de cinema do bairro de

Madureira, o famoso cinema São Luiz. Minha mãe não é muito chegada a cinema, por isso que nunca

mais fomos juntas assistir a nenhum outro filme! Isso aconteceu nas férias de janeiro, no ano de 1982

e eu tinha apenas três anos e alguns meses, já que só completaria quatro anos, três meses depois.

Embora fosse bem pequenina, lembro-me perfeitamente desse dia, uma grande fila para entrar no

cinema, que ao dar início ao filme, estava lotado! E o nome do meu filme de afeto, que muito me

marcou e também muito me emocionou, é o filme brasileiro “Os Saltimbancos Trapalhões”!

O filme era sobre a história de um circo que estava prestes a falir, mas que tinha um grupo de

artistas e funcionários que fazia de tudo para mantê-lo aberto, em pleno funcionamento e casa cheia

em todas as sessões! Fazia parte do elenco do filme: o grupo humorístico “Os Trapalhões” e alguns

atores consagrados convidados, como Lucinha Lins, Eduardo Conde, Carlos Kurt, Mila Moreira, entre

outros. Tinha muitos momentos alegres e divertidos, mas momentos tristes, todos com fundo musical

tocante, que muito me emocionaram no dia e me fizeram chorar muitas vezes depois, mesmo quando

assisti ao filme repetidas vezes, depois que já tinha crescido e deixado de ser criança. O repertório

musical que muito contribuiu para toda essa emoção, era muito bom, de excelente qualidade, com a

maioria das músicas compostas e cantadas por ninguém mais, ninguém menos que personalidades

como Chico Buarque, Lucinha Lins, Elba Ramalho e outros.

O tempo passou, me casei, tive uma filha e chegou o dia de levá-la ao cinema pela primeira vez.

Minha bela Manuella, já tinha completado quatro anos e havia chegado as tão esperadas férias de

janeiro, em 2017. E quando fui ver pela internet quais filmes estavam em cartaz, para que eu pudesse

escolher um que pontuasse bem esse nosso primeiro momento cinematográfico, para a minha surpresa

me deparei com um título muito familiar, que definiu rapidamente a minha escolha: “Os Saltimbancos

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Trapalhões rumo a Hollywood”. Não acreditei quando li a sinopse e percebi que era um verdadeiro

remix do filme que havia me marcado afetivamente lá atrás na minha infância! E que eu guardava em

minha memória como uma emocionante recordação! Ao longo do filme, novamente, principalmente

nas partes tristes, não consegui me conter e me emocionei tanto, que não conseguia parar de chorar!

Que momento lindo e marcante de cinema e memória em minha vida! Por isso que, quando soube desse

projeto, decidi que não poderia deixar de compartilhar essa história com vocês!

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Nome: Giovanna Silva Fernandes.

Função: Professor I - Espanhol

Unidade de Lotação: (06.25.031) Escola Municipal Levy Miranda

Título do Filme: “El Labirinto del Fauno” (O Labirinto do Fauno)

“(...) ela foi amada por seus súditos e deixou para trás pequenos sinais de sua passagem pelo mundo,

visíveis só àqueles que sabem onde olhar” O Labirinto do Fauno (2006)

O labirinto da memória – Lugar de afeto e resiliência

Ao escrever sobre o “Meu Filme de Afeto” busquei o significado da palavra afeto a meu ver

sempre positiva, mas, o termo compreende a disposição do indivíduo por algo, seja ele positivo ou

negativo e pode modificar o comportamento, pois, influencia na maneira como refletimos sobre

alguma coisa. Assim, refiz meu pensar e revivi uma situação que me afetou, a princípio, negativamente

ao passar o filme “El Laberinto del Fauno” (2006) para meus alunos do Ensino Médio. Eu, recémformada

pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro e concursada como professora de língua

espanhola, objetivei no meu planejamento de aula discutir a Guerra Civil Espanhola – conflito armado

ocorrido na Espanha de 1936 a 1939 - para tal, fiz uma pré-leitura conversando com eles sobre o que

achavam do conflito como um todo, as consequências e o meio pelo qual ele deu início e fim. Além

de levar xerox com imagens da guerra, do quadro Guernica - do pintor espanhol Pablo Picasso - e em

seguida as turmas assistiriam ao filme.

Fiquei tão empolgada para passar o filme, que ainda hoje consigo, nos labirintos de minha

memória, lembrar a reação dos alunos, o medo, o riso, as cenas principais de la película com a atuação

dos atores, as imagens tão escuras e sombrias, a angústia e esperança dos rebeldes, as fadas,

mandrágoras, labirinto, o enigmático Fauno, a trilha sonora “Mercedes Lullaby”. Além disso, a figura

forte da personagem Ofélia e sua crença na magia, ela que segundo a narração do filme, é a

reencarnação de uma princesa que fugiu do subterrâneo, lugar em que ainda predominava a magia e

os seres fabulosos, tais como o Fauno que tinha a missão de ajudá-la a retornar para seu verdadeiro lar,

ou seja, o submundo. “El Laberinto del Fauno” (2006) a meu ver, é repleto de fantasia e realidade a

qual nos mostra o universo do terror da guerra, em meio à ilusão da menina. Ao alocá-lo, me preocupei

em como os alunos entenderiam as cenas, ou não, pois era um filme muito rebuscado, misterioso, com

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a presença de elementos místicos, das cenas fortes com torturas, armas de fogo e tiros a sangue frio.

Porém, em meio a isso, a personagem principal era aquela garotinha leitora cheia de imaginação junto

ao caos do final da guerra.

Ao chegar à escola, após ter reservado o auditório com antecedência, e todos os alunos, assim

como eu, empolgados e sentados, afinal, eles em sua maioria, gostam de ir ao auditório para ver filmes,

assim como ir à sala de leitura para ler ou manusear livros, ou seja, qualquer ambiente onde irão ter

contato com algo diferente lhes soa melhor. Mas, nem tudo são flores, já diz o ditado, o tal afeto

negativo aconteceu. Pois, um “coleguinha docente” ficou muito furioso comigo por usar o auditório

dois dias, esbravejou, saiu pisando firme pelos corredores da escola e entrou na sala dos professores

reclamando. No momento, muito angustiada, chorei, me senti menosprezada, e até ofendida, mas, os

outros docentes vieram ao meu consolo e acalentaram meu espírito. Enfim, com pedidos de desculpas,

teci comentários com os alunos sobre o ocorrido, e debatemos o filme, além disso, trouxe à baila uma

lição de vida, esta é repleta de “coleguinhas”, ou seja, pessoas que não respeitam o limite do outro, que

são agressivas, e não empáticas.

Aclarei que na vida temos dificuldades, com um exemplo próprio, pois sou a primeira e única

mulher concursada na minha família negra, pobre, e da Baixada Fluminense, que lutou pelos sonhos e

ser professora foi um deles. Me tornei uma de língua portuguesa, espanhola e suas respectivas

literaturas, para alegria da família. E hoje, trazer à memória meu filme de afeto “El Laberinto del

Fauno” (2006) faz vê-lo como um divisor de águas no meu fazer pedagógico, já que, descobri a

importância do autocuidado, da resiliência e fortaleci minhas convicções frente ao ensinoaprendizagem.

O “coleguinha docente” se desculpou por fim. Portanto, compete a nós não permitir

que os percalços da vida nos afetem de modo negativo a ponto de nos fazer parar e sim serem usados

como motivadores para seguir. Afinal, em tempos difíceis precisamos nos fortalecer e continuar a

jornada ao longo desse labirinto chamado viver. Seguir em frente com fé, pois, a vida é assim, um

grande emaranhado de caminhos, de afetos e desafetos. Lágrimas e sorrisos!

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Nome: Ilceia de Oliveira Pinheiro.

Função: Professor Regente de Sala de Recursos

Unidade de Lotação: (06.22.002) Escola Municipal Antônio Maceo

Título do Filme: Perdidos no Espaço

Meu Filme de Afeto: Perdidos no Espaço

Abertas as janelas de minhas memórias afetivas, um cenário aflora. Lembranças de uma

infância em solo árido, cheio de barro e de barracos, na cidade de Brasília. Era final dos anos 60.

Tempo de meninas enfeitadas, com muitas tiaras e fitas no cabelo, penteados com franjas laterais e

cabelos soltos, com lindos cachos grossos. Era o meu tempo de menina.

Era o tempo de muita maquiagem nos olhos das moças, com apliques de cílios, para assim

alongar o olhar. Era o tempo dos volumosos penteados no topo das cabeças. Mas foi também o tempo

das grandes contestações, através das artes e da cultura. Era o tempo da transição entre populismo e

ditadura. Era o tempo dos The Beatles e dos The Rolling Stones, mas também era o tempo da Jovem

Guarda e do Tropicalismo.

Foi a década em que o homem pisou na lua e eu vi isso acontecer na televisão, na casa da

vizinha. E eu estava lá como parte dessa história. Meu destino já estava marcado. Quem eu seria? Uma

historiadora... Uma professora... Uma eterna filósofa sonhadora. E é nesse tempo, carregado de

lembranças pessoais e coletivas, que destaco o meu primeiro contato com minha memória

cinematográfica.

Tudo começava com as longas caminhadas nas tardes de domingo, a fim de assistir à

continuidade da série do filme, Perdidos no Espaço. Era parecido com ir ao cinema todos os

domingos. Mas não era o cinema do jeito que conhecemos. Era somente uma casa muito acolhedora,

na qual os donos cediam sua sala de estar e sua TV, para que assim, as crianças do bairro, que não

tinham televisão em casa pudessem assistir ao filme. E eu era uma delas.

Domingo era um dia especial porque era dia de assistir ao filme Perdidos no Espaço. Série

Americana que encantava as crianças brasileiras no final da década de 60. No contexto do filme, a

família Robinson parte para o espaço em 1997, porque a Terra estava com superlotação, e a missão da

Espaçonave Júpiter II, sob o comando da família Robinson, era encontrar um outro local seguro de

moradia para os terrestres.

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A cada domingo, a série terminava com aquele suspense dos próximos capítulos. Até porque o

Dr. Smith, o vilão que entrou de gaiato na nave, fazia de tudo para sabotar a missão dos tripulantes, e

como consequência das trapalhadas do Dr. Smith, a nave ficava vagando no espaço, e assim, todos

ficavam impedidos de retornarem à Terra. Eu era apaixonada por Will Robinson e seu amigável robô.

Durante a caminhada, a estrada se alongava no horizonte. Mas em dia de chuva, nada de

cineminha. Mas só de lembrar que aquela longa caminhada, entre as quadras norte e sul da cidade

satélite de Taguatinga no final da tarde de domingo, iria me dar o prazer de assistir minha série

preferida, fazia tudo valer a pena.

A sala não era muito grande, mas cabiam todos apertadinhos no sofá e no chão. Havia um

silêncio na hora de ver o filme. Ninguém queria perder nada. Os donos da casa eram hospitaleiros e

tinham orgulho de sua TV, afinal na vizinhança, pouquíssimas famílias na época podiam comprar uma

televisão. E quando a sessão terminava, era a hora do lanche antes de voltar para casa.

Na cidade onde eu morava não tinha cinema. Logo, aquela casa funcionou como um cinema

para mim. Eu fazia desenhos dos personagens do filme e torcia para que eles encontrassem o caminho

de casa. Eu sonhava em ter um futuro em 1997, espaço temporal do filme, em que a Espaçonave Júpiter

II foi lançada ao espaço.

Eu sonhava em ter uma casa com um lar estável. Eu também queria um outro lugar seguro para

morar. Perdidos no Espaço é meu filme de afeto porque também traz para o meu presente a memória

de pessoas e situações agradáveis, que consequentemente me fizeram ter momentos felizes, ainda que

tivesse motivo para chorar em vez de sorrir.

E assim, as janelas do meu tempo de infância são como um cenário de um filme, com as portas

sempre abertas para os sonhos mais belos, mas que se fecham para os pesadelos mais sombrios. E eu

só ponho o meu doce olhar no passado, que tem luz, que tem sonhos, que tem magias, a fim de apenas

focar no encantamento dos detalhes afetivos. E é assim que me vejo lá no baú de minhas memórias,

aprendendo as minhas primeiras lições de vida e amor.

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Nome: Marcelo Alves Teixeira.

Função: Professor I - História

Unidade de Lotação: (06.22.022) Escola Municipal Rose Klabin

Título do Filme: A Vida é Bela

Cinema e Memória - Meu filme de afeto

O campo de concentração e tudo de ruim que ele representa, não foram capazes de destruir o

amor entre pai e filho, não impediram que no cenário da morte, houvesse um sopro de esperança e

vida.

A vida é bela, sim, este é um filme que me marcou e ainda me impacta, exatamente porque me

fez e faz pensar no meu pai, na relação que tínhamos. Independente da circunstância, meu coroa estava

presente, costumo dizer que não lembro de tê-lo chamado e ficar sem resposta, ele sempre esteve ao

meu lado, sempre me apoiou, sempre batalhou para que a dureza da vida não me impedisse de crescer,

não me impedisse de dar e receber amor. Meu pai criou um mundo onde eu sabia exatamente o quão

importante eu era, o quão feliz eu era e isso fez e faz toda a diferença na minha vida.

Nunca houve fuga da realidade, mas meu pai deu a ela uma nova roupagem, de modo que eu a

percebesse dentro das minhas limitações de menino. Lembro dos nossos diálogos sinceros e diretos,

mas nunca exagerados e pesados, as coisas sempre aconteciam dentro do seu tempo próprio, agora,

amor, carinho e zelo eram constantes. Falo do meu pai com a consciência de que ele sempre foi e será

minha principal referência aqui na terra, sem abrir mão do legado de minha mãe. Escrevi este parágrafo

lembrando, essencialmente, da cena onde Benigni está sendo conduzido à morte, mas, apesar de toda

agonia, aquele pai caminhou como se ainda estivesse brincando com o seu filho, tudo isso para proteger

a mente do menino. Para alguns, talvez seja irresponsabilidade o fato de não se mostrar a realidade nua

e crua para uma criança; para os pais, tal atitude não é nada além de amor.

Sou um homem eternamente grato por todo amor que recebi e compartilhei com meu pai,

respeitando as escolhas de todos e cada um, tenho que dizer que os céus me agraciaram com uma

bênção sem limite: ser filho de um homem que apesar do todas as suas lutas e problemas, nunca deixou

que nada ou ninguém o impedisse de estar e ser presente na minha vida.

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Hoje sou pai, na medida do possível, tento seguir as orientações e os exemplos do mais velho,

sei que devo escrever minha história, mas o meu pai e tudo que ele me proporcionou são a minha

história, aprendi com ele que estar e ser presente na vida do filho é muito mais importante do que dar

presentes; observei o cuidado que ele tinha com o meu avô, sim, meu pai trouxe o meu avô para morar

conosco, nada de asilo na velhice, família sempre e em todos os momentos. Entendi, na convivência

com meu pai, que a melhor maneira de fortalecer, instruir, corrigir, proteger, incentivar e educar um

filho é através do amor em ação.

Espero, sinceramente, que outras pessoas possam dizer o que vou dizer agora: Roberto Benigni

e seu “A Vida é Bela” trouxeram para mim a oportunidade de visualizar na arte o que a vida me deu

na realidade.

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Nome: Queila de Castro Martins Memoria.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (06.22.005) Escola Municipal Cyro Monteiro

Título do Filme: Jurassic Park (Parque dos Dinossauros)

Recordações em cena

Falar de cinema, memória, filme e afeto... Ah, talvez soe pueril ou singelo demais, mas,

pensando bem, que soe assim... Diante de tudo que temos visto e vivido, neste ano de 2020 -

redescobrindo palavras como pandemia, isolamento e distanciamento - que soe como sonho, como

devaneio e como utopia. Poderíamos pensar em inúmeros títulos supreendentemente clássicos,

impressionantes, históricos, político-sociais, mas é sobre falar de afeto. Então, nada nos remete mais a

afeto do que “cheirinho de infância”. Partamos, então, para um clássico sim, e há quem diga

impressionante e histórico! Político? Social? E por que não? Vamos falar sobre ele... Direto do túnel

do tempo, do ano de 1993, com cheirinho de folhagem, brisa fresca e rugidos! Uau! “Jurassic Park”,

ou para nós, brasileiríssimos, “Parque dos Dinossauros”!

O Parque dos Dinossauros faz-nos mergulhar em um misto de emoções e de sentimentos que

nos conduzem à sublimação da felicidade, da catarse e do prazer. Com toque especial e um pouquinho

de tudo o que um cinéfilo deseja, em um roteiro, de duas horas e sete esplêndidos minutos, Steven

Spielberg mescla ficção científica, romance, comédia, drama e suspense. E tudo, magicamente,

recheado com aventura e gostinho de quero mais.

Segundo James Cameron, cineasta, “Todo filme muda o mundo, ainda que seja pouco”.

Algumas vezes, este mundo que é modificado, é um mundo pessoal, individual, quietinho, calado, ou,

outras ainda, espevitado, eufórico, avivado e excêntrico. Embora, não o mundo, como planeta, mas o

mundo de alguém. Sim, o filme tem o poder de transformar o mundo de uma pessoa. São as falas dos

personagens, as reflexões, as cenas, as fotografias, as paisagens, ou a falta destas, as cores, ou não, sua

nitidez, ou sua obscuridade, o rosto de um personagem com o qual nos identificamos, ou aquele, a

quem odiamos. Um filme transporta-nos a um universo paralelo, onde tudo seria possível!

Para Steven Spielberg, “As pessoas esqueceram como contar uma história”. Este pensamento

conduz-nos a enaltecer a importância dos textos memorialísticos como expressão cultural. Nossa

memória tem a capacidade de arquivar as experiências vividas e ouvidas, armazenamos sentimentos,

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ações e sensações. O gênero memorialístico relata a vida, suas experiências e sua trajetória. O relato

memorialístico, como produção linguística, com a beleza no combinar de palavras, estimula a leitura

e a prática da escrita, mantendo nossa memória de experiências. Como é bom quando assistimos a um

filme e produzimos, a partir deste, uma segunda obra. Este texto que, com criatividade e imaginação,

eleva o trabalho do autor e seu trabalho, apresenta a produção de nossos alunos, colegas, professores

e bibliotecários, aborda as diversas facetas da nossa atuação profissional e enaltece nossas

competências socioemocionais, incentivando cada vez mais nossa leitura, nossa produção escrita e

nosso processo de criação!

Cheirinho de infância, gostinho de relva, brisa no rosto, belas cachoeiras, exuberância e um

roteiro que nos instiga a saltar da cadeira são algumas das nuances oferecidas por “Parque dos

Dinossauros”. A trilha sonora fica em nossa mente e remete-nos aos mais nítidos rumores de

lembrança, evidenciando nossa competência socioemocional. Nossa mente afaga as lembranças e

permite-nos reviver, com elegante sutileza, o arrepio causado por meio da linguagem audiovisual.

Certamente, falar de cinema e de memória é falar sobre o nosso filme de afeto. São tantos, mas

é apenas um, aquele que lá no fundo, sabemos que mexe conosco. Ainda que simples e nem tão

repercutido, sim... É ele que dialoga com o nosso interior e que nos torna pessoas diferentes, quem

sabe, melhores. Ainda, segundo Spielberg, “Todos nós, em cada ano, somos uma pessoa diferente. Eu

não creio que sejamos a mesma pessoa durante toda a nossa vida”. Assim, assistir a um filme é

permitir-se memorizar, por uma vida inteira, afetos que jamais esqueceremos. E assim, com um

pensamento célebre da obra, finalizamos nossa reflexão: “Porque a história da evolução é de que a

vida escapa a todas as barreiras. A vida se liberta. A vida se expande para novos territórios.

Dolorosamente, talvez até perigosamente. Mas a vida encontra um meio”.

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Nome: Clarice Maria Silva Campos.

Função: Professora Aposentada - SME / PCRJ

Título do Filme: A Cor Púrpura

Algumas histórias misteriosamente voam e voltam carregadas pelo vento, mais de uma vez,

em nossas vidas. Uma em particular pousou sobre mim algumas vezes.

Quando conheci meu marido, o programa preferido era o cinema. O perfume adocicado do

drops de hortelã e a pipoca sabor cinema. Éramos ao mesmo tempo protagonistas da história de amor

que começávamos e espectadores da trama na tela.

Eu havia escolhido o filme, não de maneira aleatória. Fui tomada pela emoção nas primeiras cenas e

durante todo tempo chorei compulsivamente chamando a atenção das poltronas vizinhas. Perdi o

controle diante do quase desconhecido. A falta de intimidade, contudo, não me fez hesitar em decidir

por uma segunda sessão.

Whoopi Goldbery como Celie estava exatamente como eu a imaginei quando li o livro.

Oprah Winfrey e Dani Glove, entre outros, brilhavam em um elenco estrelar. “A Cor Púrpura” é um

filme considerado por muitos uma obra prima de Spielberg, embora não tenha conquistado nenhum

Oscar. Esta talvez seja mais uma injustiça junto às tantas outras sofridas pelas personagens do enredo.

Eu já contava como certa a morte prematura do romance que mal começara. Como eu ia

explicar para o meu recém-namorado um choro descontrolado diante de uma história que não era a

minha?

Enquanto descíamos as escadas do cinema, meu marido me interrogou:

- Por que você chorou tanto? Diga o motivo.

- Não há um motivo. São muitos os motivos.

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Jurei nunca mais fazê-lo passar pelo mesmo vexame. Era a minha primeira mentira.

Choraria todas as outras vezes em que eu testemunhasse ainda que na tela, personagens cujas

histórias revelam e confrontam mecanismos de exclusão, depreciação e apagamentos. O filme

que assistimos era a arte traduzida também em denúncia contundente acerca dos efeitos da

dominação e maus tratos de toda sorte sofridos por mulheres negras, silenciadas e impedidas dos

seus direitos fundamentais.

Ele me tranquilizou, o que me fez ter ímpetos de voltar para uma terceira sessão, mas

desisti quando percebi que ele estava também emocionado e com cara de quem havia chorado. A

sua sensibilidade me fez ter a certeza de que estávamos apenas começando a nossa história. E eu

teria ficado bastante frustrada se fosse diferente.

Eu já conhecia a história em uma tecnologia diversa daquela, o impresso. O sol

apareceu e junto com ele chegava a casa meu livro. Recebi A Cor Púrpura em domicílio, em capa

dura e em uma edição muito bem acabada porque eu era sócia de um clube de leitores dos anos

1980. Eu amava soletrar a palavra púr-pu-ra.

O romance de Alice Walker, que conta a história de Celie, uma menina estuprada pelo

pai aos 16 anos e que tem com este dois filhos, me comoveu profundamente. Li e reli e chorei

muitas vezes diante da narrativa dessa mulher negra e pobre em um mundo excludente e racista

e que é, ainda hoje, a história real de muitas mulheres.

A história, porém, não revela apenas dores e silêncios, mostra as lutas e conquistas.

Quando a protagonista toma consciência do seu valor e de suas possibilidades torna- se inspiração

para novas narrativas de superação e libertação.

O cenário é o sul dos Estados Unidos , mas sabemos, poderia ser uma cidade do nosso país ou de

outro lugar qualquer e em épocas nem tão distantes.

Ano passado, eu, meu marido e minha filha fomos assistir à versão brasileira, num

musical criado por Arthur Xexéu. Artistas talentosos cantaram e dançaram contando “A Cor

Púrpura” num momento em que a sociedade ainda luta por igualdades entre gêneros, classes

sociais e etnias, mostrando a atualidade dessas questões.

Quando saímos do teatro, já não éramos dois descendo as escadas. Éramos três

conectados por uma narrativa que começou diante da tela do cinema há 20 anos.

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Nome: Eliana Maria Lopes dos Santos de Andrade.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (07.16.006) Escola Municipal Desembargador Ney Palmeiro

Título do Filme: Lost Horizon – Horizonte Perdido

Num período encantador da minha vida, dos 8 aos 24 anos, em Brasília/DF, cantei em um

coral. No verão éramos levados para um centro de treinamento, próximo da capital, com

alojamentos confortáveis, cercado de cerrado por todos os lados e era o que mais nos encantava.

Fazíamos atividades ao ar livre que, para adolescente de cidade, era oportunidade rara de contato

com a natureza. O Cerrado é o bioma mais perfumado que eu conheço.

Ficávamos hospedados por sete dias com outros adolescentes e jovens que também

amavam cantar. Era a nossa “Shangri-La” particular.

O filme, Horizonte Perdido, era tradicionalmente agendado para ser exibido no domingo à

noite, logo após o jantar. Havia outras atividades oferecidas para quem declinava de vê-lo

novamente, mas esse momento se tornou o elo de um grupo que até hoje é amigo. Ficávamos

fascinados com o projetor antigo, o filme ainda em rolo, o som da fita passando, as canções... era

tudo muito nostálgico.

É claro que depois de tantos anos vendo o mesmo filme nós já sabíamos até os diálogos,

mas como era bom poder estar ali de novo, todos juntos!

Burt Bacharach assina a trilha sonora, onde uma das canções diz assim: “Vivendo juntos,

crescendo juntos, estando fiel juntos ... Corações amorosos vivendo todos juntos... Se as coisas

não estiverem dando certo, nós poderemos melhorá-las de algum modo, vivendo e crescendo

exatamente como estamos fazendo agora, juntos.” Nós acreditávamos e sentíamos isso acontecer

ali naqueles poucos dias.

O filme, que aqui no Brasil não teve grande público, inicia com uma espécie de convite

musical para uma jornada a um mundo ideal onde não há armas e as crianças podem brincar

livremente.

O filme foi inspirado em um livro com o mesmo nome, e o roteiro conta sobre a queda de

um pequeno avião sequestrado, na cordilheira do Himalaia. Todos sobrevivem, exceto o piloto

sequestrador. Caem em um local inóspito, rodeado de geleiras e são resgatados por monges que

voltavam para casa com uma caravana de mercadores.

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Levados desse local, atravessaram um portal, na fenda de uma montanha, chegando num

mundo ensolarado, fresco, verde, utópico, onde tudo funcionava em harmonia, paz, igualdade,

afeto, justiça, onde não havia morte, fome ou frio.

Shangri-La, era o nome do lugar, uma espécie de paraíso perdido, que acolheu o grupo e

ofereceu tudo que havia de melhor.

Cada um dos resgatados com suas insatisfações e questões íntimas, começa a se entregar

ao ritmo do local e sente mudanças internas e externas, eles encontram uma razão, serenidade.

Menos um deles.

Hoje, aos cinquenta e seis anos, rememoro o contexto e a importância desse filme, que vai

além da minha memória afetiva. Imprimiu alguns valores que só agora, olhando para minha

trajetória, me dou conta que, no mínimo, ativou alguns sentimentos que fazem parte do que

considero o melhor de mim, porque sei que afeto, amorosamente, os outros e sou afetada por eles.

Eu tinha apenas nove anos quando vi o filme pela primeira vez. A idade dos porquês, a

minha lembrança mais remota de quando comecei a desejar e argumentar a respeito de um mundo

mais justo e afetuoso. Foi quando comecei a fazer minhas primeiras perguntas existenciais que

deixavam minha mãe agoniada.

Há, no filme, uma canção que pergunta sobre como a pessoa se sente com ela mesma

quando se olha, com o que sonha, quando acorda todos os dias. Me ofereceu uma reflexão que

trago comigo desde então: se eu gosto do que vejo em mim, do que sinto, essa é a pessoa que eu

devo ser.

Sendo o espelho um dos símbolos do inconsciente, esse reflexo que vejo de mim que me

agrada, me diz que estou vivendo bem na casa que eu habito, mas sei que esse bem estar precisa

se estender para as pessoas que convivem comigo.

Nessa aventura que é viver, e em busca desse mundo ideal, percebi com o tempo, que meu

paraíso possível fica dentro de mim mesma, no mais profundo do iceberg do meu inconsciente.

Me conhecendo a cada dia, vou me resgatando, criando a possibilidade de ampliar a visão desse

horizonte paradisíaco que foi perdido pela humanidade.

É possível que só quem encontra o portal por dentro de si, possa oferecer o paraíso fora.

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Nome: Felipe Mello Campos.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (07.34.010) Escola Municipal Pedro Aleixo

Título do Filme: Eles não usam Black-tie

Sobre lembrar e esquecer

Muito se tem discutido recentemente sobre a relevância da memória e sua valorização

como meio de construção da identidade de um povo. Questiona-se, ainda, se o que é

registrado/lembrado pelas imagens do cinema, e da televisão, pelos monumentos públicos ou pelas

produções literárias é uma representação da memória coletiva como um todo ou de apenas uma

parcela específica da sociedade. No filme “Eles não usam black-tie”, por exemplo, o destaque fica

com os operários e moradores do morro e não com os ricos e poderosos.

A originalidade dessa obra reside no fato dela retratar como era a vida das pessoas comuns

das periferias e favelas brasileiras no início dos anos 1980, pessoas como meus familiares e

vizinhos que em sua maioria eram migrantes ou imigrantes. Ao retratar os conflitos, as angústias

e alegrias do cotidiano desses homens e mulheres e suas lutas por democracia e por melhores

condições de vida, este filme remete a minha memória afetiva por valorizar a lembrança, a história

de vida e luta dessas pessoas, incluindo nestes, meus pais, tios e avós.

Devido a esta relação entre o lembrar e o esquecer, o filme “Eles não usam black-tie” é,

para mim, uma obra de suma importância. A obra remete à memória afetiva de minha infância na

periferia da metrópole fluminense, mais precisamente no Município de São Gonçalo, com suas

ruas sem calçamento e enlameadas nos dias de chuva, suas biroscas (tipos de bares simples,

comuns na periferia), seus frequentes casos de violência e abuso policial. Além, é claro, da

desigualdade social, mas sobretudo por retratar o cotidiano de uma família de operários de fábrica,

assim como era a minha família no início da década de 1980.

A cena inicial de Tião e Maria chegando em casa no morro com os pés sujos de lama

devido à falta de saneamento, depois de voltarem do cinema em uma área mais urbanizada, trouxe

claramente em minha memória a época de quando era criança. Naquela ocasião, para termos

acesso ao cinema, por exemplo, tínhamos que ir ao centro de São Gonçalo, uma vez que o meu

bairro não possuía nem cinemas nem a mínima infraestrutura em saneamento básico, assim como

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o bairro onde residiam os personagens retratados no filme. Os móveis simples das casas dos

personagens me lembram os da casa dos meus avós, e soma-se a isso o fato do meu avô ter sido

um operário de uma fábrica de sardinhas em conserva e minha avó dona de casa, assim como

Otávio ( personagem de Gianfrancesco Guarnielle) e Romana (personagem de Fernanda

Montenegro).

Além das similitudes do espaço, seja do bairro ou até mesmo das casas e móveis, outro

fator que remeteu a minha memória foi a semelhança de comportamento entre os personagens e

os membros de minha família. Ao ver Romana catando feijão sobre uma toalha de mesa

quadriculada de material plástico, me veio à mente minha avó na mesma cena e no mesmo cenário,

enquanto nós, os netos, brincávamos no chão da cozinha.

Assim como no filme, as mulheres da minha família assumiam a total responsabilidade

sobre as tarefas domésticas, sem nenhuma participação dos homens, mesmo as que trabalhavam

fora. Apesar de duplamente exploradas, elas eram determinadas e responsáveis pelo equilíbrio da

família. Mesmo sendo ainda pequeno, consigo lembrar de minha avó preparando o prato do meu

avô toda vez que ele chegava do trabalho enquanto ele esperava à mesa.

Diante de tal exemplo, é possível afirmar ser notória a importância do cinema para a

construção da memória social. Assim sendo, o cinema nacional merece destaque com relação à

construção da memória social brasileira, que conta com a produção de inúmeros títulos

importantes e de qualidade ímpar. Por isso, “Eles não usam black-tie”, dirigido por Leon Hirszman

e escrito por Gianfrancesco Guarnielle é, para mim, um marco no cinema brasileiro e na

construção da memória social. Ele representa o cotidiano dos trabalhadores das periferias e

favelas, abordando desde a vida afetiva dos personagens com seus problemas tipicamente

familiares, até o racismo e o machismo presentes em nossa sociedade, passando pela organização

e resistência dos trabalhadores, até a violência policial e a repressão do governo ditatorial

empresarial-militar. Essa obra retrata de maneira primorosa a realidade vivida por uma parcela

majoritária da população brasileira nos idos de 1980.

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Nome: Gustavo da Motta Silva.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (07.34.502) CIEP João Batista dos Santos

Título do Filme: Paperman

Um pouco de ficção na vida e um pouco de vida na ficção: um olhar sobre a noção de

acaso a partir do curta-metragem Paperman

Desde a primeira vez que eu assisti ao curta-metragem cujo título é “Paperman”, imaginei

um dia poder comentar sobre essa história fantástica, de aproximadamente 7 minutos. Logo, meu

texto será curto como o filme e sutil como a história, pelo menos espero! Sendo assim, escolhi

dividir minha argumentação em dois momentos: no primeiro, irei apresentar as partes principais

do filme e no segundo, farei uma pequena reflexão com a ajuda de alguns autores.

A história acontece entre um homem durante um dia entediante de trabalho e uma mulher

que faz uma entrevista para conseguir um emprego. As suas vidas se cruzam no exato momento

em que estão esperando o trem para chegar aos seus destinos. Por acaso, a mulher perde uma folha

de papel e a folha toca o ombro do homem. É o primeiro encontro! Uma outra folha toca o rosto

da mulher e fica com a marca vermelha do seu batom, representando a única lembrança que o

homem possui desse momento.

O dia continua e o homem está no seu escritório, um expediente pesado e uma rotina

ingrata, porém quando ele olha pela janela, ela está no outro prédio. Ele rapidamente procura fazer

aviões de papel para chamar de alguma forma sua atenção e, mesmo terminando todas as folhas

de sua mesa, inclusive a que estava com o batom, não tem sucesso. Ele corre para a rua com a

esperança de encontrar a moça e, para sua surpresa, todos os aviões que ele fez parecem ganhar

vida e são todos comandados pelo avião com a marca do batom vermelho. Os aviões começam a

entrar em contato com o seu corpo e pretendem indicar um caminho para o rapaz, entretanto o

mesmo não sabe e continua resistindo. Após uma enorme batalha entre o homem e as suas criações

de papel, ele é conduzido forçadamente à estação de trem do início do filme. É o último e definitivo

(re) encontro!

Eu pude ler muitas críticas sobre essa história e praticamente todas mostram um homem

solitário como personagem principal. Em minha opinião, o personagem principal não é o homem

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e tampouco a mulher, é o vento! É ele que conduz a história e que apresenta o caminho. A cada

ação do vento, há uma resposta e uma intenção.

É o vento que transporta a folha de papel até que a mesma possa tocar o ombro do homem

e como resposta a essa ação, ele percebe a presença da mulher. Graças à ação do vento, a segunda

folha toca o rosto da mulher deixando a marca vermelha do batom e, como resposta a esta ação,

houve uma memória afetiva daquele momento. É a ação do vendo que faz com que a folha marcada

atinja a janela e permite que o homem veja a mulher através dela no outro prédio. Quando a

entrevista termina e ele ainda não consegue chamar sua atenção, é o vento que mostra a derradeira

folha. É o mesmo vento que retira o último avião de papel da sua mão e o possibilita ver que a

mulher já não está mais no prédio e sim na rua. Por fim, graças ao vento que a folha marcada

indica o caminho do (re) encontro na estação de tem.

Penso que o vento nesta história é uma representação do acaso na vida das pessoas, pois

demonstra que muitas coisas que acontecem escapam, na maioria das vezes, da nossa

compreensão. Eu acredito que a vida ocorra exatamente da forma como o historiador francês

Michel de Certeau uma vez (des) escreveu, como um momento de caminhar em zigue-zague no

presente e a partir de um futuro indeterminado. Complementando esta linha de pensamento, o

historiador britânico Keith Thomas destaca que em alguns momentos de tomada de decisão em

uma vida é necessário “se deixar levar pelo vento”. Na minha humilde concepção, é impossível

viver sem se deixar levar pelo vento, pois nós somos responsáveis por uma parte de nossas vidas

e a outra é o vento que irá decidir.

Portanto, gostaria de agradecer aos leitores e às leitoras que me acompanharam até o

momento. Acredito que não se deve evitar a vertente criativa e inventiva que a escrita demanda.

É por esse motivo que concordo com o historiador brasileiro José Murilo de Carvalho quando o

mesmo diz que “um historiador sem invenção é um homem da burocracia”. Penso que essa

reflexão serve também aos escritores e escritoras.

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Nome: Jeferson Lima de Carvalho Junior.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (07.16.080) Escola Municipal Ginásio Carioca Aleksander

Henryk Laks

Título do Filme: “Love Kills” – Sid & Nancy: O Amor Mata

Na adolescência iniciamos nossas escolhas, construímos nossas particularidades, valores

e opiniões. Não necessariamente os mesmos de seus familiares. Tornei-me adolescente no final

dos anos 1980, entre o fim da Ditadura Empresarial-Militar, a Redemocratização e a

promulgação da Constituição de 1988. Um contexto turbulento em nosso país!

Uma das principais paixões e expressões de um adolescente é a música. Neste período, a

new wave agonizava, as bandas inglesas rotuladas como “dark” e “indie” destacavam-se,

exemplificando Cure e Smiths como representantes dessas ondas, respectivamente. E o rock

brasileiro liderava as paradas de sucesso nas rádios e vendas nas lojas de discos.

A imprensa musical, através de publicações como Bizz, Roll, Rock Brigade e jornais

como JB e programas de TV como Shock na extinta Rede Manchete procuravam dissecar o rock

deste período, como uma influência do... punk! Ao ler esta palavra e, como um devorador não

apenas de histórias em quadrinhos como, também, das revistas e colunas musicais, sofri um

impacto e uma forte atração. Iniciei uma “caça” procurando os significados relacionados a

esta palavra. Uma obsessiva pesquisa! Porém, as fontes a minha disposição eram

insatisfatórias.

Nesta ocasião, meu pai e um tio investiram em locadoras de VHS e seus negócios

prosperavam. Compravam muitos filmes das distribuidoras para locação em suas lojas, entre

Tijuca e Centro. Assistia a vários filmes quando estreavam nesse formato em minha residência

antes de ir para suas lojas. Um destes mudou – radicalmente – minha vida. “Love Kills”, com

Garry Oldman, representando o ícone da cultura punk britânica, Sid Vicious, baixista dos Sex

Pistols, uma das bandas que modificaram completamente, não apenas o rock ´n´ roll, como

também as angustiantes e opressivas existências de adolescentes desejosos em trilhar suas

próprias estradas e de acordo com suas perspectivas.

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Estremecia e sentia calafrios, emocionado, com o simples ato de colocar a fita no

aparelho! Principalmente por assistir o filme sobre o relacionamento amoroso, visceral, agressivo

e transgressor do músico de minha banda favorita (até hoje!) com sua companheira, a norteamericana

Nancy Spungen. Apesar do final trágico da relação exposto na película (Sid foi preso

acusado de matar Nancy em uma briga no quarto do Chelsea Hotel, em Nova York em 1978), o

longa transmitiu para aquele adolescente de classe média, entediados com sua família, formando

suas próprias convicções e buscando sons e bandas que correspondessem aos seus anseios e

vontades, que era possível fazer sua própria música, publicar seus textos e participar

politicamente da sociedade sem a tutela de governos, religiões, partidos, famílias e demais

instituições! As dificuldades encontradas pela banda durante o filme marcaram-me, como a

rejeição e censura que sofriam dos grandes veículos da imprensa, e como conseguiam vencer

essas imposições com uma música crua, violenta e carregada da sinceridade das ruas e periferias

britânicas, através da ética punk: DIY (Do It Yourself ou “faça você mesmo”). As principais

lições deste filme acompanham-me até a presente data em todos os campos de minha existência:

não espere e nem dependa de algo ou alguém para agir, e a destruição também é uma das

alternativas para a construção do novo! E o punk permanece como a morada do meu Ser!

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Nome: Silvania Alves dos Santos.

Função: Professor II

Unidade de Lotação: (07.16.001) Escola Municipal Francis Hime

Título do Filme: Amistad

AMISTAD

Naquele dia, eu saí do cinema me sentindo diferente... não sei explicar.

Estava no ano de 1997 e havia acabado de assistir ao filme “Amistad”, um filme baseado em

uma história real ocorrida com um grupo de negros em 1839. Fui ao cinema por gostar dos filmes

dirigidos por Steven Spielberg. De princípio, relutei em assistir, pois não fazia ideia do que significava

aquele nome “Amistad”.

Spielberg se rendeu e recorreu ao livro “O Navio Negreiro”, do autor baiano Castro Alves,

para entender como eram aquelas embarcações e o que acontecia lá dentro.

Aquelas pessoas retratadas naquele filme, assim como nós, eram humanos também. Faziam

parte de uma sociedade, de cultura e idioma bem diferentes dos nossos, mas tinham uma vida, tinham

famílias, amavam, sentiam dor, sentiam sede, sentiam fome, tinham valores, choravam, sorriam,

tinham medo, viviam suas vidas, admiravam a natureza, criavam, brincavam, ensinavam suas crianças,

assim como nós!

Nunca imaginaria que um simples filme poderia me tocar tão fundo e para sempre!

Ele me mostrou o outro lado dos negros africanos do século XIX! Um lado culto, um lado

desconhecido naquela época.

Aquelas pessoas falavam! Elas tinham vozes! Tinham argumentos, que os ajudaram a mostrar

a todos os presentes naquele tribunal que, por serem humanos, tinham os mesmos direitos e que eram

iguais a eles, com exceção de um detalhe, apenas um detalhe: tinham mais melanina que os outros. Só

isso.

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Esse filme me ajudou a entender o outro lado dos negros africanos, me fez enxergar que em

todas as épocas e em todos os lugares sempre existiram e existirão pessoas e povos diferentes, mas não

pessoas e povos inferiores ou superiores, apenas diferentes!

“Amistad” se tornou, então, o meu filme de afeto, pois me ensinou para sempre que o

preconceito, a discriminação e o orgulho de raça, não engrandece ninguém, pelo contrário, só segrega

e humilha aqueles que os praticam!

Nunca me esquecerei daquele filme tão inteligente e bem dirigido, mas os méritos são daqueles

que viveram esse episódio na vida real, no ano de 1839, e deixaram um grande legado para as gerações

futuras, de que não importa como as pessoas o tratem, o que importa é como você vai lidar com as

situações de preconceito, discriminação que você viver e/ou presenciar em sua vida, tudo dependerá

de que tipo de pessoa você mostrará ser para os outros e o que os outros podem aprender com você.

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Nome: Zelma Candido de Souza.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (07.16.502) CIEP Almir Bomfim de Andrade

Título do Filme: Em Busca do Vale Encantado

Quando o cinema, o filme e a minha vida se encontraram naquela vez

A primeira memória que tenho a respeito de cinema não é sobre um filme especificamente, mas

se refere a um local: o Roxy. Antes mesmo de desconfiar o que se passava numa sala de exibição –

com suas imagens, sons, cheiros, sabores – tinha interesse em saber sobre aquela construção. Um

prédio de esquina, entre a Nossa Senhora de Copacabana e a rua Bolívar, com letreiro luminoso em

vermelho. De fora, podia ver uma escadaria de mármore e corrimão dourado. Mas, o que tinha lá

dentro?

Fui me acostumando a observar as filas se formarem nas bilheterias, principalmente nos fins

de semana. Um grande movimento ao redor do pipoqueiro que trabalhava na entrada do cinema. Era

um senhor conhecido do meu pai que, às vezes, nos vendia pipocas. Eu sempre me perguntava: como

é lá dentro? A curiosidade só aumentava.

Nasci nos anos 1980, período em que o Brasil passava por uma enorme recessão, juros altos,

poder de compra baixo. Infelizmente, para minha família cinema não era essencial naquele momento.

Passado tanto tempo, não me recordo com precisão o mês ou dia em que fui levada, pela

primeira vez, a uma sala, mas sei que foi em 1989.

Independente do dia ou mês, esse acontecimento mágico ocorreu! O deslumbramento, as

recordações daquele momento ainda estão em mim. Naquele dia, minha mãe e eu fomos finalmente ao

Roxy! Fiquei eufórica, não sei se por ir àquele prédio ou por assistir o primeiro filme. Hoje,

retrospectivamente, reconheço que pelos dois.

O prédio era lindo! Grande, espaçoso, imponente. Escadaria de mármore bege e preto, o chão

brilhava e o corrimão dourado que fazia umas “voltinhas na ponta”, lembrava um espiral. Era uma

única sala para mais de 1.600 espectadores. Com minha altura de criança com os seus 7 anos aquilo

tudo era admirável!

Assistimos “Em busca do Vale Encantado”, um filme com dinossauros muito simpáticos,

vulcões, terremotos, cavernas e florestas. A história concentrava as atenções nas peripécias vivenciadas

pelo Little Foot, um pequeno braquiossauro e seus quatro novos amigos: Saura, Espora, Patassaura e

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Petrúci. O pequeno Little Foot e toda sua família estavam indo para o Vale Encantado à procura de

comida, mas no meio da jornada algo trágico aconteceu com sua mãe e Little Foot se perdeu dos outros

dinossauros. Caminhando sozinho para chegar ao Vale, encontrou outros pequenos dinossauros que se

tornaram seus novos amigos e juntos passaram por várias aventuras e descobertas.

Como amei assistir a tudo isso naquela enorme tela, nunca tinha imaginado ou visto nada igual.

O som era alto, a sala era geladinha e bem escura, tinha uma mistura de cheiros: mofo, cigarro e pipoca.

Foi um dia maravilhoso! Esplêndido! Saí radiante daquela sessão. Finalmente havia assistido

a um filme, ao mesmo tempo em que conhecia aquele prédio lindo. Mais do que o meu primeiro filme,

aquele dia marcou o início de uma relação de carinho e encantamento que até hoje, após mais de 30

anos, ainda carrego comigo. Quantos sorrisos, quantos choros, quantos sonhos, quantos momentos

tiveram aquele espaço como cenário e palco principais... Tantos e incontáveis que, agora, me faltam

palavras para expressar seu significado em minha vida. Assim, mesmo ciente de suas insuficiências,

arrisco algumas últimas para homenageá-lo: Roxy, você foi (e permanece sendo) o meu cinema de

afeto.

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Nome: Zeyla Victória Conceição Brandão Duarte.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (07.16.052) Escola Municipal Rosa do Povo

Título do Filme: A Cabana

Meu filme de afeto: um elo eternizado na minha história de vida

Escrever sobre o meu filme de afeto é relatar algumas memórias da minha própria história de

vida. Consonante ao diretor e roteirista, Fedelico Filline, quando ele diz: “O cinema é o modo divino

de contar a vida”, permito-me contar um pouco da minha.

Abrindo o meu baú de memórias, logo recordo dos meus pais me levando pela primeira vez ao

Cinema América, na Praça Saens Pena, no bairro da Tijuca, zona norte do Rio de Janeiro. O ano era

1989.

Confesso meu susto com tanta escuridão, logo saí correndo em direção à luz. Visto que eu ainda

era bem pequena, esta foi a minha “estreia”. Na ocasião, meu pai me abraçou e me acalmou com

palavras doces e de encorajamento. Ele sempre se saiu bem no arquétipo de herói, talvez por ser

Bombeiro Militar e, em seu testemunho de vida, ter ajudado a salvar inúmeras. Essa associação foi

quase sempre natural para mim.

Com o passar dos anos, eu cresci e continuei gostando muito de ir ao cinema e assistir aos

filmes junto à minha família e amigos. Isso se tornou um hábito, até abril de 2020. A cidade do Rio de

Janeiro entrou em quarentena, a qual, todos tivemos que cumprir. O meu pai, já reformado no serviço

militar, fez um convite pelo celular, através do grupo da família em um aplicativo de mensagens. A

proposta era assistirmos ao filme dirigido por Stuart Hazeldine, de nome “A Cabana”. O filme é uma

adaptação do livro de William P. Young, e seria exibido em um canal por assinatura.

Eu aceitei o convite, que devido ao isolamento social, precisou ser assistido cada um em suas

respectivas casas. O filme conta a história de um homem que perde sua filha e passa por momentos

de transição até a cura. Muito tormento, dor, raiva, perdão, superação, fé e redenção são apresentados

nesta obra.

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Quando acabamos de assistir ao filme, trocamos mensagem e, em lágrimas, compartilhamos o

quanto tínhamos ficado emocionados com a história, que em boa parte do roteiro, relata um forte elo

de amor entre pai e filha.

“A Cabana” é o meu filme de afeto, pois uniu duas pessoas afastadas fisicamente, eternizando

um momento em minha história de vida, não apenas pela beleza artística e mensagem que é passada,

mas, principalmente, porque foi o último filme que eu assisti com o meu pai.

Isto me faz citar o dramaturgo Oscar Wilde: “a vida imita a arte mais do que a arte

imita a vida”. Assim como no filme, infelizmente, agora em minha vida, aconteceu uma ruptura em

um relacionamento entre pai e filha causada pela morte.

No dia 24 do mesmo mês de abril em que assistimos ao nosso último filme, meu pai foi

internado no Hospital Central do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro devido à infecção relacionada

ao vírus SARS, causador da COVID-19, fazendo, em poucos dias, o meu herói partir.

Deixou-se a saudade e um belo legado, que é o elo de amor cujo qual ele soube construir de

forma tão grandiosa, ultrapassando hoje a barreira da eternidade.

Como todo roteiro cinematográfico é acompanhado por uma história e por uma bela trilha

sonora, o nosso se constrói por essa nossa trajetória, que é acompanhada pelos versos da canção escrita

e interpretada por Tim Maia: “Não sei por que você se foi, quantas saudades eu senti [...] e aquele

adeus, não pude dar. Você marcou em minha vida, viveu, morreu na minha história [...] e eu, gostava

tanto de você... Gostava tanto de você”.

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Textos Selecionados

8@ CRE

“Não existe fim, não existe início, apenas

a infinita paixão da vida.”


Nome: Aline de Barros Nunes de França.

Função: Professor de Educação Infantil

Unidade de Lotação: (08.17.603) Creche Municipal Dente de Leite

Título do Filme: Uma Patrulha para Recordar

Sou apaixonada por artes e em 2019, ao abordar o tema cinema, quis levar para os alunos, a

compreensão da curiosidade e da necessidade que as pessoas tiveram quando criaram as formas

rudimentares de captar imagens. Produzimos alguns recursos juntos, como o zootrópio,

taumatroscópio, câmara escura e flipbook. Estava muito satisfeita com a euforia e a curiosidade dos

alunos a cada descoberta, até que certo dia, conversando sobre alguns filmes, fui levada a responder

se algumas cenas seriam reais. Quis provar que era possível reproduzir cenas assim, através de edição.

Utilizei a gravação de um aluno e, no celular, pus um efeito de explosão após um salto. Foi um

alvoroço! Todos queriam se ver com os “efeitos cinematográficos”. Propus então, fazermos um filme

cheio de efeitos, mas algo significativo para eles. Daí, lembrei da conversa que tive com a mãe do

aluno “A”, que era bem tímido e estava se fechando mais ainda, após a perda do pai. A mãe acreditava

que ele estaria desenvolvendo um quadro depressivo. Resolvi levar a situação problema para a turma,

na rodinha. E se a tristeza fosse algo que pudesse roubar a alegria de alguém, quem ela seria? O que

faríamos para ajudar essa pessoa?

Nossa produção textual, virou um roteiro. A tristeza, a depressão, viraram um monstro ”O

Amarelão”, e a turma virou a “Patrulha 33” com poderes para combater esse vilão. Cada “ator”

escolheu como faria para tentar resgatar a vítima, presa na tristeza do “Amarelão”. O aluno “A”

escolheu ser um dos heróis, o que me deixou muito feliz. Todos fizeram tentativas usando seus poderes

para salvar a colega. Como os questionamentos continuavam chegando, já não sabia como o filme

terminaria!

Resolvi colocar no pátio, a “Patrulha 33” de um lado e o “Amarelão” segurando a “vítima” do

outro lado. Preparei a câmera para captar qual seria o movimento espontâneo das crianças, pois

planejando, ninguém chegava em um acordo. E qual não foi a minha surpresa ao ver “A” e a Patrulha,

tão cheia de poderes, correr para abraçar a colega em apuros. Ouvi deles, falas cheias de amor nesse

resgate. Fiquei realmente emocionada ao ter a certeza de que as crianças, na sua inocência, souberam

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exatamente como ter empatia com quem precisava de ajuda. Meu coração quase explodiu de orgulho!

Mas não parou por aí...

Reproduzimos uma sala de cinema no refeitório, onde as crianças receberam seus pais para a

sessão, com direito a dinheirinho, pipocas e ingressos. Como as crianças gritavam de alegria no colo

dos seus pais, ao se verem na telona. Os pais no escuro, cheios de orgulho, fotografavam tudo e mesmo

aqueles mais distantes, deixavam uma lágrima rolar. Eu, mais que todos! Apresentei aos responsáveis,

a proposta de participarmos de um concurso da Multirio. Os pais acreditaram que seus filhos

construíram algo realmente belo.

Foi lindo ver a comunidade escolar nos apoiando nas redes sociais, compartilhando o filme,

votando, até chegarmos na cerimônia dos finalistas, onde dispuseram um ônibus para que os alunos e

responsáveis mais lindos e felizes seguissem para o Imperator. Que alegria em ver a vibração deles ao

conhecer um cinema pela primeira vez. Proporcionar isso foi ímpar. Difícil administrar minhas

lágrimas e a euforia deles. Eles, tão pequenos em relação aos outros alunos, mas sabiam que poderiam

vencer. Éramos todos, a cara da própria felicidade! Na abertura, cantavam e agitavam as lanternas que

ganharam, até que chegou o grande momento. Quando ouviram o nome do nosso filme, gritaram: “-

Patrulha do 33”! Corremos todos para a frente. Vi olhinhos eufóricos com seus prêmios! Tiraram fotos

com pessoas importantes. Os pais foram à loucura! Foi uma realização profissional imensa para mim!

Senti que as pessoas queriam me ouvir. E eu falei! Em entrevista à Multirio falei de amor, de

pertencimento, da excelência que meu segmento pode e deve ter!

No retorno, assisti meus alunos adormecendo com suas medalhas no pescoço e seus pais

ressignificando a educação infantil pública. E quando os dias atuais me trazem a saudade e o pesar do

que mal vivi ainda esse ano, encontro na Patrulha de pais e alunos, muitas demonstrações de afeto,

trazendo-me a esperança de dias melhores, pois tenho sempre comigo, um grande filme de amor para

recordar.

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Nome: David Borges Berkowicz

Função: Professor I - História

Unidade de Lotação: (08.17.062) Escola Municipal José Piquet Carneiro

Título do Filme: Meu Pé De Laranja Lima

UM FILME NO CINE GLÓRIA

Domingo era o dia da matinê no Cine Glória. Plateia e balcão com muitos lugares, como eram

os cinemas antigamente. Nove... Dez anos de idade em uma cidade do interior...

Nessa época o cinema exibia, semanalmente, um seriado do Batman da década de 1940, em

preto e branco. O Batman dos primórdios das séries com seu Cadillac preto não empolgava, mas

tínhamos que passar por aquele prelúdio antes do filme em cartaz.

O filme que sempre me recordo daquelas matinês é “Meu Pé de Laranja Lima”, a história de

um menino, Zezé, que no quintal de sua casa em Bangu, no Rio de janeiro, conversava com um amigo

real e imaginário...

Os estudiosos dos processos cognitivos associam a memória à emoção. Aquele filme singelo,

e tão pungente, marcou-me pela emoção que ainda sinto quando revejo as cenas pela internet, como a

da professora repreendendo Zezé com carinho depois de descobrir que as flores que ele lhe dava todos

os dias eram tiradas de uma casa no caminho da escola. E o menino respondendo, a seu modo, que não

via nada de mais porque eram apenas flores esquecidas em um jardim, que ele colhia para que a jarra

sobre a mesa da professora querida não ficasse vazia.

“Portuga”, o melhor amigo, “Luis”, o irmãozinho caçula, as irmãs “Gogoia”, “Totoca” e

“Lalá”, “Dona Cecília”, a professora, o vendedor de revistas com as letras das músicas dos cantores

de sucesso à época da infância do autor, “Minguinho”, amigo e confidente, de quem, tristemente, teria

que se separar um dia... Quantas dores podia suportar o coração de um menino de cinco anos que dizia

que queria ser poeta ao crescer?

Tempos depois, revi os personagens no livro autobiográfico de José Mauro de Vasconcelos

com a mesma emoção.

Meninos, não tínhamos um “pé” de alguma árvore frutífera como amigo e confidente. Nossos,

eram todos os pés de goiaba, manga, romãs, carambolas, quando as frutas amadureciam nas

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redondezas. Uns meninos escalando por sobre os ombros dos outros até os cumes dos muros, de onde

se podia alcançar os galhos das árvores. Algo impensável hoje em dia nos espaços ladrilhados, com

suas plantas ornamentais quase artificiais e muros com cercas elétricas. E muito medo.

Minha nostalgia não é a do tempo das matinês da infância, porque o cinema ainda está lá, vivo,

com sua antiga fachada e letreiro, com parte do espaço reaproveitado, dividido em salas que oferecem

um cardápio de filmes variados aos frequentadores.

A saudade que sinto é a de um tempo recente, do último filme que vi. Não sei quanto tempo

viveremos neste exílio – necessário – tão pertos e tão distantes uns dos outros.

Até chegar o dia de percorrer as mesmas calçadas da infância, atravessar a rua revestida de

pedras, adentrar ao Cine Glória, ver um filme e me emocionar, como naquele dia em que assisti “Meu

Pé de Laranja Lima”.

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Nome: Erika Brasil de Oliveira Barreto.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (08.17.028) Escola Municipal Presidente Médici

Título do Filme: O Mágico de Oz

Muito além de Oz

Segundo BETTELHEIM (2012, p. 413), “cada conto de fadas é um espelho mágico que reflete

alguns aspectos de nosso mundo interno e dos passos exigidos por nossa evolução da imaturidade à

maturidade”. Nesta premissa, o filme: “O Mágico de Oz”, dirigido por Victor Fleming, lançado

em 1939, captou essa ideia de tal forma, que se fez presente na construção da memória afetiva de

minha formação como pessoa. Ele tocou profundamente a minha identidade desde a primeira vez que

o assisti, devido à toda sua construção cênica e simbólica. Quando trago em minha memória

afetiva todos os personagens, seus conflitos e seus desejos, consigo percorrer por espaços fabulosos

de minha mente e coração. Ao revê-lo, a infância se revela novamente de maneira fantástica e

apaixonante na minha vida.

Preservo muito a fase de ouro da meninice, em que pude vivenciar a magia e a fantasia na

maior parte das minhas experiências cotidianas. Nesse contexto, o filme “O mágico de Oz” me

despertou o fascínio pelo mundo dos Contos de Fadas. Essa admiração nasceu pela catarse que ele

gerou, através dos personagens e dos temas apresentados. A obra me fez viajar e me materializar no

encantamento proposto pelos diretores. Nesse ínterim, assim como ocorreu com a personagem

Doroty, achei o conforto, a alegria e a liberdade para, de uma certa forma, resolver meus próprios

quebra-cabeças.

O lúdico sempre me atraiu, a ponto de carregar aspectos pueris em minha vida, mesmo na

maturidade. Isso se reflete também em minha profissão e prática pedagógica, em que procuro trazer os

elementos cênicos de uma fábula para a sala de aula, o que facilita as aprendizagens. A dinâmica do

filme demonstra esse movimento quando o “Mágico” de Oz desafia os personagens a alcançarem seus

sonhos, vencerem seus medos e fraquezas, de forma a perceberem que eles são seus próprios heróis e

protagonistas. Poderíamos dizer que cada personagem é uma parte do ser humano. Eles reunidos

poderiam tornar-se um na busca do ideal que tanto se almeja. Nesta perspectiva, a minha

identificação é exemplificada com a metodologia utilizada no cinema, na medida em que o

desconhecido, o sonho e o fantástico, que a pequena Doroty e seus amigos percorrem no jogo gerado

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pelos seus desafios, acontecem: o Homem de Lata atrás de um coração (emoção), o Espantalho na

busca de um cérebro (razão) e o Leão na procura de sua coragem (autoconfiança).

A canção “Somewhere over the rainbow”, cantada por Doroty, até hoje, transporta-me ao

modelo de mundo que almejamos, apesar de considerar utópico encontrar a perfeição no final do arcoíris,

pois a caminhada é composta de algumas pontes traiçoeiras que ofuscam o nosso coração e a nossa

esperança “infinita”. Na realidade, descobri na trama que esse lugar não está tão distante,

mas dentro de nós, na nossa visão e na nossa forma de ser e agir.

Vencer o mal, que se materializa na figura da Bruxa Má do Oeste, é o objetivo universal do ser

humano – ou deveria ser. Isso é muito bem ilustrado aqui, quando os servos leais da Bruxa Má ficaram

felizes no momento de sua derrota. Essa diferenciação polarizada de bem e mal me impactou durante

as cenas desta obra, uma vez que na infância é que o certo e o errado estão sendo aprendidos. Assim, já

na maturidade, posso identificar minhas próprias bruxas e fadas e atuar de forma mais consciente.

Em síntese, os elementos simbólicos do filme “O Mágico de Oz”, em suas

alegorias representadas: a inocência, os medos, os receios, as aprendizagens, o sonho, a fantasia e

magia, a casa, o acolhimento e a esperança, vêm à tona nesta grande “fábula” cinematográfica. Faço

questão de citar Shakespeare, quando diz que: “Lembrar é fácil para quem tem

memória, mas esquecer é difícil para quem tem coração”. É certo que todos

os ensinamentos dessa obra encantadora estão guardados não só no íntimo da minha mente, mas

também em meus átrios. Reassisti-la é... reanimar a criança pulsante da minha alma.

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Nome: Isabella Martins Dias Ferreira.

Função: Professor I - História

Unidade de Lotação: (08.33.007) Escola Municipal Rosa da Fonseca

Título do Filme: A Garota Dinamarquesa

A diversidade é o meu lugar de afeto

As salas da minha infância evocavam a lembrança de um tempo que não mais existia, mas

ainda resistia num glamour meio decadente: carpetes vermelhos, detalhes dourados e cortinas

aveludadas. Lembro dos balcões de mármore onde na ponta dos pés, pedíamos pipoca e coca-cola.

A emoção surgia antes do filme começar, correr para escolher os melhores lugares e evitar

entrar na sala com ela completamente às escuras. Revivendo o passado, perdi as contas de quantas

vezes sonhei naquela cadeira de cinema, sorri ou engoli o choro.

Adulta, todo aquele ritual foi perdendo força e fui me concentrando na estética do filme, críticas

sobre cores, referências, montagem, figurino, atuação... Nas memórias, surgem horas acordada

acompanhando o Oscar e julgando ser profunda conhecedora da Sétima Arte. Até vir a fase dos cults,

do cinema alternativo. E a descoberta de que os filmes também tinham outro idioma além do inglês.

O cinema ganhou valor pela autenticidade. Deixei de almejar finais felizes e passei a buscar a

incômoda sensação de soco na boca do estômago. Que realidade dura, fria e cortante teria o poder de

me afetar? Ganhou “A Garota Dinamarquesa”.

Pessoas idiossincráticas são meu fraco, basta um descuido e elas fisgam minha total atenção. E

Lili Elbe, a garota do título, era um desses seres humanos intrigantes.

Lili nascera como Einar Wegener. Pintor de paisagens, relativamente bem-sucedido, casado

com a também pintora Gerda Wegener, na intimidade parecem felizes.

Certo dia, uma das modelos de Gerda, cuja especialidade era pintar telas retratando corpos

femininos, não apareceu. A cumplicidade existente entre o casal, permite a Gerda recorrer a uma

estratégia inesperada: pedir que Einer se vestisse parcialmente de mulher para posar no lugar da

modelo.

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O vestido, a pose feminina, a estranheza em sentir-se bem com algo tão macio e delicado

tocando a pele. Provavelmente Einer carregava dúvidas quanto a ser um homem tradicional e a situação

apenas as reforçaram.

E o casal, que tem a fama de boêmio e de estar à frente do seu tempo, não parou por aí, levando

a brincadeira para além das quatro paredes. Sempre esquecemos que brincadeiras começam

inofensivas, mas abrem a porta para a verdade entrar.

Lili passou a frequentar os eventos sociais, sendo apresentada como prima de Einar. E aos

poucos, não temos mais dúvidas: Lili é real, ao passo que Einer é um personagem ficcional.

O casamento entre os pintores já não é mais o mesmo. Ambos não estavam preparados para a

chegada de uma 3ª pessoa. Se por um lado, Lili embarca numa viagem de descobertas e

autoconhecimento, por outro, Gerda precisa lidar com mágoas, confusão e a perda da estabilidade

como pintora e mulher casada.

Nesse sentido, o filme retrata mais as dores de um casamento do que propriamente a biografia

de Lili Elbe, que viria a ser a primeira pessoa a se submeter a uma cirurgia de mudança de sexo. Isso

em 1931.

A sua luta pelo direito de existir continua atual. Diria Nietzsche: “Nunca é alto o preço a se

pagar pelo privilégio de pertencer a si mesmo.” Resume bem a vida de Lili, embora Gerda também

seja um personagem apaixonante. Muito antes de Lulu Santos, Gerda bem que poderia ter cantado que

toda forma de amor é justa. E isso é o que ela não se cansa de fazer, amar Lili de forma tão digna e

justa, mesmo sabendo que a mulher roubara seu marido e melhor amigo.

A escolha de “A Garota Dinamarquesa” como meu filme de afeto recaiu numa lembrança em

que uma vez alguém me disse: “E não é que, mesmo com tanta diferença, a gente se entende tão bem?!

Vai ver que é porque acreditamos na diversidade como o que há de melhor nesse mundo e lutamos

para que ela seja respeitada.”

O cinema, produto cultural, é também um reflexo de tudo o que somos enquanto sociedade. E

esse mesmo reflexo, visto enquanto meros espectadores, nos afeta porque somos capazes de olhar com

mais empatia, de virarmos fãs e de celebrarmos as diferenças, que existem no mundo e em nós. E por

vezes, até aplaudi-las quando são premiadas.

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Nome: Katia Zandomingo Soares.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (08.16.033) EMAC Mário Casasanta

Título do Filme: O Nome da Rosa

No Princípio era o Verbo...

(João 1:1)

O mundo sempre me chegou pela palavra... sou fã e acredito muito nela e uma das coisas que

mais me encanta é o discurso. Eu não me dei conta disso desde cedo... a descoberta veio aos poucos

porque – no início – os diálogos eram internos e silenciosos, altamente reflexivos sempre à cata de um

interlocutor que morava em mim mesma. Mas, só descobri isso mais tarde.

Lembro-me bem do primeiro embate, no início do catecismo na Escola Municipal Churchill,

minha primeira escola. O padre, trajado de preto, era nosso professor. Ele, naturalmente, cumprindo

seu papel de padre e obedecendo aos imperativos da época, nos passava os dogmas principais da Igreja

Católica e imagine, com idade tão tenra, ousei discordar, mas não ousei externar. E, para surpresa de

todos, um dia o padre perdeu a paciência, saiu da escola batendo a porta, prometendo aos brados e em

meio a alguns impropérios, que não mais voltaria. Provavelmente não estava preparado para lidar com

a criançada. Pasmo dentro de mim e provavelmente em todos. E ele cumpriu sua promessa e, confesso,

para minha alegria.

O que tais fatos teriam a ver com o meu filme de afeto? Pois é, a memória e o vivido pregam

peças na gente. Nossas escolhas e gostos Deus sabe lá onde fomos buscar. Essa memória foi a primeira

que me denunciou a mim mesma, - como diria Bentinho, personagem de Dom Casmurro de Machado

de Assis – no que concerne à escolha do filme “O nome da rosa”, baseado no livro homônimo. Que

filme é esse?

Eu o amo porque me permitiu refletir nas incoerências do primeiro embate de ideias pelo qual

passei, o primeiro de que tenho noção, já relatado aqui. Há um sabor especial nos diálogos do Mestre

com o discípulo, nos diálogos do franciscano William de Barskerville com o beneditino Jorge de

Burgos, o guardião da maior biblioteca da Cristandade... há um sabor de medievo com todas as suas

nuances de miséria e de esplendor...a busca do conhecimento e a negação dele, ratificando a ignorância

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para não permitir a dúvida e o questionamento. A questão do riso e da comédia contidos no suposto

segundo livro da Poética de Aristóteles (livro dado como perdido). O livro maculado e maculado o

conhecimento e a descoberta. Manipulação das verdades, ausência de diálogos. Como pode? Tão

antigo e tão atual...

O filme, lançado em 1986, dirigido por Jean-Jacques Arnaud, dialoga com o livro e, sendo

assim, apresenta uma riqueza de símbolos que, certamente, não alcancei, e mesmo que o assista ainda

inúmeras vezes, não alcançaria, tamanha é a riqueza do arsenal semiótico. A começar pelo título,

inspirado pela expressão: “Stat rosa pristina nomine, nomina nuda tenemus”, que poderia ser traduzida

por “a rosa antiga permanece no nome, nada temos além do nome”. Essa expressão nos remete a uma

figura retórica da poesia medieval, ou seja, as coisas deixam de existir e ficam apenas as palavras.

Creio que seja aproximadamente essa a ideia de Adso de Melk, discípulo de William de

Baskerville, no fim da narrativa do livro, ao fazer a citação latina descrita acima. E, apesar de ratificar

esse significado, poderíamos também fazer outra leitura no filme: ele, sequer sabe o nome do único

amor terreno que carregou consigo ao longo da vida.

Nesse maravilhoso filme, tenho o resgate do padre da minha infância, na figura de

Baskerville. E o vislumbre de que a vida nos apresenta um enigma que consiste em tentar descobrir o

nome da rosa.

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Nome: Mônica Andréa dos Santos.

Função: Professor I - Espanhol

Unidade de Lotação: (08.17.028) Escola Municipal Presidente Médici

Título do Filme: Central do Brasil

Nas entrelinhas

Estávamos em 1998, e eu completaria oito anos de exercício do magistério público. Nele,

conheci e convivi no meu cotidiano com muitas “Doras” e “Josués”, protagonistas do meu filme de

afeto, “Central do Brasil”. Entretanto, foi através da magnitude dele, na tela do cinema, projetando a

realidade de brasileirinhos e brasileirinhas, que pude ter a dimensão da importância do ato da leitura e

da escrita, ao ser praticado com afetividade por seus interlocutores, assim como afirmava Paulo Freire,

“É preciso que a leitura seja um ato de amor.”

Após um grande período de falta de investimento e preconceito, o cinema nacional, surgia

naquele momento, com uma grande promessa de sucesso, através do diretor Walter Salles, que trouxe

a público, acertadamente, um filme de raiz, destacando nossa terra, nossa cultura e nossas carências,

representadas pelo talento e profissionalismo de Fernanda Montenegro, como a professora Dora e o

iniciante, descoberto em um aeroporto do Rio, engraxando sapatos, o menino, Vinícius de Oliveira, no

papel de Josué.

Dora é uma professora aposentada, que escreve cartas para os transeuntes que passam

diariamente pela popular estação Central do Brasil. Mas a personagem está longe daquele estereótipo

de “aposentada boazinha”, sem segundas intenções, ao contrário disso, a mulher cobra por essa escrita

às pessoas humildes, em geral, analfabetas, e seleciona, dentro de seu julgo, o que deve chegar ao

destinatário e o que deve ser inutilizado. No desenrolar da história, a mãe de Josué, Ana, pede à mestra

que escreva uma correspondência ao pai de seu filho, que mora no sertão nordestino, pois o mesmo

quer muito conhecê-lo. Ao observar o garoto, Dora percebe que o menino tem um comportamento

agitado e arisco, como muitos alunos que conhecemos em nossa caminhada. Diante disso, não tem

muita simpatia por ele, a princípio. Mas, quis o destino que a mãe de Josué fosse atropelada por um

ônibus, ao sair da Estação, gerando o início de uma série de conflitos na trama.

Assim como nós, em muitos momentos de nossa função, a professora se sensibiliza com a

situação do menino, e embarca numa viagem profundamente humanizada com ele, com o objetivo de

ajudá-lo a conquistar seu sonho: conhecer seu pai. Quantas de nós já fomos “Dora” em nossa profissão,

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querendo amenizar a dor de um de nossos estudantes? Creio eu, que muitas! São inúmeros “Josués”,

que transitam no decorrer de nossa carreira, e que nos fazem repensar nossa prática pedagógica

constantemente. A personagem, que no início do filme demonstrou ser uma pessoa dura, foi se

transformando ao longo de sua trajetória, de maneira sutil, como se fosse uma “redenção”, às suas

atitudes iniciais.

Em uma de suas entrevistas sobre o sucesso do filme, Fernanda disse que teve ótimas

professoras primárias, talvez isso tenha impulsionado sua espetacular atuação, na qual a dureza de

Dora vai se suavizando, à medida que as tensões vão se estabelecendo, e por consequência, a conquista

de muitos prêmios, como o “Urso de Prata”, no Festival Internacional de Cinema, em Berlim, entre

outros.

A trilha sonora do filme é fantástica! Composta de muitos sons instrumentais, como se fossem

um alento a todo pano de fundo da história, a câmera vai rodando e dá uma ideia que o comportamento

da professora vai se transformando, conforme os acontecimentos. Aliadas às belas canções, surgem às

paisagens da seca e a visível dificuldade do homem sertanejo de sobrevivência, fazendo o coração de

quem o assiste palpitar.

Na cena final, a emoção me transborda, em virtude da difícil decisão de Dora, ao partir, e ter

que deixar Josué com seus irmãos recém-conhecidos e sem, ao menos, ter visto seu pai, Jesus. Assim

como a personagem, são muitas as escolhas que nos colocam à prova, seja na vida pessoal, seja no

ofício de ensinar. Nem sempre temos o domínio da situação, e diante de tantos imprevistos,

necessitamos tomar atitudes, muitas vezes não acertadas, mas, que em sua maioria, de muito boa

vontade, cercadas de tanto carinho e afeto, que ficam eternizadas em nossos corações.

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Nome: Nádia Maria Monroy Garcez.

Função: Professor I - Ciências

Unidade de Lotação: (08.17.041) Escola Municipal Abrahão Jabour

Título do Filme: Cantando na Chuva

CINEMA E MEMÓRIA – MEU FILME DE AFETO

Quando penso em minhas lembranças mais afastadas, vejo o cinema como uma forma de trazêlas

tão rápido quanto uma corrida, afoitas e meio desengonçadas em minha mente... Ir ao cinema, na

verdade, era um luxo que minha família não dispunha, mas não faria mais diferença pra mim, depois

daquele dia...

A memória que me arrebata foi a primeira vez que assisti a “CANTANDO NA CHUVA”, ao

lado da minha mãe.

Acho que estava de férias, não sei, não lembro o horário, o dia, o entorno foi engolido da

memória, mas o que ficou vívido foi quando ela simplesmente olhou para a pequena TV em preto e

branco e sorriu, só sorriu.

Ela sentou-se no sofá e me chamou, calmamente. Não era de demonstrar afeto; as palavras mais

duras eram comuns, os gritos, não tão raros. Nada disso era novo. Mas depois daquele dia, quase não

a reconheci. Ou talvez, não a conhecesse mesmo.

No começo, eu parecia não saber o que era tudo aquilo, mas aí, eu vi... Juro que vi! Nos olhos

dela havia um brilho, algo meio que marejado, mas que não era triste! E foi quando o ator começou a

dançar. Nunca tinha visto aquilo antes! Como pode alguém fazer um filme e dançar? Mas ele não

parecia um ator quando dançava, ele parecia um brilho se mexendo rápido, uma música feita de gente.

O que foi despertado ali, enquanto eu estava sentada do lado da minha mãe, vendo o moço de

sorriso bonito rodopiar feliz debaixo da chuva torrencial? Naquele momento, enquanto ele demostrava

com seus passos, a emoção do amor, acho que ele nem sabia, mas era correspondido por mim, que

sentia meu coração bater feliz, quase que no compasso da música.

E, de repente, vi o trio de amigos desejar “bom dia” (Good Morning), em meio a uma crise.

Como alguém canta de alegria no desespero? E pensei como a vida pode não dar certo? É só dizer

feliz.... BOM DIA!

Eu entendi isso, e vi nos olhos dela ao meu lado, no sofá ...e sabia que, naquele momento pelo

menos, ela entendia também.

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Quando o Sr. Gene Kelly dançava e exalava seu fascínio, eu percebi que aquele musical era

mais que um filme, ele transbordava dos olhos da minha mãe.

Nem sempre fomos uma dupla afinada. E hoje, sei que nem sempre nossa vida é um musical

feliz, nem sempre podemos tocar a canção e nos embalar todos no mesmo ritmo.

Mas, enquanto via aquele moço dançando e sorrindo, mesmo com a roupa toda molhada,

mediante a chuva que lhe encharcava e com um policial que queria prendê-lo por desordem, entendi o

olhar molhado da minha mãe e pude vê-lo outras vezes depois no rodopio da noviça no monte, do

moço elegante de smoking que parecia flutuar e se chamava Fred Astaire, na briga dançante de rapazes

em uma sublime história de amor.

Todos esses momentos me consolidaram um amor, meio que dividido pelas imagens que

enchiam os olhos e a música que me enchia o coração. Então, eu penso nos olhos lacrimosos da minha

mãe e via neles a chuva, mas no fundo, eu podia quase ver a dança deles também, em meio à chuva do

marejar.

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Nome: Taíse Nascimento Paraná.

Função: Professor II

Unidade de Lotação: (08.17.018) Escola Municipal Leônidas Sobriño Pôrto

Título do Filme: Conta Comigo

Na minha adolescência, ao assistir “Conta Comigo”, me identifiquei com um dos personagens,

que no final escreve um livro sobre os amigos que fizeram parte da sua infância e adolescência, que

por vários motivos perderam o contato quando adultos.

Eu e meus amigos, assim como no filme, inventávamos brincadeiras que eram só nossas! Nos

reuníamos para contar histórias de terror, algumas verdadeiras, outras fruto da nossa imaginação, sentir

medo, adrenalina era uma diversão para nós!

Lembro-me que tinha um caminho alternativo para irmos para a escola, com árvores, flores,

casas, uma paisagem que parecíamos estar em um mundo paralelo. Ficávamos comentando sobre o que

víamos e a imaginação fluía.

Brincávamos em uma casa abandonada e no quintal improvisávamos um fogão a lenha, só saía

arroz empapado, ovo frito e batata gordurosa! Também tinha o escritório e o banco, onde era difícil

decidir quem era o gerente ou o caixa, a escolinha, e a clássica brincadeira de casinha. As horas se

passavam...

E o mais legal de tudo é que apesar das diferentes personalidades, onde sempre tem um mais

maduro, o brincalhão, aquele “difícil”, o estressado, e mesmo com todas essas particularidades, nos

momentos difíceis, um podia contar com o outro, nos completávamos.

O filme mostra exatamente essa questão, todos tinham problemas em casa, traumas. E aquela

parceria entre eles era um modo de saber que você não está sozinho, sempre pode contar com um

amigo. Os momentos de euforia, tristeza, decepção, surto, mas juntos! Para mim, esse é o segredo da

amizade, uma ligação que independe das adversidades financeiras, emocionais, raciais ou de

personalidade, simplesmente um faz bem para o outro, esse é o segredo.

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Sinto realmente muitas saudades dos meus amigos de infância e adolescência, sendo um

privilégio ter vivido todas essas histórias com eles, foram a minha base para reconhecer o sentido de

amizade e a importância de ter amigos de verdade!

No filme, quando ele escreve sobre seus amigos que perdeu o contato, e o que cada um se

tornou, o sentimento é de muito afeto que o tempo não apaga, apesar da distância e das adversidades

da vida. É uma realidade para muitos adultos como eu, por isso, “Conta Comigo” é meu filme de afeto.

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Nome: Ricardo Chagas Ferreira.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (09.18.205) Núcleo de Arte Dr. Dilson Fonseca de Alvarenga Menezes

Título do Filme: De Volta para o Futuro II

Ser criança nas décadas de 1980 e 90 significava ter poucas opções de filmes, além dos

clássicos Disney e dos nacionais estrelados por Xuxa e/ou Os Trapalhões, que preenchiam as nossas

semanas de férias, tanto no cinema quanto na televisão.

Eu sou morador de Campo Grande, zona oeste do Rio de Janeiro, a maior população do

município. E na década de 1980 tínhamos duas salas de cinema de rua, o Cine Palácio Campo Grande,

maior sala de cinema do RJ, até então, com 1950 lugares e o Cine Campo Grande com 1400.

Ir ao cinema era o “evento” de Campo Grande. A pipoca, a maçã do amor, o algodão doce. E

os amigos que encontrávamos na fila. Cinema era o programa de fim de semana de quase todos os

moradores. Só ganhava concorrência quando algum circo chegava aos terrenos baldios do bairro.

Durante anos, o cinema foi o único contato com a arte para muitas pessoas. A tela enorme nos

transportava para outros lugares, outras épocas, outras realidades. Era possível sair de Campo Grande,

mesmo estando no centro do bairro. Você descia do ônibus, comprava o ingresso, entrava na sala e

viajava. E é nesse contexto que apresento o meu filme de afeto: De Volta para o Futuro II (1989).

Tendo como base o bairro de Campo Grande na década de 1980, que era a minha realidade e

que para muitos era visto como zona rural, me deparei na tela com um futuro onde teríamos carros

voadores abastecidos por lixo, jaquetas que secavam automaticamente, tênis que ajustavam-se aos pés

automaticamente, skates flutuantes e tantas outras novidades/possibilidades. Eu viajei para dentro do

filme. Comecei a acreditar que poderíamos mudar o nosso futuro. Que não precisávamos ser o que

pensavam que éramos. Poderíamos ser o que quiséssemos. Entendi que qualquer ação que eu fizesse

no presente, interferiria diretamente no meu futuro, por isso era preciso pensar muito antes de agir.

Se não assistíssemos ao filme no cinema, ou se quiséssemos assistir novamente em casa,

precisávamos esperar meses para chegar às locadoras e, às vezes, anos para chegar à televisão. Não

tínhamos a facilidade de pagar um canal de streaming ou de encontrar no YouTube e nos torrents. E

assim foi. Esperei chegar à locadora, loquei o filme em uma sexta-feira e passei o final de semana

inteiro assistindo e viajando. Imaginando possibilidades se tivesse acesso à máquina do tempo. Locais

para onde poderia viajar. Pessoas que poderia conhecer. Fatos que poderia intervir ou presenciar.

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Hoje, com acesso à máquina do tempo, primeiro postaria uma foto no Instagram ao lado do

DeLorean, apenas para deixar registrado, e voltaria ao ano de 1990, exatamente no dia em que foi

assinado o contrato de venda do Cine Palácio Campo Grande para uma rede de igrejas. Proposital ou

não, foi tirada da população de Campo Grande uma das duas salas de Cinema que tínhamos. Fomos

privados de acesso à cultura. À época da venda, era comentado que o cinema havia sido vendido para

empresários de casas de shows, mantendo assim a função cultural do prédio. Ao ser descoberto que

seria construída uma igreja, sentimos o golpe. O prédio deixou de ser democrático. A partir daquele

momento, apenas um grupo específico frequentaria o local. A entrada, mesmo que gratuita, não era

permitida e nem agradava a todos. Há 30 anos que o filme em cartaz é o mesmo.

No final da década de 1990, a outra sala também encerrou as projeções, deixando Campo

Grande carente de cinema. O bairro que já teve a maior sala de projeção, agora tinha nenhuma. No

início dos anos 2000, o Governo do Estado assumiu o prédio, mas o transformou em um restaurante.

Atualmente temos salas de cinema apenas nos dois shoppings do bairro, um em cada terreno

onde os circos ficavam na década de 1980. Onde, atualmente, o acesso e a permanência não são

democráticos. Tenho alunas e alunos que amam filmes, mas nunca foram ao cinema.

Se eu pudesse voltar no tempo e impedir a venda do cinema para a igreja, talvez, essas crianças

pudessem assistir a filmes com preços populares e no coração do bairro. Não sou contra o progresso.

Não sou contra a igreja. Não sou contra o restaurante popular. Mas sou a favor da Arte e da Cultura. E

penso que um cinema não precisa deixar de existir para que exista uma igreja ou um restaurante. Um

não anula o outro. Mas há muito que Arte e Cultura não são vistas com bons olhos. Para mudar isso,

na raiz, eu precisaria voltar à chegada dos portugueses à Pindorama, mas aí já seria outro filme.

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A infância marcante de Fellini: “um rapazinho que

vivia na província, em família, com o fascismo, a

igreja, o colégio, o cinema, o cinema americano, e

no verão as alemãs de maiô na praia...”


Nome: Camilla Sousa de Mello.

Função: Professor do Ensino Fundamental

Unidade de Lotação: (10.19.075) Escola Municipal Roberto Civita

Título do Filme: Uma Babá Quase Perfeita

Recordo-me com felicidade da minha infância em uma humilde residência na Zona Oeste da

cidade do Rio de Janeiro, local que traz boas lembranças. No tempo das locadoras, das fitas de vídeo

VHS, um filme foi um marco no desenvolvimento do meu relacionamento com meu pai.

Aos finais de semana, não íamos para shopping ou cinema, mas tínhamos o hábito de alugar

filmes, fazer pipocas e assisti-los em família. Risadas, lágrimas e muitas conversas após as maratonas

de filmes em VHS.

O filme “Uma Babá Quase Perfeita”, do diretor Chris Columbus, do ano 1993. Narra a história

de um pai extrovertido e alegre, interpretado pelo ator Robin Williams, um dublador de show infantil

desempregado que após a separação acaba obrigado a passar pouco tempo com seus filhos, por isso

ele elabora uma personagem a Sra. Doubtfire para trabalhar na casa de sua ex-mulher e assim ficar

próximo dos seus filhos. Entre muitas trapalhadas e momentos cômicos o filme também passa

momentos de reflexão e ternura quanto ao esforço do pai para ficar ao lado dos filhos e acompanhar o

seu crescimento.

O filme me fascinou, não apenas pela narrativa, mas por despertar em mim a necessidade de

reconhecer o esforço dos meus pais em oferecer seus cuidados e amor, apesar de estarem divorciados.

A determinação desse pai em se reinventar, superar seus próprios limites a fim de manter a

amizade e o amor e estar presente quando seus filhos precisam, me fez despertar para algo que eu

estava a viver em minha vida. O empenho do meu pai em se fazer presente, sempre buscando recuperar

o tempo que ele esteve longe, pois após o divórcio ele se distanciou de mim e de minha irmã.

Ver a dedicação do pai relatado no filme que se fazia passar por uma babá apenas para

permanecer junto dos seus filhos me fez perceber o esforço do meu pai em tentar reativar laços antes

apagados pela distância. Ele não queria voltar a ser casado com minha mãe como eu queria, porém

desejava acima de tudo ser meu amigo, se fazer presente e ser apenas um bom pai. Independente de

todas as circunstâncias.

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Hoje meu pai é falecido, e quando assisto esse filme me lembro dele, de seu esforço e limitações

como pai, me recordo de tudo que ele superou para desempenhar o seu papel como pai. Entendo que

fizemos o nosso melhor, eu como filha e ele como pai.

Durante a nossa convivência meu pai se tornou um amigo em todo tempo, um conselheiro na

hora exata, um exemplo em todos os momentos, um protetor quando necessário e um pai sempre

disposto a se reinventar!

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Nome: Cássio Luis Veríssimo.

Função: Professor I - Espanhol

Unidade de Lotação: (10.19.040) Escola Municipal Gandhi

Título do Filme: Cinema Paradiso

Meu filme de afeto é...

Ainda não tinha 30 anos quando assisti pela primeira vez a obra Cinema Paradiso. De imediato

me impactou a trilha sonora composta por Ennio Morricone, a sensibilidade, a simplicidade e a

emotividade da película de Giuseppe Tornatore, ganhadora do Oscar de melhor filme estrangeiro, do

Globo de Ouro e do Festival de Cannes. Sou um sessentão que teve uma infância pobre em uma época

na qual não havia estímulos eletrônicos. Minha mãe, de alguma forma, se assemelhava em dificuldades

com a mãe do personagem Totó: dinheiro muito curto e preocupação com um filho ativo, curioso e

disposto a buscar alegria e carinho. Assistir ao filme é como um retorno à minha infância pobre sob a

rigidez de uma mãe que, por muitas vezes, castiga o filho simplesmente pelo fato de não saber o que

fazer. Totó é o sorriso fácil, os olhos ora tristes ora radiantes de um menino que é fascinado pela magia

do cinema e por seu amigo Alfredo.

O garoto Totó vive em um vilarejo da Itália num período em que tudo é difícil, perigoso e

escasso. O país vive a Segunda Guerra Mundial e é neste contexto que o menino busca diversão e

atenção. O que realmente o atrai e diverte é o Cinema Paradiso. É um verdadeiro fujão. Suas escapadas

com destino ao cinema custam-lhe alguns puxões de orelha e broncas de sua mãe. São comoventes as

expressões de sofrimento da criança e a angústia da mãe que não conta com a presença do pai do

menino. A verdadeira alegria de Totó é poder manusear as fitas dos filmes e colecionar trechos

cortados das mesmas pelas mãos do projetista. O Cinema Paradiso é mais que uma casa de projeção.

É puro realismo! Neste espaço, o público expressa o que entende por moral, ética, oportunidade e

sensualidade. A casa sempre lotada e barulhenta é o encanto do menino que consegue observar o

mundo adulto desde cima.

É na sala de projeção, onde velhas máquinas exibem as películas, que se dá a interação,

cumplicidade e amizade entre Totó e o projetista Alfredo. O menino tem neste adulto, que se aproxima

da velhice, o amigo que exerce as funções de colega, pai e avô. A dupla se diverte nas exibições como

se fossem duas crianças. É Alfredo que o ensina a amar a Sétima Arte. Não só os filmes, quase sempre

os mesmos, mas principalmente o comportamento e reações daquele público sofrido, mas vivaz, é o

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que fascina os dois amigos. A passagem da infância para a puberdade se dá por ocasião do incêndio

que encerra as atividades do cinema, ceifa o labor do velho projetista e marca para sempre a existência,

já difícil, do menino. Chega a juventude, a desilusão amorosa, a guerra já terminou, o cinema está

fechado e o agora jovem Totó vai para a cidade grande.

É no retorno do personagem, décadas depois, cineasta consagrado e rico, ciente da morte de

Alfredo, que defino Cinema Paradiso como “Meu filme de afeto”. Tornatore consegue, com maestria,

fazer deste retorno, a passagem a limpo da vida do agora homem Salvatore. O fato de voltar à pequena

cidade e poder rever cenas de filmes antigos em uma sala de exibição moderna e confortável o

emociona. Ter obtido sucesso profissional e a admiração dos antigos vizinhos de vilarejo já não faz

diferença neste momento da vida. A felicidade sempre esteve na infância, no amor da mãe, na

cumplicidade de Alfredo e no Cinema Paradiso.

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Nome: Luana de Fatima Machado Ignacio Rodrigues.

Função: Professor I – Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (10.19.035) Escola Municipal IPEG

Título do Filme: A Menina que Roubava Livros

A menina que roubava livros: transcendência e “empoderamento”

Há alguns anos, tive a oportunidade inspiradora de assistir ao filme “A menina que roubava

livros”, a envolvente história de Liesel, uma menina enviada como filha adotiva ao casal Hans e Rosa

Hubermann em razão dos riscos enfrentados por sua mãe biológica, uma insurgente comunista contra

os desmandos nazistas.

A protagonista já guardava fascínio por livros antes mesmo de conhecer o código gráfico, pois,

logo nas primeiras cenas do filme, furta o livro que o coveiro deixara cair ao realizar o sepultamento

de seu irmão.

Liesel aprende a ler ainda no início do filme e demonstra tamanho desejo e empenho em fazêlo.

E é justamente essa aprendizagem que abre um leque de possibilidades para ela. Enquanto assiste

ao horror das atrocidades nazistas, num momento cuja maior rebeldia por parte dos judeus e dos

simpatizantes das causas semitas (como era o caso de sua própria mãe) era tentar sobreviver, ela logra

uma possibilidade de escape: encontra na literatura a forma mais límpida e intensa de fuga, que é a

transcendência, que é a abertura para outros mundos, outras experiências.

Ao ajudar a mãe adotiva, buscando e entregando as roupas que eram lavadas para o sustento da

família, ela conhece a imensa biblioteca do prefeito e é irremediavelmente seduzida.

Ela se torna uma ladra de livros no afã de ser roubada deste mundo pela literatura, a fim de

habitar outras realidades menos devastadoras e melancólicas.

O filme desperta-nos uma profusão de emoções: a angústia, ao assistir a queima dos livros; o

enlevo, ao presenciar o envolvimento amoroso de Liesel com o mundo das palavras; o encantamento,

ao acompanhar a amizade inusitada entre a menina e Max, o hóspede clandestino dos Hubermann; a

inquietação, ao observar o sofrimento semita; o contentamento, ao ver o relacionamento inocente entre

a protagonista e Rudy; a admiração, por assistir ao surgimento da amorosidade mútua nas relações

parentais entre Liesel e aqueles que, a despeito de qualquer laço consanguíneo, acabam oferecendo a

ela o abrigo, o cuidado e a segurança, tornando-se verdadeiramente sua família; a profunda tristeza

pela partida de Hans, Rosa e Rudy.

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A trama termina com chave de ouro: Liesel reencontra Max — que havia partido para proteger

a si e aos que lhe deram guarida — e se torna uma escritora talentosa de genial manejo com as palavras.

Impossível segurar as lágrimas...

Um filme inspirador que nos faz suspirar no final e ilustra galhardamente a importância da luta

que travamos todos os dias em prol do universo literário. A película destaca o poder e a importância

do livro; evidencia o “empoderamento” promovido pelo ato da leitura, que nos torna fortes e sábios.

A partir da simbologia presente na destruição dos livros e de tudo o que eles representam, temos a

comprovação do poder que cada um deles carrega, da grandiosidade do que são capazes de fazer por

cada um de nós e pela humanidade como um todo, uma vez que transferem para o leitor todo o poder

de que são portadores. E o poder terapêutico da leitura que foi capaz de curar Max? Esse filme é um

bálsamo para a alma.

É um longa admirável que acaba nos fazendo refletir sobre a necessidade cada vez mais

premente e atual de lutar contra o preconceito, seja ele de que tipo for. O ser humano não pode ser

reduzido a cor, raça, religião, lugar de origem, grau de escolaridade, tipo físico, entre outras coisas.

Toda educação deve ser libertadora, crítica e encorajadora. Nesse sentido, “A menina que roubava

livros” é um filme admirável que merece ser apresentado aos alunos a fim de promover discussões

profícuas e elucidativas.

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Nome: Elisabete da Silva Toledo.

Função: Professor I - História

Unidade de Lotação: (11.20.029) E. M. Professora Lavinia de Oliveira Escragnolle Doria

Título do Filme: A Vida é Bela

“A Vida é Bela” tem um enorme significado para mim e me remete a um filme que tem como

enredo o AMOR intenso, de um pai por seu filho, quase “ingênuo”, que transcende e supera barreiras.

O filme se passa na Itália e tem como pano de fundo a segunda grande guerra e a ascensão de regimes

totalitários, como o nazismo alemão e o fascismo italiano.

O ator Roberto Benigni, através de seu personagem Guido, nos comove com esse amor por seu

filho Josué. Guido faz de tudo para mostrar que a Vida é Bela, apesar da rudeza do local em que se

encontram. E que local? Um campo de concentração, onde os prisioneiros eram submetidos a trabalhos

forçados. Estes eram, em sua maioria, judeus, mas também ciganos, negros, homossexuais ou

deficientes - os excluídos do estado nazi-fascista. Mal alimentados, em condições subumanas,

acabavam mortos por seus algozes, sem o menor apreço pela vida humana. Muitos não aguentavam

um ano naquelas condições, morriam subnutridos ou por alguma doença que lhes acometia. Ou eram

descartados nas câmaras de gás e cremados nos fornos ou enterrados em valas, como um lixo qualquer.

Estima-se que cerca de seis milhões de judeus foram mortos pelos nazistas e colaboradores, durante

todo o período da guerra, no que se chamou de Holocausto.

Desde o início do filme, ainda na cidade em que viviam, percebe-se a intenção de preservar seu

filho do sofrimento, quando Josué nota uma placa afixada à frente de uma loja, proibindo a entrada de

judeus e cachorros. Infelizmente, comuns em estabelecimentos italianos, depois de 1938. Por serem

de etnia-judaica e, dessa forma, considerados estrangeiros, foram alijados em seu próprio país, a Itália.

Naquela época, os judeus eram vistos como a pior espécie, eleitos como bode expiatório, culpados por

todo o mal que pesava sobre a Alemanha, entre o final da primeira e a segunda guerra mundial.

Meu lado afetivo me remete a esse filme por ser este não apenas emocionante e comovente,

mas por ter experimentado esse amor, através de uma das pessoas mais importantes da minha vida,

que me criou como filha, meu padrinho e irmão de criação, Luís Alberto. Também por eu ter tido a

experiência de visitar, o campo de concentração de Auschwitz, na Polônia, para onde eram enviados

diversos desses prisioneiros. Logo na entrada, uma frase chama atenção dos visitantes: “o trabalho

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liberta”, soando como uma espécie de zombaria, uma vez que os prisioneiros chegavam acreditando

que iam trabalhar apenas, mal sabiam o que lhes esperava.

Não obstante, apesar do martírio, o filme transmite uma mensagem positiva de que a Vida é

bela. Embora fantasioso e utópico, ele ressignifica todo aquele suplício. Mostra que devemos ser

resilientes e converter algo ruim em algo melhor, para que possamos sobreviver. Por que não?

Durante o período do confinamento, Guido esconde a verdadeira situação em que se

encontravam e diz ao filho, que estão participando de um jogo difícil, com tarefas que valem pontos,

tais como: ficar escondido, não pedir geleia, não chamar a mãe, nem ficar chorando... Caso não

consiga atender, perde ponto e perde o prêmio. E qual a surpresa? O prêmio, que na verdade, era o que

o menino mais gostava. Um tanque de guerra!

Ao transformar a experiência deles em um jogo, ele ressignifica o local. Transmuta o ódio em

amor, a angústia, em esperança e torna o local mais prazeroso. Proporciona ao filho o Amor, espalha

bondade e positividade pelo campo, tornando mais serenos seus dias ali.

Que mágico!!!

“A Vida é Bela” é um filme reflexivo e se pode afirmar que busca dar um novo sentido à vida.

Mostra que, mesmo nos momentos de dor, podemos tirar algo de bom.

E sem ser piegas, a vida é bela sempre! Tudo passa! Tudo sempre passará!

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Nome: Fabiola Guimarães Estima Paiva.

Função: Professor I - Espanhol

Unidade de Lotação: (11.20.005) Escola Municipal Dunshee de Abranches

Título do Filme: E.T.: O Extraterrestre

Memórias para Toda a Vida

Fatos ocorridos na infância nem sempre vêm à tona facilmente. Às vezes o véu do

esquecimento forma uma camada espessa e muito é deixado para trás. Mas as memórias de um único

filme são capazes de trazer, em avalanche, recordações de cheiros, sons, vozes, rostos e sentimentos.

Sensações reunidas no passado, mas que se fazem presentes por quase quatro décadas.

Rostos há muito esquecidos, ganham vida novamente todas as vezes que a história de um

extraterrestre resgatado por um menino é relembrada. São faces de amigos e vizinhos que juntos

confabulavam sobre o maior evento de todos; uma tarde no cinema.

E assim, aquele arranjo acalorado entre seres despreocupados ficou enraizado para sempre.

Combinações de como ir, o que vestir, de pedir autorização aos pais, tudo isso já era causa de grande

alvoroço. E a garotada da rua inteira, descendo a ladeira, indo em direção ao ponto de ônibus, era o

retrato da felicidade.

A viagem até o destino podia durar uma eternidade, pois, por si só, já causava grande animação.

O coletivo tornava-se pequeno para tanta excitação. E chegando ao local, o rebuliço só aumentava,

estimulado pela alegria causada pela aquisição da entrada, da bala vendida na porta, do cheiro de

pipoca. Mas o dinheiro nunca era suficiente para tamanha extravagância. Contudo, uma nova reunião

se formava rapidamente e todos juntavam seus pertences e o que antes era escassez, virava um

banquete.

Adentrar o recinto era puro contentamento. Cortinas de veludo vinho separavam a realidade do

universo dos sonhos. Poltronas gigantes esperavam com seus estofados aconchegantes. E um homem

simpático, cuja função era iluminar o caminho para todos, assumia a nova posição de vigia diante de

tanta algazarra causada pelo irrequieto bando.

E, sem mais delongas, a sessão começava. Vozes relutantes se calavam extasiadas por uma

história inebriante. Crianças, jovens e adultos aprisionados por uma magia hipnotizante. E quando os

créditos finais assumiam a tela, nada mais seria como antes. A impressão daquele dia, que poderia ter

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sido apenas mais um dentre muitos outros, ficou eternizada na superfície da mente, pronta para ser

apreciada a qualquer momento, a qualquer instante.

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Nome: Maria Lucia de Oliveira Amaral.

Função: Professor I - Espanhol

Unidade de Lotação: (11.20.031) Escola Municipal Conjunto Praia da Bandeira

Título do Filme: E o Vento Levou

FIDALGA POR FORÇA DA RAÇA

“Não há nada que justifique uma guerra e muito menos, a civil, essa luta entre irmãos...”

Meu filme de afeto passa pela minha memória e pelo meu coração como as chuvas do lugar onde

nasci – a Ilha de Marajó, no estado do Pará. Lá, elas se queixam ao vento, se lamentam nos telhados e

choram nos beirais...

Foi nesse lugar repleto de florestas que cheiram à patchouli, onde há Revoadas de Guarás ao

amanhecer e búfalos que refrescam-se nas praias de rio – que eu passei toda a minha infância na

companhia de um Ser grandioso. Jasmim de estio. Fidalga por força da raça –, minha avó materna

Guillermina Villar Rodriguéz. Ela chegou ao Brasil com seus três filhos, em 1937 – fugida da Guerra

Civil Espanhola. Meu avô Ángelo, que era do Corpo de Carabineros, foi um dos milhares de pais que

jamais voltaram aos seus lares...

... E o Vento Levou, um dos maiores clássicos da sétima arte, lançado em 1939, por ter como

pano de fundo uma guerra civil e o legado que esses conflitos deixam à humanidade como a barbárie

e, sobretudo, as perdas humanas decorridas dela – faz uma forte reverência à história dos meus avós e

as atrocidades de toda sorte por que passaram. Além disso, esse filme promove o reencontro com o

tempo passado que não existe mais em mim, mas que VIVE oculto no sagrado das minhas lembranças

e se mostra diáfano como o céu de Velázques todas as vezes que eu o assisto. O célebre juramento de

Scarlett O’Hara, por exemplo, é a cena que vai buscar nas minhas lembranças impressões carregadas

de emoções fortes e dolorosas como a que vou contar a seguir.

Vivíamos num sítio onde minha avó cultivava verduras, frutas, legumes, criava pequenos

animais, fazia queijos e chouriços. Era da venda desses produtos que ela tirava o nosso sustento. Certa

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vez, uma enchente devastou a ilha. As águas grandes levaram embora tudo o que tínhamos: os animais,

as plantações e parte da nossa casa... Só não conseguiram levar uma coisa: a fé inabalável de minha

avó, que diante de toda aquela devastação teve um dos gestos mais comoventes que eu jamais esqueci.

Foi até a horta completamente destruída, com uma das mãos pegou um punhado de terra lamacenta

ergueu para os céus e clamou:

“– Rogo-vos Senhor, do fundo do meu coração. Escutai-me, Senhor, e que vossos ouvidos não

sejam surdos às minhas súplicas!” Em seguida, ajoelhou-se no chão de lama e chorou... E com ela, eu

e a chuva fina que gotejava dos beirais...

Este texto é uma maneira de também chorar baixinho, ser solidária e demonstrar meu afeto ao

compartilhar minhas lembranças mais particulares, que estavam instaladas no mais sagrado de

minh’alma e emergiram como as Arapaimas da Amazônia para respirar e viver.

O sítio em que vivi com minha avó, existe até hoje. E quando vou lá, faço como Manoel de

Barros: com a enxada às costas e meio dementada me ponho a cavar vestígios de jasmim de estio e de

Maria Lucia Villar de Oliveira, a menina que fui.

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Nome: Vera Lúcia Bulhões Góes Bastos.

Função: Professor I - Língua Portuguesa

Unidade de Lotação: (11.20.032) EMOC Nelson Prudêncio

Título do Filme: Escritores da Liberdade

MEU FILME DE AFETO

Afeto, palavra bonita e muito significativa, pois para se ter afeto por algo ou alguém é preciso ser

afetado de alguma forma. Em 2008, fui apresentada ao filme Escritores da Liberdade, lançado no dia 27 de

agosto de 2007, que mudou a minha vida, logo após saber que foi baseado em fatos reais, escrito no livro

best-seller The Freedom Writers Diaries.

O título por si só já me encantou. Amo escrever! Principalmente, quando temos liberdade de expressão,

de pensar, de refletir e de sentir. A utopia de liberdade é algo fascinante.

Um dos motivos do filme ter dialogado tanto comigo foi pelo fato de eu ser professora e viver as

alegrias e as agruras dessa profissão, que é a base da nossa sociedade e, que muitas vezes, não recebe o

devido valor. Enfrentamos todos os dias muitas histórias dentro de nossas salas de aula e gostaríamos de

mudá-las, quando são cruéis.

Beber na fonte de “Escritores da Liberdade” é, com certeza, a oportunidade de saber que há solução

para muitos dos conflitos que enfrentamos e que podemos ser especiais na vida de nossos alunos, assim

como foi a protagonista do filme, a senhora Erin Gruwell.

A jovem professora de Língua Inglesa e Literatura, recém-formada, era casada e possuidora de um

sonho: arrumar seu primeiro emprego como professora. O pai dela era professor e foi sempre um exemplo,

por isso seguiu seus passos. Conseguiu uma entrevista e o emprego também em uma escola do subúrbio

problemático norte-americano, em Long Beach, Califórnia (Los Angeles). Entre o sonho e a realidade havia

uma ponte comprida a atravessar.

O primeiro, o segundo, o terceiro dias de trabalho foram frustrantes. Como lidar com uma realidade

tão dura, diferente do mundo da professora Gruwell? Quanta aridez, ódio, indiferença. O espaço da sala de

aula parecia pequeno, mas dentro cabia um mundo com inúmeras diversidades e com tantas igualdades.

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Diferentes histórias, raças, etnias, costumes, religiões, gostos e as mesmas dores, dificuldades, perdas,

intolerâncias e desesperanças. O que fazer diante de tudo?

Jovens com famílias desestruturadas, em total abandono, repletos de sofrimentos e medos, violentos e

desinteressados pelos estudos. A professora poderia ter desistido de tudo. Seria o caminho mais fácil, porém,

ao contrário, investiu. Sonho é mola propulsora da vida, que nos impulsiona. Ter objetivos faz você sair da

linha de conforto e crescer. Erin Gruwell teve que se reinventar, buscou novas maneiras para dialogar com

os alunos. Na busca, caminhou e ajudou muitos a caminharem junto com ela.

Propôs jogos, músicas, diálogos, aproximação. Comprou diários para que cada um escrevesse o que

quisesse de si, da vida, memórias, histórias, sonhos. Não era algo obrigatório, mas à medida que conseguia

a confiança deles, iam se abrindo, vendo-se e se descobrindo. Com o passar do tempo, a sala de aula virou o

único lugar de paz entre eles. Como não se sentir tocada, se você, como professora, sonha mudanças

significativas para seus alunos? Mais justiça, mesmas oportunidades, mais respeito às diferenças,

compreensão e amor.

Ela lutou contra regras impostas, contra currículo formal, contra a falta de sensibilidade de muitos.

Apresentou-lhes a Segunda Guerra Mundial, mostrando como não respeitar o outro traz tantas crueldades e

mortes. Comprou-lhes livros e um deles foi “O Diário de Anne Frank”. Levou-os a visitarem o Museu do

Holocausto, além de ouvirem depoimentos de alguns judeus sobreviventes em um jantar.

Assim, a tarefa de educar verdadeiramente o indivíduo aconteceu. Através do outro, cada um se viu de

forma mais transparente. A transformação se processou, porque alguém acreditou neles. E quando você se

sente importante, criar asas e voar se faz urgente para espalhar as sementes recebidas e colher outros frutos.

Poder doar aquilo que se recebeu é mágico.

Através desse exemplo, pude ser diferença na vida de muitos alunos ao longo da minha jornada

pedagógica. E os laços criados demonstram que nada foi em vão. Muitos sonharam, sentiram-se valorizados

e voaram atrás de seus sonhos. Obrigada, Erin Gruwell!

“Escritores da Liberdade” é um filme que mostra as diferenças como verdadeiros muros. É urgente

transpô-los. Somente o amor, na sua essência primeira, é capaz de trazer à tona o respeito, unindo todos,

porque no fundo, no fundo, somos iguais.

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Nome: Tadeu Goulart de Almeida Costa

Função: Agente de Administração

Unidade de Lotação: E/CMS – SME / PCRJ

Título do Filme: Meu Pé de Laranja Lima

As lições de Zezé, Portuga e do Pé de Laranja Lima sobre crescer

É inevitável não passar pela cabeça de quem assiste “Meu Pé de Laranja Lima” de que há algo

da infância que se solidifica em nós quando crescemos. Aos seis anos, Zezé protagoniza uma vida de

limitações, na periferia do Rio de Janeiro, ao lado dos pais e irmãos. Contudo, esse pequeno herói de

sua própria história é cercado de uma riqueza imaginativa e sentimental, profunda e incompreendida.

O filme, inspirado na obra de José Mauro de Vasconcelos, é um retrato afetuoso de parte da infância

do autor, sob a ótica de um menino que só quer ter a chance de errar sem sentir dor e medo de tentar.

Pouco a pouco, viramos espectadores da descoberta do mundo de emoções de Zezé, de mãos

dadas com o garotinho endiabrado. Do lado de fora da caixola de Zezé, coexistem outras figuras que

se agigantam ao decorrer dos minutos do filme, como o pé de laranja lima – Minguinho - e o vizinho

durão e mal encarado Portuga. Os improváveis aliados da jornada de Zezé o conduzem silenciosamente

ao seu destino e nos trazem de volta para nós mesmos e às nossas memórias de afeto. Foi pelas vozes

dessas figuras que resgatei, no filme, a minha própria infância — um terreno fértil em emoções e

aprendizados que prepara para o resto da vida.

Mesmo desconectado dos sentidos das coisas vistas pelos olhos adultos, Zezé não é vítima da

solidão, pois caminha na história da narrativa com a coragem de quem atravessa um túnel escuro sem

saber que há luz do outro lado. Como menino, busca compreender o mundo e se encaixar nele. Busca

não dar trabalho aos pais, pois sabe bem que em retorno ganhará as rotineiras surras físicas e

emocionais. E aprende que nem sempre a vida é justa, nem mesmo quando — para agradar — ele se

mete a cantar um tango da moda sem ter a menor ideia do sentido das palavras que ofendem o pai.

Agarrado em Minguinho, o pé de laranja lima, ele encontra um parceiro de escuta de seus aprendizados

e sonhos. São poucos os momentos felizes desse menino levado e pirracento e, talvez por isso, as

memórias de felicidade marcam tanto sua vida.

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A relação Zezé, Minguinho e Portuga, o vizinho que passa a ouvi-lo como pai, não é incomum

pelas infâncias afora. Na minha, João, meu avô, era o Portuga que Zezé encontrou. Um senhor para lá

dos setenta anos que, mesmo com suas dores e desilusões, sentava na varanda toda tarde com um café

na mão e conversava com minha versão de treze anos de idade sobre as coisas da vida. Falava sobre a

juventude, as moças, o lugar onde cresceu, sua grande família, seu pai português, suas manias e broncas

e a carreira como médico que nunca se cumpriu. Apesar de todos os percalços, aprendeu a extrair

felicidade de cada dia até o final de sua vida e ver luz no breu. Como Zezé, eu fazia escuta para o

universo dele naquelas tardes e ele entendia o meu mundo tão pequeno, que ainda iria se povoar de

experiências transformadoras muito em breve.

E, por onde quer que a gente olhe, existem meninos e meninas sonhando todos os dias. Que

levam surras da vida, mas sobreviverão com suas cicatrizes. Pois sabem sonhar e vivem no mundo

daqui de fora certos de que o mundo daqui de dentro também faz sentido. E que este completa a beleza

das coisas que não vimos no exterior.

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