NOREVISTA ABRIL 2021
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REPORTAGEM<br />
NOABR21 01
SUMÁRIO<br />
PUB.<br />
<strong>ABRIL</strong><br />
05<br />
15<br />
26<br />
38<br />
<strong>2021</strong><br />
ENTREVISTA<br />
À MESA COM GUALTER FURTADO<br />
OPINIÃO<br />
JUVENTUDES PARTIDÁRIAS<br />
REPORTAGEM<br />
PORTUGAL ENQUANTO NAÇÃO ESPACIAL<br />
REPORTAGEM<br />
A ENERGIA RENOVÁVEL MARINHA COMO<br />
ALTERNATIVA<br />
REPORTAGEM<br />
O FUTURO DO TURISMO: PARA QUANDO OS VALORES<br />
DA PANDEMIA?<br />
92<br />
24<br />
96<br />
98<br />
REPORTAGEM<br />
50 TENDÊNCIAS GLOBAIS DE EMPREGO PARA A<br />
JUVENTUDE<br />
102<br />
60 119<br />
PROJETO “CULTURA, CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA<br />
IMPRENSA” | CIÊNCIA<br />
30 ANOS DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA EM PAPEL DE<br />
JORNNAL<br />
PROJETO “CULTURA, CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA<br />
IMPRENSA” | SAÚDE<br />
COMBATER A OBESIDADE E O EXCESSO DE PESO COM<br />
A AJUDA DO TELEMÓVEL<br />
PROJETO “CULTURA, CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA<br />
IMPRENSA” | SAÚDE<br />
INQUÉRITO INTERNACIONAL REVELA QUE<br />
PORTUGUESES ESTÃO DEPRIMIDOS<br />
CRÓNICAS<br />
SÁTIRA POLÍTICA<br />
PORTUGAL ENQUANTO<br />
NAÇÃO ESPACIAL<br />
26<br />
A ENERGIA RENOVÁVEL<br />
MARINHA COMO<br />
DE EMPREGO PARA<br />
ALTERNATIVA 38 50<br />
TENDÊNCIAS GLOBAIS<br />
O FUTURO DO TURISMO:<br />
PARA QUANDO<br />
OS VALORES DA<br />
A JUVENTUDE PANDEMIA 60<br />
02 NOABR21 NOABR21 03
EDITORIAL<br />
JOVENS, POLÍTICA(S) E O FUTURO<br />
Não é novidade dizer-se que<br />
a nossa classe política está<br />
cansada e viciada em si mesma.<br />
Os mesmos lugares, em anos<br />
diferentes, ocupados pelas<br />
mesmas pessoas nas cadeiras<br />
do parlamento açoriano. De<br />
quatro em quatro anos, voltam a<br />
aparecer nos panfletos que nos<br />
entregam as mesmas caras, com<br />
uma dúzia de jovens em lugares<br />
ilegíveis.<br />
Poder-se-á dizer que as<br />
eleições que nos trarão um<br />
maior vislumbre serão,<br />
provavelmente, as autárquicas,<br />
não fossem os presidentes de<br />
junta de freguesia ter mandatos<br />
eternos e ocuparem aqueles<br />
cargos para o resto da sua vida.<br />
Na verdade, a limitação de<br />
mandatos não existe para as<br />
eleições legislativas. Pode uma<br />
senhora ou senhor deputado<br />
começar a sua carreira política<br />
aos 25 anos e até lá ficar<br />
enquanto os açorianos assim<br />
quiserem, seja apenas por<br />
quatro anos ou por mais 40.<br />
Poderão os críticos afirmar que<br />
os lugares a que pertencem<br />
nas listas aquando das eleições<br />
são escolhas do partido e, a<br />
partir do momento em que<br />
os açorianos votam, quer à<br />
esquerda, direita ou centro,<br />
conhecerão quem estarão a<br />
votar.<br />
Mas depois, questionamo-nos<br />
– porque não rejuvenescer a<br />
nossa classe política açoriana?<br />
Ora veja-se, existem apenas<br />
seis jovens com idade até<br />
aos 35 anos e com assento<br />
na Assembleia Legislativa.<br />
Representam 10,5% dos 52 que<br />
a compõem.<br />
Apregoa-se, tantas vezes, a<br />
vontade pelo rejuvenescimento<br />
dentro do seio político, por<br />
aqueles que agora vivem<br />
tempos diferentes e que<br />
ganham, em virtude desses<br />
tempos, também ideias,<br />
doutrinas e pensamentos<br />
adaptados ao novo quotidiano<br />
que todos os dias ganha vida.<br />
É igualmente fácil encontrarmos<br />
discursos, quer à direita,<br />
esquerda ou centro, o apelo<br />
à participação dos jovens na<br />
dinamização de novas políticas<br />
sociais, económicas e culturais.<br />
Pode um jovem, sem ter estado<br />
ligado a qualquer partido nos<br />
últimos anos, querer concorrer<br />
como membro integrante de<br />
uma lista? A verdade é que,<br />
muitas vezes, não pode.<br />
Não vale de nada apregoarse<br />
pela participação cívica<br />
jovem se os últimos sentem<br />
descredibilidade naqueles que<br />
são os protagonistas na nossa<br />
Região. Apelar os jovens a<br />
participarem, credibilizar a<br />
nossa classe política, ouvindo<br />
os seus pareceres, é o caminho a<br />
seguir. Não vale nem tão pouco<br />
apregoar-se pelo jovem quando<br />
não se lhe dá a capacidade para<br />
que possa mostrar o potencial.<br />
Enquanto assim for, as taxas<br />
de abstenção continuarão a ter<br />
os números que nos têm vindo<br />
a habituar, sendo depois alvo<br />
de escrutínio e de possíveis<br />
hipóteses para que tal tenha<br />
acontecido, quando a resposta<br />
parece ser óbvia – sem inclusão,<br />
não haverá nunca participação.<br />
Cláudia Carvalho<br />
FICHA TÉCNICA:<br />
ISSN 2183-4768<br />
PROPRIETÁRIO ASSOCIAÇÃO AGENDA DE NOVIDADES<br />
NIF 510570356<br />
SEDE DE REDAÇÃO RUA DA MISERICÓRDIA, 42, 2º ANDAR,<br />
9500-093 PONTA DELGADA<br />
SEDE DO EDITOR RUA DA MISERICÓRDIA, 42, 2º ANDAR,<br />
9500-093 PONTA DELGADA<br />
DIRETORA ADJUNTA CLÁUDIA CARVALHO TPE-288A<br />
REDAÇÃO CHEFE REDAÇÃO RUI SANTOS TPE-288 A,<br />
CLÁUDIA CARVALHO TPE-288 A, SARA BORGES, ANA SOFIA<br />
MASSA, ANA SOFIA CORDEIRO<br />
REVISÃO ANA SOFIA MASSA<br />
PAGINAÇÃO CARINA COELHO<br />
CAPTAÇÃO E EDIÇÃO DE IMAGEM RODRIGO RAPOSO E<br />
MIGUEL CÂMARA<br />
DEPARTAMENTO DE MARKETING, COMUNICAÇÃO E IMAGEM<br />
CILA SIMAS E RAQUEL AMARAL<br />
PUBLICIDADE RAQUEL AMARAL<br />
MULTIMÉDIA RODRIGO RAPOSO, RAFAEL ARAÚJO E MÁRIO<br />
CORRÊA<br />
INFORMÁTICA JOÃO BOTELHO<br />
RELAÇÕES PÚBLICAS CILA SIMAS<br />
Nº REGISTO ERC 126 641<br />
COLABORADORES ANTÓNIO VENTURA, JOÃO CASTRO,<br />
RICARDO SILVA<br />
CONTACTOS MARKETING@AGENDADENOVIDADES.COM<br />
ESTATUTO EDITORIAL:<br />
A NO É UMA REVISTA DE ÂMBITO REGIONAL (NÃO FICANDO<br />
EXCLUÍDOS OS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA E<br />
COMUNIDADES PORTUGUESAS ESPALHADAS PELO MUNDO).<br />
A NO DISPONIBILIZA INFORMAÇÃO INDEPENDENTE E<br />
PLURALISTA RELACIONADA COM A POLÍTICA, CULTURA<br />
E SOCIEDADE NUM CONTEXTO REGIONAL, NACIONAL E<br />
INTERNACIONAL.<br />
A NO É UMA REVISTA AUTÓNOMA, SEM QUALQUER<br />
DEPENDÊNCIA DE NATUREZA POLÍTICA, IDEOLÓGICA<br />
E ECONÓMICA, ORIENTADA POR CRITÉRIOS DE RIGOR,<br />
ISENÇÃO, TRANSPARÊNCIA E HONESTIDADE.<br />
A NO É PRODUZIDA POR UMA EQUIPA QUE SE COMPROMETE<br />
A RESPEITAR OS DIREITOS E DEVERES PREVISTOS NA<br />
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA; NA LEI DE<br />
IMPRENSA E NO CÓDIGO DEONTOLÓGICO DOS JORNALISTAS.<br />
A NO VISA COMBATER A ILITERACIA, INCENTIVAR O GOSTO<br />
PELA LEITURA E PELA ESCRITA, MAS ACIMA DE TUDO,<br />
PROMOVER A CIDADANIA E O CONHECIMENTO.<br />
A NO REGE-SE PELO CUMPRIMENTO RIGOROSO DAS<br />
NORMAS ÉTICAS E DEONTOLÓGICAS DO JORNALISMO E<br />
PELOS PRINCÍPIOS DE INDEPENDÊNCIA E PLURALISMO.<br />
À MESA COM<br />
REPORTAGEM<br />
GUALTER FURTADO<br />
presidente do Conselho Económico e Social dos Açores<br />
04 NOABR21 NOABR21 05
ENTREVISTA<br />
ENTREVISTA EM<br />
VÍDEO NA VERSÃO<br />
DIGITAL<br />
Sejam bem-vindos a mais um À Mesa<br />
Com no restaurante da Associação<br />
Agrícola. Eu tenho o prazer de vos<br />
apresentar este mês o Doutor Gualter<br />
Furtado, ele que é presidente do<br />
Conselho Económico e Social dos<br />
Açores (CESA). Começava por pedir<br />
que me explicasse, no fundo, o que é o<br />
CESA.<br />
O CESA é uma instituição que está<br />
prevista no estatuto políticoadministrativo<br />
da Região Autónoma<br />
dos Açores. Como sabem, um<br />
dos pilares da nossa autonomia<br />
democrática, juntamente com a<br />
constituição da república e com<br />
a lei das finanças das regiões<br />
autónomas, e lá, digamos, está<br />
prevista a criação deste órgão que é<br />
um órgão independente, é um órgão<br />
de aconselhamento do governo e<br />
dos órgãos próprios do governo dos<br />
Açores. É um órgão que tem como<br />
missão principal instituir o diálogo<br />
entre a sociedade civil e os órgãos de<br />
governo dos Açores e, por conseguinte,<br />
um órgão que funciona com base<br />
numa grande representatividade<br />
da sociedade açoriana. Lá estão<br />
representadas praticamente todas as<br />
organizações da sociedade civil e dos<br />
parceiros sociais incluindo também do<br />
governo. Este formato atual, que é um<br />
formato independente, resulta muito<br />
da vontade da Câmara de Comércio<br />
e Indústria dos Açores, da Federação<br />
Agrícola dos Açores e da UGT, que<br />
mais tarde se juntou à AICOPA, que é<br />
a sociedade da construção civil e eles<br />
propuseram, digamos, na altura, aos<br />
partidos e ao governo que o conselho<br />
que existia, que era o Conselho de<br />
Concertação Estratégica (CCE) e do<br />
qual eu também fazia parte como<br />
personalidade independente, de que<br />
o conselho devia ter um formato<br />
diferente e ser presidido por uma<br />
pessoa que não o Presidente do<br />
Governo dos Açores, porque antes<br />
quem presidia o CCE era o Presidente<br />
do Governo, mas uma personalidade<br />
civil que fosse escolhida e que se<br />
auto propusesse e depois fosse<br />
aprovada no parlamento regional<br />
com a maioria de 2/3; é um órgão<br />
independente de aconselhamento<br />
e agora tem funções amplas. Nós<br />
desde logo temos competência de nos<br />
pronunciarmos sobre os planos de<br />
desenvolvimento da Região Autónoma<br />
dos Açores sobre o orçamento. Temos<br />
que nos pronunciar sobre a aplicação<br />
e a gestão dos fundos comunitários,<br />
sobre a relação da Região com<br />
entidades externas à Região, ligadas<br />
ao desenvolvimento económico, sobre<br />
as leis laborais e sobre a concertação<br />
social e, por conseguinte, nós temos<br />
também essa incumbência de, ao<br />
fim ao cabo, fazer a arbitragem e<br />
intervir em possíveis plataformas de<br />
entendimento entre as organizações<br />
sindicais e as organizações patronais.<br />
Por conseguinte, são competências<br />
amplas e que nós fazemos questão em<br />
cumprir.<br />
06 NOABR21 NOABR21 07
ENTREVISTA<br />
ENTREVISTA<br />
Quem é o Doutor Gualter Furtado e como é que ele vem<br />
parar a presidir o CESA em 2019?<br />
Naturalmente isso resulta de um percurso de vida. Um<br />
percurso que começa na escola primária no Vale das Furnas,<br />
depois vem para Ponta Delgada, para a Escola Comercial<br />
e Industrial de Ponta Delgada. De seguida, consegue ter<br />
acesso a uma bolsa de<br />
estudos das antigas<br />
juntas gerais e, graças<br />
a essa bolsa de estudos,<br />
fui estudar para Lisboa,<br />
para o Instituto<br />
Comercial de Lisboa<br />
fazer a secção de<br />
Economia e também<br />
Concluído isso, fui<br />
parte do curso<br />
para a universidade,<br />
de Contabilidade.<br />
para o Instituto<br />
Superior de<br />
Economia, que<br />
naquela altura<br />
fazia parte da<br />
Universidade Técnica<br />
de Lisboa, hoje tem a<br />
designação de ISEG.<br />
Tive a felicidade de<br />
chegar a monitor,<br />
depois assistente<br />
da universidade.<br />
Quando era<br />
assistente da universidade fui desafiado a regressar aqui aos Açores<br />
para fazer doutoramento no nosso instituto universitário e para vir<br />
dar aulas. Nessa altura o diretor do departamento de Economia e<br />
Gestão era o professor Monteiro da Silva e eu mais a minha mulher,<br />
depois de uma avaliação que não durou muito tempo, resolvemos<br />
regressar e viemos para os Açores em 1984 e a partir daí tive vários<br />
desafios. Nunca me desliguei da<br />
universidade totalmente. Até há<br />
bem pouco tempo eu era membro<br />
do Conselho Geral da Universidade<br />
dos Açores, fui vice-presidente.<br />
É uma instituição pela qual eu<br />
tenho muito carinho, nunca me<br />
desliguei dela, mas, entretanto,<br />
fui fazendo outras coisas na vida.<br />
Fui para a banca, para a Caixa<br />
Económica da Misericórdia de<br />
Ponta Delgada.<br />
Depois fui desafiado pelo Doutor<br />
Mota Amaral para fazer parte<br />
de um dos governos dele como<br />
Secretário Regional das Finanças<br />
e Planeamento e que mais tarde<br />
se acrescentou a Administração<br />
Pública. Depois regressei à banca<br />
novamente, ajudei a fundar o<br />
banco que era o BES dos Açores.<br />
Foi um banco de sucesso. No<br />
meio dessa desgraça toda que<br />
aconteceu ao grupo Espírito Santo<br />
e ao BES, nós, felizmente, aqui<br />
nos Açores, conseguimos não<br />
ser intervenciados pelo Banco de<br />
Portugal. Fomos considerados um<br />
banco bom e isso significou que<br />
os nossos acionistas nacionais e<br />
regionais, que são 13 misericórdias<br />
e o grupo Bensaude, continuassem<br />
sempre a ter a sua posição<br />
acionista. Mudámos de nome, mas<br />
o espírito sempre foi o mesmo e<br />
talvez foi esse percurso de vida que<br />
fez com que me desafiassem alguns<br />
partidos, sobretudo os chamados<br />
partidos do arco da governação<br />
para me candidatar ao CESA. Fi-lo<br />
e felizmente obtive uma maioria<br />
no primeiro mandato de 81.3%,<br />
no segundo mandato de 91.2%.<br />
Não estava no meu horizonte<br />
candidatar-me a um segundo<br />
mandato, mas digamos, a pedido de<br />
alguns parceiros sociais e também<br />
de alguns partidos políticos e<br />
dos seus principais líderes e a<br />
situação muito difícil que nós<br />
estamos a passar, fez-me refletir<br />
um bocado sobre pôr ao serviço<br />
da comunidade e dos Açores a<br />
minha experiência pessoal, técnica<br />
e profissional e é isso que eu vou<br />
procurar fazer de uma forma<br />
independente e do melhor que sei.<br />
Naturalmente, ninguém faz nada<br />
na vida sozinho. Conto com o<br />
apoio dos parceiros sociais, desde<br />
logo, e também da Assembleia<br />
Legislativa da Região Autónoma<br />
dos Açores (ALRAA) e do Governo<br />
para facilitar o nosso trabalho,<br />
sempre numa base independente.<br />
Isso então faço questão de ser<br />
sempre numa base independente<br />
e de concertação com os parceiros<br />
sociais.<br />
08 NOABR21<br />
NOABR21 09
ENTREVISTA<br />
ENTREVISTA<br />
Passando agora para um assunto também ele muito importante que é o da<br />
Economia. Foi alvo de muita contestação e também de alguma preocupação a<br />
extinção da Secretaria da Economia em 2012. Agora, com o novo executivo, nós<br />
temos a Economia e Finanças juntas na mesma secretaria. Qual é o parecer que<br />
merece da sua parte esta junção das Finanças e da Economia numa só secretaria?<br />
Bom, eu já fiz parte de um Governo em que<br />
havia o Secretário Regional da Economia e<br />
o Secretário Regional das Finanças. Depois<br />
fiz parte de um Governo em que a Economia<br />
fazia parte das Finanças e, por conseguinte,<br />
já vivi isso tudo. O que eu acho é que uma<br />
Secretaria Regional das Finanças bem<br />
estruturada, com boas direções regionais<br />
é suficiente. Eu acho que, nos Açores,<br />
quanto menos complicarmos e quanto mais<br />
simplificarmos o nosso modelo de governação,<br />
mais eficiente ele vai ser. Por conseguinte, eu<br />
julgo que não é criando muitas estruturas que<br />
nos tornamos mais eficientes.<br />
Aliás, eu penso que nós aqui nos Açores o que<br />
nós temos que ter é valorizar a sociedade civil<br />
e, por conseguinte, quando digo valorizar<br />
a sociedade civil digo valorizar o papel dos<br />
parceiros sociais da Federação Agrícola, das<br />
Câmaras de Comércio, dos representantes das<br />
Pescas, das Misericórdias, os representantes<br />
do Ambiente, das Instituições Particulares<br />
de Solidariedade Social, da Associação para<br />
a Igualdade de Género, dos jovens, etc, e,<br />
por conseguinte, valorizar isso, haver um<br />
grande diálogo em concertação estratégica<br />
para aí reduzir ao máximo estruturas e eu<br />
penso que este governo vai ser avaliado e a<br />
avaliação que vai ter no fim não é por ter mais<br />
uma secretaria ou menos uma secretaria,<br />
é pela capacidade de resposta que vai dar<br />
aos problemas dos açorianos e da economia<br />
açoriana. Por conseguinte, não vejo isso<br />
com muitos maus olhos, o facto de se juntar<br />
a Economia e as Finanças numa mesma<br />
secretaria.<br />
No fundo, era uma promessa do<br />
governo uma racionalização do setor<br />
público empresarial que também passa<br />
pela SDEA. Acha que a extinção da<br />
SDEA poderá provocar algum vazio na<br />
orgânica do Governo Regional ou isso<br />
não está iminente?<br />
Bem, o que eu acho é que tem de<br />
haver aqui um sentido de equilíbrio,<br />
ou seja, não se pode estar a extinguir<br />
essas estruturas e essas empresas,<br />
e ao mesmo tempo, engordar o<br />
Governo. Tem de haver um equilíbrio<br />
e fazer isso sem prejuízo de aumentar<br />
excessivamente também a máquina<br />
governativa. É tudo uma questão de<br />
bom senso como lhe digo, com boas<br />
direções regionais, com bons diretores<br />
regionais, podemos ter bons resultados.<br />
Eu acho que podem dar conta do recado,<br />
mas depende do funcionamento e da<br />
própria orgânica do Governo. Agora,<br />
o próprio Governo também tem que<br />
dar um sinal de não excessiva gordura.<br />
Evidentemente, do ponto de vista<br />
da dívida pública, isso já estava tudo<br />
consolidado. Hoje em dia, as empresas<br />
públicas, os institutos já consolidam<br />
com a dívida pública<br />
regional. Eu sou a favor de que todas as<br />
despesas e receitas relacionadas com a<br />
administração pública regional tenham<br />
um espelho no orçamento regional.<br />
Qual é o grande desafio que os Açores<br />
têm, que é o desafio de ontem, o desafio<br />
de hoje e o desafio de amanhã? É o<br />
facto de nós termos uma governação<br />
nos Açores e termos uma sociedade nos<br />
Açores a funcionar melhor do que na<br />
Madeira e do que no Continente.<br />
Para conseguirmos esse desiderato é<br />
preciso que nos empenhemos em<br />
tudo aquilo que fazemos com grande<br />
qualidade e eficiência. Isso é que é o<br />
grande desafio. Por conseguinte, termos<br />
as nossas contas todas de uma forma<br />
transparente é uma forma que contribui<br />
para melhorarmos a qualidade da<br />
administração pública regional e, por<br />
conseguinte, eu sou a favor de que toda<br />
a receita e despesa pública tenham um<br />
reflexo no orçamento regional.<br />
Por conseguinte, eu vejo bem que isso<br />
termine nisso. Evidentemente que<br />
alguns serviços acho que têm de se<br />
manter em empresas públicas, por<br />
exemplo no caso da EDA, ou no que se<br />
refere ao SREA. Eu vejo por exemplo<br />
como positivo que o SREA ganhe uma<br />
autonomia maior, que seja um instituto<br />
público de maneira a não ser permeável.<br />
Não estou a dizer acabar com tudo.<br />
Até por exemplo criar neste caso um<br />
instituto público de estatística regional,<br />
até já digo o nome: Instituto Público de<br />
Estatística Regional dos Açores (IPERA).<br />
Sou a favor disso. Mas agora o resto de<br />
coisas assim marginais eu acho que só<br />
ficamos a ganhar com a sua integração<br />
no Governo. Essas empresas e esses<br />
organismos que devem serem extintos<br />
não têm a ver com as pessoas que<br />
lá estavam a gerir, não estou a fazer<br />
nenhum juízo de valor em relação às<br />
pessoas que lá estavam, estou a dizer é<br />
que é importante nessa fase em que nós<br />
nos encontramos que haja uma grande<br />
transparência orçamental e se esta tiver<br />
de ser conseguida com integrações ou<br />
fusões, que isto seja feito.<br />
010 NOABR21<br />
NOABR21 011
ENTREVISTA<br />
ENTREVISTA<br />
Durante muito tempo e para finalizar, nós fomos uma Região muito<br />
demarcada pelo desenvolvimento na agropecuária. Depois da<br />
agropecuária seguiram-se investimentos no turismo e acabaram<br />
ambas as áreas por competir um pouco entre si. Nos Açores, na nossa<br />
posição geoestratégica, será a tecnologia e a ciência o futuro dos<br />
Açores?<br />
Não tenho dúvidas nenhumas<br />
que, tendo em conta o nosso<br />
posicionamento insular geográfico<br />
aqui no Nordeste Atlântico, espalhado<br />
pelos nossos nove bocados plantados<br />
aqui no Atlântico, o futuro é, de facto,<br />
das novas tecnologias. É a ciência,<br />
a investigação e formação. Hoje<br />
em dia nós temos uma localização<br />
geográfica fantástica, temos grandes<br />
mais-valias ao nível por exemplo<br />
de setores estratégicos como a<br />
meteorologia. Nós estamos muito<br />
longe de explorar o potencial que<br />
temos a nível da metereologia,<br />
como estamos longe de explorar o<br />
potencial que a oceanografia e o mar<br />
dos Açores podem representar no<br />
futuro dos Açores, mas também as<br />
pescas e as próprias comunicações.<br />
Por conseguinte, os Açores hoje em<br />
dia são o porta-aviões, implantado,<br />
é verdade, porque já não tem aquela<br />
função física de ser porta-aviões<br />
clássico como era, mas em tempos<br />
de comunicações eu penso até que a<br />
nossa posição geoestratégica hoje em<br />
dia é mais reforçada do que nunca. Eu<br />
estou convencido que a nossa posição<br />
geoestratégica é até mais importante<br />
do que era no passado. Temos que<br />
valorizar muito a nossa relação com<br />
as nossas comunidades. Nós somos<br />
um povo extraordinário, temos<br />
comunidades espalhadas por todo<br />
esse mundo inteiro, mas desde logo<br />
aquela forte comunidade dos Estados<br />
Unidos e Canadá, mas também<br />
das Bermudas. O Brasil, o mundo<br />
imenso que é o Brasil. Nós temos<br />
hoje pessoas no Brasil localizadas em<br />
situações fantásticas, mas temos hoje<br />
açorianos a trabalhar na Finlândia, na<br />
Dinamarca, enfim, em toda a parte.<br />
Em todo o Mundo temos açorianos<br />
e, por conseguinte, esta rede que é o<br />
povo açoriano espalhado pelo Mundo<br />
pode ser de um valor geoestratégico<br />
que está muito longe de ser explorado.<br />
Depois, evidentemente, eu não<br />
esqueço que a nossa Universidade<br />
dos Açores tinha que ser repensada<br />
e refundida. Quer dizer, a nossa<br />
Universidade dos Açores tem que<br />
ter um carinho especial e está sendo<br />
maltratada. Eu próprio também fiz<br />
parte do Conselho Geral, aprovámos<br />
o novo estatuto, implementámos<br />
uma nova orgânica, mas eu penso<br />
que tem de ser feito um esforço<br />
ainda maior. A própria Universidade<br />
também tem que se internacionalizar,<br />
tem tudo para ser um grande polo,<br />
uma grande universidade no meio do<br />
“O que relevo de mais<br />
importante no CESA<br />
é a mobilização e a<br />
disponibilidade de todos<br />
os Parceiros Sociais para<br />
defenderem os seus<br />
sectores específicos,<br />
mas com abertura já<br />
demonstrada para<br />
trabalharmos em conjunto<br />
e em concertação<br />
para Desenvolvimento<br />
económico, social e<br />
cultural dos Açores, sem<br />
nunca esquecer os nossos<br />
emigrantes que são o nosso<br />
prolongamento territorial,<br />
de sangue e de afetividade,<br />
a que junto os imigrantes<br />
que por necessidade ou<br />
outra razão escolheram as<br />
nossas Ilhas para viver e<br />
trabalhar”.<br />
Discurso do Presidente<br />
do CESA na Tomada de<br />
Posse do II Mandato<br />
Atlântico, mas também tem que ter apoios.<br />
Finalmente, os nossos setores tradicionais<br />
que é a questão das pescas e da agricultura<br />
têm de continuar. É verdade que o Turismo<br />
é muito importante, veio catapultar<br />
os Açores para níveis de crescimento<br />
inimagináveis. O setor do turismo é um<br />
setor muito importante, tem um efeito<br />
multiplicador muito grande sobre os outros,<br />
mas é muito dependente do exterior.<br />
Temos que ter aqui uma economia que<br />
seja uma economia multissectorial e multi-<br />
especialista. Não pode ser uma economia<br />
afunilada só num tema, num setor<br />
independente. Os Açores têm que dar muita<br />
importância e jogar com a sua posição<br />
geoestratégica nessa questão da Europa,<br />
Estados Unidos da América, Brasil, China,<br />
África. O Mundo encurtou-se, está mais<br />
próximo, mas continua a haver barreiras e<br />
os Açores no meio dessas barreiras podem<br />
ter uma posição geoestratégica central a<br />
desempenhar no futuro.<br />
012 NOABR21 NOABR21 013
PUB.<br />
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
OPINIÃO<br />
JUVENTUDES<br />
PARTIDÁRIAS<br />
A NO Revista,<br />
consciente da importância<br />
dos jovens para o contributo<br />
de uma sociedade mais plural, dá a<br />
oportunidade, mais um mês, de dar voz<br />
aos jovens dos oito partidos com assento<br />
parlamentar no parlamento açoriano.<br />
Assim, os jovens têm oportunidade<br />
de expressarem as suas opiniões e<br />
pensamentos sobre as políticas de<br />
desenvolvimento na Região e<br />
não só.<br />
014 NOABR21 NOABR21 015
OPINIÃO<br />
A verdadeira coesão e autonomia é não precisar mais do<br />
dinheiro dos contribuintes portugueses e dos países ricos<br />
da União Europeia. Ao contrário do que parece ser mais<br />
intuitivo, o caminho da criação de riqueza e do bem-estar<br />
social depende muito mais da forma como se alocam os<br />
recursos do que da sua quantidade inicial. Por isso é que<br />
economias livres em territórios inóspitos conseguem<br />
prosperar e territórios ricos em recursos naturais ou<br />
apoiados há décadas por fundos comunitários se mantêm<br />
na pobreza.<br />
A proposta de plano e orçamento para <strong>2021</strong> entregue<br />
pelo governo no parlamento regional prevê gastar 45%<br />
do dinheiro total em investimento público, designado por<br />
plano. São 720 milhões mais outros fundos comunitários<br />
para os diferentes secretários terem o mérito de<br />
distribuir. Ademais, só para os leitores terem uma<br />
noção do que a casa gasta, apenas 54% do orçamento<br />
são receitas próprias da região, quase totalmente<br />
provenientes dos impostos pagos pelos Açorianos. A<br />
restante parte do bolo provém de transferências do<br />
Orçamento de Estado (22%), transferências da União<br />
Europeia (10%) e, como nada disto é suficiente, do<br />
recurso ao endividamento de 250 milhões (15%).<br />
Estes números até podem parecer normais à maioria<br />
dos leitores, porque sempre foi assim por tantos anos<br />
que até se esquece que há outra forma de fazer política<br />
e alocar recursos. Mas para este jovem autor que tem<br />
outras ambições para a sua querida terra representam o<br />
José luís parreira<br />
A fraude do<br />
governo de direita<br />
risco de os nossos recursos continuarem a ser gastos em<br />
projetos sem retorno para a economia, que precisarão<br />
de ser alimentados no futuro. No fundo, a continuação<br />
do socialismo, cuja dívida herdada custar-nos-á 38,5<br />
milhões em juros em <strong>2021</strong> (154 euros por habitante).<br />
Em primeiro lugar, dirão os leitores que o momento<br />
excecional da pandemia em que vivemos justifica<br />
continuar a apoiar a economia, o emprego e os<br />
desempregados, nem que para isso seja necessário de<br />
recorrer ao endividamento. Certo. No entanto, apenas 44<br />
milhões se destinam às medidas criadas em resposta ao<br />
surto da covid-19. Além disso, o investimento em saúde<br />
e educação representam outros 80 milhões de euros, ou<br />
seja, apenas 11% do plano de investimentos. Então, e o<br />
restante investimento? Aqui pouco importa discutir se<br />
o investimento é destinado ao setor público ou privado,<br />
porque todo o dinheiro gasto pelo estado acabará no<br />
setor privado: os funcionários públicos, as empresas<br />
fornecedoras do governo e os credores da região. Quem<br />
mais contribui é também quem mais beneficia. Por isso,<br />
o que este governo continua a fazer é nacionalizar parte<br />
da economia, mantendo as empresas na dependência<br />
do estado. Que os socialistas o fizessem era de esperar,<br />
mas que a direita o faça só mostra falta de valores e<br />
convicções fortes ou, então, deixaram-se corromper<br />
pelo poder de ter o dinheiro na mão. O dinheiro dos<br />
contribuintes, sejam eles açorianos, portugueses ou de<br />
outro qualquer país da Europa, apenas deve ir para os<br />
privados para contratar bens e serviços públicos<br />
que estes forneçam de forma mais eficiente ou para<br />
os indemnizar por perdas derivadas de decisões<br />
governamentais, como o confinamento.<br />
Em segundo lugar, dirão os leitores que havendo<br />
dinheiro da solidariedade nacional e europeia à<br />
nossa disposição, este deve ser usado e o que o que<br />
é preciso é uma melhor aplicação e fiscalização dos<br />
fundos. Todavia, o que ninguém sabe explicar é como<br />
é que se garante isso. Nos próximos anos, há duas<br />
alternativas: podemos continuar a financiar todos<br />
os caprichos de uma maioria governativa, gastando<br />
grandes quantidades, recursos e crédito, ou podemos<br />
confiar na capacidade individual de cada um para<br />
gastar o seu próprio dinheiro. O melhor investimento<br />
que podem fazer para as próximas gerações é ir<br />
pagando a dívida (ajuda não endividar mais) e<br />
reduzir a despesa pública, seja levar à insolvência as<br />
empresas públicas falidas, seja reduzir a dimensão<br />
da administração pública (reformas antecipadas,<br />
p.e.). O dinheiro da “Bazuca” deveria servir para<br />
indemnizar e apoiar temporariamente todos os<br />
prejudicados por essa redução de despesa, a fim de<br />
irem confortavelmente à sua vida. Só assim se pode<br />
baixar impostos sustentadamente e uma direita que<br />
se preze era isto que deveria fazer. Caso contrário,<br />
quando o dinheiro acabar, continuaremos a ter<br />
um governo gordo para sustentar e uma economia<br />
impreparada para andar pelas suas próprias pernas.<br />
Enfim, será uma oportunidade perdida para quebrar<br />
o ciclo vicioso de pobreza e dependência do estado<br />
em que o socialismo nos deixou.<br />
Em terceiro lugar, num tempo que que se vive<br />
uma recessão e o investimento privado é reduzido,<br />
por que razão há o governo de se comportar de<br />
forma diferente, ainda para mais recorrendo ao<br />
endividamento. Tirando as necessidades de acudir<br />
à saúde pública, socorrer os desempregados e<br />
indemnizar a economia, este deveria ser o momento<br />
para se poupar recursos e adiar investimentos. No<br />
entanto, este orçamento não evidencia um único<br />
esforço para poupar qualquer tostão. Só gastar.<br />
Vejamos 2 exemplos rápidos de investimento público,<br />
pensado para <strong>2021</strong>.<br />
A SATA prepara-se para receber mais um aumento<br />
de capital de 165 milhões em <strong>2021</strong> (em 2020 já tinha<br />
pedido um empréstimo de 133M, com garantias<br />
públicas). Estão a brincar! Um avião Twin Otter de<br />
19 lugares novinho em folha custa 7 milhões e um<br />
ATR de 50 lugares custa 10 milhões em segunda<br />
mão. 165 milhões daria para comprar frota e meia<br />
de 6 aviões inter-ilhas, pagos a pronto pagamento.<br />
Isso sim permitia reduzir significativamente o preço<br />
das viagens, nos próximos 10 anos, pois a empresa<br />
já não tinha de imputar ao consumidor o pagamento<br />
da prestação do avião. A SATA, cuja maioria dos<br />
aviões não lhe pertence, deveria entrar num processo<br />
de insolvência como qualquer empresa falida e o<br />
serviço público de transporte inter-ilhas deveria<br />
ser concessionado a outra empresa privada, como a<br />
Binter, pagando o mesmo que pagamos à SATA que é<br />
10.1 milhões de euros. É uma questão de “vender” o<br />
caderno de encargos a nível internacional, nem que<br />
se tenha de pagar um pouco mais.<br />
Em segundo, subsidiamos 10.1 milhões uma<br />
transportadora aérea para “tocar” diariamente em<br />
todas as ilhas e, depois, vamos injetar mais de 10<br />
milhões na Atlânticoline e gastamos outros tantos<br />
milhões a realizar obras de terminais de passageiros<br />
para fazer o mesmo transporte. Isso já não é brincar<br />
com o dinheiro dos outros. É burrice! O transporte<br />
marítimo de passageiros além de ter um custo<br />
operacional por passageiro maior que o avião, ainda<br />
reduz a procura do transporte aéreo, impedindo um<br />
menor preço das passagens aéreas.<br />
Em suma, a direita passa anos a falar mal do<br />
socialismo e a dizer que não funciona, mas quando<br />
está no poder não reduzem a despesa pública,<br />
aumentam-na. Passam anos a chamar xuxalistas e<br />
esquerdalha aos adversários, mas quando chegam<br />
ao governo não têm coragem política para deixar<br />
cair a SATA e negociar o caderno de encargos do<br />
transporte aéreo de passageiros com a iniciativa<br />
privada, a fim de o governo não ter de assumir as<br />
dívidas de ninguém. São anos a criticar o polvo<br />
socialista, mas continuam a manter as empresas<br />
e a economia dependente do estado. Isto tem um<br />
nome: hipocrisia. Deveremos estar satisfeitos apenas<br />
por tirar os socialistas do poder e esperar que estes<br />
sejam melhores gestores da coisa pública? Não. Isso<br />
não é suficiente para os Açores. É preciso mudar de<br />
políticas e a forma de fazer política.<br />
016 NOABR21 NOABR21 017
OPINIÃO<br />
Completados 126 anos<br />
em março do “Decreto<br />
Autonómico” de 1895, fruto<br />
de um intenso trabalho de um<br />
grupo de notáveis açorianos,<br />
o diploma permitiu a<br />
aplicação do (primeiro)<br />
regime de autonomia<br />
administrativa aos três<br />
distritos açorianos da época.<br />
É notório o papel que o<br />
arquipélago dos Açores<br />
desempenhou em várias fases<br />
da História Portuguesa e<br />
como os Açorianos sempre<br />
se destacaram e, sobretudo<br />
nesta última, pelo seu espírito<br />
aguerrido na luta pela<br />
Mariana Marques Quadros<br />
CORSÁRIO<br />
POLÍTICO<br />
identidade regional e pelos<br />
seus direitos, quer sejam eles<br />
administrativos, legislativos<br />
ou políticos que efetivamente<br />
se foram consolidando ao<br />
longo da História Açoriana.<br />
A disputa por palco político<br />
na região e a qualidade<br />
política que temos vindo a<br />
assistir sobretudo como se<br />
verificou após o resultado<br />
das últimas eleições<br />
regionais, de um autêntico<br />
Governo de retalhos, que<br />
se apoia na muleta do<br />
multipartidarismo, mesmo<br />
sendo esse um “acordo de<br />
incidência parlamentar com<br />
o Partido Chega”, chega é a nós<br />
um aspeto pouco plausível, de<br />
corsários políticos, que quer seja<br />
em alto mar como em terra firme,<br />
o principal propósito rendeu-se ao<br />
poder governar.<br />
E, navegamos assim, sem<br />
bússula nem quadrante, mas<br />
não à deriva da distribuição<br />
dos saques mediáticos, que<br />
solidariamente foram utilizados<br />
na figura de André Ventura ou no<br />
aproveitamento da reeleição de<br />
Marcelo, nem que seja porque já<br />
se avista no horizonte as eleições<br />
autárquicas. E qualquer corsário<br />
que se preze assim o faz.<br />
Assim como a afirmação<br />
depreciativa da herança ou legado<br />
regional que justifica determinadas<br />
situações inconvenientes e,<br />
portanto, maus vícios de 24<br />
anos de oposição. Justifica sim,<br />
a “herança” ser distribuída para<br />
mais nomeações políticas e cargos<br />
imprescindíveis para o novo poder<br />
político exarcebado.<br />
Vivemos por isso tempos de<br />
crise e, enquanto jovem, afligeme<br />
a mudança cada vez mais<br />
visível na nossa sociedade, na<br />
dualidade interpretativa que<br />
mentalmente realizo, quer de um<br />
lado o surgimento e representação<br />
de partidos de extrema-direita<br />
na nossa região, quer a disputa<br />
política corrosiva que tem afetado<br />
os bons valores democráticos e<br />
o bem-estar das gentes açorianas<br />
que só querem ver representados<br />
os seus direitos.<br />
Resta-nos a nós acreditar, mesmo<br />
assim, se toda esta combinação<br />
política ideológica que tanto<br />
afirma ser fruto da manifestação<br />
do voto açoriano nas últimas<br />
eleições é de facto o caminho<br />
da resolução dos desafios que<br />
enfrentamos.<br />
E, “se bem me lembro”, quando o<br />
debate deixa de ser sério e o teatro<br />
político se sobrepõe aos reais<br />
interesses públicos, assistimos<br />
novamente a um processo de<br />
descrença na classe política.<br />
018 NOABR21
OPINIÃO<br />
ADEQUAR-NOS AOS NOVOS<br />
HÁBITOS DA<br />
Vitória Silva<br />
JUVENTUDE!<br />
A globalização digital e por<br />
consequência a ascensão de uma<br />
geração de influencers levanos a<br />
refletir sobre as reais inquietudes<br />
dos jovens no seu quotidiano.<br />
Assim, devemos entender<br />
essas inquietudes de forma a<br />
sensibilizar, aplicar e instruir,<br />
através dos meios digitais, aquilo<br />
que são as maiores problemáticas<br />
de uma política de e para a<br />
juventude.<br />
A transformação digital tem de<br />
ser, efetivamente, a ferramenta<br />
essencial para a fundamentação<br />
dos novos hábitos de vida juvenis,<br />
de forma a quebrar aquelas que<br />
são as grandes lacunas no diaa-dia<br />
de alguns jovens. Através<br />
das redes sociais e de todo o<br />
seu meio digital envolvente,<br />
conseguimos chegar à geração<br />
que vive para esta era, tornando-a<br />
imprescindível, pois de outra<br />
forma torna-se desadequado,<br />
desadaptado e intransigente.<br />
Deste modo, a promoção de<br />
estilos/hábitos de vida saudáveis<br />
e os mecanismos que devem<br />
combater o flagelo social<br />
que se vive, em que todos<br />
temos conhecimento na nossa<br />
Região, no que diz respeito às<br />
elevadas taxas de consumos<br />
de estupefacientes, abandono<br />
escolar, gravidez na adolescência<br />
ou outras preocupações, como as<br />
desigualdades de oportunidades<br />
sociais, devem também ser<br />
combatidas, através dos meios<br />
digitais com conteúdos explícitos<br />
e adequados ao público-alvo.<br />
A educação para a saúde deve<br />
ter como princípio educar para<br />
prevenir e não para correr atrás<br />
do prejuízo. Desta forma, é<br />
necessário ter sempre presente<br />
a sua adaptação à realidade<br />
social, para que a sua eficácia<br />
seja benéfica e os jovens de hoje,<br />
sejam os adultos de um amanhã,<br />
como cidadãos sensibilizados<br />
e educados para estas e outras<br />
temáticas da nossa sociedade de<br />
extrema importância.<br />
É através do bem formar que<br />
se deve construir os alicerces<br />
de uma sociedade futura com<br />
menores lacunas sociais. Só<br />
assim iremos conseguir alcançar<br />
resultados benéficos e produtivos<br />
para uma geração que alguns<br />
dizem ser dada como perdida.<br />
Devemos lutar por políticas de<br />
juventude assertivas e adequadas<br />
à realidade do século XXI,<br />
indiscutivelmente seria, se assim<br />
não o fosse.<br />
020 NOABR21 NOABR21 021
OPINIÃO<br />
6 ANOS<br />
A<br />
No passado dia 23 de Fevereiro<br />
foi finalmente aprovada, por<br />
unanimidade, a proposta do PAN para<br />
o fim imediato do abate de animais<br />
errantes e de companhia na região<br />
dos Açores. A primeira iniciativa<br />
apresentada pelo PAN/Açores no<br />
Parlamento Açoriano.<br />
Esta é uma luta já de há 6 anos,<br />
quando o recém-eleito deputado Pedro<br />
Neves, enquanto cidadão, levou à<br />
Assembleia Regional dos Açores uma<br />
petição que tinha como objetivo este<br />
mesmo fim e que foi chumbada pela<br />
maioria parlamentar, num golpe muito<br />
duro para o bem-estar e proteção<br />
dos animais nos Açores. Mas não<br />
desistimos!<br />
Muitos terão achado este mais um<br />
ALEXANDRE DIAS<br />
DEPOIS,<br />
VITÓRIA!<br />
capricho do PAN - “aquele partido<br />
animalista”. Não, não é um capricho<br />
considerar que matar um animal “só<br />
porque ele está a ocupar espaço” seja<br />
um ato atroz e que nos dias de hoje<br />
não deve ser tolerável.<br />
São vidas que estão em jogo. Vidas<br />
de animais que têm capacidade de<br />
sentir amor e carinho, de se divertir<br />
e brincar e que, por outro lado, agem<br />
em legítima defesa se se sentem<br />
ameaçados ou sofrem maus-tratos.<br />
Este processo de socialização<br />
entre o ser humano e os animais,<br />
nomeadamente cães e gatos, remonta<br />
há milhares de anos, por altura do<br />
período Paleolítico, quando os cães<br />
ainda eram lobos.<br />
Inicialmente, não foi uma “amizade”<br />
com um início fácil. Na verdade, não<br />
passava de uma troca de interesses:<br />
de acordo com os historiadores, os<br />
lobos andavam atrás do ser humano<br />
por causa dos restos de comida<br />
deixados para trás, pois perceberam<br />
que, assim, conseguiam obter<br />
alimento facilmente. Começaram<br />
então a partilhar o território com o ser<br />
humano que, por sua vez, começou<br />
a sentir-se mais protegido com os<br />
lobos por perto. No fundo, criou-se<br />
uma sinergia entre ambas as espécies.<br />
Resultado? Os lobos deixaram de<br />
caçar sozinhos.<br />
Já com os gatos o processo<br />
foi diferente. Estima-se que a<br />
domesticação dos gatos teve um<br />
forte impulso de agricultores, que os<br />
usavam para proteger as plantações<br />
de cereais de roedores. Mas já antes,<br />
no Egipto, os gatos eram adorados<br />
como se fossem deuses ou entidades<br />
que simbolizavam sorte.<br />
Desta forma, torna-se evidente como<br />
esta sinergia entre ser humano e<br />
animais é já antiga. Mesmo assim,<br />
na nossa sociedade o abandono<br />
de animais ainda é um fenómeno<br />
generalizado. Com o fim do abate<br />
de animais errantes e de companhia<br />
conseguido pelo PAN nos Açores,<br />
estes animais sofrem menos um<br />
atropelo aos seus direitos.<br />
É fundamental que as diferentes<br />
forças políticas sigam o exemplo<br />
do PAN, um partido que reconhece<br />
a estes animais – e todos os outros<br />
– a senciência e capacidades que a<br />
ciência atesta. A verdade é que os<br />
animais têm hoje um papel muito<br />
significativo na nossa sociedade e<br />
que, sem eles, a nossa vida seria<br />
bastante diferente.<br />
23 de Fevereiro de <strong>2021</strong> é, por isso,<br />
uma data que deve ser relembrada<br />
com um momento progressista, um<br />
momento de viragem para possibilitar<br />
o debate de novos temas. Da parte do<br />
PAN, uma certeza: continuaremos a<br />
levar à discussão pública as questões<br />
transversais à nossa sociedade. Uma<br />
sociedade em que se incluem as<br />
Pessoas, os Animais e a Natureza.<br />
022 NOABR21 NOABR21 023
REPORTAGEM PUB.<br />
REPORTAGEM<br />
PUB.<br />
024 NOABR21 NOABR21 025
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
PORTUGAL<br />
ENQUANTO NAÇÃO ESPACIAL:<br />
UMA ESTRATÉGIA PARA UM FUTURO tecnOLÓGICO<br />
ANA SOFIA MASSA<br />
No final de 2000, Portugal tornou-se<br />
membro da Agência Espacial Europeia<br />
(ESA) e o Espaço e a utilização de<br />
tecnologias espaciais sofreram uma<br />
evolução substancial. A participação<br />
do nosso país na ESA, que conta com<br />
a colaboração do Instituto de Apoio<br />
às Pequenas e Médias Empresas e à<br />
Inovação (IAPMEI) e da Autoridade<br />
Nacional de Comunicações (ANACOM),<br />
tem contribuído para a criação de um<br />
conjunto de empresas e instituições<br />
científicas e tecnológicas, cujo objetivo<br />
é desenvolver e disponibilizar soluções<br />
para os desafios científicos e tecnológicos<br />
que se colocam neste setor.<br />
Atualmente, observam-se<br />
mudanças estruturantes no<br />
setor espacial, quer seja pela<br />
crescente implementação<br />
de tecnologias e serviços<br />
espaciais no dia a dia da<br />
população, como também<br />
na difusão de sistemas<br />
educacionais. Nos últimos<br />
anos tem-se verificado um<br />
forte investimento neste setor,<br />
formando assim um novo<br />
“ecossistema empresarial”<br />
(p.7). Todavia e atendendo a<br />
que este é um dos setores que<br />
mais evolui tecnologicamente<br />
e a velocidades difíceis às<br />
vezes de acompanhar, muitos<br />
países têm definido novas<br />
linhas de posicionamento<br />
estratégico, de maneira a<br />
influenciar investimentos<br />
futuros no setor.<br />
Neste âmbito, Portugal<br />
apresenta assim uma<br />
estratégia, alinhada com a<br />
sua localização geográfica<br />
e com o seu ecossistema<br />
científico e empresarial, mas<br />
também com a ambição de<br />
um novo posicionamento a<br />
nível internacional. Estabelece<br />
ainda o desenvolvimento e<br />
evolução dos quadros jurídico,<br />
financeiro, institucional,<br />
de internacionalização<br />
e cultural/educacional<br />
capazes de impulsionar o<br />
desenvolvimento do sector<br />
espacial em Portugal através<br />
de iniciativas de carácter<br />
nacional e da cooperação<br />
internacional para a próxima<br />
década.<br />
Depreende-se assim que, quer<br />
no território continental como<br />
nos arquipélagos<br />
dos Açores e da<br />
Madeira, há que<br />
continuar a apoiar<br />
o crescimento deste<br />
setor. Após a adesão<br />
à ESA, Portugal<br />
tem revelado uma<br />
rápida adaptação<br />
e integração<br />
nos programas<br />
espaciais. Como<br />
resultado deste<br />
investimento, o<br />
ecossistema espacial<br />
026 NOABR21<br />
NOABR21 027
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
A SEGURANÇA E O BEM-ESTAR DA<br />
SOCIEDADE “DEPENDEM CADA VEZ<br />
MAIS DA INFORMAÇÃO E DOS SERVIÇOS<br />
PRESTADOS A PARTIR DO ESPAÇO<br />
empresarial português tem um retorno<br />
económico superior a 120% na última<br />
década, envolvendo uma força total<br />
de trabalho de mais de 1400 pessoas,<br />
incluindo 300 engenheiros qualificados,<br />
e gerando um volume de negócios<br />
relacionados com tecnologias espaciais<br />
de cerca de 890 milhões de euros entre<br />
2006 e 2015.<br />
De acordo com uma publicação da<br />
Fundação para a Ciência e a Tecnologia,<br />
“Estratégia Portugal Espaço 2030.<br />
Uma Estratégia de Investigação,<br />
Inovação e Crescimento para Portugal”,<br />
Manuel Heitor, Ministro da Ciência,<br />
Tecnologia e Ensino Superior, afirma<br />
que a segurança e o bem-estar da<br />
sociedade “dependem cada vez mais<br />
da informação e dos serviços prestados<br />
a partir do Espaço, sendo de assinalar<br />
a transferência de competências<br />
adquiridas entre este setor e outros<br />
como a agricultura, as pescas, a<br />
monitorização de infraestruturas, o<br />
desenvolvimento urbano, a defesa e a<br />
segurança, e mesmo o setor da saúde<br />
pública e monitoração de epidemias”<br />
(p.7). Depreende-se, então, que a<br />
aposta do Espaço na sociedade europeia<br />
continue a aumentar, atendendo a que<br />
atualmente a Europa cada vez mais se<br />
torna unificada e mais próxima a nível<br />
social.<br />
Esclarece ainda Manuel Heitor que<br />
“o Espaço deve ser<br />
encarado como um bem<br />
público, a associar às nossas<br />
instituições e ambições<br />
coletivas, sendo crítico<br />
democratizar o acesso ao<br />
Espaço. É neste âmbito que<br />
as tecnologias espaciais<br />
são incontornáveis para o<br />
futuro da Humanidade”<br />
(p.7), requerendo, assim,<br />
continuar o investimento<br />
na educação e cultura<br />
para o Espaço, por forma<br />
a atrair jovens cientistas e<br />
engenheiros e a estimular<br />
o interesse pelas áreas<br />
da ciência, tecnologia,<br />
matemática, entre outros.<br />
O objetivo principal recai<br />
na possibilidade de as<br />
tecnologias espaciais<br />
poderem ser um<br />
instrumento através do<br />
qual seja possível “capacitar<br />
o Mundo para a Paz” (p.7).<br />
Atendendo ao presente<br />
projeto, a análise<br />
da Organização<br />
para a Cooperação<br />
e Desenvolvimento<br />
Económico (OCDE) ao<br />
retorno do investimento<br />
de Portugal na ESA<br />
aponta para um efeito<br />
multiplicador entre 4 e 5 do<br />
financiamento público de<br />
atividades de Investigação e<br />
Desenvolvimento (I&D). “O<br />
posicionamento atlântico<br />
de Portugal é assim crítico<br />
e abre novas oportunidades<br />
no contexto internacional”<br />
(p.9). De acordo com<br />
Manuel Heitor, a localização<br />
única da Região Autónoma<br />
dos Açores assume uma<br />
posição geoestratégica<br />
adequada para a criação de<br />
uma infraestrutura espacial<br />
para o lançamento de<br />
satélites. “A sua localização<br />
em território da União<br />
Europeia, no Espaço<br />
Schengen, tão perto da<br />
Europa Continental como<br />
do continente americano<br />
e com uma extensa<br />
cobertura oceânica de mais<br />
de 1500km em qualquer<br />
direção, proporciona<br />
vantagens absolutamente<br />
únicas para a promoção e<br />
desenvolvimento do “New<br />
Space”, especialmente<br />
através do reforço em curso<br />
das infraestruturas de<br />
monitorização de satélites,<br />
como antenas, e, sobretudo,<br />
a instalação de novos<br />
serviços de lançamento<br />
de satélites, incluindo o<br />
028 NOABR21 NOABR21 029
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
HOJE PODEMOS DIZER QUE<br />
OS AÇORES NÃO SÃO APENAS<br />
MAR, SÃO TAMBÉM ESPAÇO<br />
potencial para a instalação de um porto<br />
espacial” (p.9). O desafio consiste, assim,<br />
em garantir a instalação ao nível mundial<br />
de um porto espacial aberto a todos os<br />
operadores internacionais. Deste modo,<br />
a “instalação de uma nova geração<br />
de serviços de lançadores de satélites<br />
ambientalmente sustentáveis e seguros,<br />
abertos ao mundo, pode criar um novo<br />
posicionamento de Portugal no mundo”<br />
(p.9).<br />
É neste contexto que o presente plano<br />
“Portugal Espaço 2030”, aprovado pelo<br />
Governo, mobiliza diversos setores da<br />
sociedade para o Espaço, “valorizado<br />
como um bem público” (p.9), potenciando<br />
novas oportunidades de cooperação<br />
institucional, industrial e internacional<br />
e contribui para o desenvolvimento de<br />
tecnologias inovadoras e competitivas<br />
no mercado internacional. Para Manuel<br />
Heitor, o desenvolvimento desta agenda<br />
requer, também, o estabelecimento de uma<br />
entidade reguladora que regista, autoriza e<br />
regula as atividades e os objetos espaciais,<br />
devendo funcionar como interlocutor<br />
único entre o ator espacial e as entidades<br />
públicas que, em razão da matéria, devam<br />
intervir no procedimento. Estas entidades<br />
devem ser criadas e reguladas através<br />
de um quadro legal próprio, competitivo<br />
internacionalmente.<br />
Já Gui Menezes, antigo Secretário<br />
Regional do Mar, Ciência e Tecnologia,<br />
Governo Regional dos Açores, considera<br />
ser “inegável a dimensão que a Região<br />
Autónoma dos Açores confere a Portugal<br />
por via da sua localização no centro<br />
do Atlântico Norte. A essa dimensão<br />
essencialmente marítima, junta-se uma<br />
dimensão espacial que cada vez mais<br />
deixa de ser objeto de análise e exploração<br />
exclusiva das maiores potências. Hoje<br />
podemos dizer que os Açores não são<br />
apenas Mar, são também Espaço” (p.11).<br />
Para o antigo Secretário, os Açores<br />
desempenham um papel relevante fruto<br />
dos investimentos que têm sido feitos<br />
em infraestruturas, redes e projetos<br />
relacionados com esta temática. Gui<br />
Menezes começa por referir a integração<br />
na rede NEREUS (Rede de Regiões<br />
Utilizadoras de Tecnologias Espaciais)<br />
desde a sua fundação, que tem permitido<br />
acompanhar e contribuir para a definição<br />
da Estratégia Europeia do Espaço. É<br />
nos Açores que se encontra a primeira<br />
estação da Agência Espacial Europeia<br />
(AEE), instalada em Portugal e uma das<br />
primeiras estações da rede ESTRACK,<br />
com a capacidade de fazer rastreio de<br />
lançadores de satélites, à qual foi anexado<br />
um dos elementos do segmento terrestre<br />
do sistema global europeu de navegação<br />
por satélite, uma Galileo Sensor Station.<br />
“Ainda neste âmbito, os Açores estão a<br />
apostar na instalação de duas estações<br />
de radioastronomia integradas na Rede<br />
Atlântica de Estações Geodinâmicas<br />
Espaciais (RAEGE) que, fazendo uso<br />
de meios tecnológicos de rádio, tempo<br />
e frequência, se constituem como as<br />
mais adequadas infraestruturas para<br />
a observação do Espaço profundo<br />
e das fontes geradoras de sinal<br />
eletromagnético que o constituem”<br />
(p.11).<br />
De acordo com Gui Menezes, é fulcral<br />
para a Região continuar a apostar<br />
não só nas tecnologias espaciais e<br />
infraestruturas com elas relacionadas,<br />
mas também em infraestruturas de<br />
armazenamento, processamento<br />
e disponibilização de dados de<br />
observação da Terra e de serviços deles<br />
derivados. Por exemplo, ao usufruir<br />
da proximidade das infraestruturas<br />
de receção de dados provenientes<br />
dos satélites Sentinel, os Açores<br />
“poderão oferecer uma plataforma<br />
de apoio aos programas Copernicus<br />
e Galileo”. Para além disso, o antigo<br />
Secretário defende que há que apostar<br />
no desenvolvimento científico e em<br />
áreas como o Oceano, a Atmosfera e o<br />
Clima, atendendo a que estas áreas de<br />
investigação, bem como as de ponta,<br />
poderão “beneficiar da aplicabilidade<br />
de dados de observação da Terra e do<br />
Espaço e do envolvimento da Região<br />
na criação do Atlantic International<br />
Research Centre (AIR Centre)” (p.11),<br />
cuja sede poderá ser nos Açores. “Todas<br />
as ilhas possuem um conjunto de<br />
030 NOABR21 NOABR21 031
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
instalações, equipamentos e serviços<br />
de apoio à atividade empresarial, como<br />
portos, aeroportos, estradas e ainda<br />
parques tecnológicos e industriais, com<br />
excelentes infraestruturas, e uma rede<br />
de comunicações de transmissão de alta<br />
velocidade que liga os Açores a todo o<br />
mundo” (p.12).<br />
Também Paulo Ferrão, presidente<br />
da FCT, considera que o Espaço tem<br />
despertado nas últimas décadas uma<br />
“ambição de explorar novas fronteiras,<br />
de promover melhor conhecimento<br />
da Terra e de disponibilizar sistemas<br />
globais de comunicação, o sonho de<br />
protagonizar a aventura espacial e o<br />
conhecimento de base científica que<br />
indiscutivelmente está associado ao<br />
lançamento de veículos espaciais, à<br />
operação de satélites ou à exploração do<br />
espaço” (p.15).<br />
Nesta estratégia apresentada, são<br />
propostos três eixos estratégicos<br />
principais que serão implementados<br />
em colaboração com a ESA, a Comissão<br />
Europeia e outros parceiros. No que<br />
concerne ao Eixo 1, pretende-se<br />
estimular a exploração de dados e sinais<br />
espaciais através de serviços e aplicações<br />
de base espacial ou habilitadas por<br />
tecnologias espaciais, promovendo novos<br />
mercados e o emprego qualificado em<br />
diversas áreas. O Eixo 2 visa fomentar<br />
o desenvolvimento, construção e<br />
operação de equipamentos, sistemas e<br />
infraestruturas espaciais e de serviços<br />
de produção de dados espaciais, com<br />
ênfase em mini, micro e nano satélites,<br />
mas também abrindo novas áreas de<br />
intervenção em Portugal para serviços<br />
de lançadores e alargando as atuais<br />
atividades de monitorização e rastreio<br />
de satélites e observação da Terra. Por<br />
fim, o Eixo 3 pretende continuar a<br />
desenvolver a capacidade e competências<br />
nacionais na área do Espaço através<br />
da investigação científica, inovação,<br />
educação e cultura científica, permitindo<br />
a sustentabilidade a longo prazo das<br />
infraestruturas, serviços e aplicações<br />
espaciais.<br />
A Estratégia Portugal Espaço<br />
2030 preconiza, para o<br />
desenvolvimento dos três eixos<br />
apontados, o desenvolvimento<br />
de um programa-quadro<br />
envolvendo cinco linhas de ação<br />
jurídica, financeira, institucional,<br />
de internacionalização e de<br />
cultura científica. No quadro<br />
financeiro, prevê-se estimular<br />
uma estratégia de investimento,<br />
começando por complementar<br />
e alargar o atual nível de<br />
investimento público na ESA,<br />
suportado financeiramente<br />
através da FCT, I.P., com o apoio<br />
do IAPMEI e da ANACOM,<br />
bem como adequar os fundos<br />
estruturais e programas de<br />
financiamento público ao<br />
desenvolvimento e capacitação<br />
do setor do Espaço, de modo<br />
a que o investimento no setor<br />
possa alcançar um fator de<br />
multiplicação de cinco nos<br />
próximos cinco anos; e promover<br />
a diversificação das fontes<br />
de investimento, incluindo o<br />
acesso ao Banco Europeu de<br />
Investimento, entre outros<br />
fundos internacionais.<br />
No quadro institucional, está em<br />
vista a criação de um “agente<br />
regulador das atividades espaciais<br />
em Portugal, responsável por<br />
executar ações para monitorizar<br />
032 NOABR21 NOABR21 033
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
e regular atividades espaciais em<br />
Portugal, em linha com o projeto de<br />
proposta de lei de acesso e exercício<br />
de atividades espaciais” (p.34);<br />
bem como de um “agente promotor<br />
adequado e específico para o setor do<br />
Espaço, com vista à futura criação da<br />
Agência Espacial Portuguesa” (p.34).<br />
Está também prevista uma missão de<br />
preparação para a criação da agência<br />
espacial com o apoio da ESA, de<br />
especialistas internacionais, cabendo<br />
assim assegurar a nova antena de 15<br />
metros a ser instalada na ilha de Santa<br />
Maria, a qual será propriedade da FCT,<br />
I.P.; explorar a possibilidade da criação<br />
de um centro de dados do Programa<br />
Copernicus em Portugal, o qual iria<br />
auxiliar na disseminação de dados,<br />
entre outras estratégias.<br />
No âmbito da internacionalização,<br />
prevê-se o desenvolvimento de<br />
uma “agenda para o Mediterrâneo,<br />
garantindo a integração de dados<br />
espaciais para o desenvolvimento<br />
agroindustrial, a sustentabilidade<br />
energética e a gestão da água,<br />
através da cooperação com países<br />
do Norte de África e Médio Oriente,<br />
designadamente no quadro do<br />
lançamento emergente a nível europeu<br />
do Programa PRIMA (Partnership<br />
for Research and Innovation in the<br />
Mediterranean Area)” (p.35), assim<br />
como a possibilidade de criar novas<br />
parcerias internacionais com países<br />
que ainda não desenvolveram ou estão<br />
em vias de desenvolver capacidades<br />
espaciais.<br />
Por fim, no quadro da educação e<br />
cultura científica para o Espaço, o<br />
objetivo centra-se no reforço de uma<br />
“estratégia humanista para o Espaço”<br />
(p.36) que passa por promover<br />
programas de difusão da cultura<br />
tecnológica para o Espaço, estimular<br />
o enriquecimento dos currículos<br />
escolares no âmbito de matérias<br />
relacionadas com o setor espacial e,<br />
por fim “lançar e promover um portal<br />
na Internet que possibilite o acesso<br />
público a informação sobre programas<br />
espaciais, atividades científicas e<br />
tecnológicas, recursos de disseminação<br />
de imagens de satélite, oportunidades<br />
de formação, exposições e conferências,<br />
entre outros conteúdos” (p.36).<br />
Revisitando as palavras de Gui Menezes<br />
relativamente à posição “ímpar”<br />
da Região Autónoma dos Açores,<br />
detentora de uma Zona Económica<br />
Exclusiva (ZEE) com uma área de<br />
aproximadamente 1.000.000 km²,<br />
poderá concluir-se que a região “tem<br />
as premissas de base para garantir<br />
o desenvolvimento decorrente desta<br />
NUM FUTURO<br />
PRÓXIMO,<br />
PORTUGAL SE<br />
POSICIONARÁ<br />
COMO UMA<br />
VERDADEIRA<br />
NAÇÃO ESPACIAL<br />
mudança” (p.12). Já Manuel Heitor<br />
fornece uma perspetiva de “prestígio<br />
nacional” (p.9), afirmando que, num<br />
futuro próximo, Portugal se posicionará<br />
“como uma verdadeira nação espacial,<br />
com capacidade de assumir os<br />
novos desafios do sector. Tal é, aliás,<br />
imperativo para um país que se procura<br />
afirmar no cenário internacional pela<br />
ciência e inovação” (p.9).<br />
Bibliografia:<br />
Estratégia Portugal Espaço 2030. Uma<br />
Estratégia de Investigação, Inovação e<br />
Crescimento para Portugal, Aprovada<br />
no Conselho de Ministros de 15 de<br />
fevereiro de 2018. (Resolução n.º<br />
30/2018), Publicada em “Diário da<br />
República” (1.ª Série, n.º 50), 12 de<br />
maço de 2018.<br />
034 NOABR21 NOABR21 035
PUB.<br />
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
PUB.<br />
036 NOABR21 NOABR21 037
REPORTAGEM<br />
A ENERGIA<br />
RENOVÁVEL MARINHA<br />
COMO ALTERNATIVA<br />
O aproveitamento das ondas está em<br />
fase de demonstração, ou seja, encontrase<br />
em fase de teste no mar e apenas<br />
alguns dos estudos alcançaram a fase<br />
de testes no mar em condições reais,<br />
nomeadamente, o projeto Pelamis,<br />
Tecnologia Powerbuoy, Tecnologia BOLT,<br />
Tecnologia WaveRoller, entre outros.<br />
Devido aos estudos já desenvolvidos,<br />
esta energia desempenha um papel<br />
importante na transição para um<br />
sistema energético global mais<br />
sustentável.<br />
Em Portugal existem três projetos<br />
de demonstração da ERM: dois de<br />
tecnologia das ondas (WaveRoller em<br />
Peniche) e o Centro das Ondas na ilha<br />
do Pico, nos Açores e um de energia<br />
eólica offshore (projeto Windfloat na<br />
Aguçadora).<br />
A energia renovável marinha<br />
(ERM) “é qualquer tecnologia<br />
que extraia energia renovável<br />
do oceano. Abrange as energias<br />
eólicas (tanto longe como perto da<br />
costa), as energias provenientes<br />
das ondas, das correntes de maré,<br />
do gradiente de salinidade e a<br />
energia gerada pelas diferenças<br />
de temperatura”.<br />
SOFIA CORDEIRO<br />
O Centro das Ondas na ilha do<br />
Pico “foi, ao longo da última<br />
década, um importante centro de<br />
teste europeu para tecnologias de<br />
energia das ondas à escala real”. Foi<br />
construído entre 1996 e 1999 como<br />
um “projeto piloto” de energia das<br />
ondas, financiado por programas de<br />
investigação e inovação da Comissão<br />
Europeia (Projetos JOULE1), mas<br />
também por financiamento nacional<br />
(Programa Energia) e pelas empresas<br />
EDP e Electricidade dos Açores<br />
(EDA), sensivelmente em partes<br />
iguais. A obra ficou concluída no<br />
verão de 1998. Em setembro do<br />
mesmo ano, durante a instalação do<br />
equipamento elétrico no interior da<br />
Central, ocorreu uma tempestade<br />
que provocou uma inundação e<br />
danos graves nos componentes<br />
elétricos. Os primeiros testes da<br />
Central atrasaram-se, por este<br />
motivo, até ao verão do ano seguinte.<br />
Só quatro anos mais tarde viria a ser<br />
possível o funcionamento<br />
NOABR21 039
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
regular da Central, com o apoio<br />
do Programa PRIME (DEMTEC)<br />
da Agência Nacional de Inovação.<br />
O Programa de Incentivos à<br />
Modernização da Economia<br />
(PRIME), lançado em 2003, tinha<br />
um instrumento de financiamento,<br />
designado DEMTEC, para apoio a<br />
“projetos piloto” relativos a soluções<br />
tecnologicamente inovadoras.<br />
Foi no âmbito deste programa<br />
nacional financiado pela Agência<br />
de Inovação (atual ANI – Agência<br />
Nacional de Inovação), que o<br />
WavEC, criado em 2003, mobilizou<br />
o apoio de parceiros portugueses<br />
para submeter uma proposta de<br />
recuperação e arranque da Central<br />
do Pico.<br />
A Central de Ondas da Ilha do Pico<br />
“é uma versão costeira de uma<br />
tecnologia designada por ‘Coluna<br />
de Água Oscilante’, vulgarmente<br />
conhecida pela sigla CAO. Esta<br />
tecnologia é constituída por uma<br />
estrutura oca, neste caso em betão,<br />
formando uma câmara pneumática<br />
sobre a superfície livre interior<br />
da água. A câmara comunica<br />
com a atmosfera (lado de terra),<br />
através de uma conduta contendo<br />
uma turbina de ar acoplada a um<br />
gerador elétrico, e com o mar<br />
exterior através de uma abertura<br />
submersa, existente na parede<br />
frontal da câmara. As ondas do<br />
mar, ao propagarem-se para o<br />
interior da câmara através da<br />
abertura submersa, fazem oscilar<br />
verticalmente a água no seu interior.<br />
Consequentemente, movimenta-se<br />
um fluxo de ar interior em sentidos<br />
alternados, através da conduta que<br />
liga a câmara à atmosfera. Esta<br />
passagem de ar aciona a turbina<br />
instalada na conduta, que deve ser<br />
de escoamento reversível (isto é,<br />
a turbina roda sempre no mesmo<br />
sentido independentemente do<br />
escoamento de ar ser de ou para a<br />
atmosfera)”.<br />
Os dados adquiridos na Central<br />
do Pico, ao longo de vários<br />
anos de operação, “têm sido<br />
fundamentais para a melhor<br />
compreensão deste tipo de<br />
tecnologia”. A instrumentação<br />
instalada para análise em tempo<br />
real das condições do mar e de<br />
operação da turbina “permitiram<br />
tirar conclusões importantes sobre<br />
o projeto deste tipo de centrais”.<br />
O gráfico abaixo representado<br />
mostra a evolução da produção<br />
de energia elétrica nos últimos 10<br />
anos de operação da Central. A<br />
melhoria gradual das condições de<br />
funcionamento nos primeiros três<br />
anos “traduziu-se num aumento<br />
substancial de produção de<br />
energia elétrica em 2010, ano em<br />
que foram implementados, com<br />
sucesso, a operação autónoma e o<br />
controlo remoto da central (sem<br />
operador local). Em 2011, uma falha<br />
grave no gerador, seguida de um<br />
problema no inversor, obrigaram<br />
a uma paragem prolongada para<br />
diagnóstico e reparação dos<br />
problemas” assim como em 2017.<br />
Figura 1 - Energia Elétrica produzida pela Central<br />
nos últimos 10 anos<br />
Brito e Melo, Ana. “Um olhar sobre a Central Piloto<br />
Europeia de energia das ondas na ilha do Pico”. 2018.<br />
WaVEC Offshore Renewables.<br />
Segundo um documento elaborado<br />
em 2018 designado por “Um olhar<br />
sobre a Central Piloto Europeia de<br />
energia das ondas na ilha do Pico”,<br />
a autora, Ana Brito e Melo, afirma<br />
que a produção elétrica da Central<br />
“ficou, no entanto, muito aquém<br />
do previsto para uma Central de<br />
400 kW de potência nominal. Os<br />
constrangimentos financeiros não<br />
possibilitaram a correção de todos<br />
os problemas técnicos e limitaram a<br />
sua plena operação. As deficiências<br />
040 NOABR21 NOABR21 041
REPORTAGEM<br />
estruturais da Central, na sua parte<br />
submersa, e o seu agravamento ao<br />
longo dos anos inviabilizam a sua<br />
continuidade por muito mais tempo”,<br />
mas a central “cumpriu muito bem<br />
o seu papel de unidade piloto, de<br />
demonstração e de formação, sendo,<br />
de longe, a central de energia das<br />
ondas com mais longevidade, e, talvez,<br />
com mais visibilidade do mundo”.<br />
A autora adiciona que há vários<br />
fatores que afetaram a imagem da<br />
Central do Pico, nomeadamente “o<br />
seu enquadramento arquitetónico<br />
deficiente, a fraca disponibilidade<br />
para campanhas de informação<br />
e sensibilização pública e a falta<br />
de condições para permanência<br />
de equipas no local”. No entanto,<br />
o principal fator que afetou a sua<br />
reputação, quer nos Açores quer<br />
no Continente, “foi uma errada<br />
expectativa para a sua missão,<br />
nomeadamente na altura em que foi<br />
construída”.<br />
Quanto à energia eólica offshore,<br />
a Europa detém um elevado<br />
potencial eólico offshore. O<br />
continente europeu é, atualmente,<br />
o líder mundial em parques eólicos<br />
offshore. No fim do primeiro<br />
semestre de 2011 estavam em<br />
operação 1247 turbinas eólicas com<br />
uma capacidade acumulada de 3294<br />
MW, correspondendo a 49 parques<br />
eólicos existentes em nove países<br />
europeus. Em 2010 a capacidade<br />
média de cada aerogeador instalado<br />
era de 3,2 M em parque eólicos com<br />
uma dimensão média de 155,3 MW.<br />
“A integração na rede elétrica da<br />
energia produzida nos parques<br />
eólicos offshore apresentase<br />
como um novo desafio”,<br />
implicando custos elevados e<br />
o desenvolvimento de novas<br />
tecnologias, tais como navios de<br />
instalação, subestações ou cabos<br />
de transmissão. No entanto, são<br />
vários os projetos que visam o<br />
desenvolvimento de super-redes<br />
de recolha e transporte de energia<br />
eólica offshore.<br />
Os custos de capital associados à<br />
produção das energias renováveis<br />
“são ainda demasiado elevados”<br />
para que aquelas tecnologias sejam<br />
competitivas. Os custos da energia<br />
eólica offshore são, atualmente,<br />
2,5 vezes superiores aos custos<br />
da eólica em terra (onshore),<br />
enquanto os custos da energia das<br />
ondas são seis vezes superiores.<br />
No entanto, os especialistas esperam<br />
que essa diferença venha a diminuir<br />
significativamente, o que indica<br />
que pode surgir uma oportunidade<br />
de investimento nesta indústria no<br />
futuro.<br />
NOABR21 043
REPORTAGEM<br />
Em Portugal, o desenvolvimento<br />
de energias offshore envolve<br />
custos e riscos de desenvolvimento<br />
muito elevados. Por isso, o<br />
desenvolvimento deste tipo de<br />
tecnologias necessita de apoio<br />
financeiro, não só no apoio em<br />
inovação e desenvolvimento, como<br />
em cofinanciamento público-privado<br />
dos projetos de demonstração,<br />
e ainda de tarifas bonificadas à<br />
produção de energias.<br />
O investimento em fontes de energias<br />
limpas pode resultar em diferentes<br />
benefícios, o que poderá motivar o<br />
apoio público. Estes benefícios são<br />
efeitos externos da utilização desta<br />
energia como a redução de poluentes<br />
locais com populações, mas também<br />
a redução de emissões de dióxido de<br />
carbono e de poluentes atmosféricos e<br />
ainda redução do impacto visual entre<br />
outros.<br />
Pelo contrário, existem também efeitos<br />
negativos como os impactos causados<br />
pelo ruído, perda de biodiversidade<br />
associada à instalação e operação de<br />
dispositivos de energia, mortalidade<br />
de aves devido à colisão com turbinas<br />
eólicas e impactos na biodiversidade<br />
associados aos efeitos dos campos<br />
eletromagnéticos produzidos pelos<br />
cabos enterrados no fundo do mar.<br />
Relativamente aos apoios ao<br />
investimento nestas energias o<br />
investigador privado não investirá sem<br />
apoio público, pois as receitas de venda<br />
de eletricidade não são suficientes para<br />
compensar os custos de capital nos três<br />
tipos de infraestruturas de ERM. “Estas<br />
tecnologias ainda não atingiram um<br />
nível de maturidade suficiente, ao<br />
contrário do que tem sido observado,<br />
por exemplo, na indústria de energia<br />
eólica onshore”. Ainda que os custos<br />
de capital tendam a diminuir ao longo<br />
do tempo, os resultados deste trabalho<br />
sugerem que a ERM (incluindo energia<br />
eólica offshore, nearshore e energia das<br />
ondas) não será competitiva mesmo no<br />
longo prazo.<br />
De acordo com Maria Cunha-e-Sá, Ana<br />
Faria Lopes e Filipa Saldanha, “existem<br />
muitos fatores ao nível local que são<br />
cruciais para garantir a viabilidade das<br />
ERM. Por exemplo, a profundidade no<br />
local de instalação, a fonte de energia<br />
(velocidade do vento ou energia das<br />
ondas), a distância à rede elétrica,<br />
entre outros. Foram analisados vários<br />
locais ao longo da costa portuguesa<br />
para perceber como é que, do ponto de<br />
vista social, as diferentes características<br />
locais podem influenciar a viabilidade<br />
do investimento. No caso da energia<br />
das ondas, concluiu-se que nenhum dos<br />
locais selecionados parece ser viável<br />
devido aos elevados custos de capital,<br />
dado que se trata de uma indústria<br />
nascente. No caso da eólica nearshore,<br />
os impactos paisagísticos podem ser<br />
determinantes. No que se refere à<br />
NOABR21 045
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
energia eólica offshore, enquanto o fator<br />
de capacidade (ou seja, a percentagem<br />
de tempo durante o qual a turbina<br />
eólica está a operar, dado os regimes<br />
de vento) é particularmente relevante<br />
para a instalação deste tipo de energia,<br />
a distância à rede também se revela<br />
importante”.<br />
Ao nível de Inovação e Desenvolvimento<br />
em Portugal, destaca-se um conhecimento<br />
científico importante, reconhecido a nível<br />
mundial, em particular na energia das<br />
ondas fruto dos projetos de investigação<br />
que têm sido desenvolvidos nas últimas<br />
três décadas e dos pilotos pioneiros que<br />
já foram implementados. Em particular, a<br />
atividade de Inovação e Desenvolvimento<br />
começou nos anos 80, com o<br />
desenvolvimento dos primeiros trabalhos<br />
em energias das ondas. Na década de 90,<br />
os trabalhos continuaram sobretudo no<br />
âmbito do desenvolvimento do primeiro<br />
projeto de demonstração, a central do<br />
Pico. No entanto, só em meados da<br />
primeira década de 2000 existiu um maior<br />
envolvimento de entidades portuguesas<br />
neste sector, sobretudo a nível de projetos<br />
Europeus.<br />
De acordo com Maria Cunha-e-Sá, Ana<br />
Faria Lopes e Filipa Saldanha, a indústria<br />
das ERM é um “investimento de<br />
longo prazo”. A energia eólica offshore<br />
poderá ser viável do ponto de vista<br />
social. Em Portugal, as Feed-in-Tariffs<br />
(FiTs) têm sido utilizadas para apoiar<br />
projetos de energia renovável. A decisão<br />
de investir em energia eólica nearshore<br />
“está altamente dependente dos custos<br />
associados à degradação da paisagem<br />
que dela pode resultar. Uma vez que não<br />
existem estudos de valoração que estimem<br />
esses custos para Portugal, utilizámos<br />
estimativas obtidas em estudos<br />
realizados noutros países, depois de<br />
devidamente ajustados para Portugal”.<br />
Os resultados do estudo realizados<br />
pela “Iniciativa Gulbenkian Oceanos”<br />
sugerem a necessidade de promover<br />
uma visão “mais integrada e de longo<br />
prazo” que garanta estabilidade à<br />
indústria das ERM. Por exemplo,<br />
o apoio às ERM, através de FiTs,<br />
ou mesmo os objetivos nacionais<br />
propostos para as ERM, conforme<br />
definidos no Plano de Ação para as<br />
Energias Renováveis (PNAER), “não<br />
têm sido consistentes ao longo do<br />
tempo”, o que reduz a capacidade<br />
de atração dessas tecnologias em<br />
Portugal. Uma visão de longo prazo<br />
para a indústria ERM reduziria a<br />
incerteza regulatória, contribuindo<br />
para o cumprimento dos objetivos<br />
estabelecidos na Estratégia Nacional<br />
para o Mar e no PNAER.<br />
A decisão de investir em energia eólica<br />
nearshore “está altamente dependente<br />
dos custos associados à degradação<br />
da paisagem que dela pode resultar,<br />
uma vez que não existem estudos de<br />
valorização que estimam esses custos<br />
para Portugal”.<br />
Bibliografia:<br />
Brito e Melo, Ana. Um olhar sobre a<br />
Central Piloto Europeia de energia das<br />
ondas na ilha do Pico. (2018). WaVEC<br />
Offshore Renewables.<br />
Cunha-e-Sá, Maria A.; Lopes, Ana<br />
Faria; Saldanha, Filipa. Energias<br />
Renováveis Marinhas em Portugal.<br />
(2017). Fundação Calouste Gulbenkian.<br />
Silva, C. A. S., Matias, S., Mafra, C.,<br />
Sim-Sim, F., Estaqueiro, A., Simões, T.,<br />
& Cardoso, A. (2011). Roadmap para<br />
as energias renováveis offshore em<br />
Portugal. LNEG/UESEO, Lisboa.<br />
046 NOABR21 NOABR21 047
PUB.<br />
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
PUB.<br />
048 NOABR21 NOABR21 049
REPORTAGEM<br />
TENDÊNCIAS GLOBAIS<br />
DE EMPREGO PARA A<br />
JUVENTUDE:<br />
tecnologia e o futuro dos empregos<br />
SARA BORGES<br />
A tecnologia destruirá empregos e<br />
agravará a desigualdade ou trará<br />
empregos mais significativos e<br />
sociedades mais saudáveis? Esta questão<br />
preocupa a humanidade desde que o<br />
avanço tecnológico assumiu alguns<br />
trabalhos manuais e aglomera diversas<br />
conspeções entre investigadores e<br />
instituições.<br />
Deste modo, o presente artigo pretende<br />
identificar as inovações que podem<br />
levar a novos modelos de oportunidades<br />
de trabalho para os jovens, tendo por<br />
base diversos estudos. O objetivo é<br />
entender os principais pontos chave<br />
de influência para trabalhar com as<br />
organizações, corporações e outros<br />
grandes empregadores na construção<br />
de empregos futuros para os jovens, a<br />
partir de hoje.<br />
A pandemia Covid-19 e os<br />
confinamentos induzidos juntamente<br />
com a recessão global que se prosseguiu<br />
criaram perspetivas altamente incertas<br />
para o mercado de trabalho e obrigaram<br />
a uma alteração dos modos de trabalho.<br />
De acordo com o relatório - The<br />
Future of Jobs - divulgado pelo Fórum<br />
Económico Mundial, vão surgir<br />
novas funções, mas também vai<br />
haver menos procura de alguns dos<br />
trabalhos já existentes, destacando-se<br />
o “potencial” para trabalho remoto<br />
ou híbrido.<br />
Os jovens, de um modo geral, tendem<br />
a ter mais dificuldades em posicionarse<br />
no mercado de trabalho seja<br />
devido à idade, à falta de experiência<br />
ou à inadequada educação. Certas<br />
subpopulações enfrentam barreiras<br />
ainda maiores devido a fatores como<br />
raça, sexo e status socioeconómico.<br />
Esses desafios são intensificados durante<br />
uma recessão económica e deste modo<br />
é fulcral perceber como se integram os<br />
jovens nestes cenários de instabilidade.<br />
Algoritmos inteligentes e redes de<br />
robóticas estão transformando o<br />
significado do trabalho. De acordo com<br />
o relatório elaborado pelo Institute for<br />
the Future (IFTF), em parceria com The<br />
Rockefeller Foundation’s U.S. Youth<br />
Employment initiative, a automação está<br />
cada vez mais a substituir trabalhadores<br />
de trabalhos rotineiros de manufatura<br />
e serviços. Muitos empregos básicos<br />
de salário mínimo estão a tornarse<br />
escassos. Além de tudo isso, o<br />
percurso escola - trabalho já não<br />
funciona como antes, “um diploma<br />
universitário não é mais um bilhete<br />
infalível para um bom emprego”,<br />
defende o IFTF.<br />
Deste modo, antes de procedermos aos<br />
possíveis cenários para os jovens no<br />
mercado de trabalho importa salientar o<br />
modo como este, possivelmente, estará<br />
organizado.<br />
050 NOABR21 NOABR21 051
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
Neste aspeto, o relatório divulgado pelo<br />
Fórum Económico Mundial fornece<br />
informações detalhadas para 15 setores<br />
da indústria e de 26 países avançados e<br />
emergentes.<br />
De um modo sintetizado o relatório denota<br />
que é expectável que o ritmo de adoção<br />
da tecnologia permaneça inabalável e<br />
que até possa acelerar em algumas áreas.<br />
Consequentemente, a pandemia juntamente<br />
com a automação estão a criar um cenário<br />
de “rutura dupla” para os trabalhadores.<br />
Note-se que a automação é o ato de tornar<br />
um processo manual num processo<br />
independente de interação humana. Desta<br />
forma, as empresas estão e vão permanecer<br />
em processos de adaptação. Na avaliação feita<br />
pelo Fórum Económico Mundial, 43% das<br />
empresas, de vários sectores, estão a procurar<br />
obter “mais automatização e reduzir a força<br />
de trabalho” humano; 34% quer aumentar<br />
a força de trabalho “como um resultado<br />
da integração tecnológica mais profunda”,<br />
enquanto 41% procura contratar pessoas<br />
para tarefas especializadas. De acordo com<br />
o relatório, em 2025, “o tempo gasto em<br />
tarefas atuais no trabalho por humanos e<br />
as máquinas serão iguais” (2020, p. 5).<br />
exacerbada devido ao duplo impacto da<br />
tecnologia e a recessão pandémica”, refere<br />
o relatório. Assim, prevê-se que, até 2025,<br />
85 milhões de empregos no mundo sejam<br />
adaptados de forma a conciliar o trabalho<br />
entre humanos e máquinas. Além disso,<br />
espera-se que possam surgir 97 milhões<br />
de novas funções que permitam também<br />
esta divisão laboral, mas com a inserção de<br />
algoritmos.<br />
No entendimento do Fórum Económico<br />
Mundial, “durante a última década, um<br />
conjunto de inovações e tecnologias<br />
emergentes sinalizaram o início da quarta<br />
revolução industrial” (2020, p. 8). Esperase<br />
que mesmo aqueles que mantenham os<br />
empregos necessitem de atualizar 40% das<br />
competências para o futuro mercado de<br />
trabalho, por forma a responder à quarta<br />
revolução industrial. Além disso, conclui-se<br />
também que o sector público precisa de dar<br />
um apoio mais forte para a requalificação e<br />
qualificação dos trabalhadores em risco de<br />
perder o emprego ou vê-lo adaptado. Apenas<br />
21% das empresas dizem “ser capazes de usar<br />
fundos públicos para apoiar os funcionários”<br />
(2020, p. 48) de forma a conseguirem<br />
atualizar as suas competências.<br />
Em relação à questão abordada na<br />
introdução deste artigo, este relatório<br />
projeta que, a médio prazo, “o trabalho<br />
destruído provavelmente será compensado<br />
pelo crescimento do emprego nos jobs of<br />
tomorrow”, assim estes trabalhadores podem<br />
preencher empregos na economia verde,<br />
nas funções de vanguarda da economia de<br />
dados e IA, como também em novas funções<br />
na área de engenharia, computação em<br />
nuvem e desenvolvimento de produtos. No<br />
entanto, importa realçar que a criação de<br />
novos empregos é mais lenta que a destruição<br />
de antigos ofícios e a ausência de esforços<br />
proativos, pode provocar uma “desigualdade<br />
Assim, o Fórum Económico Mundial,<br />
em parceria com o Fundo Monetário<br />
Internacional, prevê que possam vir a<br />
emergir novos empregos no campo da<br />
tecnologia, como analistas e cientistas<br />
de dados e especialistas em inteligência<br />
artificial, e de profissões ligadas à<br />
estratégia e ao marketing digital, como a<br />
gestão de redes sociais, vendas e produção<br />
de conteúdos, que permite trabalhar com<br />
vários tipos de pessoas. Por outro lado, vai<br />
reduzir a procura por empregos ligados à<br />
administração, à montagem, à reparação e ao<br />
atendimento ao público.<br />
Relativamente às soft skills, em 2025, de<br />
acordo com o relatório, vão ser valorizadas<br />
as capacidades de “pensamento analítico<br />
e de inovação”, a “resolução de problemas<br />
complexos”, a “criatividade, originalidade e<br />
a iniciativa”, a “flexibilidade”, bem como a<br />
“gestão do stress” e a “inteligência emocional”<br />
dos empregados.<br />
Portanto, a questão mais relevante para as<br />
empresas, governos e indivíduos não é até<br />
que ponto a automação e aumento da força de<br />
trabalho humano afetará os números atuais<br />
de empregos, mas de que modo o mercado<br />
de trabalho pode ser apoiado de forma a<br />
encontrar um novo equilíbrio na divisão de<br />
trabalho entre trabalhadores humanos, robôs<br />
e algoritmos.<br />
O desemprego, seja causado por uma<br />
economia lenta, impulsionadores tecnológicos,<br />
ou falta de preparação, cria dificuldades<br />
duradouras para a juventude e para a<br />
economia do país como um todo. Desta<br />
forma, importa perceber quais os cenários<br />
de futuro que os mais recentes estudos<br />
indicam. Para tal, recorreremos a dois estudos<br />
diferentes que preveem mundos alternativos<br />
de trabalho. O primeiro incide no relatório<br />
intitulado - The Future of Youth Employment<br />
052 NOABR21 NOABR21 053
REPORTAGEM<br />
elaborado pelo Institute for the Future (IFTF)<br />
e o segundo da responsabilidade da Hesse e<br />
Olsen denominado - What will work look like<br />
in 2030?<br />
Em relação ao relatório do IFTF, este recorre<br />
a uma metodologia de cenários alternativos<br />
desenvolvida na Universidade do Havaí para<br />
quatro futuros arquetípicos: crescimento,<br />
colapso, restrição e transformação. Sendo<br />
assim, cada perspetiva de futuro agrega um<br />
conjunto de elementos-chave, como também<br />
recomenda estratégias-chave que podem ser<br />
usadas por empregadores preocupados em<br />
promover a preparação e o desenvolvimento<br />
da força de trabalho para os jovens, e<br />
recomendações de políticas para o governo.<br />
Desta forma, os principais elementos e políticas<br />
públicas recomendadas para cada cenários são<br />
os seguintes:<br />
Para o cenário de crescimento verifica-se<br />
uma economia flexível, onde o mercado de<br />
trabalho favorece “a elevada qualificação<br />
dos funcionários em certos setores de<br />
crescimento”. O mercado de trabalho é<br />
“altamente fluido com abundância de novas<br />
oportunidades”, mas as habilidades do<br />
trabalhador devem ser “constantemente<br />
atualizadas”. Em relação à educação, esta<br />
expande-se em “instituições para o online e<br />
espaços comunitários” e o “credenciamento<br />
alternativo cresce e torna-se aceitável” (IFTF,<br />
2014, p. 4).<br />
Em termos de políticas públicas, o estudo<br />
defende para este cenário a “subsidiação<br />
do custo do emprego inicial para ajudar<br />
jovens desfavorecidos”, como também<br />
a implementação de “currículos de<br />
aperfeiçoamento online e no trabalho”. Na<br />
sequência do estudo, as empresas deveriam<br />
receber incentivos para desenvolver e<br />
distribuir material didático online como uma<br />
ferramenta para encontrar e promover novos<br />
trabalhadores (IFTF, 2014, p. 6).<br />
Seguidamente, na abordagem do cenário de<br />
colapso, “The Growing Gap”, surge a automação<br />
crescente que reduz o conhecimento do trabalho<br />
e de empregos de salário mínimo. Neste ponto,<br />
existem “mais estudantes universitários a graduarse,<br />
mas a descobrir que a sua especialização não é<br />
comercializável”. Como também o “governo enfrenta<br />
crises e é incapaz de abordar necessidades de uma<br />
forma sistemática”, a “economia informal e moedas<br />
alternativas crescem” (IFTF, 2014, p. 7).<br />
Para este cenário, as políticas públicas recomendáveis<br />
focam na obrigação dos “empregadores a designar<br />
um tempo para melhorar as habilidades” e<br />
“reconstituir o trabalho organizado para sustentar os<br />
salários e proteger os empregos” (IFTF, 2014, p. 9).<br />
Em terceiro lugar, surge o cenário de restrição, que<br />
incorpora um mundo com “poucas oportunidades<br />
de crescimento novas e o foco das empresas é na<br />
redução de custos”. Aqui “as redes de trabalho online<br />
funcionam como um suplemento altamente eficiente<br />
para os funcionários” e as “estruturas organizacionais<br />
são apoiadas por software de coordenação que<br />
substitui a hierarquia tradicional” (IFTF, 2014, p. 10).<br />
054 NOABR21 NOABR21 055
REPORTAGEM<br />
De acordo com as caraterísticas do<br />
cenário de restrição o estudo recomenda<br />
as seguintes políticas públicas. Por um<br />
lado, “melhorar a passagem da esfera<br />
escolar para a esfera do mundo do<br />
trabalho”, entre vários motivos, foca no<br />
facto de os planos de carreira começarem<br />
a ser definidos no ensino médio. Por<br />
outro lado, defende a “promoção<br />
da propriedade dos funcionários –<br />
employee stock ownership (ESOPs)” ou<br />
propriedade de ações por funcionários,<br />
é quando os funcionários de uma<br />
empresa possuem ações nessa empresa.<br />
ESOPs demonstram que aumentam a<br />
produtividade do trabalhador, segurança<br />
económica e compensação (IFTF, 2014,<br />
p. 12).<br />
Por último, no cenário de transformação<br />
ou transformista encontramos o<br />
“indivíduo amplificado”. Neste ponto,<br />
os “custos de coordenação caem<br />
significativamente”, o “capital para<br />
empresas de crowdfunding, bancos e os<br />
VCs fluem livremente”. Este cenário é<br />
“altamente empreendedor para empresas<br />
e mentalidades flexíveis” e o “equilíbrio<br />
de poder muda de grandes organizações<br />
para indivíduos” (IFTF, 2014, p. 13).<br />
E como políticas públicas para este<br />
cenário recomendam “disponibilizar<br />
microcréditos para empreendedores de<br />
renda baixa”, como também, promover<br />
“módulos de empreendedorismo em<br />
toda a educação”, e por fim, “apoiar<br />
o desenvolvimento de negócios<br />
cooperativos dos trabalhadores” (IFTF,<br />
2014, p. 15).<br />
Em suma, os quatro cenários neste<br />
relatório fornecem uma experiência<br />
numa ampla gama de desafios<br />
enfrentados por jovens desfavorecidos<br />
no futuro emergente. Os autores<br />
do estudo realçam que “todos esses<br />
cenários estão já acontecendo, até certo<br />
ponto e numa escala de cidade por<br />
cidade. A partir daqui o futuro não irá<br />
evoluir exatamente como descrito em<br />
qualquer um dos quatro cenários, mas<br />
provavelmente entrelaça os elementos<br />
de cada um”. Assim, defendem que<br />
“será importante para as partes<br />
interessadas perseguir um portfólio<br />
de estratégias e políticas durante os<br />
próximos dez anos para tirar jovens<br />
desfavorecidos do desemprego” (IFTF,<br />
2014, p. 16).<br />
Concluída a exposição da teoria<br />
desenvolvida pelo Institute for the<br />
Future, passamos agora a demonstrar<br />
a teoria elaborada por Hesse e Olsen<br />
da PricewaterhouseCoopers (PwC).<br />
Esta perspetiva contém quatro mundos<br />
alternativos de trabalhos, todos<br />
com nomes e cores diferentes. Esses<br />
exemplos, reconhecidos pelos autores,<br />
como “extremos” de como o trabalho<br />
poderia ser em 2030 são moldados<br />
“pelas maneiras como as pessoas e as<br />
organizações respondem às forças do<br />
coletivismo e do individualismo, num<br />
eixo, e integração e fragmentação, no<br />
outro” (Hesse & Olsen, 2017). Desta<br />
forma, existe o “mundo vermelho”, o<br />
“mundo azul”, o “mundo verde” e o<br />
“mundo amarelo”, cada um deles com<br />
caraterísticas distintas.<br />
056 NOABR21 NOABR21 057
REPORTAGEM<br />
No “mundo vermelho”, a tecnologia permitirá<br />
que “pequenas empresas explorem os vastos<br />
reservatórios de informações, habilidades e<br />
financiamento”. De acordo com Hesse e Olsen,<br />
os “recursos humanos não existirão mais como<br />
uma função separada e os empreendedores<br />
contarão com serviços terceirizados para<br />
processos de pessoal”, referindo que haveria<br />
uma “competição feroz” por talentos, e aqueles<br />
com habilidades futuras exigidas obterão as<br />
maiores recompensas.<br />
Para o “mundo azul”, os autores realçam que<br />
as corporações globais tornar-se-ão “maiores,<br />
poderosas e mais influentes do que nunca”.<br />
Pois, as empresas contemplam o seu tamanho e<br />
influência como a melhor maneira de proteger<br />
as suas margens de lucro. E neste cenário, em<br />
semelhança ao anterior, os melhores talentos<br />
são disputados ferozmente (Hesse & Olsen,<br />
2017).<br />
Em relação ao “mundo verde”, este apresentase<br />
como sendo um mundo coletivo e integrado,<br />
onde a tónica está na responsabilidade ecológica.<br />
Assim, “é movido pela necessidade de uma<br />
consciência social poderosa”. Neste mundo e<br />
tendo em conta a forte opinião pública, como<br />
também a escassez dos recursos naturais e<br />
as rígidas regulamentações internacionais, as<br />
empresas promoverão uma “forte agenda ética e<br />
ecológica” (Hesse & Olsen, 2017).<br />
Por último, no atual quadro teórico, existe<br />
o “mundo amarelo”. Aqui os trabalhadores<br />
e empresas buscarão “maior significado e<br />
relevância”. Os trabalhadores deparam-se com<br />
uma maior autonomia, flexibilidade e realização<br />
quando trabalham para organizações com<br />
“fortes padrões éticos e sociais” (Hesse & Olsen,<br />
2017).<br />
Desta forma, Hesse e Olsen referem que estes<br />
cenários podem parecer “improváveis” ou até<br />
mesmo “caprichosos”, no entanto defendem que<br />
o futuro é incerto e que “as respostas podem<br />
não parecer óbvias hoje”, mas é a partir da<br />
construção de diversos cenários que se deve<br />
“enfrentar o futuro do trabalho com um maior<br />
senso de confiança”.<br />
Sendo assim, como devem os jovens, as<br />
empresas e os próprios governos<br />
preparar-se para a incerteza<br />
existente no mercado de trabalho,<br />
ainda mais com as consequências<br />
da pandemia Covid-19? Neste<br />
novo contexto, pela primeira<br />
vez nos últimos anos, a criação<br />
de empregos está começando a<br />
ser ultrapassada pela destruição<br />
e este fator está prestes a afetar<br />
os trabalhadores desfavorecidos<br />
com particular ferocidade, alerta<br />
o relatório do Fórum Económico<br />
Mundial. Este relatório indica<br />
que à medida que os números<br />
do desemprego aumentam,<br />
surge cada vez mais a urgência<br />
para expandir a proteção<br />
social, incluindo apoio para os<br />
trabalhadores que necessitam ser<br />
realocados enquanto navegam em<br />
direção a novas oportunidades<br />
no mercado de trabalho e para os<br />
‘empregos de amanhã’. Abordando<br />
os atuais desafios apresentados<br />
pelo COVID-19, em conjunto<br />
com a rutura representada pela<br />
mudança tecnológica, isto requer<br />
uma inovação do serviço público<br />
para o benefício de trabalhadores<br />
afetados em todos os lugares.<br />
É neste sentido que o Fórum<br />
Económico Mundial defende que<br />
“os governos devem buscar uma<br />
abordagem holística, criando<br />
ligações ativas e coordenação<br />
entre provedores de educação,<br />
habilidades, trabalhadores e<br />
empregadores, e garantindo<br />
eficaz colaboração entre<br />
agências de emprego, governos<br />
regionais e governos nacionais”<br />
(2020, p. 49).<br />
Bibliografia:<br />
Institute for the Future. (2014).<br />
The Future of Youth Employment.<br />
Retrieved from https://www.iftf.<br />
org/our-work/global-landscape/<br />
work/the-future-of-youthemployment/<br />
Forum Económico Mundial<br />
(2020). The Future of Jobs.<br />
Retrieved from https://www.<br />
weforum.org/reports/the-futureof-jobs-report-2020<br />
Hesse, Jeff; Olsen, Jeff. (2017,<br />
dezembro, 18). What will work<br />
look like in 2030? Retrieved from<br />
https://www.strategy-business.<br />
com/article/What-Will-Work-<br />
Look-Like-in-2030<br />
058 NOABR21 NOABR21 059
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
A pandemia<br />
CLÁUDIA CARVALHO<br />
O FUTURO DO TURISMO:<br />
PARA QUANDO OS VALORES ANTES DA PANDEMIA?<br />
Não será novidade afirmar-se que a pandemia<br />
veio trazer graves constrangimentos ao nível<br />
do desenvolvimento e progresso económico das<br />
pequenas, médias e grandes empresas, em virtude<br />
do lockdown geral por todos os países – esse é um<br />
facto que une todos os dirigentes, especialistas e<br />
empresários.<br />
Com o primeiro confinamento em Wuhan,<br />
epicentro do SaRS-COV-2, seguiram-se países<br />
como Itália, França e Espanha e, posteriormente,<br />
o resto do Mundo, que viram as suas economias<br />
fortemente abaladas por um vírus sem precedentes<br />
e que viria a alterar não só a economia, mas todo o<br />
nosso habitus na vida em sociedade.<br />
Depois dessa data, escusado será dizer que tudo<br />
mudou. Há, sem dúvida, uma realidade antes e<br />
depois desta pandemia. A barreira que as separa<br />
não é visível, mas as pessoas certamente recordarse-ão<br />
do momento em que foram, pela virtude dos<br />
acontecimentos, obrigados a ficar em casa, porque<br />
assim lhes era pedido. Alteraram a sua forma de<br />
agir, de conviver e de comunicar. Adaptaram-se<br />
a novas formas de trabalho, em que conciliar o<br />
teletrabalho e a vida doméstica parecia a tarefa<br />
mais difícil de todos os tempos.<br />
Extensível a todas as áreas da nossa vida, a<br />
COVID-19 provocou graves constrangimentos a<br />
todos os setores da nossa economia, destacandose<br />
o setor dos transportes como um dos que mais<br />
sofreu com a pandemia. Todos nos lembramos,<br />
decerto, das famosas imagens de aeroportos,<br />
em todo o Mundo, com os seus aviões parados,<br />
imagem nunca antes vista. Também através de<br />
aplicações mobile que monitorizam o tráfego<br />
aéreo, podíamos fazer a mesma comparação face<br />
ao período homólogo. Usarmos printscreens<br />
do tráfego aéreo de fevereiro de 2019 e 2020 é,<br />
deveras, devastador e assustador para qualquer um<br />
de nós.<br />
060 NOABR21<br />
NOABR21 061
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
Os números<br />
Na verdade, no ano de 2019,<br />
segundo especialistas, o turismo foi<br />
responsável por 7% do comércio<br />
global, sendo que, nesse ano,<br />
se registaram 1.500 milhões de<br />
entradas de turistas internacionais e<br />
outros 9 mil milhões de pessoas que<br />
escolheram o seu próprio país para<br />
fazer turismo. O setor do turismo,<br />
depois de quase duplicar o seu peso<br />
entre 2014 e 2019, continuou a bater<br />
recordes: as receitas na hotelaria<br />
tiveram um crescimento de 9,9%<br />
nos primeiros dois meses de 2020,<br />
em termos homólogos.<br />
Numa nota emitida pelas Nações<br />
Unidas, com palavras do secretáriogeral<br />
António Guterres, dizia que,<br />
em todo o mundo, 1 em cada 10<br />
pessoas estão empregadas na área<br />
do turismo. “Só na Europa, milhões<br />
de negócios e cerca de 27 milhões de<br />
pessoas subsistem graças ao setor”.<br />
Segundo um documento intitulado<br />
“Turismo e COVID-19”, apresentado<br />
pelo secretário-geral em agosto de<br />
2020, que se baseia em dados da<br />
Organização Mundial do Turismo,<br />
apesar do início do ano de 2020<br />
ter sido verificado um crescimento<br />
contínuo no setor, a verdade é que,<br />
“desde o início da pandemia, o<br />
setor do turismo tem sido dos mais<br />
afetados”.<br />
A ONU estimava, em agosto de<br />
2020, que a entrada de turistas<br />
pudesse cair entre 58% e 78%,<br />
colocando assim em risco cerca<br />
de 120 milhões de empregos e<br />
de pequenos comércios afetos ao<br />
turismo.<br />
Os dados recentemente divulgados<br />
pela International Air Transport<br />
Association (IATA), em novembro<br />
de 2020, previam que o prejuízo na<br />
indústria da aviação continuasse no<br />
ano de <strong>2021</strong>, “apesar da expectativa<br />
de melhoria no desempenho durante<br />
o período da previsão”. As previsões<br />
apontam, para o ano de 2020, para<br />
um prejuízo líquido estimado de<br />
US$ 118,5 biliões e, para <strong>2021</strong>, de<br />
US$ 38,7 biliões.<br />
No press divulgado pela IATA,<br />
Alexandre de Juniac, diretor-geral<br />
e CEO da associação, referiu que<br />
“a história registará 2020<br />
como o pior ano financeiro<br />
do setor, sem dúvida alguma.<br />
Em média, as companhias aéreas<br />
cortaram despesas de US$ 1 bilião<br />
por dia em 2020 e ainda acumularão<br />
perdas sem precedentes”, tendo<br />
ainda deixado o alerta: “se não<br />
fosse a ajuda financeira de US$ 173<br />
biliões dos governos, teríamos tido<br />
falências em grande escala”.<br />
E em Portugal?<br />
De acordo com o Boletim Económico<br />
do Banco de Portugal, datado de<br />
maio de 2020, de entre os setores de<br />
atividade com a maior redução de valor<br />
acrescentado bruto (VAB), constam os<br />
transportes aéreos, com -87.1%, bem<br />
como o alojamento e restauração, com<br />
-70.3%.<br />
No caso português, a companhia área<br />
TAP chegou ao mês de setembro do ano<br />
transato com um prejuízo de 700 milhões<br />
de euros, sendo que o terceiro trimestre<br />
foi o menos negativo do ano de 2020,<br />
com a transportadora aérea a registar um<br />
prejuízo de 118,8 milhões. O grupo SATA,<br />
por sua vez, fechou o terceiro trimestre<br />
de 2020 com prejuízos de 61 milhões de<br />
euros, valor superior aos 36,8 milhões do<br />
período homólogo de 2019.<br />
O estudo da OIT, intitulado “Portugal:<br />
Uma análise rápida do impacto da<br />
COVID-19 na economia e no mercado<br />
de trabalho”, explica que as companhias<br />
aéreas são um foco particular de<br />
preocupação devido à combinação de um<br />
choque imediato profundo e perspetivas<br />
sombrias para o futuro próximo. Em<br />
2020, diziam que, para “além dos<br />
voos cancelados, estão a ser efetuadas<br />
poucas reservas e provavelmente vão ser<br />
impostas medidas sanitárias restritivas<br />
às viagens aéreas (reduzindo as receitas e<br />
aumentando os custos), sendo expectável<br />
que a procura leve algum tempo a<br />
recuperar”.<br />
A Secretária de Estado do Turismo de<br />
Portugal, Rita Marques, no Anuário<br />
de Tendências do Turismo, escrevia,<br />
em maio de 2020, de acordo com o<br />
barómetro anual do World Travel &<br />
Tourism Council (WTTC), que em cada<br />
cinco euros de receitas que eram geradas<br />
em Portugal, um euro provinha do<br />
turismo.<br />
062 NOABR21 NOABR21 063
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
Os dados revelam que o turismo, em<br />
Portugal, cresceu no ano de 2019,<br />
registando-se valores históricos:<br />
Portugal recebeu 27 milhões de<br />
hóspedes em 2019 e registou 69.9<br />
milhões de dormidas, correspondendo<br />
a taxas de crescimento superiores às<br />
verificadas em 2019. O VAB gerado pelo<br />
setor chegou a 8% do VAB nacional<br />
e o setor empregava mais de 400 mil<br />
pessoas, correspondente a 9% do total<br />
do emprego nacional.<br />
O mesmo estudo da OIT referia,<br />
inclusive, que a maior preocupação<br />
é o risco de colapso das atividades<br />
de turismo e dos transportes, já que<br />
as medidas de distanciamento físico<br />
tiveram um impacto imediato na<br />
procura do setor do turismo.<br />
No final de abril de 2020, 59.4% das<br />
empresas do setor do alojamento e<br />
da restauração tinham encerrado,<br />
temporariamente (53.9%) ou<br />
indefinidamente (5.5%). Já nos<br />
estabelecimentos de alojamento<br />
turístico, quase 4/5 das reservas entre<br />
março e agosto do ano transato tinham<br />
sido canceladas.<br />
O ano de 2020, segundo explica<br />
a Secretária de Estado, prometia<br />
números muito animadores, com taxas<br />
de crescimento em janeiro e fevereiro<br />
ao nível das dormidas de 8% e 15%<br />
face aos períodos homólogos. “Todos<br />
os sinais eram muitíssimo positivos,<br />
fazendo crer que o ano de 2020 iria ser<br />
absolutamente extraordinário”, explica<br />
Rita Marques.<br />
Os obstáculos<br />
Num relatório publicado pela IATA<br />
confirmava-se, efetivamente, que um dos<br />
principais fatores que dificultou e ainda<br />
dificulta a retoma do setor são, sem dúvida,<br />
as restrições às viagens e às medidas de<br />
quarentena, “que impedem a volta das<br />
viagens”. A solução mais imediata e adotada<br />
por vários governos é, conforme explicam,<br />
“a reabertura segura das fronteiras usando<br />
testes sistemáticos para a COVID-19. A<br />
longo prazo, a ampla disponibilização<br />
de vacinas deve manter as fronteiras<br />
abertas sem testes, mas o prazo para a<br />
disponibilização dessas vacinas é incerto”.<br />
À mesma conclusão chegaram a European<br />
Travel Comission (ETC) e a Tourism<br />
Economics (TE) que, num webinar<br />
realizado em janeiro de <strong>2021</strong>, debatiam as<br />
tendências no turismo verificadas no final<br />
de 2020 e as perspetivas que se poderiam<br />
avizinhar para <strong>2021</strong> e anos conseguintes.<br />
De acordo com a ETC e a TE, a ideia<br />
principal é a de uma grande incerteza<br />
sobre o que poderá ser e significar o<br />
setor durante este ano. A incerteza,<br />
segundo explicam, está relacionada com<br />
o grau de sucesso nos programas de<br />
vacinação nacionais, com a abertura e<br />
encerramento de fronteiras e com o ritmo<br />
de recuperação da economia mundial e do<br />
emprego.<br />
O estudo realizado pela OIT reiterava, de<br />
certa forma, aquilo que já fora anunciado<br />
por outros especialistas: “a incerteza, o<br />
medo e a falta de confiança podem levar<br />
a uma crise prolongada no setor”<br />
064 NOABR21 NOABR21 065
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
Futuro e possíveis<br />
cenários<br />
Apesar de ressalvarem que as<br />
perspetivas, naquela altura, já<br />
permitiam algum otimismo, a<br />
recuperação dos níveis dos fluxos<br />
turísticos verificados em 2019, segundo<br />
a ETC e a TE, “só ocorrerá entre 2023<br />
e 2025”. Para ambas as entidades,<br />
os desafios colocados à distribuição<br />
da vacina influenciarão o nível de<br />
recuperação e os impactos da recessão<br />
económica farão, em última instância,<br />
retrair a procura, especialmente nas<br />
viagens de curta distância.<br />
Ainda sobre o Anuário de Tendências<br />
do Turismo de 2020, consta um<br />
artigo de opinião de Peter Tarlow,<br />
presidente das empresas Tourism &<br />
More e SaferTourism, que defendia<br />
que o turismo não pode estar em<br />
“hibernação” de forma prolongada.<br />
Apesar de Peter Tarlow reconhecer<br />
que o futuro do setor é ainda uma<br />
incógnita, explicou que existem dois<br />
cenários: uma escola de pensadores<br />
que acredita que o turismo sofrerá<br />
grandes mudanças e que não voltará<br />
aos padrões que existiam antes da<br />
pandemia vs os defensores de que, após<br />
o confinamento obrigatório e assim<br />
que lhes seja permitido, os turistas<br />
vão ter um enorme desejo de viver,<br />
acumular experiências e viajar. “Numa<br />
análise global, acredita-se que haverá<br />
uma conjugação destes dois pressupostos.<br />
Espera-se que alguns segmentos do<br />
mercado queiram viajar brevemente<br />
para destinos internacionais, enquanto<br />
outros vão apostar nas férias locais/<br />
domésticas”.<br />
Também as conclusões da ETC e da<br />
TE explicam que os turistas optarão,<br />
inicialmente, por viagens de proximidade,<br />
sobretudo turismo doméstico e<br />
sobrevalorizando os modos de viagem<br />
sustentáveis e as viagens de lazer<br />
liderarão o processo de recuperação do<br />
turismo, relegando o turismo de negócios<br />
para uma posição de menor relevância.<br />
Na publicação do “Guia para a Retoma<br />
do Turismo”, autoria do Instituto de<br />
Planeamento e Desenvolvimento do<br />
Turismo (IPDT), a Secretária de Estado<br />
do Turismo defende que, ultrapassada<br />
a fase da pandemia, é preciso reforçar<br />
esforços no sentido de retomar o caminho<br />
que estava a ser trilhado na prossecução<br />
das metas da Estratégia Turismo 2027,<br />
“inovando e trabalhando para que<br />
Portugal seja reconhecido como líder do<br />
turismo do futuro”.<br />
Para Rita Marques, é preciso inovar<br />
na oferta, adaptando-a às novas<br />
tendências da procura. Será certo que<br />
o cliente de ontem não será o mesmo<br />
que o de amanhã, que procurará,<br />
em primeiro lugar, mais<br />
segurança: “a implementação de uma<br />
política de informação que permita uma<br />
comunicação clara quanto à identificação<br />
066 NOABR21 NOABR21 067
REPORTAGEM<br />
de eventuais desafios de segurança,<br />
bem como o controlo de possíveis<br />
riscos inerentes à prática turística<br />
e ainda a divulgação de informação<br />
sobre a oferta de serviços de apoio<br />
em casos de emergência, que se<br />
tornará numa prioridade”.<br />
Será ainda premente que o cliente<br />
comece a procurar maior<br />
flexibilidade aquando da<br />
escolha do destino turístico,<br />
fator que deverá ser acompanhado<br />
pela inovação, de forma a conferir<br />
mais direitos aos turistas em matéria<br />
de viagens, nomeadamente no que se<br />
refere aos requisitos de informação<br />
ou à responsabilidade de cada parte<br />
pela execução da viagem.<br />
A Secretária de Estado considera,<br />
também, que o cliente procurará<br />
mais atividades de nicho, nas quais<br />
a saúde e experiências ao ar livre<br />
serão fatores inovadores, daí que<br />
se imponha “trabalhar a oferta que<br />
privilegia a Natureza”.<br />
Num inquérito realizado pelo IPDT,<br />
é referida uma tendência que se<br />
poderá vir a verificar nos próximos<br />
tempos: o peso do preço deixará<br />
de ser tão determinante, já que, a<br />
curto-prazo, o turista irá priorizar<br />
a segurança, optando por destinos e<br />
ofertas ligeiramente mais caras caso<br />
possam usufruir de experiências<br />
mais seguras.<br />
Na verdade, um estudo da Singerman<br />
e Makon, de agosto de 2020, refere<br />
que mais de 70% das pessoas não<br />
ponderavam viajar para um destino<br />
que registe indicadores altos de<br />
transmissão de COVID-19, “mesmo<br />
que os preços praticados ao nível do<br />
turismo sejam baixos”.<br />
Apesar de a ETC e a TE terem<br />
referido, como acima foi<br />
mencionado, que os valores do<br />
turismo a nível global 2019 só<br />
deveriam começar a verificar-se<br />
entre 2023-2025, no inquérito do<br />
IPDT, sobre a retoma do Turismo,<br />
onde 56% dos inquiridos afirmavam<br />
que o ano de 2022 já será um ano de<br />
progresso e onde serão alcançados os<br />
resultados de 2019: “acredita-se que<br />
em 2022 a pandemia de COVID-19<br />
estará ultrapassada. As pessoas vão<br />
sentir-se mais seguras para viajar e<br />
o ecossistema turístico recuperará,<br />
o que tornará possível alcançar<br />
resultados próximos dos registados<br />
em 2018 e 2019”.<br />
A comunicação dos destinos será<br />
determinante para a retoma do setor,<br />
dizem os especialistas. O inquérito do<br />
IPDT revelou que 75% dos inquiridos<br />
concordam com a afirmação “os<br />
destinos que tiverem os canais de<br />
comunicação ativos e atualizados vão<br />
sair na frente da corrida na preferência<br />
dos turistas”.<br />
O turista, antes de fazer qualquer<br />
tipo de reserva, irá, provavelmente,<br />
procurar informação sobre a evolução<br />
pandémica no destino, daí que a<br />
disponibilização organizada dos dados<br />
num portal será uma mais-valia para<br />
qualquer destino. Também as medidas<br />
de entrada no país, como já se fez<br />
referência ao longo do texto, serão<br />
fator influenciador para as reservas.<br />
No futuro, a estadia média não deverá<br />
diminuir e os gastos dos turistas<br />
devem aumentar – são também<br />
algumas das conclusões do inquérito<br />
do IPDT. O slow tourism vai marcar<br />
o futuro do turismo, que contribuirá<br />
para que a estadia média não sofra<br />
grandes diminuições. Assim sendo, os<br />
turistas vão procurar a oportunidade<br />
068 NOABR21 NOABR21 069
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
de se tornarem parte dos<br />
destinos, num ritmo de viagem<br />
que lhes permita estar em<br />
contacto com a comunidade<br />
residente e a aprender a cultura<br />
local. Contribuir para o comércio<br />
local será ainda uma tendência<br />
para que o IPDT aponta,<br />
aumentando assim os gastos<br />
durante a viagem: “também o<br />
desejo de conhecer a cultura e a<br />
gastronomia local serão fatores<br />
que vão influenciar o aumento do<br />
valor médio gasto por turista”.<br />
Na verdade, seja qual for o futuro<br />
do turismo, uma coisa é certa<br />
– o comportamento do turista<br />
não será mais igual. Teses de<br />
pensadores de que as pandemias<br />
serão cada vez mais recorrentes<br />
poderão fazer-nos concluir que,<br />
tal como antevia o Secretário<br />
Geral da OMT, o turismo de<br />
massas poderá chegar ao fim.<br />
Com o seu fim, haverá espaço<br />
pela procura de um turismo<br />
de segurança, qualidade e com<br />
menor fluxo de visitantes, com<br />
novas formas de se oferecer<br />
o destino e a experiência<br />
turística. Afinal, aquilo que<br />
tantos almejavam poderá<br />
ser consequência do período<br />
pandémico que ainda vivemos.<br />
Fluxos turísticos controlados,<br />
ou pelo menos a diminuição na<br />
procura de destinos massificados<br />
– é isso que os especialistas<br />
projetam, mas tal como a<br />
pandemia e em virtude dela,<br />
independentemente dos estudos<br />
e análises que possam ser feitas,<br />
aguarda-nos o futuro para<br />
podermos saber qual será o novo<br />
panorama, a nova regra.<br />
Bibliografia<br />
Banco de Portugal. (maio de<br />
2020). Boletim Económico: A<br />
economia portuguesa em 2019.<br />
Retrieved from https://www.<br />
bportugal.pt/sites/default/<br />
files/anexos/pdf-boletim/be_<br />
mai2020_p.pdf<br />
Centro Regional de Informação<br />
das Nações Unidas (2020).<br />
O Futuro do Turismo: A<br />
transformação pós-pandémica.<br />
Retrieved from https://<br />
unric.org/pt/o-futuro-doturismo-a-transformacao-pospandemica/<br />
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indústria da aviação segue em<br />
<strong>2021</strong>. Retrieved from https://<br />
www.iata.org/contentassets/9<br />
8e73eed8f0642089447f885fbe<br />
06e3b/2020-11-24-01-pt.pdf<br />
IPDT. (2020). Turismo em<br />
2020. Porto. IPDT Publishing<br />
Retrieved from https://www.<br />
ipdt.pt/publicacoes-turismo/<br />
IPDT. (2020). Guia para a<br />
Retoma do Turismo. Porto.<br />
IPDT Publishing Retrieved<br />
from https://www.ipdt.pt/<br />
en/ipdt-e-book-guide-totourism-recovery/<br />
Goodger, David; Sacks,<br />
Adam (<strong>2021</strong>). TE-ETC<br />
2020Q3 – Trends &<br />
Prospects Travel Resilience<br />
and Growth Opportunity<br />
[Webinar]. Tourism<br />
Economics and European<br />
Travel Comission. https://<br />
travelbi.turismodeportugal.<br />
pt/pt-pt/Documents/<br />
Comportamento%20do%20<br />
Consumidor/etc-tourism-<br />
trends-and-prospects-2020-<br />
Q4-webinar.pdf<br />
Organização Internacional do<br />
Trabalho (2020). Portugal:<br />
Uma análise rápida do<br />
impacto da COVID-19 na<br />
economia e no mercado de<br />
trabalho. Retrieved from<br />
https://www.ilo.org/lisbon/<br />
publica%C3%A7%C3%B5es/<br />
WCMS_754606/lang--pt/<br />
index.htm<br />
070 NOABR21<br />
NOABR21 071
PUBLIRREPORTAGEM<br />
IMPORTÂNCIA DE CRIAR UM<br />
LOGÓTIPO PROFISSIONAL<br />
Criar um logótipo é<br />
essencial para qualquer<br />
empresa, seja grande,<br />
média, pequena ou<br />
microempresa! Uma<br />
empresa sem logótipo<br />
é uma empresa sem<br />
identidade, sendo<br />
assim impossível de<br />
ser reconhecida pelos<br />
consumidores. Investir em<br />
design gráfico é importante<br />
e revela que a sua empresa<br />
está verdadeiramente<br />
empenhada em destacar-se<br />
e oferecer valor aos seus<br />
clientes.<br />
E porque é importante<br />
criar um logótipo para uma<br />
empresa?<br />
Um dos maiores erros que<br />
você, como empresário,<br />
pode cometer é fazer um<br />
baixo investimento na<br />
criação da identidade visual<br />
da sua empresa. É meio<br />
caminho para o insucesso.<br />
Um logótipo criado por<br />
uma empresa experiente<br />
mostra:<br />
1. PROFISSIONALISMO<br />
A criação de logótipos é um<br />
processo que implica análise<br />
e pesquisa por parte de um<br />
profissional qualificado,<br />
desde pesquisar sobre a<br />
concorrência, público alvo,<br />
escolha de cores, definição<br />
de tipografia, que formas e<br />
símbolos usar e outros.<br />
Todo este processo refletese<br />
num logo cuidado e<br />
pensado e os consumidores<br />
apercebem-se disso. Mostra<br />
que você colocou tempo<br />
e dedicação na imagem<br />
da sua marca, mostra<br />
profissionalismo.<br />
2. CREDIBILIDADE<br />
Com certeza já lhe<br />
aconteceu encontrar uma<br />
empresa que tem um<br />
logo claramente amador,<br />
muitas vezes desajustado e<br />
esticado, quando colocado<br />
em materiais como flyers<br />
ou imagens nas redes<br />
sociais. À primeira vista, o<br />
cliente não se sente muito<br />
à vontade em comprar<br />
daquela empresa. Criar um<br />
logótipo profissional dá<br />
segurança e confiança aos<br />
consumidores, mostra que a<br />
empresa tem credibilidade.<br />
072 NOABR21<br />
NOABR21 073
PUBLIRREPORTAGEM<br />
PUBLIRREPORTAGEM<br />
3. AUTENTICIDADE<br />
Muitos pequenos<br />
empresários recorrem<br />
a serviços de design de<br />
logótipo grátis. Usar<br />
websites que têm a opção<br />
de criar um logótipo grátis<br />
pode ser um erro fatal. Para<br />
além de mostrar falta de<br />
profissionalismo, empenho<br />
e credibilidade, existem<br />
milhares de empresas com<br />
o mesmo logo ou muito<br />
parecido.<br />
Isto é um problema<br />
porque, primeiro, tira<br />
todo o propósito de uma<br />
identidade visual, que é a<br />
autenticidade, e segundo,<br />
porque pode receber<br />
uma grande multa ou um<br />
processo por usar um<br />
logótipo, que outra empresa<br />
já registou como sendo seu.<br />
RETORNO SOBRE O<br />
INVESTIMENTO<br />
É completamente<br />
compreensível que, para um<br />
negócio que está apenas a<br />
começar, se tente reduzir<br />
custos ao máximo. No<br />
entanto, esta não é a área<br />
em que deve poupar!<br />
À medida que as pessoas<br />
começam a conhecer<br />
e confiar numa marca,<br />
e ao ver o logótipo<br />
sucessivamente em vários<br />
lugares, é mais provável<br />
que elas respondam<br />
positivamente aos seus<br />
produtos ou serviços. Desta<br />
forma, há um aumento<br />
de vendas ou um maior<br />
reconhecimento da sua<br />
marca por parte do seu público alvo. Para além disso, um bom<br />
logótipo pode levar potenciais clientes a escolherem a sua<br />
empresa, em vez de um concorrente com um logótipo amador.<br />
Esperamos que este artigo lhe tenha sido útil e se precisar de um<br />
logótipo profissional, criativo e autêntico, contacte-nos.<br />
Visite o nosso portfólio e veja os nossos trabalhos de criação de<br />
logótipos:<br />
https://acorespro.com/portfolio/<br />
074 NOABR21 NOABR21 075
13% DOS DOENTES<br />
ONCOLÓGICOS<br />
TIVERAM TRATAMENTOS<br />
SUSPENSOS POR<br />
INDICAÇÃO MÉDICA<br />
Liga Portuguesa Contra o Cancro divulga<br />
estudo sobre o impacto da covid-19 nos<br />
doentes oncológicos<br />
Liga Portuguesa Contra o Cancro<br />
(LPCC), entidade de apoio ao<br />
doente oncológico e seus familiares,<br />
realizou um estudo de âmbito<br />
nacional com o objetivo de avaliar<br />
a perceção do impacto social,<br />
económico e psicológico da pandemia<br />
COVID-19 nos doentes oncológicos/<br />
sobreviventes de cancro e em<br />
familiares/cuidadores. O estudo<br />
está disponível em https://www.<br />
ligacontracancro.pt/impactocovid/.<br />
Ao nível do acesso aos cuidados<br />
de saúde, o estudo realizado a<br />
mais de 900 doentes oncológicos/<br />
sobreviventes de cancro e a mais<br />
de 300 familiares/cuidadores,<br />
residentes em Portugal, revela que<br />
13% dos doentes oncológicos tiveram<br />
tratamentos oncológicos suspensos<br />
por indicação médica; dois em<br />
cada dez doentes e um em cada dez<br />
cuidadores ponderaram suspender,<br />
por sua iniciativa, os atos clínicos, por<br />
medo de se dirigirem aos hospitais e<br />
ainda que 57% dos doentes tiveram<br />
receio de serem infetados por outros<br />
doentes e profissionais de saúde. No<br />
caso dos cuidadores, 75% tiveram<br />
receio que o doente de quem cuidam<br />
pudesse ser infetado.<br />
A nível psicológico, cinco em cada<br />
dez doentes oncológicos apresentou<br />
distress (sofrimento) emocional<br />
significativo durante a pandemia,<br />
valor que aumenta nos casos dos<br />
doentes que tiveram tratamentos<br />
suspensos (seis em cada dez doentes).<br />
Ainda, seis em cada dez cuidadores<br />
com distress emocional significativo –<br />
os dados mostram que os cuidadores<br />
dos doentes oncológicos revelaram<br />
um maior impacto emocional durante<br />
a pandemia do que os doentes.<br />
De acordo com os mesmos dados, é<br />
ainda possível concluir que três em<br />
cada dez doentes oncológicos e quatro<br />
em cada dez cuidadores manifesta<br />
ansiedade significativa e que dois em<br />
cada dez doentes oncológicos e dois<br />
em cada dez cuidadores manifesta<br />
depressão significativa.<br />
“Além do enorme impacto que o<br />
diagnóstico e o tratamento do cancro<br />
representam, doentes, sobreviventes<br />
e familiares e cuidadores são agora<br />
confrontados com desafios adicionais,<br />
que passam pela necessidade de<br />
proteção em relação ao vírus, gerir<br />
a ansiedade e incerteza quanto à<br />
continuidade do tratamento médico,<br />
e adaptar-se às alterações nas rotinas<br />
diárias e familiares, incluindo<br />
a privação da autonomia e dos<br />
contactos sociais”, afirma Natália<br />
ARTIGO TEMÁTICO | SAÚDE<br />
Amaral, membro da Direção da<br />
LPCC.<br />
Por sua vez, um em cada dez doentes<br />
e cuidadores diz ter sentido bastante<br />
a muitíssima dificuldade em pagar<br />
as despesas familiares, indicadores<br />
que demonstram o relevante impacto<br />
socioeconómico da pandemia nestes<br />
doentes.<br />
O estudo realizado pela LPCC revela<br />
ainda que a maioria dos doentes<br />
oncológicos considera-se um doente<br />
de risco para a COVID-19 (maior<br />
probabilidade de contágio e maior<br />
vulnerabilidade a complicações) e que<br />
o mesmo acontece com os cuidadores,<br />
relativamente aos doentes que cuidam.<br />
Cerca de um a dois em cada dez<br />
doentes revelaram desconhecimento<br />
sobre o seu nível de risco.<br />
076 NOABR21 NOABR21 077
REPORTAGEM<br />
ARTIGO TEMÁTICO | CIÊNCIA<br />
UNIVERSIDADE DE ÉVORA<br />
DESENVOLVEU PROCESSO<br />
TECNOLÓGICO PARA A<br />
PRODUÇÃO EM MASSA DE<br />
TÚBERAS<br />
ladanifer (esteva), foi alcançado,<br />
permitindo a partir de agora a<br />
sua produção em massa para<br />
utilização em diversos setores.<br />
As túberas ou criadilhas (Terfezia<br />
arenaria e T. fanfani) caracterizam-se<br />
por permanecer debaixo da terra até<br />
à maturação dos esporos possuírem<br />
uma forma arredondada, medir em<br />
média 4 a 8 cm diâmetro, podendo<br />
atingir 10 cm, surgindo apenas na<br />
primavera e sendo mais comuns no<br />
sul do nosso país, região Alentejo, em<br />
solos arenosos e ácidos, ocorrendo<br />
também, com menos expressão, na<br />
Beira Litoral e na Beira Baixa.<br />
Esta importante descoberta aguarda<br />
atribuição de patente europeia<br />
e segundo Celeste Santos e Silva,<br />
professora do Departamento de<br />
Biologia e investigadora no MED<br />
uma das etapas cruciais deste<br />
processo tecnológico foi o<br />
isolamento do micélio de<br />
Terfezia em cultura pura, ou seja<br />
“conseguir fazer crescer este<br />
fungo numa caixa de Petri com<br />
ágar-ágar, que dá ao meio uma<br />
consistência gelatinosa, e com<br />
uma determinada composição<br />
de nutrientes e minerais”.<br />
Um resultado só possível graças a<br />
muitas tentativas, até porque, como<br />
explica a investigadora, “muitas<br />
cepas não podem ser subcultivadas,<br />
e assim até agora,<br />
as poucas tentativas bemsucedidas,<br />
principalmente<br />
com Terfezia, apresentavam<br />
um crescimento muito lento<br />
Com utilização em diversos setores,<br />
como farmacêutico, cosmético,<br />
alimentação e agricultura,<br />
investigadores da Universidade<br />
de Évora (UÉ) desenvolveram um<br />
processo tecnológico para a obtenção<br />
de plantas inoculadas visando a<br />
produção de túberas lançando as bases<br />
para uma nova forma de produção<br />
de alimentos com propriedades<br />
nutracêuticas e a exploração<br />
sustentável deste recurso micológico,<br />
de uma forma sustentável, resiliente e<br />
economicamente rentável.<br />
As túberas são a frutificação hipógea<br />
(cogumelos subterrâneos) de fungos<br />
micorrízicos que se associam<br />
tradicionalmente a raízes de plantas<br />
anuais e o desafio de conseguir a<br />
associação micorrízica deste fungo<br />
com plantas perenes, como o Cistus<br />
salviifolius (sargaço) e Cistus<br />
078 NOABR21 NOABR21 079
REPORTAGEM<br />
ARTIGO TEMÁTICO REPORTAGEM<br />
| CIÊNCIA<br />
e deficitário para que fosse<br />
possível produzir micélio nas<br />
quantidades adequadas”.<br />
Esta invenção, desenvolvida na<br />
Universidade de Évora, referese<br />
assim ao processo que permite<br />
melhorar o isolamento e a<br />
manutenção da cultura de micélio de<br />
espécies do género Terfezia. Este<br />
género é considerado o mais<br />
diverso, rico em número de<br />
espécies, do grupo das “trufasdo-deserto”.<br />
“Conseguimos<br />
melhorar as taxas de<br />
isolamento e aumentar a<br />
proliferação de Terfezia spp de<br />
forma confiável e reproduzível”<br />
destaca assim a investigadora da<br />
academia eborense.<br />
“Esta investigação lançou ainda<br />
as bases para uma nova forma<br />
de produção de alimentos com<br />
propriedades nutracêuticas”<br />
destaca a Investigadora referindo-se à<br />
combinação dos termos “nutrição” e<br />
“farmacêutica” mostrando utilidade,<br />
entre outros para o sector agroflorestal<br />
e “que permitirá a<br />
exploração sustentável deste<br />
recurso micológico, de uma<br />
forma sustentável, resiliente e<br />
economicamente rentável”.<br />
Celeste Santos e Silva frisa ainda que<br />
a disseminação de plantas inoculadas<br />
com Terfezia spp., “previne a<br />
desertificação e erosão do<br />
solo, reforça a integridade<br />
e a multifuncionalidade<br />
da paisagem e permite a<br />
recuperação de áreas ardidas e/<br />
ou com solos degradados’’.<br />
A concretização desta nova forma de<br />
produção assegura a investigadora<br />
do MED “possibilitará a<br />
criação de mais emprego,<br />
invertendo a tendência atual<br />
para a desertificação das áreas<br />
rurais”.<br />
Investigadores descobrem novas<br />
espécies de túberas<br />
Foi também no âmbito do projeto<br />
“Micorrização de Cistus spp com<br />
Terfezia arenaria (Moris) Trappe<br />
e sua aplicação na produção<br />
de túberas”, que o grupo de<br />
investigadores liderados por<br />
Celeste Santos e Silva realizou uma<br />
prospecção exaustiva na procura de<br />
túberas e descreveu duas novas<br />
espécies para a ciência, referimonos<br />
a Terfezia lusitanica e Terfezia<br />
solaris-libera.<br />
“É muito difícil identificar<br />
novas espécies dadas a<br />
características morfológicas de<br />
Terfezia, que são visualmente<br />
muito semelhantes entre si, e<br />
aqui a biologia molecular foi<br />
absolutamente fundamental”<br />
explica a investigadora destacando<br />
que foi possível “atualizar e resolver<br />
problemas sobre a taxonomia e<br />
filogenia (relação evolutiva entre<br />
grupos de organismos), deste género”.<br />
080 NOABR21 NOABR21 081
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
ARTIGO TEMÁTICO REPORTAGEM<br />
| CIÊNCIA<br />
UNIVERSIDADE DE ÉVORA<br />
DESENVOLVE MOLÉCULAS<br />
PARA TRATAMENTO DE<br />
VÁRIOS TIPOS DE CANCRO<br />
Uma equipa de investigação<br />
liderada por Anthony Burke,<br />
professor do Departamento<br />
de Química da Universidade<br />
de Évora (UÉ) desenvolveu<br />
uma série de pequenas novas<br />
moléculas que mostram<br />
potencial para o tratamento<br />
de vários tipos de cancro,<br />
incluindo o linfoma difuso de<br />
grandes células B (DLBCLs).<br />
O desenvolvimento destas<br />
moléculas com potencial para o<br />
tratamento de cancro e alguns<br />
linfomas foi patenteado a nível<br />
europeu.<br />
“Um tratamento para o<br />
linfoma difuso de grandes<br />
células B (DLBCL) - o tipo<br />
mais comum de linfoma - é<br />
um objetivo muito importante,<br />
pois afeta muitas pessoas”<br />
explica o investigador da academia<br />
eborense. As moléculas desenvolvidas<br />
“mostram potencial também<br />
para o tratamento deste tipo de<br />
linfoma, o DLBCL”, um tumor<br />
maligno do sistema linfático em que<br />
as células tumorais são os linfócitos<br />
B, de tamanho grande, que proliferam<br />
e infiltram o gânglio de forma difusa.<br />
Os resultados foram obtidos por<br />
Anthony Burke e Carolina Marques,<br />
investigadores do grupo de Síntese<br />
Molecular da UÉ, um dos 11 grupos<br />
que integram o Laboratório Associado<br />
para a Química Verde (LAQV-<br />
REQUIMTE), em colaboração<br />
com investigadores internacionais<br />
de Centros de I&D da Suíça e de<br />
Espanha.<br />
As novas moléculas “foram<br />
sintetizadas usando métodos<br />
químicos sustentáveis com<br />
catalisadores metálicos” revela<br />
o investigador e “apresentam uma<br />
estrutura química relativamente<br />
simples e são construídas por dois<br />
anéis heterocíclicos (um composto<br />
que tem um anel, do qual fazem parte<br />
pelo menos dois tipos diferentes<br />
de átomos), e em alguns casos são<br />
quirais, ou seja, não podem ser<br />
sobrepostos à sua imagem especular<br />
(espelho)”.<br />
A investigação na área da Química é<br />
“absolutamente fundamental”<br />
na deteção e tratamento do cancro,<br />
doença que é a segunda causa de<br />
morte a nível mundial e que apresenta<br />
ainda altas taxas de morbilidade,<br />
considera o também professor do<br />
Departamento de Química da UÉ,<br />
sendo “o do pulmão, colorretal e<br />
linfomas os três tipos de cancro<br />
mais difíceis de tratar”.<br />
Além disso, “estas moléculas<br />
também mostram atividade na<br />
área de doença de Alzheimer,<br />
principalmente na inibição de<br />
uma enzima importante para a<br />
progressão da doença chamada<br />
082 NOABR21 NOABR21 083
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
PUB.<br />
butirilcolinesterase” destaca<br />
Anthony Burke, referindo que o grupo<br />
publicou este estudo no ano passado<br />
na revista internacional Bioorganic<br />
Chemistry, também aqui em<br />
colaboração com grupos estrangeiros,<br />
da Espanha, Itália e da Alemanha.<br />
Este é mais um passo para o<br />
desenvolvimento de novas formas<br />
de tratamento do cancro estando<br />
atualmente os investigadores<br />
da Universidade de Évora “a<br />
identificar os alvos moleculares<br />
destas moléculas para permitir<br />
melhorar as suas características<br />
estruturais e assim aumentar<br />
a sua potência farmacológica”,<br />
avança Anthony Burke, para<br />
que proximamente “possamos<br />
avançar com estudos préclínicos<br />
e conseguir determinar<br />
a sua potência in vivo e o<br />
seu comportamento geral no<br />
organismo do animal”.<br />
Recorde-se que a equipa de<br />
investigadores liderados por<br />
Anthony Burke, entre outros<br />
avanços científicos, produziu<br />
com sucesso um novo inibidor da<br />
enzima Colinesterase, fundamental<br />
para assegurar a comunicação<br />
entre neurónios em doentes com a<br />
doença de Alzheimer. Inovadora,<br />
esta molécula apresenta apenas na<br />
sua composição o ingrediente ativo<br />
benéfico, por isso mais segura para o<br />
organismo humano.<br />
PUB.<br />
9600-549 Ribeira Grande<br />
geral@grupoideal.pt<br />
GRUPO<br />
084 NOABR21 NOABR21 085
ARTIGO TEMÁTICO | ALIMENTAÇÃO<br />
REPORTAGEM<br />
UE está a estudar o aumento das<br />
restrições dos produtos de origem<br />
vegetal e 76,4% dos consumidores<br />
portugueses não estão de acordo<br />
Estudo da Universidade Católica<br />
para a Upfield apura o conhecimento<br />
dos consumidores portugueses<br />
relativamente a produtos vegetais no<br />
sentido de averiguar a necessidade,<br />
ou não, de uma regulamentação mais<br />
restritiva sugerida pela União Europeia<br />
com a Alteração 171.<br />
De acordo com um estudo realizado a<br />
uma amostra representativa de 1013<br />
consumidores portugueses, 95.9% dos<br />
inquiridos sabe distinguir produtos<br />
lácteos e produtos de origem vegetal<br />
quanto à origem dos seus ingredientes<br />
e não se confundem com as diferentes<br />
alternativas.<br />
75.5% dos inquiridos “gostaria que as<br />
restrições legislativas aplicadas a nível<br />
europeu na rotulagem de produtos<br />
lácteos cumprissem as mesmas regras<br />
para rotular os produtos de origem<br />
vegetal”, regras essas que hoje são mais<br />
restritivas para os produtos de origem<br />
vegetal.<br />
Apenas 11.2% dos consumidores estão<br />
a par da atual legislação que regula<br />
a rotulagem de produtos de origem<br />
vegetal.<br />
A maioria dos portugueses (96.4%)<br />
sabe que os produtos de origem<br />
vegetal (plant-based) são produtos<br />
com ingredientes maioritariamente<br />
provenientes de origem vegetal e<br />
95.9% sabe identificar corretamente<br />
a diferença entre produtos lácteos e<br />
produtos de origem vegetal quanto à<br />
origem dos ingredientes com que são<br />
produzidos. Estas são as conclusões<br />
de um estudo levado a cabo pela<br />
Universidade Católica para a Upfield,<br />
a produtora líder de cremes vegetais,<br />
margarinas e alternativas vegetais<br />
ao queijo com mais de 100 marcas,<br />
incluindo a PLANTA e BECEL.<br />
Este estudo procurou determinar<br />
o conhecimento dos consumidores<br />
relativamente às alternativas vegetais<br />
e insere-se no contexto da discussão<br />
da Alteração 171 por parte da Comissão<br />
Europeia, Conselho da UE e Parlamento<br />
Europeu, previsto durante o mês de<br />
março. Esta alteração, apresentada<br />
por um grupo político que alega que<br />
as práticas atuais de rotulagem de<br />
alimentos de origem vegetal enganam<br />
os consumidores, visa impor diversas<br />
restrições na nomenclatura, no tipo<br />
de embalagens, e nas imagens e<br />
comunicações que podem ser utilizadas<br />
nos produtos de origem vegetal.<br />
Com o objetivo de avaliar perceções<br />
dos consumidores sobre produtos de<br />
origem vegetal a partir de diferentes<br />
nomenclaturas e a sua capacidade para<br />
os distinguir de produtos de origem<br />
animal, o estudo demonstra que os<br />
portugueses não ficam confusos no<br />
supermercado e sabem identificar<br />
e diferenciar os produtos de origem<br />
vegetal, como no caso da ‘alternativa de<br />
soja ao iogurte’ (95.1% dos inquiridos<br />
considerou que este é um produto de<br />
origem vegetal) ou do queijo vegan<br />
onde 97,2% classificou corretamente<br />
como ‘alternativa vegetal ao queijo’.<br />
Assim, a respeito da rotulagem, 76.4%<br />
dos consumidores entendem que<br />
termos como ‘cremoso’ ou ‘não contém<br />
lactose’ poderão aparecer nos rótulos<br />
para qualificar alternativas de origem<br />
vegetal, o que, segundo a Alteração<br />
171 sugerida pela União Europeia não<br />
poderá ser permitida.<br />
Francisco Guerreiro, eurodeputado<br />
do Verdes / EFA, comenta que “é<br />
lamentável, em primeiro lugar, que a<br />
imposição de mais restrições ao sector<br />
alimentar de produtos vegetais seja<br />
sequer discutida. O grupo político que<br />
propôs esta alteração defende que<br />
as práticas atuais de rotulagem de<br />
produtos à base de plantas confundem<br />
os consumidores - uma alegação criada<br />
por setores que estão insatisfeitos com a<br />
crescente preferência dos consumidores<br />
por alternativas à base de plantas. Este<br />
086 NOABR21 NOABR21 087
REPORTAGEM<br />
ARTIGO TEMÁTICO |ALIMENTAÇÃO<br />
REPORTAGEM<br />
estudo muito oportuno vem provar<br />
o que os consumidores, empresas e<br />
ONGs têm tentado dizer aos decisores<br />
políticos: não somos enganados por<br />
produtos à base de plantas - compramos<br />
porque gostamos destes produtos,<br />
porque nos preocupamos com o planeta,<br />
com a nossa saúde e com o bem-estar<br />
animal!”<br />
Qual o conhecimento dos consumidores<br />
em relação ao quadro jurídico dos<br />
produtos de origem vegetal?<br />
O estudo em causa quis também<br />
conhecer a opinião dos consumidores<br />
portugueses sobre o quadro jurídico dos<br />
produtos vegetais, de forma a perceber<br />
a necessidade de uma alteração com<br />
regras mais restritas. Questionados<br />
sobre o conhecimento da legislação<br />
em vigor sobre rotulagem de produtos<br />
de origem vegetal, apenas 11.2% dos<br />
inquiridos identificaram a resposta<br />
correta e está ciente da legislação em<br />
vigor.<br />
A maioria, 88,8% dos consumidores<br />
portugueses, não estão a par<br />
da legislação em vigor. 59.5%<br />
desconheciam que a informação de<br />
que termos comumente conhecidos<br />
como ‘iogurte de coco’, ‘leite de soja’,<br />
‘queijo vegan’ ou ‘natas vegetais’ são<br />
atualmente restritos e 29.3% referiram<br />
desconhecer a legislação sobre este<br />
assunto.<br />
Álvaro Carrilho, Head of Sales Portugal<br />
da Upfield, reafirma que “embora, pelo<br />
estudo, a maioria dos consumidores<br />
portugueses não o saibam, o atual<br />
quadro regulamentar da União Europeia<br />
já é suficientemente restritivo. Esta<br />
Alteração 171, que está em vias de ser<br />
discutida, pode significar a proibição<br />
de produtos de origem vegetal<br />
utilizarem embalagens com formatos<br />
já reconhecidos (como por exemplo<br />
um copo de iogurte), a utilização<br />
de informação útil sobre saúde e<br />
alergénios para descrever um produto<br />
como “adequado para pessoas que<br />
sofrem de intolerância à lactose” ou<br />
palavras descritivas como “cremoso”<br />
e “amanteigado” nas embalagens e na<br />
publicidade dos produtos alternativos<br />
aos lacticínios de base vegetal.”<br />
Ainda neste âmbito, e apesar da<br />
maioria dos inquiridos desconhecer o<br />
quadro legal aplicável a produtos de<br />
origem vegetal, 75.5% dos inquiridos<br />
consideram que as restrições legislativas<br />
aplicadas a nível europeu na rotulagem<br />
de produtos lácteos cumprissem as<br />
mesmas regras para rotular os produtos<br />
de origem vegetal.<br />
Os portugueses são também<br />
muito positivos quanto ao acesso<br />
a mais alternativas vegetais nos<br />
supermercados, com 96.0% dos<br />
consumidores a confirmar que a oferta<br />
de produtos deve ser cada vez mais<br />
alargada, possibilitando opções de<br />
escolhas para todos os gostos, tipos de<br />
alimentos e intolerâncias.<br />
Metodologia<br />
Realizado pela Universidade Católica<br />
Portuguesa, para a Upfield, este<br />
inquérito teve por base uma amostra<br />
representativa de 1013 participantes,<br />
recrutados através do Painel de Estudos<br />
Online (PEO) da CATÓLICA-LISBON,<br />
com uma distribuição semelhante à da<br />
população portuguesa em termos de<br />
sexo e faixa etária (i.e., 18-19, 20-29,<br />
30-39, 40-49, 50-69 anos). De modo<br />
a assegurar a qualidade dos dados<br />
obtidos, a ordem de apresentação<br />
das opções de resposta foi aleatória<br />
e só foram considerados válidos os<br />
questionários que obtiveram um tempo<br />
de resposta superior a 2 minutos e 30<br />
segundos. Os dados foram analisados<br />
com recurso à versão 26 do software<br />
IBM® SPSS®.<br />
088 NOABR21 NOABR21 089
REPORTAGEM<br />
ARTIGO TEMÁTICO REPORTAGEM<br />
| ESTUDO TURISMO<br />
Estudo avalia a perceção dos<br />
residentes em cidades pequenas<br />
sobre a atividade turística<br />
Para os residentes em cidades pequenas,<br />
os impactos socioculturais da atividade<br />
turística são mais importantes do que<br />
os impactos económicos, conclui um<br />
estudo conduzido por investigadores<br />
da Universidade de Coimbra (UC) e do<br />
Instituto Politécnico de Viseu (IPV).<br />
Esta investigação, que teve por objetivo<br />
analisar a relação entre a ligação ao<br />
lugar e os impactos percecionados<br />
pelos residentes em cidades de pequena<br />
dimensão relativamente à atividade<br />
turística, envolveu 350 habitantes de<br />
várias cidades, entre as quais Aveiro,<br />
Covilhã, Figueira da Foz, Gouveia,<br />
Guarda, Leiria, Seia e Viseu.<br />
“A investigação sobre a visão dos<br />
residentes relativamente à atividade<br />
turística é pouco explorada, mais<br />
ainda em cidades de pequena<br />
dimensão. Por isso, este estudo<br />
pretende precisamente colmatar<br />
essa lacuna na literatura e contribuir<br />
para um melhor planeamento destes<br />
destinos que, fruto da pandemia,<br />
vão ter uma maior procura”, afirma<br />
Cláudia Seabra, investigadora e docente<br />
da Faculdade de Letras da Universidade<br />
de Coimbra (FLUC).<br />
Uma explicação para os dados obtidos<br />
no estudo, financiado pela Fundação<br />
para a Ciência e a Tecnologia (FCT),<br />
prende-se com o facto de “nas<br />
pequenas cidades o espírito de<br />
comunidade ainda ser forte. As<br />
pessoas estão mais conscientes dos<br />
efeitos sociais que o desenvolvimento<br />
do turismo tem nas suas vidas<br />
do que os efeitos económicos ou<br />
ambientais. Em geral, as pequenas<br />
cidades têm uma população<br />
pequena e envelhecida, com menos<br />
oportunidades de emprego, cuidados<br />
de saúde e grandes infraestruturas de<br />
comunicação”, afirma Cláudia Seabra.<br />
Nessas comunidades, fundamenta, “as<br />
pessoas geralmente estão ansiosas<br />
para conhecer novas pessoas e se<br />
conectar com outras culturas e<br />
gerações diferentes. Em geral, os<br />
impactos negativos dos grandes<br />
centros urbanos onde milhares<br />
de turistas se aglomeram não são<br />
sentidos. Os turistas são vistos como<br />
pessoas que trazem oportunidades<br />
de negócios, visitando bares,<br />
restaurantes, hotéis e atrações<br />
da região, ao mesmo tempo que<br />
compram produtos locais para levar.<br />
Por outro lado, os turistas são fontes<br />
de rejuvenescimento cultural”.<br />
A docente e investigadora do Centro de<br />
Estudos em Geografia e Ordenamento<br />
do Território (CEGOT) considera<br />
que os resultados deste estudo, além<br />
de contribuírem para uma “maior<br />
consciência dos efeitos que o<br />
desenvolvimento do turismo está<br />
a ter na comunidade dos destinos<br />
das pequenas cidades, porque o<br />
turismo pode ser um desafio para<br />
as pequenas localidades e cidades,<br />
sobretudo de forma sustentável”,<br />
podem ajudar “os gestores a fornecer<br />
benefícios económicos, sociais e<br />
culturais de longo prazo para a<br />
comunidade local, melhorando<br />
a qualidade de vida e, assim,<br />
fortalecendo o lugar e o vínculo com<br />
a comunidade”.<br />
090 NOABR21 NOABR21 091
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
ÁREA TEMÁTICA REPORTAGEM<br />
| CIÊNCIA<br />
30 anos de Ciência e<br />
Tecnologia em papel de jornal<br />
Rui Brito Fonseca<br />
Partindo da análise de milhares de<br />
artigos de jornais diários, pagos e<br />
de circulação nacional, ou seja, sem<br />
contemplar os jornais ditos regionais,<br />
refletiu-se sobre as representações que<br />
os portugueses têm da ciência e da<br />
tecnologia, de 1976 até 2005.<br />
A comparação efetuada, entre os jornais<br />
de “qualidade” e os jornais “populares”,<br />
revelou-se frutuosa, ainda que as<br />
fronteiras entre estes dois tipos de<br />
jornais sejam cada vez mais ténues.<br />
A grande diferença identificada entre<br />
estes dois tipos de jornal refere-se à<br />
tendência geral observada. Nos jornais<br />
de “qualidade, foi possível identificar<br />
uma forte tendência para o aumento<br />
dos artigos sobre assuntos de ciência e<br />
tecnologia. Curiosamente, no caso dos<br />
jornais “populares”, verificou-se uma<br />
maior apetência para a publicação de<br />
artigos sobre estes assuntos até finais da<br />
década de 1980. A partir daí, observouse<br />
uma opção editorial marcada pela<br />
diminuição de publicação destes artigos.<br />
Acrescente-se que, no caso dos jornais<br />
“populares”, boa parte deste artigos<br />
debruçou-se sobre estas temáticas de<br />
forma superficial, abordando o assunto<br />
do ponto de vista da curiosidade e da<br />
bizarria.<br />
No que diz respeito aos principais atores<br />
presentes, em ambas as tipologias<br />
de jornal, os artigos revelaram uma<br />
ciência e tecnologia de rosto masculino,<br />
não consonante com a proporção e<br />
importância das mulheres na ciência<br />
e tecnologia produzidas em Portugal,<br />
ainda que se tenha observado uma<br />
crescente presença de mulheres, à<br />
Rui Brito Fonseca<br />
Presidente e Professor Coordenador no Instituto<br />
Superior de Ciências Educativas do Douro, em<br />
Penafiel (desde 2019). Professor adjunto no<br />
Instituto Superior de Ciências Educativas, em<br />
Odivelas (desde 2010). Doutorado em Sociologia<br />
e Mestre em Ciências do Trabalho, pelo ISCTE-<br />
IUL. É também licenciado em Ciência Política<br />
com especialização em relações internacionais,<br />
pela Universidade Lusófona. É desde 2000<br />
investigador, tendo vindo a desenvolver trabalho<br />
sobre comunicação, media e compreensão pública<br />
da ciência, sobre tecnologias da informação e<br />
comunicação em saúde e sobre toxicodependências,<br />
em diversos projetos de investigação.<br />
092 NOABR21 NOABR21 093
ÁREA REPORTAGEM<br />
TEMÁTICA | CIÊNCIA<br />
ÁREA TEMÁTICA REPORTAGEM<br />
| AMBIENTE<br />
medida que nos aproximamos da<br />
atualidade.<br />
Relativamente aos temas dominantes,<br />
em ambos os tipos de jornal, observouse<br />
um predomínio generalizado dos<br />
artigos que versavam sobre questões de<br />
biologia humana e saúde. A presença<br />
paradigmática da medicina e da saúde,<br />
revelou uma imagem da ciência e<br />
tecnologia muito conectada com as<br />
preocupações quotidianas com a saúde.<br />
Não obstante as nuances de proporção,<br />
ao longo dos anos, também ambos<br />
os tipos de jornal deram especial<br />
ênfase à astronomia e ao espaço, e à<br />
história, arqueologia e antropologia.<br />
Se no caso da astronomia e do espaço,<br />
os artigos eram muito relacionados<br />
com a conquista espacial e a guerra<br />
fria, no caso da história, arqueologia<br />
e antropologia, os artigos reportavam<br />
descobertas arqueológicas, bem como<br />
o património histórico português, em<br />
Portugal e no mundo.<br />
Saliente-se que esta visão de autovalorização<br />
da história e património<br />
nacionais estava mais patente nos<br />
jornais “populares”. Também não é de<br />
descurar a relevância dada às questões<br />
ambientais e relacionadas com a<br />
energia nuclear e de uma crescente<br />
consciencialização das populações,<br />
para os problemas decorrentes da má<br />
gestão ambiental – mais nos jornais<br />
de “qualidade” – e aos computadores,<br />
informática e internet – nos jornais<br />
“populares”.<br />
No sentido de compreender as<br />
geografias da ciência e da tecnologia,<br />
considerou-se relevante analisar a<br />
localização geográfica dos eventos<br />
relatados nos jornais. Assim, os dados<br />
recolhidos permitem afirmar que<br />
independentemente do tipo de jornal<br />
os eventos ocorreram maioritariamente<br />
na Europa, primeiro, e na América do<br />
Norte, depois. Estamos perante uma<br />
ciência e tecnologia Made in Europe<br />
e Made in USA and Canada. Nos<br />
últimos anos, ambos os tipos de jornais<br />
transmitiram uma imagem da ciência e<br />
da tecnologia de “rosto europeu”.<br />
Quanto ao discurso dominante utilizado<br />
na comunicação de questões de ciência<br />
e tecnologia, também se identificaram<br />
algumas nuances. Ao longo dos anos,<br />
nos jornais de “qualidade” observou-se<br />
a evolução de um discurso dominante<br />
de benefício dos desenvolvimentos,<br />
científicos e tecnológicos, para um<br />
discurso tendencialmente enfatizador<br />
dos riscos. Nos jornais “populares”, o<br />
discurso do benefício foi predominante.<br />
De um modo geral, a imagem da ciência<br />
e da tecnologia parece ser dominada por<br />
um discurso de benefício e de promessa.<br />
Estes são alguns dos itens que<br />
permitem compreender e refletir sobre<br />
a presença da ciência e da tecnologia<br />
na imprensa portuguesa, num longo<br />
período da história recente de Portugal.<br />
Dá que pensar…<br />
094 NOABR21 NOABR21 095
ÁREA REPORTAGEM<br />
TEMÁTICA | SAÚDE<br />
ÁREA TEMÁTICA REPORTAGEM<br />
|CIÊNCIA<br />
Combater a obesidade e o excesso<br />
de peso com a ajuda do telemóvel<br />
José Pinto Gouveia<br />
José Pinto Gouveia<br />
Uma equipa de investigadores do Centro<br />
de Investigação em Neuropsicologia e<br />
Intervenção Cognitivo-Comportamental<br />
(CINEICC) da Universidade de Coimbra<br />
(UC), liderada por José Pinto Gouveia,<br />
desenvolveu uma aplicação móvel (app)<br />
para ajudar no combate à obesidade e<br />
excesso de peso.<br />
A app foi desenvolvida no âmbito<br />
do projeto eBEfree, que tem como<br />
grande objetivo fornecer ferramentas e<br />
estratégias de regulação emocional que<br />
permitam às pessoas com obesidade<br />
ou excesso de peso eliminar ou reduzir<br />
significativamente os episódios de<br />
ingestão alimentar compulsiva, e<br />
aumentar a sua saúde mental e qualidade<br />
de vida.<br />
No atual contexto da pandemia<br />
Covid-19, «especialmente com o<br />
confinamento geral no nosso país, vários<br />
estudos sugerem que o isolamento vem<br />
acompanhado de uma redução na saúde<br />
mental das pessoas. Neste sentido, o<br />
projeto eBEfree, nomeadamente pelo<br />
seu formato digital, pretende ser um<br />
contributo especialmente apropriado<br />
à situação atual», explica a equipa do<br />
projeto, financiado pela Fundação para a<br />
Ciência e a Tecnologia (FCT).<br />
A app eBEfree é constituída por<br />
12 módulos, disponibilizado um<br />
por semana, que abordam diversas<br />
perspetivas do problema. «Os<br />
conteúdos para o tratamento da<br />
ingestão alimentar compulsiva, como<br />
estratégias de regulação emocional<br />
através de exercícios comportamentais<br />
e de meditação foram desenvolvidos<br />
com recurso a vídeos de animação<br />
explicativos, exercícios áudio e vídeos<br />
de psicólogos/as da nossa equipa a<br />
abordar os temas relevantes», detalha<br />
José Pinto Gouveia, acrescentando que<br />
a aplicação inclui também um fórum de<br />
discussão, «onde os utilizadores podem<br />
colocar questões aos terapeutas (haverá<br />
sempre um terapeuta a acompanhar o<br />
funcionamento da app)».<br />
Para testar e validar a eficácia da<br />
aplicação, a equipa está a solicitar a<br />
colaboração de pessoas de todo o país,<br />
com idades compreendidas entre os<br />
18 e os 55 anos, com excesso de peso e<br />
ingestão alimentar compulsiva, e que<br />
possuam um smartphone ou tablet com<br />
acesso à internet. Os voluntários que<br />
pretendam participar no estudo devem<br />
contactar a equipa de investigação<br />
através do endereço eletrónico: ebefree@<br />
uc.pt.<br />
A participação no estudo envolverá<br />
uma entrevista inicial, via zoom, para<br />
avaliar os critérios de elegibilidade,<br />
o preenchimento de uma bateria de<br />
questionários online e a utilização da<br />
aplicação móvel.<br />
O eBEfree resulta de um estudo anterior<br />
cujos resultados evidenciaram que «estas<br />
ferramentas de regulação emocional e<br />
promoção de saúde mental são eficazes<br />
quando implementadas presencialmente<br />
em formato grupal. O que pretendemos<br />
com o eBEfree é alargar esse estudo para<br />
chegar a todo o território nacional, com<br />
todas as vantagens de uma aplicação<br />
móvel», conclui José Pinto Gouveia.<br />
Mais informação sobre o projeto<br />
disponível em: https://ebefree.uc.pt/<br />
096 NOABR21 NOABR21 097
REPORTAGEM<br />
REPORTAGEM<br />
ÁREA TEMÁTICA REPORTAGEM<br />
| SAÚDE<br />
Inquérito internacional<br />
revela que portugueses estão<br />
deprimidos: jovens e famílias<br />
com filhos são os mais afetados<br />
Liliana Abreu<br />
Liliana Abreu<br />
Doutorada em Saúde Pública pelo Instituto de<br />
Saúde Pública da Universidade do Porto (2018).<br />
Obteve uma bolsa de Doutoramento da Fundação<br />
para a Ciência e Tecnologia, tendo como Instituição<br />
de Acolhimento o i3S – Instituto de Investigação e<br />
Inovação em Saúde. Durante o seu doutoramento<br />
obteve uma Bolsa Fulbright, que lhe permitiu<br />
desenvolver parte do seu doutoramento nos EUA,<br />
passando pela Universidade de Massachussets e<br />
pela T.H. Chan Harvard School of Public Health.<br />
A sua tese de doutoramento centrou-se no estudo<br />
da literacia em saúde distribuída de pessoas com<br />
doenças crónicas, especificamente, asma e diabetes.<br />
Atualmente, é investigadora na Universidade de<br />
Constança (desde 2019), Alemanha, no Grupo de<br />
Desenvolvimento e Investigação, onde desenvolve<br />
investigação na área da epidemiologia social em<br />
países em desenvolvimento e dá aulas de Saúde<br />
Global.<br />
Com o objetivo de continuar a avaliar<br />
o impacto social e económico da<br />
pandemia a nível mundial, foi lançado<br />
há cerca de seis meses a segunda fase<br />
do inquérito mundial denominado<br />
“Life with Corona” que, em Portugal,<br />
tem como parceiro o Instituto de<br />
Investigação e Inovação em Saúde da<br />
Universidade do Porto (i3S). Os dados<br />
já obtidos mostram que uma parte<br />
considerável da população apresenta<br />
sintomas ligeiros de depressão e<br />
que cerca de 50% dos inquiridos de<br />
Portugal, Argentina, Indonésia, Reino<br />
Unido e Estados Unidos, assim como<br />
40% dos alemães, revelam sintomas<br />
mais graves de depressão. A geração<br />
mais jovem e as famílias com filhos são<br />
os mais afetados.<br />
O “Life with Corona” foi lançado a 23 de<br />
março de 2020 e, nesta segunda fase,<br />
que começou a 1 de outubro, “tentámos<br />
perceber os efeitos psicológicos que a<br />
pandemia e as medidas preventivas<br />
têm tido sobre as pessoas. Até 4 de<br />
março recebemos um total de 21.552<br />
respostas de 136 países e, até ao<br />
momento, Portugal é o segundo país<br />
com mais participações” no estudo,<br />
depois da Alemanha, salienta Liliana<br />
Abreu, investigadora portuguesa na<br />
Universidade de Constança (Alemanha),<br />
uma das instituições que lidera o<br />
projeto.<br />
Liliana Abreu, que já foi investigadora<br />
no i3S e com o qual mantém a<br />
colaboração através deste projeto,<br />
explica que analisaram os dados<br />
relativos a Portugal e verificaram que<br />
“50% dos participantes apresentam<br />
níveis de depressão moderada”, o<br />
que, diz, “é significativo”. Uma das<br />
causas identificadas tem a ver com a<br />
diminuição dos rendimentos mensais.<br />
“Percebemos também, ao contrário<br />
do que se pensava, que os mais jovens<br />
são mais propensos a apresentar<br />
níveis mais elevados de depressão em<br />
comparação com os mais velhos, o que<br />
expõe o fardo adicional que as gerações<br />
mais jovens estão a sofrer”, acrescenta.<br />
“Existem imensos estudos a decorrer<br />
sobre a pandemia, termos um bom<br />
nível de participação num estudo<br />
098 NOABR21 NOABR21 099
ÁREA REPORTAGEM<br />
TEMÁTICA | SAÚDE<br />
ÁREA TEMÁTICA REPORTAGEM<br />
| SAÚDE<br />
internacional demonstra o interesse<br />
dos portugueses em nos ajudarem a<br />
compreender o impacto que esta crise<br />
está a ter nas suas vidas”, salienta<br />
Liliana Abreu. Os dados que chegaram<br />
de Portugal são semelhantes aos<br />
obtidos nos restantes países e tornase<br />
evidente que a saúde mental foi<br />
fortemente afetada pela pandemia.<br />
“Só o facto de ter sintomas da doença<br />
pode desencadear problemas de saúde<br />
mental. Isto sugere que o medo de<br />
estar doente com COVID pode estar a<br />
causar níveis mais elevados de stress”,<br />
acrescentam os investigadores.<br />
A equipa internacional de<br />
investigadores está agora a comparar<br />
como estão a reagir aqueles que vivem<br />
sozinhos e aqueles que vivem com<br />
outros, e também aqueles que vivem<br />
com crianças e aqueles que não vivem.<br />
Segundo os dados já disponibilizados<br />
no site “Life with Corona” (https://<br />
lifewithcorona.org/how-we-experiencethe-pandemic-is-shaped-by-whowe-live-with/),<br />
as pessoas que vivem<br />
sozinhas “emergem como o grupo que<br />
teve as piores experiências durante a<br />
pandemia. São mais propensos a relatar<br />
níveis mais baixos de satisfação de<br />
vida do que a média geral da amostra<br />
e são também mais propensos a<br />
sentir ansiedade ou depressão”. Pelo<br />
contrário, os indivíduos que vivem com<br />
uma outra pessoa “têm, geralmente,<br />
lidado melhor com a pandemia e as<br />
suas contramedidas. Em comparação<br />
com a média da amostra, relatam<br />
um maior bem-estar subjetivo, e<br />
têm menos probabilidades de sentir<br />
depressão, ansiedade ou demonstrarem<br />
comportamentos agressivos”.<br />
Quanto às pessoas que vivem com<br />
um ou mais adultos e com crianças,<br />
em comparação com a média da<br />
amostra, “têm os piores indicadores de<br />
consumo alimentar. É mais provável<br />
que tenham ganho peso, petiscam mais<br />
frequentemente e fumam e bebem<br />
mais do que qualquer outro grupo.<br />
Também apresentam níveis mais<br />
elevados de ansiedade e agressividade.<br />
É também mais provável que tenham<br />
experimentado maiores tensões entre os<br />
membros das suas famílias”.<br />
O objetivo dos investigadores passa<br />
por “gravar” as vozes e as experiências<br />
dos cidadãos de todo o mundo durante<br />
este período invulgar de pandemia.<br />
Sem fins lucrativos, e baseado em<br />
métodos académicos rigorosos, o<br />
projeto visa populações adultas em<br />
todo o mundo e está traduzido em<br />
27 línguas. O inquérito continua em<br />
curso (https://lifewithcorona.org/<br />
survey/) pelo menos até finais de <strong>2021</strong>,<br />
pelo que ainda é possível participar.<br />
Maria Rui Correia, investigadora no i3S<br />
responsável por disseminar o projeto<br />
em território português, apela “a todos<br />
os portugueses para responderem ao<br />
inquérito, pois só com a participação<br />
dos cidadãos se consegue uma imagem<br />
real do que se passa na nossa população<br />
neste tempo de pandemia”.<br />
A iniciativa do “Life with Corona”<br />
partiu de uma equipa de investigadores<br />
internacionais da área das ciências<br />
sociais, nomeadamente do Centro<br />
de Segurança e Desenvolvimento<br />
Internacional (ISDC), na Alemanha,<br />
do Instituto Mundial de Investigação<br />
em Economia do Desenvolvimento<br />
da Universidade das Nações Unidas<br />
(UNU-WIDER), na Finlândia, do<br />
Instituto Leibniz de Culturas Vegetais<br />
e Ornamentais (IGZ), na Alemanha,<br />
da Universidade de Constança, na<br />
Alemanha, e do Instituto de Estudos<br />
de Desenvolvimento (IDS), no Reino<br />
Unido. O projeto é liderado por<br />
Tilman Brück (ISDC/IGZ), Patrícia<br />
Justino (UNU-WIDER), Anke Hoeffler<br />
(Universidade de Constança) e<br />
Wolfgang Stojetz (ISDC). Para<br />
além do i3S, este projeto de Ciência<br />
Cidadã contou com a participação de<br />
instituições e organizações de vários<br />
países. Os investigadores pretendem<br />
obter dados relevantes para apoiar<br />
respostas socioeconómicas sustentáveis<br />
à pandemia causada pelo novo<br />
coronavírus.<br />
0100 NOABR21 NOABR21 0101
CRÓNICA<br />
CRÓNICA<br />
Enfermeira Sara Sousa,<br />
Enfermeira Especialista em<br />
Saúde Infantil e Pediátrica<br />
Um ano passou desde o surgimento<br />
do primeiro caso confirmado de<br />
infeção pelo novo coronavírus nos<br />
Açores. Momento de refletir sobre<br />
algumas das mudanças que vivenciei<br />
enquanto enfermeira neste mundo tão<br />
particular que é a pediatria, a minha<br />
área de cuidados de eleição, onde<br />
exerço há 12 anos a minha atividade<br />
profissional e pela qual ganhei um<br />
gosto exponencial. O cuidado à<br />
criança/jovem é um desafio constante,<br />
não só por englobar várias faixas<br />
etárias e diferentes especialidades<br />
O cuidar em<br />
pediatria em tempos<br />
de pandemia<br />
médicas e cirúrgicas, como também<br />
porque a adesão e o resultado dos<br />
cuidados prestados e objetivos<br />
alcançados dependerá da relação<br />
de confiança estabelecida entre<br />
enfermeiro – pais – criança/jovem.<br />
Há um ano atrás viveram-se dias<br />
em contrarrelógio. Foi tempo<br />
de adaptação a novas práticas,<br />
reestruturação de espaços físicos e<br />
equipas. Era urgente refletir da forma<br />
mais criteriosa possível sobre todos os<br />
pormenores. Vários cenários possíveis<br />
foram antecipados de forma a provir<br />
os ambientes de toda a segurança para<br />
nós, profissionais de saúde, e para a<br />
criança e sua família.<br />
Reunidas as condições para<br />
garantir uma resposta adequada<br />
às necessidades identificadas,<br />
começamos a escrever um novo<br />
capítulo nas nossas vidas pessoais<br />
e profissionais. O nosso número<br />
mecanográfico deu lugar a imagens<br />
de arco-íris, desenhados nas batas<br />
junto ao nosso nome, como forma<br />
de manter a esperança e amenizar a<br />
insegurança causada pelo impacto<br />
ameaçador do uso dos equipamentos<br />
de proteção individual. O medo que<br />
todos sentimos, e que era bem real,<br />
converteu-se em coragem e seguimos<br />
juntos, mais unidos do que nunca,<br />
com os mesmos receios, mas também<br />
com as mesmas armas – sorriso no<br />
olhar e muita arte no brincar. Nem<br />
sempre é fácil conquistar a confiança<br />
das nossas crianças. Em pediatria nem<br />
sempre o mais simples se torna fácil.<br />
A pandemia trouxe-nos muitos<br />
entraves na nossa forma de cuidar e o<br />
nosso trabalho emocional foi o mais<br />
afetado. O enfermeiro de pediatria<br />
procura diariamente transformar<br />
o internamento de uma criança/<br />
jovem numa vivência positiva e não<br />
num acontecimento potencialmente<br />
traumático. A realidade dos tempos<br />
que correm lançou-nos um desafio<br />
ainda maior. Desenvolver uma<br />
relação empática e terapêutica<br />
estável, na adversidade imposta pelo<br />
0102 NOABR21 NOABR21 0103
CRÓNICA<br />
CRÓNICA<br />
distanciamento físico e pelo uso de<br />
máscaras que condicionam a perceção<br />
das nossas expressões de afeto. Eles<br />
não gostam do nosso rosto escondido,<br />
mas percebem que o nosso olhar<br />
é de confiança e isso, por vezes, é<br />
inexplicável.<br />
O foco de toda equipa foi sempre o<br />
mesmo – reorganizar e reinventar<br />
de forma a garantir a excelência do<br />
cuidar – e isto não se reduz apenas aos<br />
colegas que numa primeira instância<br />
e de uma forma bastante altruísta<br />
avançaram e constituíram a equipa<br />
covid pediátrica. No exterior desta<br />
ala estão sempre outros enfermeiros,<br />
assistentes operacionais, médicos e<br />
toda uma equipa de profissionais que,<br />
com o mesmo afinco, trabalham para<br />
assegurar as necessidades do serviço e<br />
que, vestindo as suas fardas coloridas,<br />
com personagens conhecidas do<br />
mundo infantil, usando o seu<br />
sentido de humor, disponibilidade,<br />
tranquilidade e empatia dão suporte<br />
às crianças/jovens e suas famílias,<br />
não infetadas pelo vírus sarsCov2,<br />
que são hospitalizadas para cumprir<br />
tratamentos inerentes a outras áreas<br />
de especialidade.<br />
Era e é importante desmistificar<br />
os receios inerentes ao recurso<br />
aos cuidados de saúde e à própria<br />
hospitalização em tempo de<br />
pandemia. Todos os dias equipas<br />
inteiras trabalham arduamente para<br />
que os seus serviços sejam ambientes<br />
seguros e acolhedores para os seus<br />
utentes.<br />
Embora tenham direito a um<br />
acompanhante, as visitas diárias de<br />
familiares numa altura pré-pandemia<br />
constituíam um momento importante<br />
no dia de uma criança/jovem<br />
hospitalizada. Com as limitações<br />
nas visitas era importante manter o<br />
vínculo familiar e com a sua rede de<br />
apoio. As visitas à janela do quarto,<br />
onde a criança se encontra, são<br />
uma alternativa que contribuiu para<br />
manter uma aproximação benéfica ao<br />
ambiente familiar. As videochamadas<br />
e as plataformas digitais são, do<br />
mesmo modo, recursos muito<br />
utilizados para manter a comunicação<br />
com amigos e familiares,<br />
proporcionando sentimentos de<br />
segurança e bem-estar importantes no<br />
processo de cura.<br />
As áreas lúdicas foram encerradas<br />
e a partilha de brinquedos<br />
desaconselhada, apesar da sua<br />
limpeza e desinfeção frequente, que já<br />
acontecia anteriormente como prática<br />
comum. Impreterivelmente são<br />
apuradas as competências criativas<br />
dos enfermeiros. As atividades<br />
recreativas num quarto onde estão<br />
mais crianças foram ajustadas de<br />
forma a não implicarem proximidade<br />
no contato. Cenário nem sempre<br />
fácil de controlar quando até aos<br />
dias de hoje partilhar, ajudar e<br />
brincar com os outros fazia parte<br />
do quotidiano das nossas crianças,<br />
noutros moldes. Contamos com<br />
os pais como parceiros nesta tarefa<br />
inglória, sendo que estes, geralmente,<br />
se demonstram sensibilizados para<br />
colaborar, privilegiando brincadeiras<br />
mais individualizadas.<br />
O brincar mantém-se o nosso<br />
grande instrumento terapêutico de<br />
trabalho, pois é a forma através da<br />
qual as nossas crianças comunicam<br />
connosco, com o meio em que vivem<br />
0104 NOABR21 NOABR21 0105
CRÓNICA<br />
PUB.<br />
REPORTAGEM<br />
e expressam os seus sentimentos.<br />
Os enfermeiros de pediatria têm<br />
inato um palhaço interior. Não<br />
é treinado, nem forçado e não<br />
há grande teoria que sustente<br />
este nosso “saber ser”. É assim<br />
que conquistamos as crianças<br />
no nosso dia a dia – a brincar.<br />
Minimizamos medos, inseguranças<br />
e conseguimos a sua colaboração<br />
até mesmo em procedimentos mais<br />
invasivos.<br />
Todas as estratégias têm um<br />
cariz evolutivo e acompanham<br />
as alterações que ocorrem nas<br />
diretrizes do plano de contingência<br />
hospitalar. Considero que poderia<br />
descrever muito mais e assumo<br />
que mais ainda poderia ser feito<br />
no sentido de colmatar as lacunas<br />
próprias dos obstáculos colocados<br />
pela pandemia no cuidar em<br />
pediatria. No entanto, e apesar<br />
do inegável cansaço físico e<br />
psicológico que nós, profissionais<br />
de saúde, vivenciamos, o nosso foco<br />
de atuação sempre esteve presente e<br />
bem definido.<br />
O caminho ainda é longo, mas<br />
enquanto equipa seguimos com<br />
a mesma linha de pensamento e<br />
com a vontade comum de aligeirar<br />
as sequelas deixadas por estes<br />
tempos particulares que vivemos.<br />
Cuidamos uns dos outros como<br />
a segunda família que somos e<br />
depositamos paralelamente toda<br />
a emocionalidade, empenho e<br />
profissionalismo no nosso cuidar.<br />
0106 NOABR21 NOABR21 0107
CRÓNICA<br />
CRÓNICA<br />
Por Ricardo Silva<br />
José Tolentino de Mendonça, O Que É Amar<br />
um País, O Poder da Esperança, Quetzal, 2020<br />
O madeirense, cardeal, poeta e pensador José<br />
Tolentino Mendonça propôs como reflexão<br />
no seu discurso de 2020, no Dia de Portugal,<br />
de Camões e das Comunidades Portuguesas a<br />
temática “O que é Amar um País”, convertida<br />
em título do livro ora presente. O subtítulo<br />
aponta para uma outra reflexão, traduzida numa<br />
pequena coletânea de textos, feita no decorrer<br />
da pandemia e que, pela sua profundidade,<br />
merece um cuidado que este escrito não vai<br />
observar. E isto porque o cidadão que foi<br />
convidado para proferir o discurso do dia 10<br />
de junho quis destacar a palavra Esperança<br />
como o poder sobre a pandemia, embora na sua<br />
intervenção solene tenha optado pela palavra<br />
“raiz” que tenta interpretar aplicada ao nosso<br />
país.<br />
E se as raízes podem ser a força, a estabilidade<br />
temporal e o vigor do crescimento, elas também<br />
nos recordam que são vulneráveis às crises<br />
meteorológicas e aos atos insanos dos homens.<br />
Lembram-nos que, sendo ou parecendo<br />
inabaláveis, são, também, frágeis aos tremores<br />
do mundo físico e humano. E nesta oscilação<br />
tem Portugal viajado no tempo.<br />
O também pensador lembrou<br />
Camões como o poeta que<br />
desconfinou Portugal não só<br />
porque nos deu “o poema” (Os<br />
Lusíadas), mas, sobretudo,<br />
“deixou-nos em herança a poesia<br />
como ciência de navegação<br />
interior” e “um guia náutico<br />
perpétuo.” Releva Os Lusíadas<br />
como um livro que nos conduz a<br />
nós próprios “como indivíduos e<br />
como nação” fazendo-nos chegar<br />
à “consciência última de nós<br />
mesmos”.<br />
Refere a filósofa Simone Weil<br />
para mostrar que amar um<br />
país é amar o dinamismo da<br />
sua história, os seus solavancos<br />
e riscos, e não meramente a<br />
imagem ideal do mesmo, fixa,<br />
gloriosa, num dado momento,<br />
e não aceitando as alterações<br />
do tempo. Amar um país leva,<br />
segundo Tolentino de Mendonça,<br />
ao exercício da fraternidade e<br />
da compaixão, numa viagem<br />
nacional que inclui riscos, mas<br />
que importa o caminho para<br />
onde queremos ir.<br />
Um país que, enquanto<br />
comunidade cuida da vida de<br />
cada um, formalizando um<br />
pacto que não deve deixar para<br />
trás os mais fracos, indiferentes<br />
à sua sorte. Esta ideia de<br />
pacto comunitário é tão mais<br />
importante, conquanto hoje<br />
voltam a germinar ideias de<br />
discriminação e abandono de uns<br />
por outros, num salve-se quem<br />
puder que a pandemia mais<br />
expôs.<br />
O conceito seguinte de pacto<br />
intergeracional é uma alusão<br />
à necessidade de se reabilitar<br />
e robustecer o diálogo entre<br />
faixas etárias diferentes numa<br />
perspetiva de ajuda mútua, de<br />
aprendizagem e colaboração<br />
pungente. Reforça a ideia de que<br />
a sociedade é una, inclusiva e<br />
0108 NOABR21 NOABR21 0109
CRÓNICA<br />
REPORTAGEM<br />
CRÓNICA<br />
REPORTAGEM<br />
não desagregadora e que os mais<br />
velhos não podem ser vistos<br />
como um peso sobre o manto dos<br />
mais jovens.<br />
É importante, porque evidente,<br />
a sua chamada de atenção<br />
aos jovens abaixo dos 35<br />
anos, escolarizados e bem<br />
qualificados, tantas vezes<br />
vítimas de precariedade laboral,<br />
impeditiva de realizar sonhos<br />
pessoais e familiares em pleno.<br />
As gerações devem olhar-se<br />
em complementaridade, com<br />
dignidade própria e com um<br />
caminho de fortalecimento<br />
mútuo.<br />
O discurso no seu passo seguinte<br />
releva a importância de mais um<br />
pacto: o ambiental. O Homem<br />
tem de assumir o papel de<br />
cuidador do mundo, com uma<br />
ética da criação, embora tenha de<br />
mudar a “raiz” do sistema cujas<br />
estirpes assentam no consumo<br />
desenfreado e num conceito<br />
de “progresso” e abundância<br />
destrutivas. Mais se agrava a<br />
situação é quando esta raiz até é<br />
francamente desigual entre países<br />
e continentes e, obviamente,<br />
geradora de riqueza concentrada<br />
em poucos face à miséria e<br />
pobreza de muitos.<br />
José Tolentino de Mendonça<br />
recupera depois a ideia de<br />
viagem a partir de Camões e<br />
dos Lusíadas para comparála<br />
a Portugal, esta nau de 9<br />
séculos que em comunidade<br />
vai melhorando o seu futuro.<br />
“Portugal é e será, por isso, uma<br />
viagem que fazemos juntos”,<br />
terminando o seu discurso<br />
afirmando que esta viagem é<br />
como um grande Amor que não<br />
se esgota na temporalidade da<br />
história, vai além dela, criando<br />
um rasto do seu fulgor.<br />
Podemos afirmar que num ano<br />
de pandemia, 2020, o nosso Dia<br />
de Portugal, foi marcado por<br />
palavras sensíveis de um cardeal<br />
– poeta que apontam ao futuro<br />
como União, Amor, Esperança,<br />
Poesia, Raízes, Viagem e Pacto.<br />
Com elas sabemos “o que é amar<br />
um país”: Portugal.<br />
A leitura vale a pena! E José<br />
Tolentino Mendonça merece-o!<br />
Ricardo Silva<br />
TIAGO MATIAS<br />
EDITOR<br />
São a mesma coisa? É certo<br />
que andam, muitas vezes,<br />
de mãos dadas. Afinal de<br />
contas, muitas vezes os<br />
empreendedores em potência ou<br />
os professores da área entendem<br />
“empreendedorismo” como<br />
sinónimo de “fazer coisas novas,<br />
que não existam ainda”.<br />
Vamos ao Dicionário. Infopédia.<br />
Empreendedorismo significa:<br />
“1) qualidade do que é<br />
empreendedor; 2) atitude de<br />
quem, por iniciativa própria,<br />
assume os riscos financeiros<br />
inerentes à criação de um<br />
negócio com vista à obtenção<br />
de lucro; 3) atitude de quem se<br />
propõe a começar novo projeto<br />
ou a implementar novo método<br />
com vista a desenvolver uma<br />
Empreendedorismo<br />
Vs<br />
Inovação<br />
dada atividade ou a responder<br />
a determinado problema; 4)<br />
espírito de iniciativa; diligência;<br />
dinamismo”.<br />
Inovação significa: “1) ato ou<br />
efeito de inovar; 2) introdução<br />
de qualquer novidade na gestão<br />
ou no modo de fazer algo,<br />
mudança, renovação; 3) criação<br />
de algo de novo, descoberta”.<br />
Assim, ser empreendedor<br />
– que não é sinónimo de<br />
ser empresário – é tomar a<br />
iniciativa, desenhar o seu<br />
próprio caminho e ser inovador<br />
é criar algo de novo.<br />
Será necessário ser inovador<br />
para ser empreendedor? Pois<br />
aqui é que reside, muitas vezes, a<br />
confusão.<br />
Se uma pessoa se propuser<br />
NOABR21 0111
CRÓNICA<br />
REPORTAGEM<br />
PUB.<br />
a criar um negócio, como um<br />
restaurante, um cabeleireiro, um<br />
salão de estética, não estará a ser<br />
inovador, mas sim empreendedor.<br />
E só porque esse negócio<br />
não comporta inovação, está<br />
condenado ao fracasso? Não!<br />
Quem quer criar um negócio<br />
deve estudar muito bem a área<br />
de negócio em que se pretende<br />
envolver, estudar a concorrência,<br />
pensar como irá viabilizar a sua<br />
ideia e refletir sobre quais os<br />
fatores de diferenciação que a<br />
distinguirão da concorrência.<br />
Em suma, fazer um plano de<br />
negócios. Isto não implica<br />
reinventar a roda nem pensar<br />
em cultivar algas em ambiente<br />
suborbital.<br />
Assim, se estiver a pensar em<br />
criar o seu próprio emprego,<br />
não precisa de ter uma ideia<br />
mirabolante. Pense nas suas<br />
competências, pense no que<br />
faz falta no mercado, quem irá<br />
adquirir os seus produtos ou<br />
serviços, se consegue ter preços<br />
razoáveis e como será a melhor<br />
naquilo que fizer. Pode também<br />
ir pensando numa estratégia de<br />
comunicação e sobre como irá<br />
crescer nos próximos anos. Seja<br />
realista. Recorde-se sempre do<br />
princípio KISS - Keep it Short &<br />
Simple. Descomplique.<br />
Tiago Matias,<br />
Editor<br />
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JOÃO AZEVEDO CASTRO<br />
joaocastro@sapo.pt<br />
PROFESSOR<br />
MESTRADO EM GESTÃO PORTUÁRIA<br />
SUEZ<br />
mais dias de navegação.<br />
O porta contentores “Ever<br />
Given” é um dos maiores<br />
navios do mundo. Construído<br />
no ano de 2018, com 400m de<br />
comprimento, 59m de largura e<br />
15,7m de calado, navegava sob o<br />
registo da bandeira do Panamá,<br />
com uma arqueação na ordem<br />
das 200 mil toneladas, que<br />
podem transportar até 20 mil<br />
contentores de 20 pés (20.000<br />
TEU’s).<br />
O Canal do Suez, com 164 Km<br />
de extensão, é um dos principais<br />
circuitos do transporte marítimo<br />
à escala global. Foi inaugurado<br />
em 1869, sendo um “atalho”<br />
na ligação marítima entre a<br />
Ásia e a Europa, permitindo<br />
aos navios economizar, cerca<br />
de 6.000 milhas náuticas, em<br />
relação ao percurso pela costa<br />
de África através do Cabo da<br />
Boa Esperança. Estima-se que<br />
passem, pelo canal do Suez, cerca<br />
de 19.000 navios anualmente,<br />
representando 12% do total de<br />
A navegação marítima<br />
internacional foi surpreendida,<br />
no passado dia 23 de março,<br />
com o encalhe, do navio “Ever<br />
Given” no canal do Suez,<br />
onde navegava, tendo como<br />
destino a cidade de Roterdão. O<br />
acidente terá ocorrido devido<br />
às condições meteorológicas,<br />
com ventos fortes associados<br />
a uma tempestade de areia,<br />
após a passagem pela entrada<br />
Sul do canal, que terá gerado<br />
um problema de visibilidade e<br />
controlo do navio.<br />
Esta situação impediu a<br />
passagem de centenas de navios,<br />
que planeavam utilizar o canal,<br />
que se aglomeram nos dois<br />
lados da passagem, criando um<br />
efeito de atrasos sucessivos,<br />
com impactos significativos à<br />
escala global, o que obrigará<br />
a encontrar rotas comerciais<br />
alternativas, certamente o cabo<br />
da boa esperança, obrigando a<br />
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CRÓNICA<br />
CRÓNICA<br />
mercadorias transportadas no<br />
mundo, tendo mesmo o registo<br />
de 6,1 milhões de toneladas num<br />
único dia.<br />
Se pensarmos que mais de<br />
80% das mercadorias, do<br />
mundo, são transportadas<br />
por via marítima, facilmente<br />
se percebe que o Canal do<br />
Suez é vital para as cadeias de<br />
abastecimento global pelo que,<br />
este acidente, terá consequências<br />
significativas. Desde logo<br />
pelas consequências diretas,<br />
nos prazos de entrega, para as<br />
mercadorias transportadas pelos<br />
navios diretamente afetados, mas<br />
também face a um previsível<br />
congestionamento das cargas<br />
nos portos europeus, para<br />
os próximos dias, bem como<br />
dificuldades no abastecimento<br />
de recursos energéticos, como<br />
o petróleo e o gás natural<br />
liquefeito, com provável,<br />
aumento dos preços.<br />
Também nos portos as<br />
consequências poderão<br />
ser significativas, face às<br />
transformações, a que tem sido<br />
sujeita a operação portuária,<br />
nos últimos anos, decorrentes<br />
da implantação de meganavios<br />
e à reestruturação das<br />
alianças marítimas, efetuadas<br />
pelas grandes empresas de<br />
navegação. A procura por<br />
ganhos de eficiência, das redes<br />
de transporte marítimo, tem<br />
aumentado o tamanho dos<br />
navios, aumentando por esta<br />
via o grau de exigência sobre os<br />
portos, que tentam corresponder<br />
ao desafio de adaptação a esta<br />
realidade.<br />
Enquanto alinhavávamos o<br />
presente texto, os trabalhos<br />
de desencalhe apresentavam<br />
sinais de solução, prevendo-se<br />
uma intervenção de dragagem<br />
das areias, em que o Ever<br />
Given ficou preso, ou mesmo<br />
uma diminuição do peso<br />
do navio, com a retirada da<br />
carga (contentores), água e<br />
combustível, o que atrasaria<br />
inevitavelmente toda a operação<br />
face aos meios necessários para a<br />
concretizar.<br />
Falamos de “milhões”, de<br />
prejuízos, com impactos<br />
previsíveis na economia<br />
mundial, obrigando os navios<br />
a procurar rotas alternativas,<br />
com custos acrescidos para<br />
as mercadorias, logo para o<br />
consumidor.<br />
Uma consequência parece já<br />
clara, associada à pandemia que<br />
o mundo enfrenta, este é um<br />
evento que fará refletir sobre o<br />
processo de globalização.<br />
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FRASES DO MÊS<br />
REPORTAGEM<br />
PUB.<br />
“Estimamos que apenas cerca de 80 mil vacinas seriam<br />
necessárias para nós. Não se trata de um pedido egoísta,<br />
mas sim de uma necessidade específica”<br />
José Manuel Bolieiro,<br />
Presidente do Governo Regional<br />
“O que vai acontecer é que, em vez da produção acrescida<br />
ser feita no hospital público, a produção acrescida<br />
será feita no hospital privado, o que terá custos muito<br />
superiores para o Serviço Regional de Saúde”<br />
António Lima, deputado do BE/Açores<br />
“Precisa de ser a mulher a garantir a mudança de mentalidade<br />
nas próximas gerações, a romper com o sentimento de culpa<br />
que por vezes sente quem tem responsabilidades familiares e se<br />
dedica a outras causas”<br />
Sandra Dias Faria,<br />
deputada do PS/Açores<br />
“Se o incumprimento dos compromissos assumidos por António Costa<br />
mereceu, ao longo de todos estes anos, apenas um mero encolher de<br />
ombros por parte do PS de Vasco Cordeiro, estamos certos de que o<br />
atual Governo Regional vai desencadear todas as ações para que a<br />
República cumpra o que prometeu”<br />
Pedro Nascimento Cabral, PSD/Açores<br />
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REPORTAGEM