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NOREVISTA ABRIL 2021

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REPORTAGEM<br />

NOABR21 01


SUMÁRIO<br />

PUB.<br />

<strong>ABRIL</strong><br />

05<br />

15<br />

26<br />

38<br />

<strong>2021</strong><br />

ENTREVISTA<br />

À MESA COM GUALTER FURTADO<br />

OPINIÃO<br />

JUVENTUDES PARTIDÁRIAS<br />

REPORTAGEM<br />

PORTUGAL ENQUANTO NAÇÃO ESPACIAL<br />

REPORTAGEM<br />

A ENERGIA RENOVÁVEL MARINHA COMO<br />

ALTERNATIVA<br />

REPORTAGEM<br />

O FUTURO DO TURISMO: PARA QUANDO OS VALORES<br />

DA PANDEMIA?<br />

92<br />

24<br />

96<br />

98<br />

REPORTAGEM<br />

50 TENDÊNCIAS GLOBAIS DE EMPREGO PARA A<br />

JUVENTUDE<br />

102<br />

60 119<br />

PROJETO “CULTURA, CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA<br />

IMPRENSA” | CIÊNCIA<br />

30 ANOS DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA EM PAPEL DE<br />

JORNNAL<br />

PROJETO “CULTURA, CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA<br />

IMPRENSA” | SAÚDE<br />

COMBATER A OBESIDADE E O EXCESSO DE PESO COM<br />

A AJUDA DO TELEMÓVEL<br />

PROJETO “CULTURA, CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA<br />

IMPRENSA” | SAÚDE<br />

INQUÉRITO INTERNACIONAL REVELA QUE<br />

PORTUGUESES ESTÃO DEPRIMIDOS<br />

CRÓNICAS<br />

SÁTIRA POLÍTICA<br />

PORTUGAL ENQUANTO<br />

NAÇÃO ESPACIAL<br />

26<br />

A ENERGIA RENOVÁVEL<br />

MARINHA COMO<br />

DE EMPREGO PARA<br />

ALTERNATIVA 38 50<br />

TENDÊNCIAS GLOBAIS<br />

O FUTURO DO TURISMO:<br />

PARA QUANDO<br />

OS VALORES DA<br />

A JUVENTUDE PANDEMIA 60<br />

02 NOABR21 NOABR21 03


EDITORIAL<br />

JOVENS, POLÍTICA(S) E O FUTURO<br />

Não é novidade dizer-se que<br />

a nossa classe política está<br />

cansada e viciada em si mesma.<br />

Os mesmos lugares, em anos<br />

diferentes, ocupados pelas<br />

mesmas pessoas nas cadeiras<br />

do parlamento açoriano. De<br />

quatro em quatro anos, voltam a<br />

aparecer nos panfletos que nos<br />

entregam as mesmas caras, com<br />

uma dúzia de jovens em lugares<br />

ilegíveis.<br />

Poder-se-á dizer que as<br />

eleições que nos trarão um<br />

maior vislumbre serão,<br />

provavelmente, as autárquicas,<br />

não fossem os presidentes de<br />

junta de freguesia ter mandatos<br />

eternos e ocuparem aqueles<br />

cargos para o resto da sua vida.<br />

Na verdade, a limitação de<br />

mandatos não existe para as<br />

eleições legislativas. Pode uma<br />

senhora ou senhor deputado<br />

começar a sua carreira política<br />

aos 25 anos e até lá ficar<br />

enquanto os açorianos assim<br />

quiserem, seja apenas por<br />

quatro anos ou por mais 40.<br />

Poderão os críticos afirmar que<br />

os lugares a que pertencem<br />

nas listas aquando das eleições<br />

são escolhas do partido e, a<br />

partir do momento em que<br />

os açorianos votam, quer à<br />

esquerda, direita ou centro,<br />

conhecerão quem estarão a<br />

votar.<br />

Mas depois, questionamo-nos<br />

– porque não rejuvenescer a<br />

nossa classe política açoriana?<br />

Ora veja-se, existem apenas<br />

seis jovens com idade até<br />

aos 35 anos e com assento<br />

na Assembleia Legislativa.<br />

Representam 10,5% dos 52 que<br />

a compõem.<br />

Apregoa-se, tantas vezes, a<br />

vontade pelo rejuvenescimento<br />

dentro do seio político, por<br />

aqueles que agora vivem<br />

tempos diferentes e que<br />

ganham, em virtude desses<br />

tempos, também ideias,<br />

doutrinas e pensamentos<br />

adaptados ao novo quotidiano<br />

que todos os dias ganha vida.<br />

É igualmente fácil encontrarmos<br />

discursos, quer à direita,<br />

esquerda ou centro, o apelo<br />

à participação dos jovens na<br />

dinamização de novas políticas<br />

sociais, económicas e culturais.<br />

Pode um jovem, sem ter estado<br />

ligado a qualquer partido nos<br />

últimos anos, querer concorrer<br />

como membro integrante de<br />

uma lista? A verdade é que,<br />

muitas vezes, não pode.<br />

Não vale de nada apregoarse<br />

pela participação cívica<br />

jovem se os últimos sentem<br />

descredibilidade naqueles que<br />

são os protagonistas na nossa<br />

Região. Apelar os jovens a<br />

participarem, credibilizar a<br />

nossa classe política, ouvindo<br />

os seus pareceres, é o caminho a<br />

seguir. Não vale nem tão pouco<br />

apregoar-se pelo jovem quando<br />

não se lhe dá a capacidade para<br />

que possa mostrar o potencial.<br />

Enquanto assim for, as taxas<br />

de abstenção continuarão a ter<br />

os números que nos têm vindo<br />

a habituar, sendo depois alvo<br />

de escrutínio e de possíveis<br />

hipóteses para que tal tenha<br />

acontecido, quando a resposta<br />

parece ser óbvia – sem inclusão,<br />

não haverá nunca participação.<br />

Cláudia Carvalho<br />

FICHA TÉCNICA:<br />

ISSN 2183-4768<br />

PROPRIETÁRIO ASSOCIAÇÃO AGENDA DE NOVIDADES<br />

NIF 510570356<br />

SEDE DE REDAÇÃO RUA DA MISERICÓRDIA, 42, 2º ANDAR,<br />

9500-093 PONTA DELGADA<br />

SEDE DO EDITOR RUA DA MISERICÓRDIA, 42, 2º ANDAR,<br />

9500-093 PONTA DELGADA<br />

DIRETORA ADJUNTA CLÁUDIA CARVALHO TPE-288A<br />

REDAÇÃO CHEFE REDAÇÃO RUI SANTOS TPE-288 A,<br />

CLÁUDIA CARVALHO TPE-288 A, SARA BORGES, ANA SOFIA<br />

MASSA, ANA SOFIA CORDEIRO<br />

REVISÃO ANA SOFIA MASSA<br />

PAGINAÇÃO CARINA COELHO<br />

CAPTAÇÃO E EDIÇÃO DE IMAGEM RODRIGO RAPOSO E<br />

MIGUEL CÂMARA<br />

DEPARTAMENTO DE MARKETING, COMUNICAÇÃO E IMAGEM<br />

CILA SIMAS E RAQUEL AMARAL<br />

PUBLICIDADE RAQUEL AMARAL<br />

MULTIMÉDIA RODRIGO RAPOSO, RAFAEL ARAÚJO E MÁRIO<br />

CORRÊA<br />

INFORMÁTICA JOÃO BOTELHO<br />

RELAÇÕES PÚBLICAS CILA SIMAS<br />

Nº REGISTO ERC 126 641<br />

COLABORADORES ANTÓNIO VENTURA, JOÃO CASTRO,<br />

RICARDO SILVA<br />

CONTACTOS MARKETING@AGENDADENOVIDADES.COM<br />

ESTATUTO EDITORIAL:<br />

A NO É UMA REVISTA DE ÂMBITO REGIONAL (NÃO FICANDO<br />

EXCLUÍDOS OS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA E<br />

COMUNIDADES PORTUGUESAS ESPALHADAS PELO MUNDO).<br />

A NO DISPONIBILIZA INFORMAÇÃO INDEPENDENTE E<br />

PLURALISTA RELACIONADA COM A POLÍTICA, CULTURA<br />

E SOCIEDADE NUM CONTEXTO REGIONAL, NACIONAL E<br />

INTERNACIONAL.<br />

A NO É UMA REVISTA AUTÓNOMA, SEM QUALQUER<br />

DEPENDÊNCIA DE NATUREZA POLÍTICA, IDEOLÓGICA<br />

E ECONÓMICA, ORIENTADA POR CRITÉRIOS DE RIGOR,<br />

ISENÇÃO, TRANSPARÊNCIA E HONESTIDADE.<br />

A NO É PRODUZIDA POR UMA EQUIPA QUE SE COMPROMETE<br />

A RESPEITAR OS DIREITOS E DEVERES PREVISTOS NA<br />

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA; NA LEI DE<br />

IMPRENSA E NO CÓDIGO DEONTOLÓGICO DOS JORNALISTAS.<br />

A NO VISA COMBATER A ILITERACIA, INCENTIVAR O GOSTO<br />

PELA LEITURA E PELA ESCRITA, MAS ACIMA DE TUDO,<br />

PROMOVER A CIDADANIA E O CONHECIMENTO.<br />

A NO REGE-SE PELO CUMPRIMENTO RIGOROSO DAS<br />

NORMAS ÉTICAS E DEONTOLÓGICAS DO JORNALISMO E<br />

PELOS PRINCÍPIOS DE INDEPENDÊNCIA E PLURALISMO.<br />

À MESA COM<br />

REPORTAGEM<br />

GUALTER FURTADO<br />

presidente do Conselho Económico e Social dos Açores<br />

04 NOABR21 NOABR21 05


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA EM<br />

VÍDEO NA VERSÃO<br />

DIGITAL<br />

Sejam bem-vindos a mais um À Mesa<br />

Com no restaurante da Associação<br />

Agrícola. Eu tenho o prazer de vos<br />

apresentar este mês o Doutor Gualter<br />

Furtado, ele que é presidente do<br />

Conselho Económico e Social dos<br />

Açores (CESA). Começava por pedir<br />

que me explicasse, no fundo, o que é o<br />

CESA.<br />

O CESA é uma instituição que está<br />

prevista no estatuto políticoadministrativo<br />

da Região Autónoma<br />

dos Açores. Como sabem, um<br />

dos pilares da nossa autonomia<br />

democrática, juntamente com a<br />

constituição da república e com<br />

a lei das finanças das regiões<br />

autónomas, e lá, digamos, está<br />

prevista a criação deste órgão que é<br />

um órgão independente, é um órgão<br />

de aconselhamento do governo e<br />

dos órgãos próprios do governo dos<br />

Açores. É um órgão que tem como<br />

missão principal instituir o diálogo<br />

entre a sociedade civil e os órgãos de<br />

governo dos Açores e, por conseguinte,<br />

um órgão que funciona com base<br />

numa grande representatividade<br />

da sociedade açoriana. Lá estão<br />

representadas praticamente todas as<br />

organizações da sociedade civil e dos<br />

parceiros sociais incluindo também do<br />

governo. Este formato atual, que é um<br />

formato independente, resulta muito<br />

da vontade da Câmara de Comércio<br />

e Indústria dos Açores, da Federação<br />

Agrícola dos Açores e da UGT, que<br />

mais tarde se juntou à AICOPA, que é<br />

a sociedade da construção civil e eles<br />

propuseram, digamos, na altura, aos<br />

partidos e ao governo que o conselho<br />

que existia, que era o Conselho de<br />

Concertação Estratégica (CCE) e do<br />

qual eu também fazia parte como<br />

personalidade independente, de que<br />

o conselho devia ter um formato<br />

diferente e ser presidido por uma<br />

pessoa que não o Presidente do<br />

Governo dos Açores, porque antes<br />

quem presidia o CCE era o Presidente<br />

do Governo, mas uma personalidade<br />

civil que fosse escolhida e que se<br />

auto propusesse e depois fosse<br />

aprovada no parlamento regional<br />

com a maioria de 2/3; é um órgão<br />

independente de aconselhamento<br />

e agora tem funções amplas. Nós<br />

desde logo temos competência de nos<br />

pronunciarmos sobre os planos de<br />

desenvolvimento da Região Autónoma<br />

dos Açores sobre o orçamento. Temos<br />

que nos pronunciar sobre a aplicação<br />

e a gestão dos fundos comunitários,<br />

sobre a relação da Região com<br />

entidades externas à Região, ligadas<br />

ao desenvolvimento económico, sobre<br />

as leis laborais e sobre a concertação<br />

social e, por conseguinte, nós temos<br />

também essa incumbência de, ao<br />

fim ao cabo, fazer a arbitragem e<br />

intervir em possíveis plataformas de<br />

entendimento entre as organizações<br />

sindicais e as organizações patronais.<br />

Por conseguinte, são competências<br />

amplas e que nós fazemos questão em<br />

cumprir.<br />

06 NOABR21 NOABR21 07


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

Quem é o Doutor Gualter Furtado e como é que ele vem<br />

parar a presidir o CESA em 2019?<br />

Naturalmente isso resulta de um percurso de vida. Um<br />

percurso que começa na escola primária no Vale das Furnas,<br />

depois vem para Ponta Delgada, para a Escola Comercial<br />

e Industrial de Ponta Delgada. De seguida, consegue ter<br />

acesso a uma bolsa de<br />

estudos das antigas<br />

juntas gerais e, graças<br />

a essa bolsa de estudos,<br />

fui estudar para Lisboa,<br />

para o Instituto<br />

Comercial de Lisboa<br />

fazer a secção de<br />

Economia e também<br />

Concluído isso, fui<br />

parte do curso<br />

para a universidade,<br />

de Contabilidade.<br />

para o Instituto<br />

Superior de<br />

Economia, que<br />

naquela altura<br />

fazia parte da<br />

Universidade Técnica<br />

de Lisboa, hoje tem a<br />

designação de ISEG.<br />

Tive a felicidade de<br />

chegar a monitor,<br />

depois assistente<br />

da universidade.<br />

Quando era<br />

assistente da universidade fui desafiado a regressar aqui aos Açores<br />

para fazer doutoramento no nosso instituto universitário e para vir<br />

dar aulas. Nessa altura o diretor do departamento de Economia e<br />

Gestão era o professor Monteiro da Silva e eu mais a minha mulher,<br />

depois de uma avaliação que não durou muito tempo, resolvemos<br />

regressar e viemos para os Açores em 1984 e a partir daí tive vários<br />

desafios. Nunca me desliguei da<br />

universidade totalmente. Até há<br />

bem pouco tempo eu era membro<br />

do Conselho Geral da Universidade<br />

dos Açores, fui vice-presidente.<br />

É uma instituição pela qual eu<br />

tenho muito carinho, nunca me<br />

desliguei dela, mas, entretanto,<br />

fui fazendo outras coisas na vida.<br />

Fui para a banca, para a Caixa<br />

Económica da Misericórdia de<br />

Ponta Delgada.<br />

Depois fui desafiado pelo Doutor<br />

Mota Amaral para fazer parte<br />

de um dos governos dele como<br />

Secretário Regional das Finanças<br />

e Planeamento e que mais tarde<br />

se acrescentou a Administração<br />

Pública. Depois regressei à banca<br />

novamente, ajudei a fundar o<br />

banco que era o BES dos Açores.<br />

Foi um banco de sucesso. No<br />

meio dessa desgraça toda que<br />

aconteceu ao grupo Espírito Santo<br />

e ao BES, nós, felizmente, aqui<br />

nos Açores, conseguimos não<br />

ser intervenciados pelo Banco de<br />

Portugal. Fomos considerados um<br />

banco bom e isso significou que<br />

os nossos acionistas nacionais e<br />

regionais, que são 13 misericórdias<br />

e o grupo Bensaude, continuassem<br />

sempre a ter a sua posição<br />

acionista. Mudámos de nome, mas<br />

o espírito sempre foi o mesmo e<br />

talvez foi esse percurso de vida que<br />

fez com que me desafiassem alguns<br />

partidos, sobretudo os chamados<br />

partidos do arco da governação<br />

para me candidatar ao CESA. Fi-lo<br />

e felizmente obtive uma maioria<br />

no primeiro mandato de 81.3%,<br />

no segundo mandato de 91.2%.<br />

Não estava no meu horizonte<br />

candidatar-me a um segundo<br />

mandato, mas digamos, a pedido de<br />

alguns parceiros sociais e também<br />

de alguns partidos políticos e<br />

dos seus principais líderes e a<br />

situação muito difícil que nós<br />

estamos a passar, fez-me refletir<br />

um bocado sobre pôr ao serviço<br />

da comunidade e dos Açores a<br />

minha experiência pessoal, técnica<br />

e profissional e é isso que eu vou<br />

procurar fazer de uma forma<br />

independente e do melhor que sei.<br />

Naturalmente, ninguém faz nada<br />

na vida sozinho. Conto com o<br />

apoio dos parceiros sociais, desde<br />

logo, e também da Assembleia<br />

Legislativa da Região Autónoma<br />

dos Açores (ALRAA) e do Governo<br />

para facilitar o nosso trabalho,<br />

sempre numa base independente.<br />

Isso então faço questão de ser<br />

sempre numa base independente<br />

e de concertação com os parceiros<br />

sociais.<br />

08 NOABR21<br />

NOABR21 09


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

Passando agora para um assunto também ele muito importante que é o da<br />

Economia. Foi alvo de muita contestação e também de alguma preocupação a<br />

extinção da Secretaria da Economia em 2012. Agora, com o novo executivo, nós<br />

temos a Economia e Finanças juntas na mesma secretaria. Qual é o parecer que<br />

merece da sua parte esta junção das Finanças e da Economia numa só secretaria?<br />

Bom, eu já fiz parte de um Governo em que<br />

havia o Secretário Regional da Economia e<br />

o Secretário Regional das Finanças. Depois<br />

fiz parte de um Governo em que a Economia<br />

fazia parte das Finanças e, por conseguinte,<br />

já vivi isso tudo. O que eu acho é que uma<br />

Secretaria Regional das Finanças bem<br />

estruturada, com boas direções regionais<br />

é suficiente. Eu acho que, nos Açores,<br />

quanto menos complicarmos e quanto mais<br />

simplificarmos o nosso modelo de governação,<br />

mais eficiente ele vai ser. Por conseguinte, eu<br />

julgo que não é criando muitas estruturas que<br />

nos tornamos mais eficientes.<br />

Aliás, eu penso que nós aqui nos Açores o que<br />

nós temos que ter é valorizar a sociedade civil<br />

e, por conseguinte, quando digo valorizar<br />

a sociedade civil digo valorizar o papel dos<br />

parceiros sociais da Federação Agrícola, das<br />

Câmaras de Comércio, dos representantes das<br />

Pescas, das Misericórdias, os representantes<br />

do Ambiente, das Instituições Particulares<br />

de Solidariedade Social, da Associação para<br />

a Igualdade de Género, dos jovens, etc, e,<br />

por conseguinte, valorizar isso, haver um<br />

grande diálogo em concertação estratégica<br />

para aí reduzir ao máximo estruturas e eu<br />

penso que este governo vai ser avaliado e a<br />

avaliação que vai ter no fim não é por ter mais<br />

uma secretaria ou menos uma secretaria,<br />

é pela capacidade de resposta que vai dar<br />

aos problemas dos açorianos e da economia<br />

açoriana. Por conseguinte, não vejo isso<br />

com muitos maus olhos, o facto de se juntar<br />

a Economia e as Finanças numa mesma<br />

secretaria.<br />

No fundo, era uma promessa do<br />

governo uma racionalização do setor<br />

público empresarial que também passa<br />

pela SDEA. Acha que a extinção da<br />

SDEA poderá provocar algum vazio na<br />

orgânica do Governo Regional ou isso<br />

não está iminente?<br />

Bem, o que eu acho é que tem de<br />

haver aqui um sentido de equilíbrio,<br />

ou seja, não se pode estar a extinguir<br />

essas estruturas e essas empresas,<br />

e ao mesmo tempo, engordar o<br />

Governo. Tem de haver um equilíbrio<br />

e fazer isso sem prejuízo de aumentar<br />

excessivamente também a máquina<br />

governativa. É tudo uma questão de<br />

bom senso como lhe digo, com boas<br />

direções regionais, com bons diretores<br />

regionais, podemos ter bons resultados.<br />

Eu acho que podem dar conta do recado,<br />

mas depende do funcionamento e da<br />

própria orgânica do Governo. Agora,<br />

o próprio Governo também tem que<br />

dar um sinal de não excessiva gordura.<br />

Evidentemente, do ponto de vista<br />

da dívida pública, isso já estava tudo<br />

consolidado. Hoje em dia, as empresas<br />

públicas, os institutos já consolidam<br />

com a dívida pública<br />

regional. Eu sou a favor de que todas as<br />

despesas e receitas relacionadas com a<br />

administração pública regional tenham<br />

um espelho no orçamento regional.<br />

Qual é o grande desafio que os Açores<br />

têm, que é o desafio de ontem, o desafio<br />

de hoje e o desafio de amanhã? É o<br />

facto de nós termos uma governação<br />

nos Açores e termos uma sociedade nos<br />

Açores a funcionar melhor do que na<br />

Madeira e do que no Continente.<br />

Para conseguirmos esse desiderato é<br />

preciso que nos empenhemos em<br />

tudo aquilo que fazemos com grande<br />

qualidade e eficiência. Isso é que é o<br />

grande desafio. Por conseguinte, termos<br />

as nossas contas todas de uma forma<br />

transparente é uma forma que contribui<br />

para melhorarmos a qualidade da<br />

administração pública regional e, por<br />

conseguinte, eu sou a favor de que toda<br />

a receita e despesa pública tenham um<br />

reflexo no orçamento regional.<br />

Por conseguinte, eu vejo bem que isso<br />

termine nisso. Evidentemente que<br />

alguns serviços acho que têm de se<br />

manter em empresas públicas, por<br />

exemplo no caso da EDA, ou no que se<br />

refere ao SREA. Eu vejo por exemplo<br />

como positivo que o SREA ganhe uma<br />

autonomia maior, que seja um instituto<br />

público de maneira a não ser permeável.<br />

Não estou a dizer acabar com tudo.<br />

Até por exemplo criar neste caso um<br />

instituto público de estatística regional,<br />

até já digo o nome: Instituto Público de<br />

Estatística Regional dos Açores (IPERA).<br />

Sou a favor disso. Mas agora o resto de<br />

coisas assim marginais eu acho que só<br />

ficamos a ganhar com a sua integração<br />

no Governo. Essas empresas e esses<br />

organismos que devem serem extintos<br />

não têm a ver com as pessoas que<br />

lá estavam a gerir, não estou a fazer<br />

nenhum juízo de valor em relação às<br />

pessoas que lá estavam, estou a dizer é<br />

que é importante nessa fase em que nós<br />

nos encontramos que haja uma grande<br />

transparência orçamental e se esta tiver<br />

de ser conseguida com integrações ou<br />

fusões, que isto seja feito.<br />

010 NOABR21<br />

NOABR21 011


ENTREVISTA<br />

ENTREVISTA<br />

Durante muito tempo e para finalizar, nós fomos uma Região muito<br />

demarcada pelo desenvolvimento na agropecuária. Depois da<br />

agropecuária seguiram-se investimentos no turismo e acabaram<br />

ambas as áreas por competir um pouco entre si. Nos Açores, na nossa<br />

posição geoestratégica, será a tecnologia e a ciência o futuro dos<br />

Açores?<br />

Não tenho dúvidas nenhumas<br />

que, tendo em conta o nosso<br />

posicionamento insular geográfico<br />

aqui no Nordeste Atlântico, espalhado<br />

pelos nossos nove bocados plantados<br />

aqui no Atlântico, o futuro é, de facto,<br />

das novas tecnologias. É a ciência,<br />

a investigação e formação. Hoje<br />

em dia nós temos uma localização<br />

geográfica fantástica, temos grandes<br />

mais-valias ao nível por exemplo<br />

de setores estratégicos como a<br />

meteorologia. Nós estamos muito<br />

longe de explorar o potencial que<br />

temos a nível da metereologia,<br />

como estamos longe de explorar o<br />

potencial que a oceanografia e o mar<br />

dos Açores podem representar no<br />

futuro dos Açores, mas também as<br />

pescas e as próprias comunicações.<br />

Por conseguinte, os Açores hoje em<br />

dia são o porta-aviões, implantado,<br />

é verdade, porque já não tem aquela<br />

função física de ser porta-aviões<br />

clássico como era, mas em tempos<br />

de comunicações eu penso até que a<br />

nossa posição geoestratégica hoje em<br />

dia é mais reforçada do que nunca. Eu<br />

estou convencido que a nossa posição<br />

geoestratégica é até mais importante<br />

do que era no passado. Temos que<br />

valorizar muito a nossa relação com<br />

as nossas comunidades. Nós somos<br />

um povo extraordinário, temos<br />

comunidades espalhadas por todo<br />

esse mundo inteiro, mas desde logo<br />

aquela forte comunidade dos Estados<br />

Unidos e Canadá, mas também<br />

das Bermudas. O Brasil, o mundo<br />

imenso que é o Brasil. Nós temos<br />

hoje pessoas no Brasil localizadas em<br />

situações fantásticas, mas temos hoje<br />

açorianos a trabalhar na Finlândia, na<br />

Dinamarca, enfim, em toda a parte.<br />

Em todo o Mundo temos açorianos<br />

e, por conseguinte, esta rede que é o<br />

povo açoriano espalhado pelo Mundo<br />

pode ser de um valor geoestratégico<br />

que está muito longe de ser explorado.<br />

Depois, evidentemente, eu não<br />

esqueço que a nossa Universidade<br />

dos Açores tinha que ser repensada<br />

e refundida. Quer dizer, a nossa<br />

Universidade dos Açores tem que<br />

ter um carinho especial e está sendo<br />

maltratada. Eu próprio também fiz<br />

parte do Conselho Geral, aprovámos<br />

o novo estatuto, implementámos<br />

uma nova orgânica, mas eu penso<br />

que tem de ser feito um esforço<br />

ainda maior. A própria Universidade<br />

também tem que se internacionalizar,<br />

tem tudo para ser um grande polo,<br />

uma grande universidade no meio do<br />

“O que relevo de mais<br />

importante no CESA<br />

é a mobilização e a<br />

disponibilidade de todos<br />

os Parceiros Sociais para<br />

defenderem os seus<br />

sectores específicos,<br />

mas com abertura já<br />

demonstrada para<br />

trabalharmos em conjunto<br />

e em concertação<br />

para Desenvolvimento<br />

económico, social e<br />

cultural dos Açores, sem<br />

nunca esquecer os nossos<br />

emigrantes que são o nosso<br />

prolongamento territorial,<br />

de sangue e de afetividade,<br />

a que junto os imigrantes<br />

que por necessidade ou<br />

outra razão escolheram as<br />

nossas Ilhas para viver e<br />

trabalhar”.<br />

Discurso do Presidente<br />

do CESA na Tomada de<br />

Posse do II Mandato<br />

Atlântico, mas também tem que ter apoios.<br />

Finalmente, os nossos setores tradicionais<br />

que é a questão das pescas e da agricultura<br />

têm de continuar. É verdade que o Turismo<br />

é muito importante, veio catapultar<br />

os Açores para níveis de crescimento<br />

inimagináveis. O setor do turismo é um<br />

setor muito importante, tem um efeito<br />

multiplicador muito grande sobre os outros,<br />

mas é muito dependente do exterior.<br />

Temos que ter aqui uma economia que<br />

seja uma economia multissectorial e multi-<br />

especialista. Não pode ser uma economia<br />

afunilada só num tema, num setor<br />

independente. Os Açores têm que dar muita<br />

importância e jogar com a sua posição<br />

geoestratégica nessa questão da Europa,<br />

Estados Unidos da América, Brasil, China,<br />

África. O Mundo encurtou-se, está mais<br />

próximo, mas continua a haver barreiras e<br />

os Açores no meio dessas barreiras podem<br />

ter uma posição geoestratégica central a<br />

desempenhar no futuro.<br />

012 NOABR21 NOABR21 013


PUB.<br />

REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

OPINIÃO<br />

JUVENTUDES<br />

PARTIDÁRIAS<br />

A NO Revista,<br />

consciente da importância<br />

dos jovens para o contributo<br />

de uma sociedade mais plural, dá a<br />

oportunidade, mais um mês, de dar voz<br />

aos jovens dos oito partidos com assento<br />

parlamentar no parlamento açoriano.<br />

Assim, os jovens têm oportunidade<br />

de expressarem as suas opiniões e<br />

pensamentos sobre as políticas de<br />

desenvolvimento na Região e<br />

não só.<br />

014 NOABR21 NOABR21 015


OPINIÃO<br />

A verdadeira coesão e autonomia é não precisar mais do<br />

dinheiro dos contribuintes portugueses e dos países ricos<br />

da União Europeia. Ao contrário do que parece ser mais<br />

intuitivo, o caminho da criação de riqueza e do bem-estar<br />

social depende muito mais da forma como se alocam os<br />

recursos do que da sua quantidade inicial. Por isso é que<br />

economias livres em territórios inóspitos conseguem<br />

prosperar e territórios ricos em recursos naturais ou<br />

apoiados há décadas por fundos comunitários se mantêm<br />

na pobreza.<br />

A proposta de plano e orçamento para <strong>2021</strong> entregue<br />

pelo governo no parlamento regional prevê gastar 45%<br />

do dinheiro total em investimento público, designado por<br />

plano. São 720 milhões mais outros fundos comunitários<br />

para os diferentes secretários terem o mérito de<br />

distribuir. Ademais, só para os leitores terem uma<br />

noção do que a casa gasta, apenas 54% do orçamento<br />

são receitas próprias da região, quase totalmente<br />

provenientes dos impostos pagos pelos Açorianos. A<br />

restante parte do bolo provém de transferências do<br />

Orçamento de Estado (22%), transferências da União<br />

Europeia (10%) e, como nada disto é suficiente, do<br />

recurso ao endividamento de 250 milhões (15%).<br />

Estes números até podem parecer normais à maioria<br />

dos leitores, porque sempre foi assim por tantos anos<br />

que até se esquece que há outra forma de fazer política<br />

e alocar recursos. Mas para este jovem autor que tem<br />

outras ambições para a sua querida terra representam o<br />

José luís parreira<br />

A fraude do<br />

governo de direita<br />

risco de os nossos recursos continuarem a ser gastos em<br />

projetos sem retorno para a economia, que precisarão<br />

de ser alimentados no futuro. No fundo, a continuação<br />

do socialismo, cuja dívida herdada custar-nos-á 38,5<br />

milhões em juros em <strong>2021</strong> (154 euros por habitante).<br />

Em primeiro lugar, dirão os leitores que o momento<br />

excecional da pandemia em que vivemos justifica<br />

continuar a apoiar a economia, o emprego e os<br />

desempregados, nem que para isso seja necessário de<br />

recorrer ao endividamento. Certo. No entanto, apenas 44<br />

milhões se destinam às medidas criadas em resposta ao<br />

surto da covid-19. Além disso, o investimento em saúde<br />

e educação representam outros 80 milhões de euros, ou<br />

seja, apenas 11% do plano de investimentos. Então, e o<br />

restante investimento? Aqui pouco importa discutir se<br />

o investimento é destinado ao setor público ou privado,<br />

porque todo o dinheiro gasto pelo estado acabará no<br />

setor privado: os funcionários públicos, as empresas<br />

fornecedoras do governo e os credores da região. Quem<br />

mais contribui é também quem mais beneficia. Por isso,<br />

o que este governo continua a fazer é nacionalizar parte<br />

da economia, mantendo as empresas na dependência<br />

do estado. Que os socialistas o fizessem era de esperar,<br />

mas que a direita o faça só mostra falta de valores e<br />

convicções fortes ou, então, deixaram-se corromper<br />

pelo poder de ter o dinheiro na mão. O dinheiro dos<br />

contribuintes, sejam eles açorianos, portugueses ou de<br />

outro qualquer país da Europa, apenas deve ir para os<br />

privados para contratar bens e serviços públicos<br />

que estes forneçam de forma mais eficiente ou para<br />

os indemnizar por perdas derivadas de decisões<br />

governamentais, como o confinamento.<br />

Em segundo lugar, dirão os leitores que havendo<br />

dinheiro da solidariedade nacional e europeia à<br />

nossa disposição, este deve ser usado e o que o que<br />

é preciso é uma melhor aplicação e fiscalização dos<br />

fundos. Todavia, o que ninguém sabe explicar é como<br />

é que se garante isso. Nos próximos anos, há duas<br />

alternativas: podemos continuar a financiar todos<br />

os caprichos de uma maioria governativa, gastando<br />

grandes quantidades, recursos e crédito, ou podemos<br />

confiar na capacidade individual de cada um para<br />

gastar o seu próprio dinheiro. O melhor investimento<br />

que podem fazer para as próximas gerações é ir<br />

pagando a dívida (ajuda não endividar mais) e<br />

reduzir a despesa pública, seja levar à insolvência as<br />

empresas públicas falidas, seja reduzir a dimensão<br />

da administração pública (reformas antecipadas,<br />

p.e.). O dinheiro da “Bazuca” deveria servir para<br />

indemnizar e apoiar temporariamente todos os<br />

prejudicados por essa redução de despesa, a fim de<br />

irem confortavelmente à sua vida. Só assim se pode<br />

baixar impostos sustentadamente e uma direita que<br />

se preze era isto que deveria fazer. Caso contrário,<br />

quando o dinheiro acabar, continuaremos a ter<br />

um governo gordo para sustentar e uma economia<br />

impreparada para andar pelas suas próprias pernas.<br />

Enfim, será uma oportunidade perdida para quebrar<br />

o ciclo vicioso de pobreza e dependência do estado<br />

em que o socialismo nos deixou.<br />

Em terceiro lugar, num tempo que que se vive<br />

uma recessão e o investimento privado é reduzido,<br />

por que razão há o governo de se comportar de<br />

forma diferente, ainda para mais recorrendo ao<br />

endividamento. Tirando as necessidades de acudir<br />

à saúde pública, socorrer os desempregados e<br />

indemnizar a economia, este deveria ser o momento<br />

para se poupar recursos e adiar investimentos. No<br />

entanto, este orçamento não evidencia um único<br />

esforço para poupar qualquer tostão. Só gastar.<br />

Vejamos 2 exemplos rápidos de investimento público,<br />

pensado para <strong>2021</strong>.<br />

A SATA prepara-se para receber mais um aumento<br />

de capital de 165 milhões em <strong>2021</strong> (em 2020 já tinha<br />

pedido um empréstimo de 133M, com garantias<br />

públicas). Estão a brincar! Um avião Twin Otter de<br />

19 lugares novinho em folha custa 7 milhões e um<br />

ATR de 50 lugares custa 10 milhões em segunda<br />

mão. 165 milhões daria para comprar frota e meia<br />

de 6 aviões inter-ilhas, pagos a pronto pagamento.<br />

Isso sim permitia reduzir significativamente o preço<br />

das viagens, nos próximos 10 anos, pois a empresa<br />

já não tinha de imputar ao consumidor o pagamento<br />

da prestação do avião. A SATA, cuja maioria dos<br />

aviões não lhe pertence, deveria entrar num processo<br />

de insolvência como qualquer empresa falida e o<br />

serviço público de transporte inter-ilhas deveria<br />

ser concessionado a outra empresa privada, como a<br />

Binter, pagando o mesmo que pagamos à SATA que é<br />

10.1 milhões de euros. É uma questão de “vender” o<br />

caderno de encargos a nível internacional, nem que<br />

se tenha de pagar um pouco mais.<br />

Em segundo, subsidiamos 10.1 milhões uma<br />

transportadora aérea para “tocar” diariamente em<br />

todas as ilhas e, depois, vamos injetar mais de 10<br />

milhões na Atlânticoline e gastamos outros tantos<br />

milhões a realizar obras de terminais de passageiros<br />

para fazer o mesmo transporte. Isso já não é brincar<br />

com o dinheiro dos outros. É burrice! O transporte<br />

marítimo de passageiros além de ter um custo<br />

operacional por passageiro maior que o avião, ainda<br />

reduz a procura do transporte aéreo, impedindo um<br />

menor preço das passagens aéreas.<br />

Em suma, a direita passa anos a falar mal do<br />

socialismo e a dizer que não funciona, mas quando<br />

está no poder não reduzem a despesa pública,<br />

aumentam-na. Passam anos a chamar xuxalistas e<br />

esquerdalha aos adversários, mas quando chegam<br />

ao governo não têm coragem política para deixar<br />

cair a SATA e negociar o caderno de encargos do<br />

transporte aéreo de passageiros com a iniciativa<br />

privada, a fim de o governo não ter de assumir as<br />

dívidas de ninguém. São anos a criticar o polvo<br />

socialista, mas continuam a manter as empresas<br />

e a economia dependente do estado. Isto tem um<br />

nome: hipocrisia. Deveremos estar satisfeitos apenas<br />

por tirar os socialistas do poder e esperar que estes<br />

sejam melhores gestores da coisa pública? Não. Isso<br />

não é suficiente para os Açores. É preciso mudar de<br />

políticas e a forma de fazer política.<br />

016 NOABR21 NOABR21 017


OPINIÃO<br />

Completados 126 anos<br />

em março do “Decreto<br />

Autonómico” de 1895, fruto<br />

de um intenso trabalho de um<br />

grupo de notáveis açorianos,<br />

o diploma permitiu a<br />

aplicação do (primeiro)<br />

regime de autonomia<br />

administrativa aos três<br />

distritos açorianos da época.<br />

É notório o papel que o<br />

arquipélago dos Açores<br />

desempenhou em várias fases<br />

da História Portuguesa e<br />

como os Açorianos sempre<br />

se destacaram e, sobretudo<br />

nesta última, pelo seu espírito<br />

aguerrido na luta pela<br />

Mariana Marques Quadros<br />

CORSÁRIO<br />

POLÍTICO<br />

identidade regional e pelos<br />

seus direitos, quer sejam eles<br />

administrativos, legislativos<br />

ou políticos que efetivamente<br />

se foram consolidando ao<br />

longo da História Açoriana.<br />

A disputa por palco político<br />

na região e a qualidade<br />

política que temos vindo a<br />

assistir sobretudo como se<br />

verificou após o resultado<br />

das últimas eleições<br />

regionais, de um autêntico<br />

Governo de retalhos, que<br />

se apoia na muleta do<br />

multipartidarismo, mesmo<br />

sendo esse um “acordo de<br />

incidência parlamentar com<br />

o Partido Chega”, chega é a nós<br />

um aspeto pouco plausível, de<br />

corsários políticos, que quer seja<br />

em alto mar como em terra firme,<br />

o principal propósito rendeu-se ao<br />

poder governar.<br />

E, navegamos assim, sem<br />

bússula nem quadrante, mas<br />

não à deriva da distribuição<br />

dos saques mediáticos, que<br />

solidariamente foram utilizados<br />

na figura de André Ventura ou no<br />

aproveitamento da reeleição de<br />

Marcelo, nem que seja porque já<br />

se avista no horizonte as eleições<br />

autárquicas. E qualquer corsário<br />

que se preze assim o faz.<br />

Assim como a afirmação<br />

depreciativa da herança ou legado<br />

regional que justifica determinadas<br />

situações inconvenientes e,<br />

portanto, maus vícios de 24<br />

anos de oposição. Justifica sim,<br />

a “herança” ser distribuída para<br />

mais nomeações políticas e cargos<br />

imprescindíveis para o novo poder<br />

político exarcebado.<br />

Vivemos por isso tempos de<br />

crise e, enquanto jovem, afligeme<br />

a mudança cada vez mais<br />

visível na nossa sociedade, na<br />

dualidade interpretativa que<br />

mentalmente realizo, quer de um<br />

lado o surgimento e representação<br />

de partidos de extrema-direita<br />

na nossa região, quer a disputa<br />

política corrosiva que tem afetado<br />

os bons valores democráticos e<br />

o bem-estar das gentes açorianas<br />

que só querem ver representados<br />

os seus direitos.<br />

Resta-nos a nós acreditar, mesmo<br />

assim, se toda esta combinação<br />

política ideológica que tanto<br />

afirma ser fruto da manifestação<br />

do voto açoriano nas últimas<br />

eleições é de facto o caminho<br />

da resolução dos desafios que<br />

enfrentamos.<br />

E, “se bem me lembro”, quando o<br />

debate deixa de ser sério e o teatro<br />

político se sobrepõe aos reais<br />

interesses públicos, assistimos<br />

novamente a um processo de<br />

descrença na classe política.<br />

018 NOABR21


OPINIÃO<br />

ADEQUAR-NOS AOS NOVOS<br />

HÁBITOS DA<br />

Vitória Silva<br />

JUVENTUDE!<br />

A globalização digital e por<br />

consequência a ascensão de uma<br />

geração de influencers levanos a<br />

refletir sobre as reais inquietudes<br />

dos jovens no seu quotidiano.<br />

Assim, devemos entender<br />

essas inquietudes de forma a<br />

sensibilizar, aplicar e instruir,<br />

através dos meios digitais, aquilo<br />

que são as maiores problemáticas<br />

de uma política de e para a<br />

juventude.<br />

A transformação digital tem de<br />

ser, efetivamente, a ferramenta<br />

essencial para a fundamentação<br />

dos novos hábitos de vida juvenis,<br />

de forma a quebrar aquelas que<br />

são as grandes lacunas no diaa-dia<br />

de alguns jovens. Através<br />

das redes sociais e de todo o<br />

seu meio digital envolvente,<br />

conseguimos chegar à geração<br />

que vive para esta era, tornando-a<br />

imprescindível, pois de outra<br />

forma torna-se desadequado,<br />

desadaptado e intransigente.<br />

Deste modo, a promoção de<br />

estilos/hábitos de vida saudáveis<br />

e os mecanismos que devem<br />

combater o flagelo social<br />

que se vive, em que todos<br />

temos conhecimento na nossa<br />

Região, no que diz respeito às<br />

elevadas taxas de consumos<br />

de estupefacientes, abandono<br />

escolar, gravidez na adolescência<br />

ou outras preocupações, como as<br />

desigualdades de oportunidades<br />

sociais, devem também ser<br />

combatidas, através dos meios<br />

digitais com conteúdos explícitos<br />

e adequados ao público-alvo.<br />

A educação para a saúde deve<br />

ter como princípio educar para<br />

prevenir e não para correr atrás<br />

do prejuízo. Desta forma, é<br />

necessário ter sempre presente<br />

a sua adaptação à realidade<br />

social, para que a sua eficácia<br />

seja benéfica e os jovens de hoje,<br />

sejam os adultos de um amanhã,<br />

como cidadãos sensibilizados<br />

e educados para estas e outras<br />

temáticas da nossa sociedade de<br />

extrema importância.<br />

É através do bem formar que<br />

se deve construir os alicerces<br />

de uma sociedade futura com<br />

menores lacunas sociais. Só<br />

assim iremos conseguir alcançar<br />

resultados benéficos e produtivos<br />

para uma geração que alguns<br />

dizem ser dada como perdida.<br />

Devemos lutar por políticas de<br />

juventude assertivas e adequadas<br />

à realidade do século XXI,<br />

indiscutivelmente seria, se assim<br />

não o fosse.<br />

020 NOABR21 NOABR21 021


OPINIÃO<br />

6 ANOS<br />

A<br />

No passado dia 23 de Fevereiro<br />

foi finalmente aprovada, por<br />

unanimidade, a proposta do PAN para<br />

o fim imediato do abate de animais<br />

errantes e de companhia na região<br />

dos Açores. A primeira iniciativa<br />

apresentada pelo PAN/Açores no<br />

Parlamento Açoriano.<br />

Esta é uma luta já de há 6 anos,<br />

quando o recém-eleito deputado Pedro<br />

Neves, enquanto cidadão, levou à<br />

Assembleia Regional dos Açores uma<br />

petição que tinha como objetivo este<br />

mesmo fim e que foi chumbada pela<br />

maioria parlamentar, num golpe muito<br />

duro para o bem-estar e proteção<br />

dos animais nos Açores. Mas não<br />

desistimos!<br />

Muitos terão achado este mais um<br />

ALEXANDRE DIAS<br />

DEPOIS,<br />

VITÓRIA!<br />

capricho do PAN - “aquele partido<br />

animalista”. Não, não é um capricho<br />

considerar que matar um animal “só<br />

porque ele está a ocupar espaço” seja<br />

um ato atroz e que nos dias de hoje<br />

não deve ser tolerável.<br />

São vidas que estão em jogo. Vidas<br />

de animais que têm capacidade de<br />

sentir amor e carinho, de se divertir<br />

e brincar e que, por outro lado, agem<br />

em legítima defesa se se sentem<br />

ameaçados ou sofrem maus-tratos.<br />

Este processo de socialização<br />

entre o ser humano e os animais,<br />

nomeadamente cães e gatos, remonta<br />

há milhares de anos, por altura do<br />

período Paleolítico, quando os cães<br />

ainda eram lobos.<br />

Inicialmente, não foi uma “amizade”<br />

com um início fácil. Na verdade, não<br />

passava de uma troca de interesses:<br />

de acordo com os historiadores, os<br />

lobos andavam atrás do ser humano<br />

por causa dos restos de comida<br />

deixados para trás, pois perceberam<br />

que, assim, conseguiam obter<br />

alimento facilmente. Começaram<br />

então a partilhar o território com o ser<br />

humano que, por sua vez, começou<br />

a sentir-se mais protegido com os<br />

lobos por perto. No fundo, criou-se<br />

uma sinergia entre ambas as espécies.<br />

Resultado? Os lobos deixaram de<br />

caçar sozinhos.<br />

Já com os gatos o processo<br />

foi diferente. Estima-se que a<br />

domesticação dos gatos teve um<br />

forte impulso de agricultores, que os<br />

usavam para proteger as plantações<br />

de cereais de roedores. Mas já antes,<br />

no Egipto, os gatos eram adorados<br />

como se fossem deuses ou entidades<br />

que simbolizavam sorte.<br />

Desta forma, torna-se evidente como<br />

esta sinergia entre ser humano e<br />

animais é já antiga. Mesmo assim,<br />

na nossa sociedade o abandono<br />

de animais ainda é um fenómeno<br />

generalizado. Com o fim do abate<br />

de animais errantes e de companhia<br />

conseguido pelo PAN nos Açores,<br />

estes animais sofrem menos um<br />

atropelo aos seus direitos.<br />

É fundamental que as diferentes<br />

forças políticas sigam o exemplo<br />

do PAN, um partido que reconhece<br />

a estes animais – e todos os outros<br />

– a senciência e capacidades que a<br />

ciência atesta. A verdade é que os<br />

animais têm hoje um papel muito<br />

significativo na nossa sociedade e<br />

que, sem eles, a nossa vida seria<br />

bastante diferente.<br />

23 de Fevereiro de <strong>2021</strong> é, por isso,<br />

uma data que deve ser relembrada<br />

com um momento progressista, um<br />

momento de viragem para possibilitar<br />

o debate de novos temas. Da parte do<br />

PAN, uma certeza: continuaremos a<br />

levar à discussão pública as questões<br />

transversais à nossa sociedade. Uma<br />

sociedade em que se incluem as<br />

Pessoas, os Animais e a Natureza.<br />

022 NOABR21 NOABR21 023


REPORTAGEM PUB.<br />

REPORTAGEM<br />

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024 NOABR21 NOABR21 025


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

PORTUGAL<br />

ENQUANTO NAÇÃO ESPACIAL:<br />

UMA ESTRATÉGIA PARA UM FUTURO tecnOLÓGICO<br />

ANA SOFIA MASSA<br />

No final de 2000, Portugal tornou-se<br />

membro da Agência Espacial Europeia<br />

(ESA) e o Espaço e a utilização de<br />

tecnologias espaciais sofreram uma<br />

evolução substancial. A participação<br />

do nosso país na ESA, que conta com<br />

a colaboração do Instituto de Apoio<br />

às Pequenas e Médias Empresas e à<br />

Inovação (IAPMEI) e da Autoridade<br />

Nacional de Comunicações (ANACOM),<br />

tem contribuído para a criação de um<br />

conjunto de empresas e instituições<br />

científicas e tecnológicas, cujo objetivo<br />

é desenvolver e disponibilizar soluções<br />

para os desafios científicos e tecnológicos<br />

que se colocam neste setor.<br />

Atualmente, observam-se<br />

mudanças estruturantes no<br />

setor espacial, quer seja pela<br />

crescente implementação<br />

de tecnologias e serviços<br />

espaciais no dia a dia da<br />

população, como também<br />

na difusão de sistemas<br />

educacionais. Nos últimos<br />

anos tem-se verificado um<br />

forte investimento neste setor,<br />

formando assim um novo<br />

“ecossistema empresarial”<br />

(p.7). Todavia e atendendo a<br />

que este é um dos setores que<br />

mais evolui tecnologicamente<br />

e a velocidades difíceis às<br />

vezes de acompanhar, muitos<br />

países têm definido novas<br />

linhas de posicionamento<br />

estratégico, de maneira a<br />

influenciar investimentos<br />

futuros no setor.<br />

Neste âmbito, Portugal<br />

apresenta assim uma<br />

estratégia, alinhada com a<br />

sua localização geográfica<br />

e com o seu ecossistema<br />

científico e empresarial, mas<br />

também com a ambição de<br />

um novo posicionamento a<br />

nível internacional. Estabelece<br />

ainda o desenvolvimento e<br />

evolução dos quadros jurídico,<br />

financeiro, institucional,<br />

de internacionalização<br />

e cultural/educacional<br />

capazes de impulsionar o<br />

desenvolvimento do sector<br />

espacial em Portugal através<br />

de iniciativas de carácter<br />

nacional e da cooperação<br />

internacional para a próxima<br />

década.<br />

Depreende-se assim que, quer<br />

no território continental como<br />

nos arquipélagos<br />

dos Açores e da<br />

Madeira, há que<br />

continuar a apoiar<br />

o crescimento deste<br />

setor. Após a adesão<br />

à ESA, Portugal<br />

tem revelado uma<br />

rápida adaptação<br />

e integração<br />

nos programas<br />

espaciais. Como<br />

resultado deste<br />

investimento, o<br />

ecossistema espacial<br />

026 NOABR21<br />

NOABR21 027


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

A SEGURANÇA E O BEM-ESTAR DA<br />

SOCIEDADE “DEPENDEM CADA VEZ<br />

MAIS DA INFORMAÇÃO E DOS SERVIÇOS<br />

PRESTADOS A PARTIR DO ESPAÇO<br />

empresarial português tem um retorno<br />

económico superior a 120% na última<br />

década, envolvendo uma força total<br />

de trabalho de mais de 1400 pessoas,<br />

incluindo 300 engenheiros qualificados,<br />

e gerando um volume de negócios<br />

relacionados com tecnologias espaciais<br />

de cerca de 890 milhões de euros entre<br />

2006 e 2015.<br />

De acordo com uma publicação da<br />

Fundação para a Ciência e a Tecnologia,<br />

“Estratégia Portugal Espaço 2030.<br />

Uma Estratégia de Investigação,<br />

Inovação e Crescimento para Portugal”,<br />

Manuel Heitor, Ministro da Ciência,<br />

Tecnologia e Ensino Superior, afirma<br />

que a segurança e o bem-estar da<br />

sociedade “dependem cada vez mais<br />

da informação e dos serviços prestados<br />

a partir do Espaço, sendo de assinalar<br />

a transferência de competências<br />

adquiridas entre este setor e outros<br />

como a agricultura, as pescas, a<br />

monitorização de infraestruturas, o<br />

desenvolvimento urbano, a defesa e a<br />

segurança, e mesmo o setor da saúde<br />

pública e monitoração de epidemias”<br />

(p.7). Depreende-se, então, que a<br />

aposta do Espaço na sociedade europeia<br />

continue a aumentar, atendendo a que<br />

atualmente a Europa cada vez mais se<br />

torna unificada e mais próxima a nível<br />

social.<br />

Esclarece ainda Manuel Heitor que<br />

“o Espaço deve ser<br />

encarado como um bem<br />

público, a associar às nossas<br />

instituições e ambições<br />

coletivas, sendo crítico<br />

democratizar o acesso ao<br />

Espaço. É neste âmbito que<br />

as tecnologias espaciais<br />

são incontornáveis para o<br />

futuro da Humanidade”<br />

(p.7), requerendo, assim,<br />

continuar o investimento<br />

na educação e cultura<br />

para o Espaço, por forma<br />

a atrair jovens cientistas e<br />

engenheiros e a estimular<br />

o interesse pelas áreas<br />

da ciência, tecnologia,<br />

matemática, entre outros.<br />

O objetivo principal recai<br />

na possibilidade de as<br />

tecnologias espaciais<br />

poderem ser um<br />

instrumento através do<br />

qual seja possível “capacitar<br />

o Mundo para a Paz” (p.7).<br />

Atendendo ao presente<br />

projeto, a análise<br />

da Organização<br />

para a Cooperação<br />

e Desenvolvimento<br />

Económico (OCDE) ao<br />

retorno do investimento<br />

de Portugal na ESA<br />

aponta para um efeito<br />

multiplicador entre 4 e 5 do<br />

financiamento público de<br />

atividades de Investigação e<br />

Desenvolvimento (I&D). “O<br />

posicionamento atlântico<br />

de Portugal é assim crítico<br />

e abre novas oportunidades<br />

no contexto internacional”<br />

(p.9). De acordo com<br />

Manuel Heitor, a localização<br />

única da Região Autónoma<br />

dos Açores assume uma<br />

posição geoestratégica<br />

adequada para a criação de<br />

uma infraestrutura espacial<br />

para o lançamento de<br />

satélites. “A sua localização<br />

em território da União<br />

Europeia, no Espaço<br />

Schengen, tão perto da<br />

Europa Continental como<br />

do continente americano<br />

e com uma extensa<br />

cobertura oceânica de mais<br />

de 1500km em qualquer<br />

direção, proporciona<br />

vantagens absolutamente<br />

únicas para a promoção e<br />

desenvolvimento do “New<br />

Space”, especialmente<br />

através do reforço em curso<br />

das infraestruturas de<br />

monitorização de satélites,<br />

como antenas, e, sobretudo,<br />

a instalação de novos<br />

serviços de lançamento<br />

de satélites, incluindo o<br />

028 NOABR21 NOABR21 029


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

HOJE PODEMOS DIZER QUE<br />

OS AÇORES NÃO SÃO APENAS<br />

MAR, SÃO TAMBÉM ESPAÇO<br />

potencial para a instalação de um porto<br />

espacial” (p.9). O desafio consiste, assim,<br />

em garantir a instalação ao nível mundial<br />

de um porto espacial aberto a todos os<br />

operadores internacionais. Deste modo,<br />

a “instalação de uma nova geração<br />

de serviços de lançadores de satélites<br />

ambientalmente sustentáveis e seguros,<br />

abertos ao mundo, pode criar um novo<br />

posicionamento de Portugal no mundo”<br />

(p.9).<br />

É neste contexto que o presente plano<br />

“Portugal Espaço 2030”, aprovado pelo<br />

Governo, mobiliza diversos setores da<br />

sociedade para o Espaço, “valorizado<br />

como um bem público” (p.9), potenciando<br />

novas oportunidades de cooperação<br />

institucional, industrial e internacional<br />

e contribui para o desenvolvimento de<br />

tecnologias inovadoras e competitivas<br />

no mercado internacional. Para Manuel<br />

Heitor, o desenvolvimento desta agenda<br />

requer, também, o estabelecimento de uma<br />

entidade reguladora que regista, autoriza e<br />

regula as atividades e os objetos espaciais,<br />

devendo funcionar como interlocutor<br />

único entre o ator espacial e as entidades<br />

públicas que, em razão da matéria, devam<br />

intervir no procedimento. Estas entidades<br />

devem ser criadas e reguladas através<br />

de um quadro legal próprio, competitivo<br />

internacionalmente.<br />

Já Gui Menezes, antigo Secretário<br />

Regional do Mar, Ciência e Tecnologia,<br />

Governo Regional dos Açores, considera<br />

ser “inegável a dimensão que a Região<br />

Autónoma dos Açores confere a Portugal<br />

por via da sua localização no centro<br />

do Atlântico Norte. A essa dimensão<br />

essencialmente marítima, junta-se uma<br />

dimensão espacial que cada vez mais<br />

deixa de ser objeto de análise e exploração<br />

exclusiva das maiores potências. Hoje<br />

podemos dizer que os Açores não são<br />

apenas Mar, são também Espaço” (p.11).<br />

Para o antigo Secretário, os Açores<br />

desempenham um papel relevante fruto<br />

dos investimentos que têm sido feitos<br />

em infraestruturas, redes e projetos<br />

relacionados com esta temática. Gui<br />

Menezes começa por referir a integração<br />

na rede NEREUS (Rede de Regiões<br />

Utilizadoras de Tecnologias Espaciais)<br />

desde a sua fundação, que tem permitido<br />

acompanhar e contribuir para a definição<br />

da Estratégia Europeia do Espaço. É<br />

nos Açores que se encontra a primeira<br />

estação da Agência Espacial Europeia<br />

(AEE), instalada em Portugal e uma das<br />

primeiras estações da rede ESTRACK,<br />

com a capacidade de fazer rastreio de<br />

lançadores de satélites, à qual foi anexado<br />

um dos elementos do segmento terrestre<br />

do sistema global europeu de navegação<br />

por satélite, uma Galileo Sensor Station.<br />

“Ainda neste âmbito, os Açores estão a<br />

apostar na instalação de duas estações<br />

de radioastronomia integradas na Rede<br />

Atlântica de Estações Geodinâmicas<br />

Espaciais (RAEGE) que, fazendo uso<br />

de meios tecnológicos de rádio, tempo<br />

e frequência, se constituem como as<br />

mais adequadas infraestruturas para<br />

a observação do Espaço profundo<br />

e das fontes geradoras de sinal<br />

eletromagnético que o constituem”<br />

(p.11).<br />

De acordo com Gui Menezes, é fulcral<br />

para a Região continuar a apostar<br />

não só nas tecnologias espaciais e<br />

infraestruturas com elas relacionadas,<br />

mas também em infraestruturas de<br />

armazenamento, processamento<br />

e disponibilização de dados de<br />

observação da Terra e de serviços deles<br />

derivados. Por exemplo, ao usufruir<br />

da proximidade das infraestruturas<br />

de receção de dados provenientes<br />

dos satélites Sentinel, os Açores<br />

“poderão oferecer uma plataforma<br />

de apoio aos programas Copernicus<br />

e Galileo”. Para além disso, o antigo<br />

Secretário defende que há que apostar<br />

no desenvolvimento científico e em<br />

áreas como o Oceano, a Atmosfera e o<br />

Clima, atendendo a que estas áreas de<br />

investigação, bem como as de ponta,<br />

poderão “beneficiar da aplicabilidade<br />

de dados de observação da Terra e do<br />

Espaço e do envolvimento da Região<br />

na criação do Atlantic International<br />

Research Centre (AIR Centre)” (p.11),<br />

cuja sede poderá ser nos Açores. “Todas<br />

as ilhas possuem um conjunto de<br />

030 NOABR21 NOABR21 031


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

instalações, equipamentos e serviços<br />

de apoio à atividade empresarial, como<br />

portos, aeroportos, estradas e ainda<br />

parques tecnológicos e industriais, com<br />

excelentes infraestruturas, e uma rede<br />

de comunicações de transmissão de alta<br />

velocidade que liga os Açores a todo o<br />

mundo” (p.12).<br />

Também Paulo Ferrão, presidente<br />

da FCT, considera que o Espaço tem<br />

despertado nas últimas décadas uma<br />

“ambição de explorar novas fronteiras,<br />

de promover melhor conhecimento<br />

da Terra e de disponibilizar sistemas<br />

globais de comunicação, o sonho de<br />

protagonizar a aventura espacial e o<br />

conhecimento de base científica que<br />

indiscutivelmente está associado ao<br />

lançamento de veículos espaciais, à<br />

operação de satélites ou à exploração do<br />

espaço” (p.15).<br />

Nesta estratégia apresentada, são<br />

propostos três eixos estratégicos<br />

principais que serão implementados<br />

em colaboração com a ESA, a Comissão<br />

Europeia e outros parceiros. No que<br />

concerne ao Eixo 1, pretende-se<br />

estimular a exploração de dados e sinais<br />

espaciais através de serviços e aplicações<br />

de base espacial ou habilitadas por<br />

tecnologias espaciais, promovendo novos<br />

mercados e o emprego qualificado em<br />

diversas áreas. O Eixo 2 visa fomentar<br />

o desenvolvimento, construção e<br />

operação de equipamentos, sistemas e<br />

infraestruturas espaciais e de serviços<br />

de produção de dados espaciais, com<br />

ênfase em mini, micro e nano satélites,<br />

mas também abrindo novas áreas de<br />

intervenção em Portugal para serviços<br />

de lançadores e alargando as atuais<br />

atividades de monitorização e rastreio<br />

de satélites e observação da Terra. Por<br />

fim, o Eixo 3 pretende continuar a<br />

desenvolver a capacidade e competências<br />

nacionais na área do Espaço através<br />

da investigação científica, inovação,<br />

educação e cultura científica, permitindo<br />

a sustentabilidade a longo prazo das<br />

infraestruturas, serviços e aplicações<br />

espaciais.<br />

A Estratégia Portugal Espaço<br />

2030 preconiza, para o<br />

desenvolvimento dos três eixos<br />

apontados, o desenvolvimento<br />

de um programa-quadro<br />

envolvendo cinco linhas de ação<br />

jurídica, financeira, institucional,<br />

de internacionalização e de<br />

cultura científica. No quadro<br />

financeiro, prevê-se estimular<br />

uma estratégia de investimento,<br />

começando por complementar<br />

e alargar o atual nível de<br />

investimento público na ESA,<br />

suportado financeiramente<br />

através da FCT, I.P., com o apoio<br />

do IAPMEI e da ANACOM,<br />

bem como adequar os fundos<br />

estruturais e programas de<br />

financiamento público ao<br />

desenvolvimento e capacitação<br />

do setor do Espaço, de modo<br />

a que o investimento no setor<br />

possa alcançar um fator de<br />

multiplicação de cinco nos<br />

próximos cinco anos; e promover<br />

a diversificação das fontes<br />

de investimento, incluindo o<br />

acesso ao Banco Europeu de<br />

Investimento, entre outros<br />

fundos internacionais.<br />

No quadro institucional, está em<br />

vista a criação de um “agente<br />

regulador das atividades espaciais<br />

em Portugal, responsável por<br />

executar ações para monitorizar<br />

032 NOABR21 NOABR21 033


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

e regular atividades espaciais em<br />

Portugal, em linha com o projeto de<br />

proposta de lei de acesso e exercício<br />

de atividades espaciais” (p.34);<br />

bem como de um “agente promotor<br />

adequado e específico para o setor do<br />

Espaço, com vista à futura criação da<br />

Agência Espacial Portuguesa” (p.34).<br />

Está também prevista uma missão de<br />

preparação para a criação da agência<br />

espacial com o apoio da ESA, de<br />

especialistas internacionais, cabendo<br />

assim assegurar a nova antena de 15<br />

metros a ser instalada na ilha de Santa<br />

Maria, a qual será propriedade da FCT,<br />

I.P.; explorar a possibilidade da criação<br />

de um centro de dados do Programa<br />

Copernicus em Portugal, o qual iria<br />

auxiliar na disseminação de dados,<br />

entre outras estratégias.<br />

No âmbito da internacionalização,<br />

prevê-se o desenvolvimento de<br />

uma “agenda para o Mediterrâneo,<br />

garantindo a integração de dados<br />

espaciais para o desenvolvimento<br />

agroindustrial, a sustentabilidade<br />

energética e a gestão da água,<br />

através da cooperação com países<br />

do Norte de África e Médio Oriente,<br />

designadamente no quadro do<br />

lançamento emergente a nível europeu<br />

do Programa PRIMA (Partnership<br />

for Research and Innovation in the<br />

Mediterranean Area)” (p.35), assim<br />

como a possibilidade de criar novas<br />

parcerias internacionais com países<br />

que ainda não desenvolveram ou estão<br />

em vias de desenvolver capacidades<br />

espaciais.<br />

Por fim, no quadro da educação e<br />

cultura científica para o Espaço, o<br />

objetivo centra-se no reforço de uma<br />

“estratégia humanista para o Espaço”<br />

(p.36) que passa por promover<br />

programas de difusão da cultura<br />

tecnológica para o Espaço, estimular<br />

o enriquecimento dos currículos<br />

escolares no âmbito de matérias<br />

relacionadas com o setor espacial e,<br />

por fim “lançar e promover um portal<br />

na Internet que possibilite o acesso<br />

público a informação sobre programas<br />

espaciais, atividades científicas e<br />

tecnológicas, recursos de disseminação<br />

de imagens de satélite, oportunidades<br />

de formação, exposições e conferências,<br />

entre outros conteúdos” (p.36).<br />

Revisitando as palavras de Gui Menezes<br />

relativamente à posição “ímpar”<br />

da Região Autónoma dos Açores,<br />

detentora de uma Zona Económica<br />

Exclusiva (ZEE) com uma área de<br />

aproximadamente 1.000.000 km²,<br />

poderá concluir-se que a região “tem<br />

as premissas de base para garantir<br />

o desenvolvimento decorrente desta<br />

NUM FUTURO<br />

PRÓXIMO,<br />

PORTUGAL SE<br />

POSICIONARÁ<br />

COMO UMA<br />

VERDADEIRA<br />

NAÇÃO ESPACIAL<br />

mudança” (p.12). Já Manuel Heitor<br />

fornece uma perspetiva de “prestígio<br />

nacional” (p.9), afirmando que, num<br />

futuro próximo, Portugal se posicionará<br />

“como uma verdadeira nação espacial,<br />

com capacidade de assumir os<br />

novos desafios do sector. Tal é, aliás,<br />

imperativo para um país que se procura<br />

afirmar no cenário internacional pela<br />

ciência e inovação” (p.9).<br />

Bibliografia:<br />

Estratégia Portugal Espaço 2030. Uma<br />

Estratégia de Investigação, Inovação e<br />

Crescimento para Portugal, Aprovada<br />

no Conselho de Ministros de 15 de<br />

fevereiro de 2018. (Resolução n.º<br />

30/2018), Publicada em “Diário da<br />

República” (1.ª Série, n.º 50), 12 de<br />

maço de 2018.<br />

034 NOABR21 NOABR21 035


PUB.<br />

REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

PUB.<br />

036 NOABR21 NOABR21 037


REPORTAGEM<br />

A ENERGIA<br />

RENOVÁVEL MARINHA<br />

COMO ALTERNATIVA<br />

O aproveitamento das ondas está em<br />

fase de demonstração, ou seja, encontrase<br />

em fase de teste no mar e apenas<br />

alguns dos estudos alcançaram a fase<br />

de testes no mar em condições reais,<br />

nomeadamente, o projeto Pelamis,<br />

Tecnologia Powerbuoy, Tecnologia BOLT,<br />

Tecnologia WaveRoller, entre outros.<br />

Devido aos estudos já desenvolvidos,<br />

esta energia desempenha um papel<br />

importante na transição para um<br />

sistema energético global mais<br />

sustentável.<br />

Em Portugal existem três projetos<br />

de demonstração da ERM: dois de<br />

tecnologia das ondas (WaveRoller em<br />

Peniche) e o Centro das Ondas na ilha<br />

do Pico, nos Açores e um de energia<br />

eólica offshore (projeto Windfloat na<br />

Aguçadora).<br />

A energia renovável marinha<br />

(ERM) “é qualquer tecnologia<br />

que extraia energia renovável<br />

do oceano. Abrange as energias<br />

eólicas (tanto longe como perto da<br />

costa), as energias provenientes<br />

das ondas, das correntes de maré,<br />

do gradiente de salinidade e a<br />

energia gerada pelas diferenças<br />

de temperatura”.<br />

SOFIA CORDEIRO<br />

O Centro das Ondas na ilha do<br />

Pico “foi, ao longo da última<br />

década, um importante centro de<br />

teste europeu para tecnologias de<br />

energia das ondas à escala real”. Foi<br />

construído entre 1996 e 1999 como<br />

um “projeto piloto” de energia das<br />

ondas, financiado por programas de<br />

investigação e inovação da Comissão<br />

Europeia (Projetos JOULE1), mas<br />

também por financiamento nacional<br />

(Programa Energia) e pelas empresas<br />

EDP e Electricidade dos Açores<br />

(EDA), sensivelmente em partes<br />

iguais. A obra ficou concluída no<br />

verão de 1998. Em setembro do<br />

mesmo ano, durante a instalação do<br />

equipamento elétrico no interior da<br />

Central, ocorreu uma tempestade<br />

que provocou uma inundação e<br />

danos graves nos componentes<br />

elétricos. Os primeiros testes da<br />

Central atrasaram-se, por este<br />

motivo, até ao verão do ano seguinte.<br />

Só quatro anos mais tarde viria a ser<br />

possível o funcionamento<br />

NOABR21 039


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

regular da Central, com o apoio<br />

do Programa PRIME (DEMTEC)<br />

da Agência Nacional de Inovação.<br />

O Programa de Incentivos à<br />

Modernização da Economia<br />

(PRIME), lançado em 2003, tinha<br />

um instrumento de financiamento,<br />

designado DEMTEC, para apoio a<br />

“projetos piloto” relativos a soluções<br />

tecnologicamente inovadoras.<br />

Foi no âmbito deste programa<br />

nacional financiado pela Agência<br />

de Inovação (atual ANI – Agência<br />

Nacional de Inovação), que o<br />

WavEC, criado em 2003, mobilizou<br />

o apoio de parceiros portugueses<br />

para submeter uma proposta de<br />

recuperação e arranque da Central<br />

do Pico.<br />

A Central de Ondas da Ilha do Pico<br />

“é uma versão costeira de uma<br />

tecnologia designada por ‘Coluna<br />

de Água Oscilante’, vulgarmente<br />

conhecida pela sigla CAO. Esta<br />

tecnologia é constituída por uma<br />

estrutura oca, neste caso em betão,<br />

formando uma câmara pneumática<br />

sobre a superfície livre interior<br />

da água. A câmara comunica<br />

com a atmosfera (lado de terra),<br />

através de uma conduta contendo<br />

uma turbina de ar acoplada a um<br />

gerador elétrico, e com o mar<br />

exterior através de uma abertura<br />

submersa, existente na parede<br />

frontal da câmara. As ondas do<br />

mar, ao propagarem-se para o<br />

interior da câmara através da<br />

abertura submersa, fazem oscilar<br />

verticalmente a água no seu interior.<br />

Consequentemente, movimenta-se<br />

um fluxo de ar interior em sentidos<br />

alternados, através da conduta que<br />

liga a câmara à atmosfera. Esta<br />

passagem de ar aciona a turbina<br />

instalada na conduta, que deve ser<br />

de escoamento reversível (isto é,<br />

a turbina roda sempre no mesmo<br />

sentido independentemente do<br />

escoamento de ar ser de ou para a<br />

atmosfera)”.<br />

Os dados adquiridos na Central<br />

do Pico, ao longo de vários<br />

anos de operação, “têm sido<br />

fundamentais para a melhor<br />

compreensão deste tipo de<br />

tecnologia”. A instrumentação<br />

instalada para análise em tempo<br />

real das condições do mar e de<br />

operação da turbina “permitiram<br />

tirar conclusões importantes sobre<br />

o projeto deste tipo de centrais”.<br />

O gráfico abaixo representado<br />

mostra a evolução da produção<br />

de energia elétrica nos últimos 10<br />

anos de operação da Central. A<br />

melhoria gradual das condições de<br />

funcionamento nos primeiros três<br />

anos “traduziu-se num aumento<br />

substancial de produção de<br />

energia elétrica em 2010, ano em<br />

que foram implementados, com<br />

sucesso, a operação autónoma e o<br />

controlo remoto da central (sem<br />

operador local). Em 2011, uma falha<br />

grave no gerador, seguida de um<br />

problema no inversor, obrigaram<br />

a uma paragem prolongada para<br />

diagnóstico e reparação dos<br />

problemas” assim como em 2017.<br />

Figura 1 - Energia Elétrica produzida pela Central<br />

nos últimos 10 anos<br />

Brito e Melo, Ana. “Um olhar sobre a Central Piloto<br />

Europeia de energia das ondas na ilha do Pico”. 2018.<br />

WaVEC Offshore Renewables.<br />

Segundo um documento elaborado<br />

em 2018 designado por “Um olhar<br />

sobre a Central Piloto Europeia de<br />

energia das ondas na ilha do Pico”,<br />

a autora, Ana Brito e Melo, afirma<br />

que a produção elétrica da Central<br />

“ficou, no entanto, muito aquém<br />

do previsto para uma Central de<br />

400 kW de potência nominal. Os<br />

constrangimentos financeiros não<br />

possibilitaram a correção de todos<br />

os problemas técnicos e limitaram a<br />

sua plena operação. As deficiências<br />

040 NOABR21 NOABR21 041


REPORTAGEM<br />

estruturais da Central, na sua parte<br />

submersa, e o seu agravamento ao<br />

longo dos anos inviabilizam a sua<br />

continuidade por muito mais tempo”,<br />

mas a central “cumpriu muito bem<br />

o seu papel de unidade piloto, de<br />

demonstração e de formação, sendo,<br />

de longe, a central de energia das<br />

ondas com mais longevidade, e, talvez,<br />

com mais visibilidade do mundo”.<br />

A autora adiciona que há vários<br />

fatores que afetaram a imagem da<br />

Central do Pico, nomeadamente “o<br />

seu enquadramento arquitetónico<br />

deficiente, a fraca disponibilidade<br />

para campanhas de informação<br />

e sensibilização pública e a falta<br />

de condições para permanência<br />

de equipas no local”. No entanto,<br />

o principal fator que afetou a sua<br />

reputação, quer nos Açores quer<br />

no Continente, “foi uma errada<br />

expectativa para a sua missão,<br />

nomeadamente na altura em que foi<br />

construída”.<br />

Quanto à energia eólica offshore,<br />

a Europa detém um elevado<br />

potencial eólico offshore. O<br />

continente europeu é, atualmente,<br />

o líder mundial em parques eólicos<br />

offshore. No fim do primeiro<br />

semestre de 2011 estavam em<br />

operação 1247 turbinas eólicas com<br />

uma capacidade acumulada de 3294<br />

MW, correspondendo a 49 parques<br />

eólicos existentes em nove países<br />

europeus. Em 2010 a capacidade<br />

média de cada aerogeador instalado<br />

era de 3,2 M em parque eólicos com<br />

uma dimensão média de 155,3 MW.<br />

“A integração na rede elétrica da<br />

energia produzida nos parques<br />

eólicos offshore apresentase<br />

como um novo desafio”,<br />

implicando custos elevados e<br />

o desenvolvimento de novas<br />

tecnologias, tais como navios de<br />

instalação, subestações ou cabos<br />

de transmissão. No entanto, são<br />

vários os projetos que visam o<br />

desenvolvimento de super-redes<br />

de recolha e transporte de energia<br />

eólica offshore.<br />

Os custos de capital associados à<br />

produção das energias renováveis<br />

“são ainda demasiado elevados”<br />

para que aquelas tecnologias sejam<br />

competitivas. Os custos da energia<br />

eólica offshore são, atualmente,<br />

2,5 vezes superiores aos custos<br />

da eólica em terra (onshore),<br />

enquanto os custos da energia das<br />

ondas são seis vezes superiores.<br />

No entanto, os especialistas esperam<br />

que essa diferença venha a diminuir<br />

significativamente, o que indica<br />

que pode surgir uma oportunidade<br />

de investimento nesta indústria no<br />

futuro.<br />

NOABR21 043


REPORTAGEM<br />

Em Portugal, o desenvolvimento<br />

de energias offshore envolve<br />

custos e riscos de desenvolvimento<br />

muito elevados. Por isso, o<br />

desenvolvimento deste tipo de<br />

tecnologias necessita de apoio<br />

financeiro, não só no apoio em<br />

inovação e desenvolvimento, como<br />

em cofinanciamento público-privado<br />

dos projetos de demonstração,<br />

e ainda de tarifas bonificadas à<br />

produção de energias.<br />

O investimento em fontes de energias<br />

limpas pode resultar em diferentes<br />

benefícios, o que poderá motivar o<br />

apoio público. Estes benefícios são<br />

efeitos externos da utilização desta<br />

energia como a redução de poluentes<br />

locais com populações, mas também<br />

a redução de emissões de dióxido de<br />

carbono e de poluentes atmosféricos e<br />

ainda redução do impacto visual entre<br />

outros.<br />

Pelo contrário, existem também efeitos<br />

negativos como os impactos causados<br />

pelo ruído, perda de biodiversidade<br />

associada à instalação e operação de<br />

dispositivos de energia, mortalidade<br />

de aves devido à colisão com turbinas<br />

eólicas e impactos na biodiversidade<br />

associados aos efeitos dos campos<br />

eletromagnéticos produzidos pelos<br />

cabos enterrados no fundo do mar.<br />

Relativamente aos apoios ao<br />

investimento nestas energias o<br />

investigador privado não investirá sem<br />

apoio público, pois as receitas de venda<br />

de eletricidade não são suficientes para<br />

compensar os custos de capital nos três<br />

tipos de infraestruturas de ERM. “Estas<br />

tecnologias ainda não atingiram um<br />

nível de maturidade suficiente, ao<br />

contrário do que tem sido observado,<br />

por exemplo, na indústria de energia<br />

eólica onshore”. Ainda que os custos<br />

de capital tendam a diminuir ao longo<br />

do tempo, os resultados deste trabalho<br />

sugerem que a ERM (incluindo energia<br />

eólica offshore, nearshore e energia das<br />

ondas) não será competitiva mesmo no<br />

longo prazo.<br />

De acordo com Maria Cunha-e-Sá, Ana<br />

Faria Lopes e Filipa Saldanha, “existem<br />

muitos fatores ao nível local que são<br />

cruciais para garantir a viabilidade das<br />

ERM. Por exemplo, a profundidade no<br />

local de instalação, a fonte de energia<br />

(velocidade do vento ou energia das<br />

ondas), a distância à rede elétrica,<br />

entre outros. Foram analisados vários<br />

locais ao longo da costa portuguesa<br />

para perceber como é que, do ponto de<br />

vista social, as diferentes características<br />

locais podem influenciar a viabilidade<br />

do investimento. No caso da energia<br />

das ondas, concluiu-se que nenhum dos<br />

locais selecionados parece ser viável<br />

devido aos elevados custos de capital,<br />

dado que se trata de uma indústria<br />

nascente. No caso da eólica nearshore,<br />

os impactos paisagísticos podem ser<br />

determinantes. No que se refere à<br />

NOABR21 045


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

energia eólica offshore, enquanto o fator<br />

de capacidade (ou seja, a percentagem<br />

de tempo durante o qual a turbina<br />

eólica está a operar, dado os regimes<br />

de vento) é particularmente relevante<br />

para a instalação deste tipo de energia,<br />

a distância à rede também se revela<br />

importante”.<br />

Ao nível de Inovação e Desenvolvimento<br />

em Portugal, destaca-se um conhecimento<br />

científico importante, reconhecido a nível<br />

mundial, em particular na energia das<br />

ondas fruto dos projetos de investigação<br />

que têm sido desenvolvidos nas últimas<br />

três décadas e dos pilotos pioneiros que<br />

já foram implementados. Em particular, a<br />

atividade de Inovação e Desenvolvimento<br />

começou nos anos 80, com o<br />

desenvolvimento dos primeiros trabalhos<br />

em energias das ondas. Na década de 90,<br />

os trabalhos continuaram sobretudo no<br />

âmbito do desenvolvimento do primeiro<br />

projeto de demonstração, a central do<br />

Pico. No entanto, só em meados da<br />

primeira década de 2000 existiu um maior<br />

envolvimento de entidades portuguesas<br />

neste sector, sobretudo a nível de projetos<br />

Europeus.<br />

De acordo com Maria Cunha-e-Sá, Ana<br />

Faria Lopes e Filipa Saldanha, a indústria<br />

das ERM é um “investimento de<br />

longo prazo”. A energia eólica offshore<br />

poderá ser viável do ponto de vista<br />

social. Em Portugal, as Feed-in-Tariffs<br />

(FiTs) têm sido utilizadas para apoiar<br />

projetos de energia renovável. A decisão<br />

de investir em energia eólica nearshore<br />

“está altamente dependente dos custos<br />

associados à degradação da paisagem<br />

que dela pode resultar. Uma vez que não<br />

existem estudos de valoração que estimem<br />

esses custos para Portugal, utilizámos<br />

estimativas obtidas em estudos<br />

realizados noutros países, depois de<br />

devidamente ajustados para Portugal”.<br />

Os resultados do estudo realizados<br />

pela “Iniciativa Gulbenkian Oceanos”<br />

sugerem a necessidade de promover<br />

uma visão “mais integrada e de longo<br />

prazo” que garanta estabilidade à<br />

indústria das ERM. Por exemplo,<br />

o apoio às ERM, através de FiTs,<br />

ou mesmo os objetivos nacionais<br />

propostos para as ERM, conforme<br />

definidos no Plano de Ação para as<br />

Energias Renováveis (PNAER), “não<br />

têm sido consistentes ao longo do<br />

tempo”, o que reduz a capacidade<br />

de atração dessas tecnologias em<br />

Portugal. Uma visão de longo prazo<br />

para a indústria ERM reduziria a<br />

incerteza regulatória, contribuindo<br />

para o cumprimento dos objetivos<br />

estabelecidos na Estratégia Nacional<br />

para o Mar e no PNAER.<br />

A decisão de investir em energia eólica<br />

nearshore “está altamente dependente<br />

dos custos associados à degradação<br />

da paisagem que dela pode resultar,<br />

uma vez que não existem estudos de<br />

valorização que estimam esses custos<br />

para Portugal”.<br />

Bibliografia:<br />

Brito e Melo, Ana. Um olhar sobre a<br />

Central Piloto Europeia de energia das<br />

ondas na ilha do Pico. (2018). WaVEC<br />

Offshore Renewables.<br />

Cunha-e-Sá, Maria A.; Lopes, Ana<br />

Faria; Saldanha, Filipa. Energias<br />

Renováveis Marinhas em Portugal.<br />

(2017). Fundação Calouste Gulbenkian.<br />

Silva, C. A. S., Matias, S., Mafra, C.,<br />

Sim-Sim, F., Estaqueiro, A., Simões, T.,<br />

& Cardoso, A. (2011). Roadmap para<br />

as energias renováveis offshore em<br />

Portugal. LNEG/UESEO, Lisboa.<br />

046 NOABR21 NOABR21 047


PUB.<br />

REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

PUB.<br />

048 NOABR21 NOABR21 049


REPORTAGEM<br />

TENDÊNCIAS GLOBAIS<br />

DE EMPREGO PARA A<br />

JUVENTUDE:<br />

tecnologia e o futuro dos empregos<br />

SARA BORGES<br />

A tecnologia destruirá empregos e<br />

agravará a desigualdade ou trará<br />

empregos mais significativos e<br />

sociedades mais saudáveis? Esta questão<br />

preocupa a humanidade desde que o<br />

avanço tecnológico assumiu alguns<br />

trabalhos manuais e aglomera diversas<br />

conspeções entre investigadores e<br />

instituições.<br />

Deste modo, o presente artigo pretende<br />

identificar as inovações que podem<br />

levar a novos modelos de oportunidades<br />

de trabalho para os jovens, tendo por<br />

base diversos estudos. O objetivo é<br />

entender os principais pontos chave<br />

de influência para trabalhar com as<br />

organizações, corporações e outros<br />

grandes empregadores na construção<br />

de empregos futuros para os jovens, a<br />

partir de hoje.<br />

A pandemia Covid-19 e os<br />

confinamentos induzidos juntamente<br />

com a recessão global que se prosseguiu<br />

criaram perspetivas altamente incertas<br />

para o mercado de trabalho e obrigaram<br />

a uma alteração dos modos de trabalho.<br />

De acordo com o relatório - The<br />

Future of Jobs - divulgado pelo Fórum<br />

Económico Mundial, vão surgir<br />

novas funções, mas também vai<br />

haver menos procura de alguns dos<br />

trabalhos já existentes, destacando-se<br />

o “potencial” para trabalho remoto<br />

ou híbrido.<br />

Os jovens, de um modo geral, tendem<br />

a ter mais dificuldades em posicionarse<br />

no mercado de trabalho seja<br />

devido à idade, à falta de experiência<br />

ou à inadequada educação. Certas<br />

subpopulações enfrentam barreiras<br />

ainda maiores devido a fatores como<br />

raça, sexo e status socioeconómico.<br />

Esses desafios são intensificados durante<br />

uma recessão económica e deste modo<br />

é fulcral perceber como se integram os<br />

jovens nestes cenários de instabilidade.<br />

Algoritmos inteligentes e redes de<br />

robóticas estão transformando o<br />

significado do trabalho. De acordo com<br />

o relatório elaborado pelo Institute for<br />

the Future (IFTF), em parceria com The<br />

Rockefeller Foundation’s U.S. Youth<br />

Employment initiative, a automação está<br />

cada vez mais a substituir trabalhadores<br />

de trabalhos rotineiros de manufatura<br />

e serviços. Muitos empregos básicos<br />

de salário mínimo estão a tornarse<br />

escassos. Além de tudo isso, o<br />

percurso escola - trabalho já não<br />

funciona como antes, “um diploma<br />

universitário não é mais um bilhete<br />

infalível para um bom emprego”,<br />

defende o IFTF.<br />

Deste modo, antes de procedermos aos<br />

possíveis cenários para os jovens no<br />

mercado de trabalho importa salientar o<br />

modo como este, possivelmente, estará<br />

organizado.<br />

050 NOABR21 NOABR21 051


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

Neste aspeto, o relatório divulgado pelo<br />

Fórum Económico Mundial fornece<br />

informações detalhadas para 15 setores<br />

da indústria e de 26 países avançados e<br />

emergentes.<br />

De um modo sintetizado o relatório denota<br />

que é expectável que o ritmo de adoção<br />

da tecnologia permaneça inabalável e<br />

que até possa acelerar em algumas áreas.<br />

Consequentemente, a pandemia juntamente<br />

com a automação estão a criar um cenário<br />

de “rutura dupla” para os trabalhadores.<br />

Note-se que a automação é o ato de tornar<br />

um processo manual num processo<br />

independente de interação humana. Desta<br />

forma, as empresas estão e vão permanecer<br />

em processos de adaptação. Na avaliação feita<br />

pelo Fórum Económico Mundial, 43% das<br />

empresas, de vários sectores, estão a procurar<br />

obter “mais automatização e reduzir a força<br />

de trabalho” humano; 34% quer aumentar<br />

a força de trabalho “como um resultado<br />

da integração tecnológica mais profunda”,<br />

enquanto 41% procura contratar pessoas<br />

para tarefas especializadas. De acordo com<br />

o relatório, em 2025, “o tempo gasto em<br />

tarefas atuais no trabalho por humanos e<br />

as máquinas serão iguais” (2020, p. 5).<br />

exacerbada devido ao duplo impacto da<br />

tecnologia e a recessão pandémica”, refere<br />

o relatório. Assim, prevê-se que, até 2025,<br />

85 milhões de empregos no mundo sejam<br />

adaptados de forma a conciliar o trabalho<br />

entre humanos e máquinas. Além disso,<br />

espera-se que possam surgir 97 milhões<br />

de novas funções que permitam também<br />

esta divisão laboral, mas com a inserção de<br />

algoritmos.<br />

No entendimento do Fórum Económico<br />

Mundial, “durante a última década, um<br />

conjunto de inovações e tecnologias<br />

emergentes sinalizaram o início da quarta<br />

revolução industrial” (2020, p. 8). Esperase<br />

que mesmo aqueles que mantenham os<br />

empregos necessitem de atualizar 40% das<br />

competências para o futuro mercado de<br />

trabalho, por forma a responder à quarta<br />

revolução industrial. Além disso, conclui-se<br />

também que o sector público precisa de dar<br />

um apoio mais forte para a requalificação e<br />

qualificação dos trabalhadores em risco de<br />

perder o emprego ou vê-lo adaptado. Apenas<br />

21% das empresas dizem “ser capazes de usar<br />

fundos públicos para apoiar os funcionários”<br />

(2020, p. 48) de forma a conseguirem<br />

atualizar as suas competências.<br />

Em relação à questão abordada na<br />

introdução deste artigo, este relatório<br />

projeta que, a médio prazo, “o trabalho<br />

destruído provavelmente será compensado<br />

pelo crescimento do emprego nos jobs of<br />

tomorrow”, assim estes trabalhadores podem<br />

preencher empregos na economia verde,<br />

nas funções de vanguarda da economia de<br />

dados e IA, como também em novas funções<br />

na área de engenharia, computação em<br />

nuvem e desenvolvimento de produtos. No<br />

entanto, importa realçar que a criação de<br />

novos empregos é mais lenta que a destruição<br />

de antigos ofícios e a ausência de esforços<br />

proativos, pode provocar uma “desigualdade<br />

Assim, o Fórum Económico Mundial,<br />

em parceria com o Fundo Monetário<br />

Internacional, prevê que possam vir a<br />

emergir novos empregos no campo da<br />

tecnologia, como analistas e cientistas<br />

de dados e especialistas em inteligência<br />

artificial, e de profissões ligadas à<br />

estratégia e ao marketing digital, como a<br />

gestão de redes sociais, vendas e produção<br />

de conteúdos, que permite trabalhar com<br />

vários tipos de pessoas. Por outro lado, vai<br />

reduzir a procura por empregos ligados à<br />

administração, à montagem, à reparação e ao<br />

atendimento ao público.<br />

Relativamente às soft skills, em 2025, de<br />

acordo com o relatório, vão ser valorizadas<br />

as capacidades de “pensamento analítico<br />

e de inovação”, a “resolução de problemas<br />

complexos”, a “criatividade, originalidade e<br />

a iniciativa”, a “flexibilidade”, bem como a<br />

“gestão do stress” e a “inteligência emocional”<br />

dos empregados.<br />

Portanto, a questão mais relevante para as<br />

empresas, governos e indivíduos não é até<br />

que ponto a automação e aumento da força de<br />

trabalho humano afetará os números atuais<br />

de empregos, mas de que modo o mercado<br />

de trabalho pode ser apoiado de forma a<br />

encontrar um novo equilíbrio na divisão de<br />

trabalho entre trabalhadores humanos, robôs<br />

e algoritmos.<br />

O desemprego, seja causado por uma<br />

economia lenta, impulsionadores tecnológicos,<br />

ou falta de preparação, cria dificuldades<br />

duradouras para a juventude e para a<br />

economia do país como um todo. Desta<br />

forma, importa perceber quais os cenários<br />

de futuro que os mais recentes estudos<br />

indicam. Para tal, recorreremos a dois estudos<br />

diferentes que preveem mundos alternativos<br />

de trabalho. O primeiro incide no relatório<br />

intitulado - The Future of Youth Employment<br />

052 NOABR21 NOABR21 053


REPORTAGEM<br />

elaborado pelo Institute for the Future (IFTF)<br />

e o segundo da responsabilidade da Hesse e<br />

Olsen denominado - What will work look like<br />

in 2030?<br />

Em relação ao relatório do IFTF, este recorre<br />

a uma metodologia de cenários alternativos<br />

desenvolvida na Universidade do Havaí para<br />

quatro futuros arquetípicos: crescimento,<br />

colapso, restrição e transformação. Sendo<br />

assim, cada perspetiva de futuro agrega um<br />

conjunto de elementos-chave, como também<br />

recomenda estratégias-chave que podem ser<br />

usadas por empregadores preocupados em<br />

promover a preparação e o desenvolvimento<br />

da força de trabalho para os jovens, e<br />

recomendações de políticas para o governo.<br />

Desta forma, os principais elementos e políticas<br />

públicas recomendadas para cada cenários são<br />

os seguintes:<br />

Para o cenário de crescimento verifica-se<br />

uma economia flexível, onde o mercado de<br />

trabalho favorece “a elevada qualificação<br />

dos funcionários em certos setores de<br />

crescimento”. O mercado de trabalho é<br />

“altamente fluido com abundância de novas<br />

oportunidades”, mas as habilidades do<br />

trabalhador devem ser “constantemente<br />

atualizadas”. Em relação à educação, esta<br />

expande-se em “instituições para o online e<br />

espaços comunitários” e o “credenciamento<br />

alternativo cresce e torna-se aceitável” (IFTF,<br />

2014, p. 4).<br />

Em termos de políticas públicas, o estudo<br />

defende para este cenário a “subsidiação<br />

do custo do emprego inicial para ajudar<br />

jovens desfavorecidos”, como também<br />

a implementação de “currículos de<br />

aperfeiçoamento online e no trabalho”. Na<br />

sequência do estudo, as empresas deveriam<br />

receber incentivos para desenvolver e<br />

distribuir material didático online como uma<br />

ferramenta para encontrar e promover novos<br />

trabalhadores (IFTF, 2014, p. 6).<br />

Seguidamente, na abordagem do cenário de<br />

colapso, “The Growing Gap”, surge a automação<br />

crescente que reduz o conhecimento do trabalho<br />

e de empregos de salário mínimo. Neste ponto,<br />

existem “mais estudantes universitários a graduarse,<br />

mas a descobrir que a sua especialização não é<br />

comercializável”. Como também o “governo enfrenta<br />

crises e é incapaz de abordar necessidades de uma<br />

forma sistemática”, a “economia informal e moedas<br />

alternativas crescem” (IFTF, 2014, p. 7).<br />

Para este cenário, as políticas públicas recomendáveis<br />

focam na obrigação dos “empregadores a designar<br />

um tempo para melhorar as habilidades” e<br />

“reconstituir o trabalho organizado para sustentar os<br />

salários e proteger os empregos” (IFTF, 2014, p. 9).<br />

Em terceiro lugar, surge o cenário de restrição, que<br />

incorpora um mundo com “poucas oportunidades<br />

de crescimento novas e o foco das empresas é na<br />

redução de custos”. Aqui “as redes de trabalho online<br />

funcionam como um suplemento altamente eficiente<br />

para os funcionários” e as “estruturas organizacionais<br />

são apoiadas por software de coordenação que<br />

substitui a hierarquia tradicional” (IFTF, 2014, p. 10).<br />

054 NOABR21 NOABR21 055


REPORTAGEM<br />

De acordo com as caraterísticas do<br />

cenário de restrição o estudo recomenda<br />

as seguintes políticas públicas. Por um<br />

lado, “melhorar a passagem da esfera<br />

escolar para a esfera do mundo do<br />

trabalho”, entre vários motivos, foca no<br />

facto de os planos de carreira começarem<br />

a ser definidos no ensino médio. Por<br />

outro lado, defende a “promoção<br />

da propriedade dos funcionários –<br />

employee stock ownership (ESOPs)” ou<br />

propriedade de ações por funcionários,<br />

é quando os funcionários de uma<br />

empresa possuem ações nessa empresa.<br />

ESOPs demonstram que aumentam a<br />

produtividade do trabalhador, segurança<br />

económica e compensação (IFTF, 2014,<br />

p. 12).<br />

Por último, no cenário de transformação<br />

ou transformista encontramos o<br />

“indivíduo amplificado”. Neste ponto,<br />

os “custos de coordenação caem<br />

significativamente”, o “capital para<br />

empresas de crowdfunding, bancos e os<br />

VCs fluem livremente”. Este cenário é<br />

“altamente empreendedor para empresas<br />

e mentalidades flexíveis” e o “equilíbrio<br />

de poder muda de grandes organizações<br />

para indivíduos” (IFTF, 2014, p. 13).<br />

E como políticas públicas para este<br />

cenário recomendam “disponibilizar<br />

microcréditos para empreendedores de<br />

renda baixa”, como também, promover<br />

“módulos de empreendedorismo em<br />

toda a educação”, e por fim, “apoiar<br />

o desenvolvimento de negócios<br />

cooperativos dos trabalhadores” (IFTF,<br />

2014, p. 15).<br />

Em suma, os quatro cenários neste<br />

relatório fornecem uma experiência<br />

numa ampla gama de desafios<br />

enfrentados por jovens desfavorecidos<br />

no futuro emergente. Os autores<br />

do estudo realçam que “todos esses<br />

cenários estão já acontecendo, até certo<br />

ponto e numa escala de cidade por<br />

cidade. A partir daqui o futuro não irá<br />

evoluir exatamente como descrito em<br />

qualquer um dos quatro cenários, mas<br />

provavelmente entrelaça os elementos<br />

de cada um”. Assim, defendem que<br />

“será importante para as partes<br />

interessadas perseguir um portfólio<br />

de estratégias e políticas durante os<br />

próximos dez anos para tirar jovens<br />

desfavorecidos do desemprego” (IFTF,<br />

2014, p. 16).<br />

Concluída a exposição da teoria<br />

desenvolvida pelo Institute for the<br />

Future, passamos agora a demonstrar<br />

a teoria elaborada por Hesse e Olsen<br />

da PricewaterhouseCoopers (PwC).<br />

Esta perspetiva contém quatro mundos<br />

alternativos de trabalhos, todos<br />

com nomes e cores diferentes. Esses<br />

exemplos, reconhecidos pelos autores,<br />

como “extremos” de como o trabalho<br />

poderia ser em 2030 são moldados<br />

“pelas maneiras como as pessoas e as<br />

organizações respondem às forças do<br />

coletivismo e do individualismo, num<br />

eixo, e integração e fragmentação, no<br />

outro” (Hesse & Olsen, 2017). Desta<br />

forma, existe o “mundo vermelho”, o<br />

“mundo azul”, o “mundo verde” e o<br />

“mundo amarelo”, cada um deles com<br />

caraterísticas distintas.<br />

056 NOABR21 NOABR21 057


REPORTAGEM<br />

No “mundo vermelho”, a tecnologia permitirá<br />

que “pequenas empresas explorem os vastos<br />

reservatórios de informações, habilidades e<br />

financiamento”. De acordo com Hesse e Olsen,<br />

os “recursos humanos não existirão mais como<br />

uma função separada e os empreendedores<br />

contarão com serviços terceirizados para<br />

processos de pessoal”, referindo que haveria<br />

uma “competição feroz” por talentos, e aqueles<br />

com habilidades futuras exigidas obterão as<br />

maiores recompensas.<br />

Para o “mundo azul”, os autores realçam que<br />

as corporações globais tornar-se-ão “maiores,<br />

poderosas e mais influentes do que nunca”.<br />

Pois, as empresas contemplam o seu tamanho e<br />

influência como a melhor maneira de proteger<br />

as suas margens de lucro. E neste cenário, em<br />

semelhança ao anterior, os melhores talentos<br />

são disputados ferozmente (Hesse & Olsen,<br />

2017).<br />

Em relação ao “mundo verde”, este apresentase<br />

como sendo um mundo coletivo e integrado,<br />

onde a tónica está na responsabilidade ecológica.<br />

Assim, “é movido pela necessidade de uma<br />

consciência social poderosa”. Neste mundo e<br />

tendo em conta a forte opinião pública, como<br />

também a escassez dos recursos naturais e<br />

as rígidas regulamentações internacionais, as<br />

empresas promoverão uma “forte agenda ética e<br />

ecológica” (Hesse & Olsen, 2017).<br />

Por último, no atual quadro teórico, existe<br />

o “mundo amarelo”. Aqui os trabalhadores<br />

e empresas buscarão “maior significado e<br />

relevância”. Os trabalhadores deparam-se com<br />

uma maior autonomia, flexibilidade e realização<br />

quando trabalham para organizações com<br />

“fortes padrões éticos e sociais” (Hesse & Olsen,<br />

2017).<br />

Desta forma, Hesse e Olsen referem que estes<br />

cenários podem parecer “improváveis” ou até<br />

mesmo “caprichosos”, no entanto defendem que<br />

o futuro é incerto e que “as respostas podem<br />

não parecer óbvias hoje”, mas é a partir da<br />

construção de diversos cenários que se deve<br />

“enfrentar o futuro do trabalho com um maior<br />

senso de confiança”.<br />

Sendo assim, como devem os jovens, as<br />

empresas e os próprios governos<br />

preparar-se para a incerteza<br />

existente no mercado de trabalho,<br />

ainda mais com as consequências<br />

da pandemia Covid-19? Neste<br />

novo contexto, pela primeira<br />

vez nos últimos anos, a criação<br />

de empregos está começando a<br />

ser ultrapassada pela destruição<br />

e este fator está prestes a afetar<br />

os trabalhadores desfavorecidos<br />

com particular ferocidade, alerta<br />

o relatório do Fórum Económico<br />

Mundial. Este relatório indica<br />

que à medida que os números<br />

do desemprego aumentam,<br />

surge cada vez mais a urgência<br />

para expandir a proteção<br />

social, incluindo apoio para os<br />

trabalhadores que necessitam ser<br />

realocados enquanto navegam em<br />

direção a novas oportunidades<br />

no mercado de trabalho e para os<br />

‘empregos de amanhã’. Abordando<br />

os atuais desafios apresentados<br />

pelo COVID-19, em conjunto<br />

com a rutura representada pela<br />

mudança tecnológica, isto requer<br />

uma inovação do serviço público<br />

para o benefício de trabalhadores<br />

afetados em todos os lugares.<br />

É neste sentido que o Fórum<br />

Económico Mundial defende que<br />

“os governos devem buscar uma<br />

abordagem holística, criando<br />

ligações ativas e coordenação<br />

entre provedores de educação,<br />

habilidades, trabalhadores e<br />

empregadores, e garantindo<br />

eficaz colaboração entre<br />

agências de emprego, governos<br />

regionais e governos nacionais”<br />

(2020, p. 49).<br />

Bibliografia:<br />

Institute for the Future. (2014).<br />

The Future of Youth Employment.<br />

Retrieved from https://www.iftf.<br />

org/our-work/global-landscape/<br />

work/the-future-of-youthemployment/<br />

Forum Económico Mundial<br />

(2020). The Future of Jobs.<br />

Retrieved from https://www.<br />

weforum.org/reports/the-futureof-jobs-report-2020<br />

Hesse, Jeff; Olsen, Jeff. (2017,<br />

dezembro, 18). What will work<br />

look like in 2030? Retrieved from<br />

https://www.strategy-business.<br />

com/article/What-Will-Work-<br />

Look-Like-in-2030<br />

058 NOABR21 NOABR21 059


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

A pandemia<br />

CLÁUDIA CARVALHO<br />

O FUTURO DO TURISMO:<br />

PARA QUANDO OS VALORES ANTES DA PANDEMIA?<br />

Não será novidade afirmar-se que a pandemia<br />

veio trazer graves constrangimentos ao nível<br />

do desenvolvimento e progresso económico das<br />

pequenas, médias e grandes empresas, em virtude<br />

do lockdown geral por todos os países – esse é um<br />

facto que une todos os dirigentes, especialistas e<br />

empresários.<br />

Com o primeiro confinamento em Wuhan,<br />

epicentro do SaRS-COV-2, seguiram-se países<br />

como Itália, França e Espanha e, posteriormente,<br />

o resto do Mundo, que viram as suas economias<br />

fortemente abaladas por um vírus sem precedentes<br />

e que viria a alterar não só a economia, mas todo o<br />

nosso habitus na vida em sociedade.<br />

Depois dessa data, escusado será dizer que tudo<br />

mudou. Há, sem dúvida, uma realidade antes e<br />

depois desta pandemia. A barreira que as separa<br />

não é visível, mas as pessoas certamente recordarse-ão<br />

do momento em que foram, pela virtude dos<br />

acontecimentos, obrigados a ficar em casa, porque<br />

assim lhes era pedido. Alteraram a sua forma de<br />

agir, de conviver e de comunicar. Adaptaram-se<br />

a novas formas de trabalho, em que conciliar o<br />

teletrabalho e a vida doméstica parecia a tarefa<br />

mais difícil de todos os tempos.<br />

Extensível a todas as áreas da nossa vida, a<br />

COVID-19 provocou graves constrangimentos a<br />

todos os setores da nossa economia, destacandose<br />

o setor dos transportes como um dos que mais<br />

sofreu com a pandemia. Todos nos lembramos,<br />

decerto, das famosas imagens de aeroportos,<br />

em todo o Mundo, com os seus aviões parados,<br />

imagem nunca antes vista. Também através de<br />

aplicações mobile que monitorizam o tráfego<br />

aéreo, podíamos fazer a mesma comparação face<br />

ao período homólogo. Usarmos printscreens<br />

do tráfego aéreo de fevereiro de 2019 e 2020 é,<br />

deveras, devastador e assustador para qualquer um<br />

de nós.<br />

060 NOABR21<br />

NOABR21 061


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

Os números<br />

Na verdade, no ano de 2019,<br />

segundo especialistas, o turismo foi<br />

responsável por 7% do comércio<br />

global, sendo que, nesse ano,<br />

se registaram 1.500 milhões de<br />

entradas de turistas internacionais e<br />

outros 9 mil milhões de pessoas que<br />

escolheram o seu próprio país para<br />

fazer turismo. O setor do turismo,<br />

depois de quase duplicar o seu peso<br />

entre 2014 e 2019, continuou a bater<br />

recordes: as receitas na hotelaria<br />

tiveram um crescimento de 9,9%<br />

nos primeiros dois meses de 2020,<br />

em termos homólogos.<br />

Numa nota emitida pelas Nações<br />

Unidas, com palavras do secretáriogeral<br />

António Guterres, dizia que,<br />

em todo o mundo, 1 em cada 10<br />

pessoas estão empregadas na área<br />

do turismo. “Só na Europa, milhões<br />

de negócios e cerca de 27 milhões de<br />

pessoas subsistem graças ao setor”.<br />

Segundo um documento intitulado<br />

“Turismo e COVID-19”, apresentado<br />

pelo secretário-geral em agosto de<br />

2020, que se baseia em dados da<br />

Organização Mundial do Turismo,<br />

apesar do início do ano de 2020<br />

ter sido verificado um crescimento<br />

contínuo no setor, a verdade é que,<br />

“desde o início da pandemia, o<br />

setor do turismo tem sido dos mais<br />

afetados”.<br />

A ONU estimava, em agosto de<br />

2020, que a entrada de turistas<br />

pudesse cair entre 58% e 78%,<br />

colocando assim em risco cerca<br />

de 120 milhões de empregos e<br />

de pequenos comércios afetos ao<br />

turismo.<br />

Os dados recentemente divulgados<br />

pela International Air Transport<br />

Association (IATA), em novembro<br />

de 2020, previam que o prejuízo na<br />

indústria da aviação continuasse no<br />

ano de <strong>2021</strong>, “apesar da expectativa<br />

de melhoria no desempenho durante<br />

o período da previsão”. As previsões<br />

apontam, para o ano de 2020, para<br />

um prejuízo líquido estimado de<br />

US$ 118,5 biliões e, para <strong>2021</strong>, de<br />

US$ 38,7 biliões.<br />

No press divulgado pela IATA,<br />

Alexandre de Juniac, diretor-geral<br />

e CEO da associação, referiu que<br />

“a história registará 2020<br />

como o pior ano financeiro<br />

do setor, sem dúvida alguma.<br />

Em média, as companhias aéreas<br />

cortaram despesas de US$ 1 bilião<br />

por dia em 2020 e ainda acumularão<br />

perdas sem precedentes”, tendo<br />

ainda deixado o alerta: “se não<br />

fosse a ajuda financeira de US$ 173<br />

biliões dos governos, teríamos tido<br />

falências em grande escala”.<br />

E em Portugal?<br />

De acordo com o Boletim Económico<br />

do Banco de Portugal, datado de<br />

maio de 2020, de entre os setores de<br />

atividade com a maior redução de valor<br />

acrescentado bruto (VAB), constam os<br />

transportes aéreos, com -87.1%, bem<br />

como o alojamento e restauração, com<br />

-70.3%.<br />

No caso português, a companhia área<br />

TAP chegou ao mês de setembro do ano<br />

transato com um prejuízo de 700 milhões<br />

de euros, sendo que o terceiro trimestre<br />

foi o menos negativo do ano de 2020,<br />

com a transportadora aérea a registar um<br />

prejuízo de 118,8 milhões. O grupo SATA,<br />

por sua vez, fechou o terceiro trimestre<br />

de 2020 com prejuízos de 61 milhões de<br />

euros, valor superior aos 36,8 milhões do<br />

período homólogo de 2019.<br />

O estudo da OIT, intitulado “Portugal:<br />

Uma análise rápida do impacto da<br />

COVID-19 na economia e no mercado<br />

de trabalho”, explica que as companhias<br />

aéreas são um foco particular de<br />

preocupação devido à combinação de um<br />

choque imediato profundo e perspetivas<br />

sombrias para o futuro próximo. Em<br />

2020, diziam que, para “além dos<br />

voos cancelados, estão a ser efetuadas<br />

poucas reservas e provavelmente vão ser<br />

impostas medidas sanitárias restritivas<br />

às viagens aéreas (reduzindo as receitas e<br />

aumentando os custos), sendo expectável<br />

que a procura leve algum tempo a<br />

recuperar”.<br />

A Secretária de Estado do Turismo de<br />

Portugal, Rita Marques, no Anuário<br />

de Tendências do Turismo, escrevia,<br />

em maio de 2020, de acordo com o<br />

barómetro anual do World Travel &<br />

Tourism Council (WTTC), que em cada<br />

cinco euros de receitas que eram geradas<br />

em Portugal, um euro provinha do<br />

turismo.<br />

062 NOABR21 NOABR21 063


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

Os dados revelam que o turismo, em<br />

Portugal, cresceu no ano de 2019,<br />

registando-se valores históricos:<br />

Portugal recebeu 27 milhões de<br />

hóspedes em 2019 e registou 69.9<br />

milhões de dormidas, correspondendo<br />

a taxas de crescimento superiores às<br />

verificadas em 2019. O VAB gerado pelo<br />

setor chegou a 8% do VAB nacional<br />

e o setor empregava mais de 400 mil<br />

pessoas, correspondente a 9% do total<br />

do emprego nacional.<br />

O mesmo estudo da OIT referia,<br />

inclusive, que a maior preocupação<br />

é o risco de colapso das atividades<br />

de turismo e dos transportes, já que<br />

as medidas de distanciamento físico<br />

tiveram um impacto imediato na<br />

procura do setor do turismo.<br />

No final de abril de 2020, 59.4% das<br />

empresas do setor do alojamento e<br />

da restauração tinham encerrado,<br />

temporariamente (53.9%) ou<br />

indefinidamente (5.5%). Já nos<br />

estabelecimentos de alojamento<br />

turístico, quase 4/5 das reservas entre<br />

março e agosto do ano transato tinham<br />

sido canceladas.<br />

O ano de 2020, segundo explica<br />

a Secretária de Estado, prometia<br />

números muito animadores, com taxas<br />

de crescimento em janeiro e fevereiro<br />

ao nível das dormidas de 8% e 15%<br />

face aos períodos homólogos. “Todos<br />

os sinais eram muitíssimo positivos,<br />

fazendo crer que o ano de 2020 iria ser<br />

absolutamente extraordinário”, explica<br />

Rita Marques.<br />

Os obstáculos<br />

Num relatório publicado pela IATA<br />

confirmava-se, efetivamente, que um dos<br />

principais fatores que dificultou e ainda<br />

dificulta a retoma do setor são, sem dúvida,<br />

as restrições às viagens e às medidas de<br />

quarentena, “que impedem a volta das<br />

viagens”. A solução mais imediata e adotada<br />

por vários governos é, conforme explicam,<br />

“a reabertura segura das fronteiras usando<br />

testes sistemáticos para a COVID-19. A<br />

longo prazo, a ampla disponibilização<br />

de vacinas deve manter as fronteiras<br />

abertas sem testes, mas o prazo para a<br />

disponibilização dessas vacinas é incerto”.<br />

À mesma conclusão chegaram a European<br />

Travel Comission (ETC) e a Tourism<br />

Economics (TE) que, num webinar<br />

realizado em janeiro de <strong>2021</strong>, debatiam as<br />

tendências no turismo verificadas no final<br />

de 2020 e as perspetivas que se poderiam<br />

avizinhar para <strong>2021</strong> e anos conseguintes.<br />

De acordo com a ETC e a TE, a ideia<br />

principal é a de uma grande incerteza<br />

sobre o que poderá ser e significar o<br />

setor durante este ano. A incerteza,<br />

segundo explicam, está relacionada com<br />

o grau de sucesso nos programas de<br />

vacinação nacionais, com a abertura e<br />

encerramento de fronteiras e com o ritmo<br />

de recuperação da economia mundial e do<br />

emprego.<br />

O estudo realizado pela OIT reiterava, de<br />

certa forma, aquilo que já fora anunciado<br />

por outros especialistas: “a incerteza, o<br />

medo e a falta de confiança podem levar<br />

a uma crise prolongada no setor”<br />

064 NOABR21 NOABR21 065


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

Futuro e possíveis<br />

cenários<br />

Apesar de ressalvarem que as<br />

perspetivas, naquela altura, já<br />

permitiam algum otimismo, a<br />

recuperação dos níveis dos fluxos<br />

turísticos verificados em 2019, segundo<br />

a ETC e a TE, “só ocorrerá entre 2023<br />

e 2025”. Para ambas as entidades,<br />

os desafios colocados à distribuição<br />

da vacina influenciarão o nível de<br />

recuperação e os impactos da recessão<br />

económica farão, em última instância,<br />

retrair a procura, especialmente nas<br />

viagens de curta distância.<br />

Ainda sobre o Anuário de Tendências<br />

do Turismo de 2020, consta um<br />

artigo de opinião de Peter Tarlow,<br />

presidente das empresas Tourism &<br />

More e SaferTourism, que defendia<br />

que o turismo não pode estar em<br />

“hibernação” de forma prolongada.<br />

Apesar de Peter Tarlow reconhecer<br />

que o futuro do setor é ainda uma<br />

incógnita, explicou que existem dois<br />

cenários: uma escola de pensadores<br />

que acredita que o turismo sofrerá<br />

grandes mudanças e que não voltará<br />

aos padrões que existiam antes da<br />

pandemia vs os defensores de que, após<br />

o confinamento obrigatório e assim<br />

que lhes seja permitido, os turistas<br />

vão ter um enorme desejo de viver,<br />

acumular experiências e viajar. “Numa<br />

análise global, acredita-se que haverá<br />

uma conjugação destes dois pressupostos.<br />

Espera-se que alguns segmentos do<br />

mercado queiram viajar brevemente<br />

para destinos internacionais, enquanto<br />

outros vão apostar nas férias locais/<br />

domésticas”.<br />

Também as conclusões da ETC e da<br />

TE explicam que os turistas optarão,<br />

inicialmente, por viagens de proximidade,<br />

sobretudo turismo doméstico e<br />

sobrevalorizando os modos de viagem<br />

sustentáveis e as viagens de lazer<br />

liderarão o processo de recuperação do<br />

turismo, relegando o turismo de negócios<br />

para uma posição de menor relevância.<br />

Na publicação do “Guia para a Retoma<br />

do Turismo”, autoria do Instituto de<br />

Planeamento e Desenvolvimento do<br />

Turismo (IPDT), a Secretária de Estado<br />

do Turismo defende que, ultrapassada<br />

a fase da pandemia, é preciso reforçar<br />

esforços no sentido de retomar o caminho<br />

que estava a ser trilhado na prossecução<br />

das metas da Estratégia Turismo 2027,<br />

“inovando e trabalhando para que<br />

Portugal seja reconhecido como líder do<br />

turismo do futuro”.<br />

Para Rita Marques, é preciso inovar<br />

na oferta, adaptando-a às novas<br />

tendências da procura. Será certo que<br />

o cliente de ontem não será o mesmo<br />

que o de amanhã, que procurará,<br />

em primeiro lugar, mais<br />

segurança: “a implementação de uma<br />

política de informação que permita uma<br />

comunicação clara quanto à identificação<br />

066 NOABR21 NOABR21 067


REPORTAGEM<br />

de eventuais desafios de segurança,<br />

bem como o controlo de possíveis<br />

riscos inerentes à prática turística<br />

e ainda a divulgação de informação<br />

sobre a oferta de serviços de apoio<br />

em casos de emergência, que se<br />

tornará numa prioridade”.<br />

Será ainda premente que o cliente<br />

comece a procurar maior<br />

flexibilidade aquando da<br />

escolha do destino turístico,<br />

fator que deverá ser acompanhado<br />

pela inovação, de forma a conferir<br />

mais direitos aos turistas em matéria<br />

de viagens, nomeadamente no que se<br />

refere aos requisitos de informação<br />

ou à responsabilidade de cada parte<br />

pela execução da viagem.<br />

A Secretária de Estado considera,<br />

também, que o cliente procurará<br />

mais atividades de nicho, nas quais<br />

a saúde e experiências ao ar livre<br />

serão fatores inovadores, daí que<br />

se imponha “trabalhar a oferta que<br />

privilegia a Natureza”.<br />

Num inquérito realizado pelo IPDT,<br />

é referida uma tendência que se<br />

poderá vir a verificar nos próximos<br />

tempos: o peso do preço deixará<br />

de ser tão determinante, já que, a<br />

curto-prazo, o turista irá priorizar<br />

a segurança, optando por destinos e<br />

ofertas ligeiramente mais caras caso<br />

possam usufruir de experiências<br />

mais seguras.<br />

Na verdade, um estudo da Singerman<br />

e Makon, de agosto de 2020, refere<br />

que mais de 70% das pessoas não<br />

ponderavam viajar para um destino<br />

que registe indicadores altos de<br />

transmissão de COVID-19, “mesmo<br />

que os preços praticados ao nível do<br />

turismo sejam baixos”.<br />

Apesar de a ETC e a TE terem<br />

referido, como acima foi<br />

mencionado, que os valores do<br />

turismo a nível global 2019 só<br />

deveriam começar a verificar-se<br />

entre 2023-2025, no inquérito do<br />

IPDT, sobre a retoma do Turismo,<br />

onde 56% dos inquiridos afirmavam<br />

que o ano de 2022 já será um ano de<br />

progresso e onde serão alcançados os<br />

resultados de 2019: “acredita-se que<br />

em 2022 a pandemia de COVID-19<br />

estará ultrapassada. As pessoas vão<br />

sentir-se mais seguras para viajar e<br />

o ecossistema turístico recuperará,<br />

o que tornará possível alcançar<br />

resultados próximos dos registados<br />

em 2018 e 2019”.<br />

A comunicação dos destinos será<br />

determinante para a retoma do setor,<br />

dizem os especialistas. O inquérito do<br />

IPDT revelou que 75% dos inquiridos<br />

concordam com a afirmação “os<br />

destinos que tiverem os canais de<br />

comunicação ativos e atualizados vão<br />

sair na frente da corrida na preferência<br />

dos turistas”.<br />

O turista, antes de fazer qualquer<br />

tipo de reserva, irá, provavelmente,<br />

procurar informação sobre a evolução<br />

pandémica no destino, daí que a<br />

disponibilização organizada dos dados<br />

num portal será uma mais-valia para<br />

qualquer destino. Também as medidas<br />

de entrada no país, como já se fez<br />

referência ao longo do texto, serão<br />

fator influenciador para as reservas.<br />

No futuro, a estadia média não deverá<br />

diminuir e os gastos dos turistas<br />

devem aumentar – são também<br />

algumas das conclusões do inquérito<br />

do IPDT. O slow tourism vai marcar<br />

o futuro do turismo, que contribuirá<br />

para que a estadia média não sofra<br />

grandes diminuições. Assim sendo, os<br />

turistas vão procurar a oportunidade<br />

068 NOABR21 NOABR21 069


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

de se tornarem parte dos<br />

destinos, num ritmo de viagem<br />

que lhes permita estar em<br />

contacto com a comunidade<br />

residente e a aprender a cultura<br />

local. Contribuir para o comércio<br />

local será ainda uma tendência<br />

para que o IPDT aponta,<br />

aumentando assim os gastos<br />

durante a viagem: “também o<br />

desejo de conhecer a cultura e a<br />

gastronomia local serão fatores<br />

que vão influenciar o aumento do<br />

valor médio gasto por turista”.<br />

Na verdade, seja qual for o futuro<br />

do turismo, uma coisa é certa<br />

– o comportamento do turista<br />

não será mais igual. Teses de<br />

pensadores de que as pandemias<br />

serão cada vez mais recorrentes<br />

poderão fazer-nos concluir que,<br />

tal como antevia o Secretário<br />

Geral da OMT, o turismo de<br />

massas poderá chegar ao fim.<br />

Com o seu fim, haverá espaço<br />

pela procura de um turismo<br />

de segurança, qualidade e com<br />

menor fluxo de visitantes, com<br />

novas formas de se oferecer<br />

o destino e a experiência<br />

turística. Afinal, aquilo que<br />

tantos almejavam poderá<br />

ser consequência do período<br />

pandémico que ainda vivemos.<br />

Fluxos turísticos controlados,<br />

ou pelo menos a diminuição na<br />

procura de destinos massificados<br />

– é isso que os especialistas<br />

projetam, mas tal como a<br />

pandemia e em virtude dela,<br />

independentemente dos estudos<br />

e análises que possam ser feitas,<br />

aguarda-nos o futuro para<br />

podermos saber qual será o novo<br />

panorama, a nova regra.<br />

Bibliografia<br />

Banco de Portugal. (maio de<br />

2020). Boletim Económico: A<br />

economia portuguesa em 2019.<br />

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files/anexos/pdf-boletim/be_<br />

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das Nações Unidas (2020).<br />

O Futuro do Turismo: A<br />

transformação pós-pandémica.<br />

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Goodger, David; Sacks,<br />

Adam (<strong>2021</strong>). TE-ETC<br />

2020Q3 – Trends &<br />

Prospects Travel Resilience<br />

and Growth Opportunity<br />

[Webinar]. Tourism<br />

Economics and European<br />

Travel Comission. https://<br />

travelbi.turismodeportugal.<br />

pt/pt-pt/Documents/<br />

Comportamento%20do%20<br />

Consumidor/etc-tourism-<br />

trends-and-prospects-2020-<br />

Q4-webinar.pdf<br />

Organização Internacional do<br />

Trabalho (2020). Portugal:<br />

Uma análise rápida do<br />

impacto da COVID-19 na<br />

economia e no mercado de<br />

trabalho. Retrieved from<br />

https://www.ilo.org/lisbon/<br />

publica%C3%A7%C3%B5es/<br />

WCMS_754606/lang--pt/<br />

index.htm<br />

070 NOABR21<br />

NOABR21 071


PUBLIRREPORTAGEM<br />

IMPORTÂNCIA DE CRIAR UM<br />

LOGÓTIPO PROFISSIONAL<br />

Criar um logótipo é<br />

essencial para qualquer<br />

empresa, seja grande,<br />

média, pequena ou<br />

microempresa! Uma<br />

empresa sem logótipo<br />

é uma empresa sem<br />

identidade, sendo<br />

assim impossível de<br />

ser reconhecida pelos<br />

consumidores. Investir em<br />

design gráfico é importante<br />

e revela que a sua empresa<br />

está verdadeiramente<br />

empenhada em destacar-se<br />

e oferecer valor aos seus<br />

clientes.<br />

E porque é importante<br />

criar um logótipo para uma<br />

empresa?<br />

Um dos maiores erros que<br />

você, como empresário,<br />

pode cometer é fazer um<br />

baixo investimento na<br />

criação da identidade visual<br />

da sua empresa. É meio<br />

caminho para o insucesso.<br />

Um logótipo criado por<br />

uma empresa experiente<br />

mostra:<br />

1. PROFISSIONALISMO<br />

A criação de logótipos é um<br />

processo que implica análise<br />

e pesquisa por parte de um<br />

profissional qualificado,<br />

desde pesquisar sobre a<br />

concorrência, público alvo,<br />

escolha de cores, definição<br />

de tipografia, que formas e<br />

símbolos usar e outros.<br />

Todo este processo refletese<br />

num logo cuidado e<br />

pensado e os consumidores<br />

apercebem-se disso. Mostra<br />

que você colocou tempo<br />

e dedicação na imagem<br />

da sua marca, mostra<br />

profissionalismo.<br />

2. CREDIBILIDADE<br />

Com certeza já lhe<br />

aconteceu encontrar uma<br />

empresa que tem um<br />

logo claramente amador,<br />

muitas vezes desajustado e<br />

esticado, quando colocado<br />

em materiais como flyers<br />

ou imagens nas redes<br />

sociais. À primeira vista, o<br />

cliente não se sente muito<br />

à vontade em comprar<br />

daquela empresa. Criar um<br />

logótipo profissional dá<br />

segurança e confiança aos<br />

consumidores, mostra que a<br />

empresa tem credibilidade.<br />

072 NOABR21<br />

NOABR21 073


PUBLIRREPORTAGEM<br />

PUBLIRREPORTAGEM<br />

3. AUTENTICIDADE<br />

Muitos pequenos<br />

empresários recorrem<br />

a serviços de design de<br />

logótipo grátis. Usar<br />

websites que têm a opção<br />

de criar um logótipo grátis<br />

pode ser um erro fatal. Para<br />

além de mostrar falta de<br />

profissionalismo, empenho<br />

e credibilidade, existem<br />

milhares de empresas com<br />

o mesmo logo ou muito<br />

parecido.<br />

Isto é um problema<br />

porque, primeiro, tira<br />

todo o propósito de uma<br />

identidade visual, que é a<br />

autenticidade, e segundo,<br />

porque pode receber<br />

uma grande multa ou um<br />

processo por usar um<br />

logótipo, que outra empresa<br />

já registou como sendo seu.<br />

RETORNO SOBRE O<br />

INVESTIMENTO<br />

É completamente<br />

compreensível que, para um<br />

negócio que está apenas a<br />

começar, se tente reduzir<br />

custos ao máximo. No<br />

entanto, esta não é a área<br />

em que deve poupar!<br />

À medida que as pessoas<br />

começam a conhecer<br />

e confiar numa marca,<br />

e ao ver o logótipo<br />

sucessivamente em vários<br />

lugares, é mais provável<br />

que elas respondam<br />

positivamente aos seus<br />

produtos ou serviços. Desta<br />

forma, há um aumento<br />

de vendas ou um maior<br />

reconhecimento da sua<br />

marca por parte do seu público alvo. Para além disso, um bom<br />

logótipo pode levar potenciais clientes a escolherem a sua<br />

empresa, em vez de um concorrente com um logótipo amador.<br />

Esperamos que este artigo lhe tenha sido útil e se precisar de um<br />

logótipo profissional, criativo e autêntico, contacte-nos.<br />

Visite o nosso portfólio e veja os nossos trabalhos de criação de<br />

logótipos:<br />

https://acorespro.com/portfolio/<br />

074 NOABR21 NOABR21 075


13% DOS DOENTES<br />

ONCOLÓGICOS<br />

TIVERAM TRATAMENTOS<br />

SUSPENSOS POR<br />

INDICAÇÃO MÉDICA<br />

Liga Portuguesa Contra o Cancro divulga<br />

estudo sobre o impacto da covid-19 nos<br />

doentes oncológicos<br />

Liga Portuguesa Contra o Cancro<br />

(LPCC), entidade de apoio ao<br />

doente oncológico e seus familiares,<br />

realizou um estudo de âmbito<br />

nacional com o objetivo de avaliar<br />

a perceção do impacto social,<br />

económico e psicológico da pandemia<br />

COVID-19 nos doentes oncológicos/<br />

sobreviventes de cancro e em<br />

familiares/cuidadores. O estudo<br />

está disponível em https://www.<br />

ligacontracancro.pt/impactocovid/.<br />

Ao nível do acesso aos cuidados<br />

de saúde, o estudo realizado a<br />

mais de 900 doentes oncológicos/<br />

sobreviventes de cancro e a mais<br />

de 300 familiares/cuidadores,<br />

residentes em Portugal, revela que<br />

13% dos doentes oncológicos tiveram<br />

tratamentos oncológicos suspensos<br />

por indicação médica; dois em<br />

cada dez doentes e um em cada dez<br />

cuidadores ponderaram suspender,<br />

por sua iniciativa, os atos clínicos, por<br />

medo de se dirigirem aos hospitais e<br />

ainda que 57% dos doentes tiveram<br />

receio de serem infetados por outros<br />

doentes e profissionais de saúde. No<br />

caso dos cuidadores, 75% tiveram<br />

receio que o doente de quem cuidam<br />

pudesse ser infetado.<br />

A nível psicológico, cinco em cada<br />

dez doentes oncológicos apresentou<br />

distress (sofrimento) emocional<br />

significativo durante a pandemia,<br />

valor que aumenta nos casos dos<br />

doentes que tiveram tratamentos<br />

suspensos (seis em cada dez doentes).<br />

Ainda, seis em cada dez cuidadores<br />

com distress emocional significativo –<br />

os dados mostram que os cuidadores<br />

dos doentes oncológicos revelaram<br />

um maior impacto emocional durante<br />

a pandemia do que os doentes.<br />

De acordo com os mesmos dados, é<br />

ainda possível concluir que três em<br />

cada dez doentes oncológicos e quatro<br />

em cada dez cuidadores manifesta<br />

ansiedade significativa e que dois em<br />

cada dez doentes oncológicos e dois<br />

em cada dez cuidadores manifesta<br />

depressão significativa.<br />

“Além do enorme impacto que o<br />

diagnóstico e o tratamento do cancro<br />

representam, doentes, sobreviventes<br />

e familiares e cuidadores são agora<br />

confrontados com desafios adicionais,<br />

que passam pela necessidade de<br />

proteção em relação ao vírus, gerir<br />

a ansiedade e incerteza quanto à<br />

continuidade do tratamento médico,<br />

e adaptar-se às alterações nas rotinas<br />

diárias e familiares, incluindo<br />

a privação da autonomia e dos<br />

contactos sociais”, afirma Natália<br />

ARTIGO TEMÁTICO | SAÚDE<br />

Amaral, membro da Direção da<br />

LPCC.<br />

Por sua vez, um em cada dez doentes<br />

e cuidadores diz ter sentido bastante<br />

a muitíssima dificuldade em pagar<br />

as despesas familiares, indicadores<br />

que demonstram o relevante impacto<br />

socioeconómico da pandemia nestes<br />

doentes.<br />

O estudo realizado pela LPCC revela<br />

ainda que a maioria dos doentes<br />

oncológicos considera-se um doente<br />

de risco para a COVID-19 (maior<br />

probabilidade de contágio e maior<br />

vulnerabilidade a complicações) e que<br />

o mesmo acontece com os cuidadores,<br />

relativamente aos doentes que cuidam.<br />

Cerca de um a dois em cada dez<br />

doentes revelaram desconhecimento<br />

sobre o seu nível de risco.<br />

076 NOABR21 NOABR21 077


REPORTAGEM<br />

ARTIGO TEMÁTICO | CIÊNCIA<br />

UNIVERSIDADE DE ÉVORA<br />

DESENVOLVEU PROCESSO<br />

TECNOLÓGICO PARA A<br />

PRODUÇÃO EM MASSA DE<br />

TÚBERAS<br />

ladanifer (esteva), foi alcançado,<br />

permitindo a partir de agora a<br />

sua produção em massa para<br />

utilização em diversos setores.<br />

As túberas ou criadilhas (Terfezia<br />

arenaria e T. fanfani) caracterizam-se<br />

por permanecer debaixo da terra até<br />

à maturação dos esporos possuírem<br />

uma forma arredondada, medir em<br />

média 4 a 8 cm diâmetro, podendo<br />

atingir 10 cm, surgindo apenas na<br />

primavera e sendo mais comuns no<br />

sul do nosso país, região Alentejo, em<br />

solos arenosos e ácidos, ocorrendo<br />

também, com menos expressão, na<br />

Beira Litoral e na Beira Baixa.<br />

Esta importante descoberta aguarda<br />

atribuição de patente europeia<br />

e segundo Celeste Santos e Silva,<br />

professora do Departamento de<br />

Biologia e investigadora no MED<br />

uma das etapas cruciais deste<br />

processo tecnológico foi o<br />

isolamento do micélio de<br />

Terfezia em cultura pura, ou seja<br />

“conseguir fazer crescer este<br />

fungo numa caixa de Petri com<br />

ágar-ágar, que dá ao meio uma<br />

consistência gelatinosa, e com<br />

uma determinada composição<br />

de nutrientes e minerais”.<br />

Um resultado só possível graças a<br />

muitas tentativas, até porque, como<br />

explica a investigadora, “muitas<br />

cepas não podem ser subcultivadas,<br />

e assim até agora,<br />

as poucas tentativas bemsucedidas,<br />

principalmente<br />

com Terfezia, apresentavam<br />

um crescimento muito lento<br />

Com utilização em diversos setores,<br />

como farmacêutico, cosmético,<br />

alimentação e agricultura,<br />

investigadores da Universidade<br />

de Évora (UÉ) desenvolveram um<br />

processo tecnológico para a obtenção<br />

de plantas inoculadas visando a<br />

produção de túberas lançando as bases<br />

para uma nova forma de produção<br />

de alimentos com propriedades<br />

nutracêuticas e a exploração<br />

sustentável deste recurso micológico,<br />

de uma forma sustentável, resiliente e<br />

economicamente rentável.<br />

As túberas são a frutificação hipógea<br />

(cogumelos subterrâneos) de fungos<br />

micorrízicos que se associam<br />

tradicionalmente a raízes de plantas<br />

anuais e o desafio de conseguir a<br />

associação micorrízica deste fungo<br />

com plantas perenes, como o Cistus<br />

salviifolius (sargaço) e Cistus<br />

078 NOABR21 NOABR21 079


REPORTAGEM<br />

ARTIGO TEMÁTICO REPORTAGEM<br />

| CIÊNCIA<br />

e deficitário para que fosse<br />

possível produzir micélio nas<br />

quantidades adequadas”.<br />

Esta invenção, desenvolvida na<br />

Universidade de Évora, referese<br />

assim ao processo que permite<br />

melhorar o isolamento e a<br />

manutenção da cultura de micélio de<br />

espécies do género Terfezia. Este<br />

género é considerado o mais<br />

diverso, rico em número de<br />

espécies, do grupo das “trufasdo-deserto”.<br />

“Conseguimos<br />

melhorar as taxas de<br />

isolamento e aumentar a<br />

proliferação de Terfezia spp de<br />

forma confiável e reproduzível”<br />

destaca assim a investigadora da<br />

academia eborense.<br />

“Esta investigação lançou ainda<br />

as bases para uma nova forma<br />

de produção de alimentos com<br />

propriedades nutracêuticas”<br />

destaca a Investigadora referindo-se à<br />

combinação dos termos “nutrição” e<br />

“farmacêutica” mostrando utilidade,<br />

entre outros para o sector agroflorestal<br />

e “que permitirá a<br />

exploração sustentável deste<br />

recurso micológico, de uma<br />

forma sustentável, resiliente e<br />

economicamente rentável”.<br />

Celeste Santos e Silva frisa ainda que<br />

a disseminação de plantas inoculadas<br />

com Terfezia spp., “previne a<br />

desertificação e erosão do<br />

solo, reforça a integridade<br />

e a multifuncionalidade<br />

da paisagem e permite a<br />

recuperação de áreas ardidas e/<br />

ou com solos degradados’’.<br />

A concretização desta nova forma de<br />

produção assegura a investigadora<br />

do MED “possibilitará a<br />

criação de mais emprego,<br />

invertendo a tendência atual<br />

para a desertificação das áreas<br />

rurais”.<br />

Investigadores descobrem novas<br />

espécies de túberas<br />

Foi também no âmbito do projeto<br />

“Micorrização de Cistus spp com<br />

Terfezia arenaria (Moris) Trappe<br />

e sua aplicação na produção<br />

de túberas”, que o grupo de<br />

investigadores liderados por<br />

Celeste Santos e Silva realizou uma<br />

prospecção exaustiva na procura de<br />

túberas e descreveu duas novas<br />

espécies para a ciência, referimonos<br />

a Terfezia lusitanica e Terfezia<br />

solaris-libera.<br />

“É muito difícil identificar<br />

novas espécies dadas a<br />

características morfológicas de<br />

Terfezia, que são visualmente<br />

muito semelhantes entre si, e<br />

aqui a biologia molecular foi<br />

absolutamente fundamental”<br />

explica a investigadora destacando<br />

que foi possível “atualizar e resolver<br />

problemas sobre a taxonomia e<br />

filogenia (relação evolutiva entre<br />

grupos de organismos), deste género”.<br />

080 NOABR21 NOABR21 081


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

ARTIGO TEMÁTICO REPORTAGEM<br />

| CIÊNCIA<br />

UNIVERSIDADE DE ÉVORA<br />

DESENVOLVE MOLÉCULAS<br />

PARA TRATAMENTO DE<br />

VÁRIOS TIPOS DE CANCRO<br />

Uma equipa de investigação<br />

liderada por Anthony Burke,<br />

professor do Departamento<br />

de Química da Universidade<br />

de Évora (UÉ) desenvolveu<br />

uma série de pequenas novas<br />

moléculas que mostram<br />

potencial para o tratamento<br />

de vários tipos de cancro,<br />

incluindo o linfoma difuso de<br />

grandes células B (DLBCLs).<br />

O desenvolvimento destas<br />

moléculas com potencial para o<br />

tratamento de cancro e alguns<br />

linfomas foi patenteado a nível<br />

europeu.<br />

“Um tratamento para o<br />

linfoma difuso de grandes<br />

células B (DLBCL) - o tipo<br />

mais comum de linfoma - é<br />

um objetivo muito importante,<br />

pois afeta muitas pessoas”<br />

explica o investigador da academia<br />

eborense. As moléculas desenvolvidas<br />

“mostram potencial também<br />

para o tratamento deste tipo de<br />

linfoma, o DLBCL”, um tumor<br />

maligno do sistema linfático em que<br />

as células tumorais são os linfócitos<br />

B, de tamanho grande, que proliferam<br />

e infiltram o gânglio de forma difusa.<br />

Os resultados foram obtidos por<br />

Anthony Burke e Carolina Marques,<br />

investigadores do grupo de Síntese<br />

Molecular da UÉ, um dos 11 grupos<br />

que integram o Laboratório Associado<br />

para a Química Verde (LAQV-<br />

REQUIMTE), em colaboração<br />

com investigadores internacionais<br />

de Centros de I&D da Suíça e de<br />

Espanha.<br />

As novas moléculas “foram<br />

sintetizadas usando métodos<br />

químicos sustentáveis com<br />

catalisadores metálicos” revela<br />

o investigador e “apresentam uma<br />

estrutura química relativamente<br />

simples e são construídas por dois<br />

anéis heterocíclicos (um composto<br />

que tem um anel, do qual fazem parte<br />

pelo menos dois tipos diferentes<br />

de átomos), e em alguns casos são<br />

quirais, ou seja, não podem ser<br />

sobrepostos à sua imagem especular<br />

(espelho)”.<br />

A investigação na área da Química é<br />

“absolutamente fundamental”<br />

na deteção e tratamento do cancro,<br />

doença que é a segunda causa de<br />

morte a nível mundial e que apresenta<br />

ainda altas taxas de morbilidade,<br />

considera o também professor do<br />

Departamento de Química da UÉ,<br />

sendo “o do pulmão, colorretal e<br />

linfomas os três tipos de cancro<br />

mais difíceis de tratar”.<br />

Além disso, “estas moléculas<br />

também mostram atividade na<br />

área de doença de Alzheimer,<br />

principalmente na inibição de<br />

uma enzima importante para a<br />

progressão da doença chamada<br />

082 NOABR21 NOABR21 083


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

PUB.<br />

butirilcolinesterase” destaca<br />

Anthony Burke, referindo que o grupo<br />

publicou este estudo no ano passado<br />

na revista internacional Bioorganic<br />

Chemistry, também aqui em<br />

colaboração com grupos estrangeiros,<br />

da Espanha, Itália e da Alemanha.<br />

Este é mais um passo para o<br />

desenvolvimento de novas formas<br />

de tratamento do cancro estando<br />

atualmente os investigadores<br />

da Universidade de Évora “a<br />

identificar os alvos moleculares<br />

destas moléculas para permitir<br />

melhorar as suas características<br />

estruturais e assim aumentar<br />

a sua potência farmacológica”,<br />

avança Anthony Burke, para<br />

que proximamente “possamos<br />

avançar com estudos préclínicos<br />

e conseguir determinar<br />

a sua potência in vivo e o<br />

seu comportamento geral no<br />

organismo do animal”.<br />

Recorde-se que a equipa de<br />

investigadores liderados por<br />

Anthony Burke, entre outros<br />

avanços científicos, produziu<br />

com sucesso um novo inibidor da<br />

enzima Colinesterase, fundamental<br />

para assegurar a comunicação<br />

entre neurónios em doentes com a<br />

doença de Alzheimer. Inovadora,<br />

esta molécula apresenta apenas na<br />

sua composição o ingrediente ativo<br />

benéfico, por isso mais segura para o<br />

organismo humano.<br />

PUB.<br />

9600-549 Ribeira Grande<br />

geral@grupoideal.pt<br />

GRUPO<br />

084 NOABR21 NOABR21 085


ARTIGO TEMÁTICO | ALIMENTAÇÃO<br />

REPORTAGEM<br />

UE está a estudar o aumento das<br />

restrições dos produtos de origem<br />

vegetal e 76,4% dos consumidores<br />

portugueses não estão de acordo<br />

Estudo da Universidade Católica<br />

para a Upfield apura o conhecimento<br />

dos consumidores portugueses<br />

relativamente a produtos vegetais no<br />

sentido de averiguar a necessidade,<br />

ou não, de uma regulamentação mais<br />

restritiva sugerida pela União Europeia<br />

com a Alteração 171.<br />

De acordo com um estudo realizado a<br />

uma amostra representativa de 1013<br />

consumidores portugueses, 95.9% dos<br />

inquiridos sabe distinguir produtos<br />

lácteos e produtos de origem vegetal<br />

quanto à origem dos seus ingredientes<br />

e não se confundem com as diferentes<br />

alternativas.<br />

75.5% dos inquiridos “gostaria que as<br />

restrições legislativas aplicadas a nível<br />

europeu na rotulagem de produtos<br />

lácteos cumprissem as mesmas regras<br />

para rotular os produtos de origem<br />

vegetal”, regras essas que hoje são mais<br />

restritivas para os produtos de origem<br />

vegetal.<br />

Apenas 11.2% dos consumidores estão<br />

a par da atual legislação que regula<br />

a rotulagem de produtos de origem<br />

vegetal.<br />

A maioria dos portugueses (96.4%)<br />

sabe que os produtos de origem<br />

vegetal (plant-based) são produtos<br />

com ingredientes maioritariamente<br />

provenientes de origem vegetal e<br />

95.9% sabe identificar corretamente<br />

a diferença entre produtos lácteos e<br />

produtos de origem vegetal quanto à<br />

origem dos ingredientes com que são<br />

produzidos. Estas são as conclusões<br />

de um estudo levado a cabo pela<br />

Universidade Católica para a Upfield,<br />

a produtora líder de cremes vegetais,<br />

margarinas e alternativas vegetais<br />

ao queijo com mais de 100 marcas,<br />

incluindo a PLANTA e BECEL.<br />

Este estudo procurou determinar<br />

o conhecimento dos consumidores<br />

relativamente às alternativas vegetais<br />

e insere-se no contexto da discussão<br />

da Alteração 171 por parte da Comissão<br />

Europeia, Conselho da UE e Parlamento<br />

Europeu, previsto durante o mês de<br />

março. Esta alteração, apresentada<br />

por um grupo político que alega que<br />

as práticas atuais de rotulagem de<br />

alimentos de origem vegetal enganam<br />

os consumidores, visa impor diversas<br />

restrições na nomenclatura, no tipo<br />

de embalagens, e nas imagens e<br />

comunicações que podem ser utilizadas<br />

nos produtos de origem vegetal.<br />

Com o objetivo de avaliar perceções<br />

dos consumidores sobre produtos de<br />

origem vegetal a partir de diferentes<br />

nomenclaturas e a sua capacidade para<br />

os distinguir de produtos de origem<br />

animal, o estudo demonstra que os<br />

portugueses não ficam confusos no<br />

supermercado e sabem identificar<br />

e diferenciar os produtos de origem<br />

vegetal, como no caso da ‘alternativa de<br />

soja ao iogurte’ (95.1% dos inquiridos<br />

considerou que este é um produto de<br />

origem vegetal) ou do queijo vegan<br />

onde 97,2% classificou corretamente<br />

como ‘alternativa vegetal ao queijo’.<br />

Assim, a respeito da rotulagem, 76.4%<br />

dos consumidores entendem que<br />

termos como ‘cremoso’ ou ‘não contém<br />

lactose’ poderão aparecer nos rótulos<br />

para qualificar alternativas de origem<br />

vegetal, o que, segundo a Alteração<br />

171 sugerida pela União Europeia não<br />

poderá ser permitida.<br />

Francisco Guerreiro, eurodeputado<br />

do Verdes / EFA, comenta que “é<br />

lamentável, em primeiro lugar, que a<br />

imposição de mais restrições ao sector<br />

alimentar de produtos vegetais seja<br />

sequer discutida. O grupo político que<br />

propôs esta alteração defende que<br />

as práticas atuais de rotulagem de<br />

produtos à base de plantas confundem<br />

os consumidores - uma alegação criada<br />

por setores que estão insatisfeitos com a<br />

crescente preferência dos consumidores<br />

por alternativas à base de plantas. Este<br />

086 NOABR21 NOABR21 087


REPORTAGEM<br />

ARTIGO TEMÁTICO |ALIMENTAÇÃO<br />

REPORTAGEM<br />

estudo muito oportuno vem provar<br />

o que os consumidores, empresas e<br />

ONGs têm tentado dizer aos decisores<br />

políticos: não somos enganados por<br />

produtos à base de plantas - compramos<br />

porque gostamos destes produtos,<br />

porque nos preocupamos com o planeta,<br />

com a nossa saúde e com o bem-estar<br />

animal!”<br />

Qual o conhecimento dos consumidores<br />

em relação ao quadro jurídico dos<br />

produtos de origem vegetal?<br />

O estudo em causa quis também<br />

conhecer a opinião dos consumidores<br />

portugueses sobre o quadro jurídico dos<br />

produtos vegetais, de forma a perceber<br />

a necessidade de uma alteração com<br />

regras mais restritas. Questionados<br />

sobre o conhecimento da legislação<br />

em vigor sobre rotulagem de produtos<br />

de origem vegetal, apenas 11.2% dos<br />

inquiridos identificaram a resposta<br />

correta e está ciente da legislação em<br />

vigor.<br />

A maioria, 88,8% dos consumidores<br />

portugueses, não estão a par<br />

da legislação em vigor. 59.5%<br />

desconheciam que a informação de<br />

que termos comumente conhecidos<br />

como ‘iogurte de coco’, ‘leite de soja’,<br />

‘queijo vegan’ ou ‘natas vegetais’ são<br />

atualmente restritos e 29.3% referiram<br />

desconhecer a legislação sobre este<br />

assunto.<br />

Álvaro Carrilho, Head of Sales Portugal<br />

da Upfield, reafirma que “embora, pelo<br />

estudo, a maioria dos consumidores<br />

portugueses não o saibam, o atual<br />

quadro regulamentar da União Europeia<br />

já é suficientemente restritivo. Esta<br />

Alteração 171, que está em vias de ser<br />

discutida, pode significar a proibição<br />

de produtos de origem vegetal<br />

utilizarem embalagens com formatos<br />

já reconhecidos (como por exemplo<br />

um copo de iogurte), a utilização<br />

de informação útil sobre saúde e<br />

alergénios para descrever um produto<br />

como “adequado para pessoas que<br />

sofrem de intolerância à lactose” ou<br />

palavras descritivas como “cremoso”<br />

e “amanteigado” nas embalagens e na<br />

publicidade dos produtos alternativos<br />

aos lacticínios de base vegetal.”<br />

Ainda neste âmbito, e apesar da<br />

maioria dos inquiridos desconhecer o<br />

quadro legal aplicável a produtos de<br />

origem vegetal, 75.5% dos inquiridos<br />

consideram que as restrições legislativas<br />

aplicadas a nível europeu na rotulagem<br />

de produtos lácteos cumprissem as<br />

mesmas regras para rotular os produtos<br />

de origem vegetal.<br />

Os portugueses são também<br />

muito positivos quanto ao acesso<br />

a mais alternativas vegetais nos<br />

supermercados, com 96.0% dos<br />

consumidores a confirmar que a oferta<br />

de produtos deve ser cada vez mais<br />

alargada, possibilitando opções de<br />

escolhas para todos os gostos, tipos de<br />

alimentos e intolerâncias.<br />

Metodologia<br />

Realizado pela Universidade Católica<br />

Portuguesa, para a Upfield, este<br />

inquérito teve por base uma amostra<br />

representativa de 1013 participantes,<br />

recrutados através do Painel de Estudos<br />

Online (PEO) da CATÓLICA-LISBON,<br />

com uma distribuição semelhante à da<br />

população portuguesa em termos de<br />

sexo e faixa etária (i.e., 18-19, 20-29,<br />

30-39, 40-49, 50-69 anos). De modo<br />

a assegurar a qualidade dos dados<br />

obtidos, a ordem de apresentação<br />

das opções de resposta foi aleatória<br />

e só foram considerados válidos os<br />

questionários que obtiveram um tempo<br />

de resposta superior a 2 minutos e 30<br />

segundos. Os dados foram analisados<br />

com recurso à versão 26 do software<br />

IBM® SPSS®.<br />

088 NOABR21 NOABR21 089


REPORTAGEM<br />

ARTIGO TEMÁTICO REPORTAGEM<br />

| ESTUDO TURISMO<br />

Estudo avalia a perceção dos<br />

residentes em cidades pequenas<br />

sobre a atividade turística<br />

Para os residentes em cidades pequenas,<br />

os impactos socioculturais da atividade<br />

turística são mais importantes do que<br />

os impactos económicos, conclui um<br />

estudo conduzido por investigadores<br />

da Universidade de Coimbra (UC) e do<br />

Instituto Politécnico de Viseu (IPV).<br />

Esta investigação, que teve por objetivo<br />

analisar a relação entre a ligação ao<br />

lugar e os impactos percecionados<br />

pelos residentes em cidades de pequena<br />

dimensão relativamente à atividade<br />

turística, envolveu 350 habitantes de<br />

várias cidades, entre as quais Aveiro,<br />

Covilhã, Figueira da Foz, Gouveia,<br />

Guarda, Leiria, Seia e Viseu.<br />

“A investigação sobre a visão dos<br />

residentes relativamente à atividade<br />

turística é pouco explorada, mais<br />

ainda em cidades de pequena<br />

dimensão. Por isso, este estudo<br />

pretende precisamente colmatar<br />

essa lacuna na literatura e contribuir<br />

para um melhor planeamento destes<br />

destinos que, fruto da pandemia,<br />

vão ter uma maior procura”, afirma<br />

Cláudia Seabra, investigadora e docente<br />

da Faculdade de Letras da Universidade<br />

de Coimbra (FLUC).<br />

Uma explicação para os dados obtidos<br />

no estudo, financiado pela Fundação<br />

para a Ciência e a Tecnologia (FCT),<br />

prende-se com o facto de “nas<br />

pequenas cidades o espírito de<br />

comunidade ainda ser forte. As<br />

pessoas estão mais conscientes dos<br />

efeitos sociais que o desenvolvimento<br />

do turismo tem nas suas vidas<br />

do que os efeitos económicos ou<br />

ambientais. Em geral, as pequenas<br />

cidades têm uma população<br />

pequena e envelhecida, com menos<br />

oportunidades de emprego, cuidados<br />

de saúde e grandes infraestruturas de<br />

comunicação”, afirma Cláudia Seabra.<br />

Nessas comunidades, fundamenta, “as<br />

pessoas geralmente estão ansiosas<br />

para conhecer novas pessoas e se<br />

conectar com outras culturas e<br />

gerações diferentes. Em geral, os<br />

impactos negativos dos grandes<br />

centros urbanos onde milhares<br />

de turistas se aglomeram não são<br />

sentidos. Os turistas são vistos como<br />

pessoas que trazem oportunidades<br />

de negócios, visitando bares,<br />

restaurantes, hotéis e atrações<br />

da região, ao mesmo tempo que<br />

compram produtos locais para levar.<br />

Por outro lado, os turistas são fontes<br />

de rejuvenescimento cultural”.<br />

A docente e investigadora do Centro de<br />

Estudos em Geografia e Ordenamento<br />

do Território (CEGOT) considera<br />

que os resultados deste estudo, além<br />

de contribuírem para uma “maior<br />

consciência dos efeitos que o<br />

desenvolvimento do turismo está<br />

a ter na comunidade dos destinos<br />

das pequenas cidades, porque o<br />

turismo pode ser um desafio para<br />

as pequenas localidades e cidades,<br />

sobretudo de forma sustentável”,<br />

podem ajudar “os gestores a fornecer<br />

benefícios económicos, sociais e<br />

culturais de longo prazo para a<br />

comunidade local, melhorando<br />

a qualidade de vida e, assim,<br />

fortalecendo o lugar e o vínculo com<br />

a comunidade”.<br />

090 NOABR21 NOABR21 091


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

ÁREA TEMÁTICA REPORTAGEM<br />

| CIÊNCIA<br />

30 anos de Ciência e<br />

Tecnologia em papel de jornal<br />

Rui Brito Fonseca<br />

Partindo da análise de milhares de<br />

artigos de jornais diários, pagos e<br />

de circulação nacional, ou seja, sem<br />

contemplar os jornais ditos regionais,<br />

refletiu-se sobre as representações que<br />

os portugueses têm da ciência e da<br />

tecnologia, de 1976 até 2005.<br />

A comparação efetuada, entre os jornais<br />

de “qualidade” e os jornais “populares”,<br />

revelou-se frutuosa, ainda que as<br />

fronteiras entre estes dois tipos de<br />

jornais sejam cada vez mais ténues.<br />

A grande diferença identificada entre<br />

estes dois tipos de jornal refere-se à<br />

tendência geral observada. Nos jornais<br />

de “qualidade, foi possível identificar<br />

uma forte tendência para o aumento<br />

dos artigos sobre assuntos de ciência e<br />

tecnologia. Curiosamente, no caso dos<br />

jornais “populares”, verificou-se uma<br />

maior apetência para a publicação de<br />

artigos sobre estes assuntos até finais da<br />

década de 1980. A partir daí, observouse<br />

uma opção editorial marcada pela<br />

diminuição de publicação destes artigos.<br />

Acrescente-se que, no caso dos jornais<br />

“populares”, boa parte deste artigos<br />

debruçou-se sobre estas temáticas de<br />

forma superficial, abordando o assunto<br />

do ponto de vista da curiosidade e da<br />

bizarria.<br />

No que diz respeito aos principais atores<br />

presentes, em ambas as tipologias<br />

de jornal, os artigos revelaram uma<br />

ciência e tecnologia de rosto masculino,<br />

não consonante com a proporção e<br />

importância das mulheres na ciência<br />

e tecnologia produzidas em Portugal,<br />

ainda que se tenha observado uma<br />

crescente presença de mulheres, à<br />

Rui Brito Fonseca<br />

Presidente e Professor Coordenador no Instituto<br />

Superior de Ciências Educativas do Douro, em<br />

Penafiel (desde 2019). Professor adjunto no<br />

Instituto Superior de Ciências Educativas, em<br />

Odivelas (desde 2010). Doutorado em Sociologia<br />

e Mestre em Ciências do Trabalho, pelo ISCTE-<br />

IUL. É também licenciado em Ciência Política<br />

com especialização em relações internacionais,<br />

pela Universidade Lusófona. É desde 2000<br />

investigador, tendo vindo a desenvolver trabalho<br />

sobre comunicação, media e compreensão pública<br />

da ciência, sobre tecnologias da informação e<br />

comunicação em saúde e sobre toxicodependências,<br />

em diversos projetos de investigação.<br />

092 NOABR21 NOABR21 093


ÁREA REPORTAGEM<br />

TEMÁTICA | CIÊNCIA<br />

ÁREA TEMÁTICA REPORTAGEM<br />

| AMBIENTE<br />

medida que nos aproximamos da<br />

atualidade.<br />

Relativamente aos temas dominantes,<br />

em ambos os tipos de jornal, observouse<br />

um predomínio generalizado dos<br />

artigos que versavam sobre questões de<br />

biologia humana e saúde. A presença<br />

paradigmática da medicina e da saúde,<br />

revelou uma imagem da ciência e<br />

tecnologia muito conectada com as<br />

preocupações quotidianas com a saúde.<br />

Não obstante as nuances de proporção,<br />

ao longo dos anos, também ambos<br />

os tipos de jornal deram especial<br />

ênfase à astronomia e ao espaço, e à<br />

história, arqueologia e antropologia.<br />

Se no caso da astronomia e do espaço,<br />

os artigos eram muito relacionados<br />

com a conquista espacial e a guerra<br />

fria, no caso da história, arqueologia<br />

e antropologia, os artigos reportavam<br />

descobertas arqueológicas, bem como<br />

o património histórico português, em<br />

Portugal e no mundo.<br />

Saliente-se que esta visão de autovalorização<br />

da história e património<br />

nacionais estava mais patente nos<br />

jornais “populares”. Também não é de<br />

descurar a relevância dada às questões<br />

ambientais e relacionadas com a<br />

energia nuclear e de uma crescente<br />

consciencialização das populações,<br />

para os problemas decorrentes da má<br />

gestão ambiental – mais nos jornais<br />

de “qualidade” – e aos computadores,<br />

informática e internet – nos jornais<br />

“populares”.<br />

No sentido de compreender as<br />

geografias da ciência e da tecnologia,<br />

considerou-se relevante analisar a<br />

localização geográfica dos eventos<br />

relatados nos jornais. Assim, os dados<br />

recolhidos permitem afirmar que<br />

independentemente do tipo de jornal<br />

os eventos ocorreram maioritariamente<br />

na Europa, primeiro, e na América do<br />

Norte, depois. Estamos perante uma<br />

ciência e tecnologia Made in Europe<br />

e Made in USA and Canada. Nos<br />

últimos anos, ambos os tipos de jornais<br />

transmitiram uma imagem da ciência e<br />

da tecnologia de “rosto europeu”.<br />

Quanto ao discurso dominante utilizado<br />

na comunicação de questões de ciência<br />

e tecnologia, também se identificaram<br />

algumas nuances. Ao longo dos anos,<br />

nos jornais de “qualidade” observou-se<br />

a evolução de um discurso dominante<br />

de benefício dos desenvolvimentos,<br />

científicos e tecnológicos, para um<br />

discurso tendencialmente enfatizador<br />

dos riscos. Nos jornais “populares”, o<br />

discurso do benefício foi predominante.<br />

De um modo geral, a imagem da ciência<br />

e da tecnologia parece ser dominada por<br />

um discurso de benefício e de promessa.<br />

Estes são alguns dos itens que<br />

permitem compreender e refletir sobre<br />

a presença da ciência e da tecnologia<br />

na imprensa portuguesa, num longo<br />

período da história recente de Portugal.<br />

Dá que pensar…<br />

094 NOABR21 NOABR21 095


ÁREA REPORTAGEM<br />

TEMÁTICA | SAÚDE<br />

ÁREA TEMÁTICA REPORTAGEM<br />

|CIÊNCIA<br />

Combater a obesidade e o excesso<br />

de peso com a ajuda do telemóvel<br />

José Pinto Gouveia<br />

José Pinto Gouveia<br />

Uma equipa de investigadores do Centro<br />

de Investigação em Neuropsicologia e<br />

Intervenção Cognitivo-Comportamental<br />

(CINEICC) da Universidade de Coimbra<br />

(UC), liderada por José Pinto Gouveia,<br />

desenvolveu uma aplicação móvel (app)<br />

para ajudar no combate à obesidade e<br />

excesso de peso.<br />

A app foi desenvolvida no âmbito<br />

do projeto eBEfree, que tem como<br />

grande objetivo fornecer ferramentas e<br />

estratégias de regulação emocional que<br />

permitam às pessoas com obesidade<br />

ou excesso de peso eliminar ou reduzir<br />

significativamente os episódios de<br />

ingestão alimentar compulsiva, e<br />

aumentar a sua saúde mental e qualidade<br />

de vida.<br />

No atual contexto da pandemia<br />

Covid-19, «especialmente com o<br />

confinamento geral no nosso país, vários<br />

estudos sugerem que o isolamento vem<br />

acompanhado de uma redução na saúde<br />

mental das pessoas. Neste sentido, o<br />

projeto eBEfree, nomeadamente pelo<br />

seu formato digital, pretende ser um<br />

contributo especialmente apropriado<br />

à situação atual», explica a equipa do<br />

projeto, financiado pela Fundação para a<br />

Ciência e a Tecnologia (FCT).<br />

A app eBEfree é constituída por<br />

12 módulos, disponibilizado um<br />

por semana, que abordam diversas<br />

perspetivas do problema. «Os<br />

conteúdos para o tratamento da<br />

ingestão alimentar compulsiva, como<br />

estratégias de regulação emocional<br />

através de exercícios comportamentais<br />

e de meditação foram desenvolvidos<br />

com recurso a vídeos de animação<br />

explicativos, exercícios áudio e vídeos<br />

de psicólogos/as da nossa equipa a<br />

abordar os temas relevantes», detalha<br />

José Pinto Gouveia, acrescentando que<br />

a aplicação inclui também um fórum de<br />

discussão, «onde os utilizadores podem<br />

colocar questões aos terapeutas (haverá<br />

sempre um terapeuta a acompanhar o<br />

funcionamento da app)».<br />

Para testar e validar a eficácia da<br />

aplicação, a equipa está a solicitar a<br />

colaboração de pessoas de todo o país,<br />

com idades compreendidas entre os<br />

18 e os 55 anos, com excesso de peso e<br />

ingestão alimentar compulsiva, e que<br />

possuam um smartphone ou tablet com<br />

acesso à internet. Os voluntários que<br />

pretendam participar no estudo devem<br />

contactar a equipa de investigação<br />

através do endereço eletrónico: ebefree@<br />

uc.pt.<br />

A participação no estudo envolverá<br />

uma entrevista inicial, via zoom, para<br />

avaliar os critérios de elegibilidade,<br />

o preenchimento de uma bateria de<br />

questionários online e a utilização da<br />

aplicação móvel.<br />

O eBEfree resulta de um estudo anterior<br />

cujos resultados evidenciaram que «estas<br />

ferramentas de regulação emocional e<br />

promoção de saúde mental são eficazes<br />

quando implementadas presencialmente<br />

em formato grupal. O que pretendemos<br />

com o eBEfree é alargar esse estudo para<br />

chegar a todo o território nacional, com<br />

todas as vantagens de uma aplicação<br />

móvel», conclui José Pinto Gouveia.<br />

Mais informação sobre o projeto<br />

disponível em: https://ebefree.uc.pt/<br />

096 NOABR21 NOABR21 097


REPORTAGEM<br />

REPORTAGEM<br />

ÁREA TEMÁTICA REPORTAGEM<br />

| SAÚDE<br />

Inquérito internacional<br />

revela que portugueses estão<br />

deprimidos: jovens e famílias<br />

com filhos são os mais afetados<br />

Liliana Abreu<br />

Liliana Abreu<br />

Doutorada em Saúde Pública pelo Instituto de<br />

Saúde Pública da Universidade do Porto (2018).<br />

Obteve uma bolsa de Doutoramento da Fundação<br />

para a Ciência e Tecnologia, tendo como Instituição<br />

de Acolhimento o i3S – Instituto de Investigação e<br />

Inovação em Saúde. Durante o seu doutoramento<br />

obteve uma Bolsa Fulbright, que lhe permitiu<br />

desenvolver parte do seu doutoramento nos EUA,<br />

passando pela Universidade de Massachussets e<br />

pela T.H. Chan Harvard School of Public Health.<br />

A sua tese de doutoramento centrou-se no estudo<br />

da literacia em saúde distribuída de pessoas com<br />

doenças crónicas, especificamente, asma e diabetes.<br />

Atualmente, é investigadora na Universidade de<br />

Constança (desde 2019), Alemanha, no Grupo de<br />

Desenvolvimento e Investigação, onde desenvolve<br />

investigação na área da epidemiologia social em<br />

países em desenvolvimento e dá aulas de Saúde<br />

Global.<br />

Com o objetivo de continuar a avaliar<br />

o impacto social e económico da<br />

pandemia a nível mundial, foi lançado<br />

há cerca de seis meses a segunda fase<br />

do inquérito mundial denominado<br />

“Life with Corona” que, em Portugal,<br />

tem como parceiro o Instituto de<br />

Investigação e Inovação em Saúde da<br />

Universidade do Porto (i3S). Os dados<br />

já obtidos mostram que uma parte<br />

considerável da população apresenta<br />

sintomas ligeiros de depressão e<br />

que cerca de 50% dos inquiridos de<br />

Portugal, Argentina, Indonésia, Reino<br />

Unido e Estados Unidos, assim como<br />

40% dos alemães, revelam sintomas<br />

mais graves de depressão. A geração<br />

mais jovem e as famílias com filhos são<br />

os mais afetados.<br />

O “Life with Corona” foi lançado a 23 de<br />

março de 2020 e, nesta segunda fase,<br />

que começou a 1 de outubro, “tentámos<br />

perceber os efeitos psicológicos que a<br />

pandemia e as medidas preventivas<br />

têm tido sobre as pessoas. Até 4 de<br />

março recebemos um total de 21.552<br />

respostas de 136 países e, até ao<br />

momento, Portugal é o segundo país<br />

com mais participações” no estudo,<br />

depois da Alemanha, salienta Liliana<br />

Abreu, investigadora portuguesa na<br />

Universidade de Constança (Alemanha),<br />

uma das instituições que lidera o<br />

projeto.<br />

Liliana Abreu, que já foi investigadora<br />

no i3S e com o qual mantém a<br />

colaboração através deste projeto,<br />

explica que analisaram os dados<br />

relativos a Portugal e verificaram que<br />

“50% dos participantes apresentam<br />

níveis de depressão moderada”, o<br />

que, diz, “é significativo”. Uma das<br />

causas identificadas tem a ver com a<br />

diminuição dos rendimentos mensais.<br />

“Percebemos também, ao contrário<br />

do que se pensava, que os mais jovens<br />

são mais propensos a apresentar<br />

níveis mais elevados de depressão em<br />

comparação com os mais velhos, o que<br />

expõe o fardo adicional que as gerações<br />

mais jovens estão a sofrer”, acrescenta.<br />

“Existem imensos estudos a decorrer<br />

sobre a pandemia, termos um bom<br />

nível de participação num estudo<br />

098 NOABR21 NOABR21 099


ÁREA REPORTAGEM<br />

TEMÁTICA | SAÚDE<br />

ÁREA TEMÁTICA REPORTAGEM<br />

| SAÚDE<br />

internacional demonstra o interesse<br />

dos portugueses em nos ajudarem a<br />

compreender o impacto que esta crise<br />

está a ter nas suas vidas”, salienta<br />

Liliana Abreu. Os dados que chegaram<br />

de Portugal são semelhantes aos<br />

obtidos nos restantes países e tornase<br />

evidente que a saúde mental foi<br />

fortemente afetada pela pandemia.<br />

“Só o facto de ter sintomas da doença<br />

pode desencadear problemas de saúde<br />

mental. Isto sugere que o medo de<br />

estar doente com COVID pode estar a<br />

causar níveis mais elevados de stress”,<br />

acrescentam os investigadores.<br />

A equipa internacional de<br />

investigadores está agora a comparar<br />

como estão a reagir aqueles que vivem<br />

sozinhos e aqueles que vivem com<br />

outros, e também aqueles que vivem<br />

com crianças e aqueles que não vivem.<br />

Segundo os dados já disponibilizados<br />

no site “Life with Corona” (https://<br />

lifewithcorona.org/how-we-experiencethe-pandemic-is-shaped-by-whowe-live-with/),<br />

as pessoas que vivem<br />

sozinhas “emergem como o grupo que<br />

teve as piores experiências durante a<br />

pandemia. São mais propensos a relatar<br />

níveis mais baixos de satisfação de<br />

vida do que a média geral da amostra<br />

e são também mais propensos a<br />

sentir ansiedade ou depressão”. Pelo<br />

contrário, os indivíduos que vivem com<br />

uma outra pessoa “têm, geralmente,<br />

lidado melhor com a pandemia e as<br />

suas contramedidas. Em comparação<br />

com a média da amostra, relatam<br />

um maior bem-estar subjetivo, e<br />

têm menos probabilidades de sentir<br />

depressão, ansiedade ou demonstrarem<br />

comportamentos agressivos”.<br />

Quanto às pessoas que vivem com<br />

um ou mais adultos e com crianças,<br />

em comparação com a média da<br />

amostra, “têm os piores indicadores de<br />

consumo alimentar. É mais provável<br />

que tenham ganho peso, petiscam mais<br />

frequentemente e fumam e bebem<br />

mais do que qualquer outro grupo.<br />

Também apresentam níveis mais<br />

elevados de ansiedade e agressividade.<br />

É também mais provável que tenham<br />

experimentado maiores tensões entre os<br />

membros das suas famílias”.<br />

O objetivo dos investigadores passa<br />

por “gravar” as vozes e as experiências<br />

dos cidadãos de todo o mundo durante<br />

este período invulgar de pandemia.<br />

Sem fins lucrativos, e baseado em<br />

métodos académicos rigorosos, o<br />

projeto visa populações adultas em<br />

todo o mundo e está traduzido em<br />

27 línguas. O inquérito continua em<br />

curso (https://lifewithcorona.org/<br />

survey/) pelo menos até finais de <strong>2021</strong>,<br />

pelo que ainda é possível participar.<br />

Maria Rui Correia, investigadora no i3S<br />

responsável por disseminar o projeto<br />

em território português, apela “a todos<br />

os portugueses para responderem ao<br />

inquérito, pois só com a participação<br />

dos cidadãos se consegue uma imagem<br />

real do que se passa na nossa população<br />

neste tempo de pandemia”.<br />

A iniciativa do “Life with Corona”<br />

partiu de uma equipa de investigadores<br />

internacionais da área das ciências<br />

sociais, nomeadamente do Centro<br />

de Segurança e Desenvolvimento<br />

Internacional (ISDC), na Alemanha,<br />

do Instituto Mundial de Investigação<br />

em Economia do Desenvolvimento<br />

da Universidade das Nações Unidas<br />

(UNU-WIDER), na Finlândia, do<br />

Instituto Leibniz de Culturas Vegetais<br />

e Ornamentais (IGZ), na Alemanha,<br />

da Universidade de Constança, na<br />

Alemanha, e do Instituto de Estudos<br />

de Desenvolvimento (IDS), no Reino<br />

Unido. O projeto é liderado por<br />

Tilman Brück (ISDC/IGZ), Patrícia<br />

Justino (UNU-WIDER), Anke Hoeffler<br />

(Universidade de Constança) e<br />

Wolfgang Stojetz (ISDC). Para<br />

além do i3S, este projeto de Ciência<br />

Cidadã contou com a participação de<br />

instituições e organizações de vários<br />

países. Os investigadores pretendem<br />

obter dados relevantes para apoiar<br />

respostas socioeconómicas sustentáveis<br />

à pandemia causada pelo novo<br />

coronavírus.<br />

0100 NOABR21 NOABR21 0101


CRÓNICA<br />

CRÓNICA<br />

Enfermeira Sara Sousa,<br />

Enfermeira Especialista em<br />

Saúde Infantil e Pediátrica<br />

Um ano passou desde o surgimento<br />

do primeiro caso confirmado de<br />

infeção pelo novo coronavírus nos<br />

Açores. Momento de refletir sobre<br />

algumas das mudanças que vivenciei<br />

enquanto enfermeira neste mundo tão<br />

particular que é a pediatria, a minha<br />

área de cuidados de eleição, onde<br />

exerço há 12 anos a minha atividade<br />

profissional e pela qual ganhei um<br />

gosto exponencial. O cuidado à<br />

criança/jovem é um desafio constante,<br />

não só por englobar várias faixas<br />

etárias e diferentes especialidades<br />

O cuidar em<br />

pediatria em tempos<br />

de pandemia<br />

médicas e cirúrgicas, como também<br />

porque a adesão e o resultado dos<br />

cuidados prestados e objetivos<br />

alcançados dependerá da relação<br />

de confiança estabelecida entre<br />

enfermeiro – pais – criança/jovem.<br />

Há um ano atrás viveram-se dias<br />

em contrarrelógio. Foi tempo<br />

de adaptação a novas práticas,<br />

reestruturação de espaços físicos e<br />

equipas. Era urgente refletir da forma<br />

mais criteriosa possível sobre todos os<br />

pormenores. Vários cenários possíveis<br />

foram antecipados de forma a provir<br />

os ambientes de toda a segurança para<br />

nós, profissionais de saúde, e para a<br />

criança e sua família.<br />

Reunidas as condições para<br />

garantir uma resposta adequada<br />

às necessidades identificadas,<br />

começamos a escrever um novo<br />

capítulo nas nossas vidas pessoais<br />

e profissionais. O nosso número<br />

mecanográfico deu lugar a imagens<br />

de arco-íris, desenhados nas batas<br />

junto ao nosso nome, como forma<br />

de manter a esperança e amenizar a<br />

insegurança causada pelo impacto<br />

ameaçador do uso dos equipamentos<br />

de proteção individual. O medo que<br />

todos sentimos, e que era bem real,<br />

converteu-se em coragem e seguimos<br />

juntos, mais unidos do que nunca,<br />

com os mesmos receios, mas também<br />

com as mesmas armas – sorriso no<br />

olhar e muita arte no brincar. Nem<br />

sempre é fácil conquistar a confiança<br />

das nossas crianças. Em pediatria nem<br />

sempre o mais simples se torna fácil.<br />

A pandemia trouxe-nos muitos<br />

entraves na nossa forma de cuidar e o<br />

nosso trabalho emocional foi o mais<br />

afetado. O enfermeiro de pediatria<br />

procura diariamente transformar<br />

o internamento de uma criança/<br />

jovem numa vivência positiva e não<br />

num acontecimento potencialmente<br />

traumático. A realidade dos tempos<br />

que correm lançou-nos um desafio<br />

ainda maior. Desenvolver uma<br />

relação empática e terapêutica<br />

estável, na adversidade imposta pelo<br />

0102 NOABR21 NOABR21 0103


CRÓNICA<br />

CRÓNICA<br />

distanciamento físico e pelo uso de<br />

máscaras que condicionam a perceção<br />

das nossas expressões de afeto. Eles<br />

não gostam do nosso rosto escondido,<br />

mas percebem que o nosso olhar<br />

é de confiança e isso, por vezes, é<br />

inexplicável.<br />

O foco de toda equipa foi sempre o<br />

mesmo – reorganizar e reinventar<br />

de forma a garantir a excelência do<br />

cuidar – e isto não se reduz apenas aos<br />

colegas que numa primeira instância<br />

e de uma forma bastante altruísta<br />

avançaram e constituíram a equipa<br />

covid pediátrica. No exterior desta<br />

ala estão sempre outros enfermeiros,<br />

assistentes operacionais, médicos e<br />

toda uma equipa de profissionais que,<br />

com o mesmo afinco, trabalham para<br />

assegurar as necessidades do serviço e<br />

que, vestindo as suas fardas coloridas,<br />

com personagens conhecidas do<br />

mundo infantil, usando o seu<br />

sentido de humor, disponibilidade,<br />

tranquilidade e empatia dão suporte<br />

às crianças/jovens e suas famílias,<br />

não infetadas pelo vírus sarsCov2,<br />

que são hospitalizadas para cumprir<br />

tratamentos inerentes a outras áreas<br />

de especialidade.<br />

Era e é importante desmistificar<br />

os receios inerentes ao recurso<br />

aos cuidados de saúde e à própria<br />

hospitalização em tempo de<br />

pandemia. Todos os dias equipas<br />

inteiras trabalham arduamente para<br />

que os seus serviços sejam ambientes<br />

seguros e acolhedores para os seus<br />

utentes.<br />

Embora tenham direito a um<br />

acompanhante, as visitas diárias de<br />

familiares numa altura pré-pandemia<br />

constituíam um momento importante<br />

no dia de uma criança/jovem<br />

hospitalizada. Com as limitações<br />

nas visitas era importante manter o<br />

vínculo familiar e com a sua rede de<br />

apoio. As visitas à janela do quarto,<br />

onde a criança se encontra, são<br />

uma alternativa que contribuiu para<br />

manter uma aproximação benéfica ao<br />

ambiente familiar. As videochamadas<br />

e as plataformas digitais são, do<br />

mesmo modo, recursos muito<br />

utilizados para manter a comunicação<br />

com amigos e familiares,<br />

proporcionando sentimentos de<br />

segurança e bem-estar importantes no<br />

processo de cura.<br />

As áreas lúdicas foram encerradas<br />

e a partilha de brinquedos<br />

desaconselhada, apesar da sua<br />

limpeza e desinfeção frequente, que já<br />

acontecia anteriormente como prática<br />

comum. Impreterivelmente são<br />

apuradas as competências criativas<br />

dos enfermeiros. As atividades<br />

recreativas num quarto onde estão<br />

mais crianças foram ajustadas de<br />

forma a não implicarem proximidade<br />

no contato. Cenário nem sempre<br />

fácil de controlar quando até aos<br />

dias de hoje partilhar, ajudar e<br />

brincar com os outros fazia parte<br />

do quotidiano das nossas crianças,<br />

noutros moldes. Contamos com<br />

os pais como parceiros nesta tarefa<br />

inglória, sendo que estes, geralmente,<br />

se demonstram sensibilizados para<br />

colaborar, privilegiando brincadeiras<br />

mais individualizadas.<br />

O brincar mantém-se o nosso<br />

grande instrumento terapêutico de<br />

trabalho, pois é a forma através da<br />

qual as nossas crianças comunicam<br />

connosco, com o meio em que vivem<br />

0104 NOABR21 NOABR21 0105


CRÓNICA<br />

PUB.<br />

REPORTAGEM<br />

e expressam os seus sentimentos.<br />

Os enfermeiros de pediatria têm<br />

inato um palhaço interior. Não<br />

é treinado, nem forçado e não<br />

há grande teoria que sustente<br />

este nosso “saber ser”. É assim<br />

que conquistamos as crianças<br />

no nosso dia a dia – a brincar.<br />

Minimizamos medos, inseguranças<br />

e conseguimos a sua colaboração<br />

até mesmo em procedimentos mais<br />

invasivos.<br />

Todas as estratégias têm um<br />

cariz evolutivo e acompanham<br />

as alterações que ocorrem nas<br />

diretrizes do plano de contingência<br />

hospitalar. Considero que poderia<br />

descrever muito mais e assumo<br />

que mais ainda poderia ser feito<br />

no sentido de colmatar as lacunas<br />

próprias dos obstáculos colocados<br />

pela pandemia no cuidar em<br />

pediatria. No entanto, e apesar<br />

do inegável cansaço físico e<br />

psicológico que nós, profissionais<br />

de saúde, vivenciamos, o nosso foco<br />

de atuação sempre esteve presente e<br />

bem definido.<br />

O caminho ainda é longo, mas<br />

enquanto equipa seguimos com<br />

a mesma linha de pensamento e<br />

com a vontade comum de aligeirar<br />

as sequelas deixadas por estes<br />

tempos particulares que vivemos.<br />

Cuidamos uns dos outros como<br />

a segunda família que somos e<br />

depositamos paralelamente toda<br />

a emocionalidade, empenho e<br />

profissionalismo no nosso cuidar.<br />

0106 NOABR21 NOABR21 0107


CRÓNICA<br />

CRÓNICA<br />

Por Ricardo Silva<br />

José Tolentino de Mendonça, O Que É Amar<br />

um País, O Poder da Esperança, Quetzal, 2020<br />

O madeirense, cardeal, poeta e pensador José<br />

Tolentino Mendonça propôs como reflexão<br />

no seu discurso de 2020, no Dia de Portugal,<br />

de Camões e das Comunidades Portuguesas a<br />

temática “O que é Amar um País”, convertida<br />

em título do livro ora presente. O subtítulo<br />

aponta para uma outra reflexão, traduzida numa<br />

pequena coletânea de textos, feita no decorrer<br />

da pandemia e que, pela sua profundidade,<br />

merece um cuidado que este escrito não vai<br />

observar. E isto porque o cidadão que foi<br />

convidado para proferir o discurso do dia 10<br />

de junho quis destacar a palavra Esperança<br />

como o poder sobre a pandemia, embora na sua<br />

intervenção solene tenha optado pela palavra<br />

“raiz” que tenta interpretar aplicada ao nosso<br />

país.<br />

E se as raízes podem ser a força, a estabilidade<br />

temporal e o vigor do crescimento, elas também<br />

nos recordam que são vulneráveis às crises<br />

meteorológicas e aos atos insanos dos homens.<br />

Lembram-nos que, sendo ou parecendo<br />

inabaláveis, são, também, frágeis aos tremores<br />

do mundo físico e humano. E nesta oscilação<br />

tem Portugal viajado no tempo.<br />

O também pensador lembrou<br />

Camões como o poeta que<br />

desconfinou Portugal não só<br />

porque nos deu “o poema” (Os<br />

Lusíadas), mas, sobretudo,<br />

“deixou-nos em herança a poesia<br />

como ciência de navegação<br />

interior” e “um guia náutico<br />

perpétuo.” Releva Os Lusíadas<br />

como um livro que nos conduz a<br />

nós próprios “como indivíduos e<br />

como nação” fazendo-nos chegar<br />

à “consciência última de nós<br />

mesmos”.<br />

Refere a filósofa Simone Weil<br />

para mostrar que amar um<br />

país é amar o dinamismo da<br />

sua história, os seus solavancos<br />

e riscos, e não meramente a<br />

imagem ideal do mesmo, fixa,<br />

gloriosa, num dado momento,<br />

e não aceitando as alterações<br />

do tempo. Amar um país leva,<br />

segundo Tolentino de Mendonça,<br />

ao exercício da fraternidade e<br />

da compaixão, numa viagem<br />

nacional que inclui riscos, mas<br />

que importa o caminho para<br />

onde queremos ir.<br />

Um país que, enquanto<br />

comunidade cuida da vida de<br />

cada um, formalizando um<br />

pacto que não deve deixar para<br />

trás os mais fracos, indiferentes<br />

à sua sorte. Esta ideia de<br />

pacto comunitário é tão mais<br />

importante, conquanto hoje<br />

voltam a germinar ideias de<br />

discriminação e abandono de uns<br />

por outros, num salve-se quem<br />

puder que a pandemia mais<br />

expôs.<br />

O conceito seguinte de pacto<br />

intergeracional é uma alusão<br />

à necessidade de se reabilitar<br />

e robustecer o diálogo entre<br />

faixas etárias diferentes numa<br />

perspetiva de ajuda mútua, de<br />

aprendizagem e colaboração<br />

pungente. Reforça a ideia de que<br />

a sociedade é una, inclusiva e<br />

0108 NOABR21 NOABR21 0109


CRÓNICA<br />

REPORTAGEM<br />

CRÓNICA<br />

REPORTAGEM<br />

não desagregadora e que os mais<br />

velhos não podem ser vistos<br />

como um peso sobre o manto dos<br />

mais jovens.<br />

É importante, porque evidente,<br />

a sua chamada de atenção<br />

aos jovens abaixo dos 35<br />

anos, escolarizados e bem<br />

qualificados, tantas vezes<br />

vítimas de precariedade laboral,<br />

impeditiva de realizar sonhos<br />

pessoais e familiares em pleno.<br />

As gerações devem olhar-se<br />

em complementaridade, com<br />

dignidade própria e com um<br />

caminho de fortalecimento<br />

mútuo.<br />

O discurso no seu passo seguinte<br />

releva a importância de mais um<br />

pacto: o ambiental. O Homem<br />

tem de assumir o papel de<br />

cuidador do mundo, com uma<br />

ética da criação, embora tenha de<br />

mudar a “raiz” do sistema cujas<br />

estirpes assentam no consumo<br />

desenfreado e num conceito<br />

de “progresso” e abundância<br />

destrutivas. Mais se agrava a<br />

situação é quando esta raiz até é<br />

francamente desigual entre países<br />

e continentes e, obviamente,<br />

geradora de riqueza concentrada<br />

em poucos face à miséria e<br />

pobreza de muitos.<br />

José Tolentino de Mendonça<br />

recupera depois a ideia de<br />

viagem a partir de Camões e<br />

dos Lusíadas para comparála<br />

a Portugal, esta nau de 9<br />

séculos que em comunidade<br />

vai melhorando o seu futuro.<br />

“Portugal é e será, por isso, uma<br />

viagem que fazemos juntos”,<br />

terminando o seu discurso<br />

afirmando que esta viagem é<br />

como um grande Amor que não<br />

se esgota na temporalidade da<br />

história, vai além dela, criando<br />

um rasto do seu fulgor.<br />

Podemos afirmar que num ano<br />

de pandemia, 2020, o nosso Dia<br />

de Portugal, foi marcado por<br />

palavras sensíveis de um cardeal<br />

– poeta que apontam ao futuro<br />

como União, Amor, Esperança,<br />

Poesia, Raízes, Viagem e Pacto.<br />

Com elas sabemos “o que é amar<br />

um país”: Portugal.<br />

A leitura vale a pena! E José<br />

Tolentino Mendonça merece-o!<br />

Ricardo Silva<br />

TIAGO MATIAS<br />

EDITOR<br />

São a mesma coisa? É certo<br />

que andam, muitas vezes,<br />

de mãos dadas. Afinal de<br />

contas, muitas vezes os<br />

empreendedores em potência ou<br />

os professores da área entendem<br />

“empreendedorismo” como<br />

sinónimo de “fazer coisas novas,<br />

que não existam ainda”.<br />

Vamos ao Dicionário. Infopédia.<br />

Empreendedorismo significa:<br />

“1) qualidade do que é<br />

empreendedor; 2) atitude de<br />

quem, por iniciativa própria,<br />

assume os riscos financeiros<br />

inerentes à criação de um<br />

negócio com vista à obtenção<br />

de lucro; 3) atitude de quem se<br />

propõe a começar novo projeto<br />

ou a implementar novo método<br />

com vista a desenvolver uma<br />

Empreendedorismo<br />

Vs<br />

Inovação<br />

dada atividade ou a responder<br />

a determinado problema; 4)<br />

espírito de iniciativa; diligência;<br />

dinamismo”.<br />

Inovação significa: “1) ato ou<br />

efeito de inovar; 2) introdução<br />

de qualquer novidade na gestão<br />

ou no modo de fazer algo,<br />

mudança, renovação; 3) criação<br />

de algo de novo, descoberta”.<br />

Assim, ser empreendedor<br />

– que não é sinónimo de<br />

ser empresário – é tomar a<br />

iniciativa, desenhar o seu<br />

próprio caminho e ser inovador<br />

é criar algo de novo.<br />

Será necessário ser inovador<br />

para ser empreendedor? Pois<br />

aqui é que reside, muitas vezes, a<br />

confusão.<br />

Se uma pessoa se propuser<br />

NOABR21 0111


CRÓNICA<br />

REPORTAGEM<br />

PUB.<br />

a criar um negócio, como um<br />

restaurante, um cabeleireiro, um<br />

salão de estética, não estará a ser<br />

inovador, mas sim empreendedor.<br />

E só porque esse negócio<br />

não comporta inovação, está<br />

condenado ao fracasso? Não!<br />

Quem quer criar um negócio<br />

deve estudar muito bem a área<br />

de negócio em que se pretende<br />

envolver, estudar a concorrência,<br />

pensar como irá viabilizar a sua<br />

ideia e refletir sobre quais os<br />

fatores de diferenciação que a<br />

distinguirão da concorrência.<br />

Em suma, fazer um plano de<br />

negócios. Isto não implica<br />

reinventar a roda nem pensar<br />

em cultivar algas em ambiente<br />

suborbital.<br />

Assim, se estiver a pensar em<br />

criar o seu próprio emprego,<br />

não precisa de ter uma ideia<br />

mirabolante. Pense nas suas<br />

competências, pense no que<br />

faz falta no mercado, quem irá<br />

adquirir os seus produtos ou<br />

serviços, se consegue ter preços<br />

razoáveis e como será a melhor<br />

naquilo que fizer. Pode também<br />

ir pensando numa estratégia de<br />

comunicação e sobre como irá<br />

crescer nos próximos anos. Seja<br />

realista. Recorde-se sempre do<br />

princípio KISS - Keep it Short &<br />

Simple. Descomplique.<br />

Tiago Matias,<br />

Editor<br />

empregonosacores.blogspot.pt<br />

tasmatias@gmail.com<br />

PRATOS<br />

GEOTERMICOS<br />

U M A E X P E R I Ê N C I A Ú N I C A<br />

I N S P I R A D A N A N A T U R E Z A<br />

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0112 NOABR21 NOABR21 0113


CRÓNICA<br />

JOÃO AZEVEDO CASTRO<br />

joaocastro@sapo.pt<br />

PROFESSOR<br />

MESTRADO EM GESTÃO PORTUÁRIA<br />

SUEZ<br />

mais dias de navegação.<br />

O porta contentores “Ever<br />

Given” é um dos maiores<br />

navios do mundo. Construído<br />

no ano de 2018, com 400m de<br />

comprimento, 59m de largura e<br />

15,7m de calado, navegava sob o<br />

registo da bandeira do Panamá,<br />

com uma arqueação na ordem<br />

das 200 mil toneladas, que<br />

podem transportar até 20 mil<br />

contentores de 20 pés (20.000<br />

TEU’s).<br />

O Canal do Suez, com 164 Km<br />

de extensão, é um dos principais<br />

circuitos do transporte marítimo<br />

à escala global. Foi inaugurado<br />

em 1869, sendo um “atalho”<br />

na ligação marítima entre a<br />

Ásia e a Europa, permitindo<br />

aos navios economizar, cerca<br />

de 6.000 milhas náuticas, em<br />

relação ao percurso pela costa<br />

de África através do Cabo da<br />

Boa Esperança. Estima-se que<br />

passem, pelo canal do Suez, cerca<br />

de 19.000 navios anualmente,<br />

representando 12% do total de<br />

A navegação marítima<br />

internacional foi surpreendida,<br />

no passado dia 23 de março,<br />

com o encalhe, do navio “Ever<br />

Given” no canal do Suez,<br />

onde navegava, tendo como<br />

destino a cidade de Roterdão. O<br />

acidente terá ocorrido devido<br />

às condições meteorológicas,<br />

com ventos fortes associados<br />

a uma tempestade de areia,<br />

após a passagem pela entrada<br />

Sul do canal, que terá gerado<br />

um problema de visibilidade e<br />

controlo do navio.<br />

Esta situação impediu a<br />

passagem de centenas de navios,<br />

que planeavam utilizar o canal,<br />

que se aglomeram nos dois<br />

lados da passagem, criando um<br />

efeito de atrasos sucessivos,<br />

com impactos significativos à<br />

escala global, o que obrigará<br />

a encontrar rotas comerciais<br />

alternativas, certamente o cabo<br />

da boa esperança, obrigando a<br />

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CRÓNICA<br />

CRÓNICA<br />

mercadorias transportadas no<br />

mundo, tendo mesmo o registo<br />

de 6,1 milhões de toneladas num<br />

único dia.<br />

Se pensarmos que mais de<br />

80% das mercadorias, do<br />

mundo, são transportadas<br />

por via marítima, facilmente<br />

se percebe que o Canal do<br />

Suez é vital para as cadeias de<br />

abastecimento global pelo que,<br />

este acidente, terá consequências<br />

significativas. Desde logo<br />

pelas consequências diretas,<br />

nos prazos de entrega, para as<br />

mercadorias transportadas pelos<br />

navios diretamente afetados, mas<br />

também face a um previsível<br />

congestionamento das cargas<br />

nos portos europeus, para<br />

os próximos dias, bem como<br />

dificuldades no abastecimento<br />

de recursos energéticos, como<br />

o petróleo e o gás natural<br />

liquefeito, com provável,<br />

aumento dos preços.<br />

Também nos portos as<br />

consequências poderão<br />

ser significativas, face às<br />

transformações, a que tem sido<br />

sujeita a operação portuária,<br />

nos últimos anos, decorrentes<br />

da implantação de meganavios<br />

e à reestruturação das<br />

alianças marítimas, efetuadas<br />

pelas grandes empresas de<br />

navegação. A procura por<br />

ganhos de eficiência, das redes<br />

de transporte marítimo, tem<br />

aumentado o tamanho dos<br />

navios, aumentando por esta<br />

via o grau de exigência sobre os<br />

portos, que tentam corresponder<br />

ao desafio de adaptação a esta<br />

realidade.<br />

Enquanto alinhavávamos o<br />

presente texto, os trabalhos<br />

de desencalhe apresentavam<br />

sinais de solução, prevendo-se<br />

uma intervenção de dragagem<br />

das areias, em que o Ever<br />

Given ficou preso, ou mesmo<br />

uma diminuição do peso<br />

do navio, com a retirada da<br />

carga (contentores), água e<br />

combustível, o que atrasaria<br />

inevitavelmente toda a operação<br />

face aos meios necessários para a<br />

concretizar.<br />

Falamos de “milhões”, de<br />

prejuízos, com impactos<br />

previsíveis na economia<br />

mundial, obrigando os navios<br />

a procurar rotas alternativas,<br />

com custos acrescidos para<br />

as mercadorias, logo para o<br />

consumidor.<br />

Uma consequência parece já<br />

clara, associada à pandemia que<br />

o mundo enfrenta, este é um<br />

evento que fará refletir sobre o<br />

processo de globalização.<br />

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FRASES DO MÊS<br />

REPORTAGEM<br />

PUB.<br />

“Estimamos que apenas cerca de 80 mil vacinas seriam<br />

necessárias para nós. Não se trata de um pedido egoísta,<br />

mas sim de uma necessidade específica”<br />

José Manuel Bolieiro,<br />

Presidente do Governo Regional<br />

“O que vai acontecer é que, em vez da produção acrescida<br />

ser feita no hospital público, a produção acrescida<br />

será feita no hospital privado, o que terá custos muito<br />

superiores para o Serviço Regional de Saúde”<br />

António Lima, deputado do BE/Açores<br />

“Precisa de ser a mulher a garantir a mudança de mentalidade<br />

nas próximas gerações, a romper com o sentimento de culpa<br />

que por vezes sente quem tem responsabilidades familiares e se<br />

dedica a outras causas”<br />

Sandra Dias Faria,<br />

deputada do PS/Açores<br />

“Se o incumprimento dos compromissos assumidos por António Costa<br />

mereceu, ao longo de todos estes anos, apenas um mero encolher de<br />

ombros por parte do PS de Vasco Cordeiro, estamos certos de que o<br />

atual Governo Regional vai desencadear todas as ações para que a<br />

República cumpra o que prometeu”<br />

Pedro Nascimento Cabral, PSD/Açores<br />

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REPORTAGEM

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