ENTREVISTAHélderSpínola4 saber Outubro 2021
Nasceu em Moçambique,em 1973, quando os pais,madeirenses de Santanae São Jorge, aí residiam etrabalhavam. Veio para aMadeira com 3 anos, quandoa família se viu obrigada aregressar pelos tumultossociais e políticos que seseguiram à independênciadas ex-colónias portuguesas.Cresceu em Santana, rodeadode um ambiente rural enatural, e influenciadopelos livros e a comunicaçãosocial que associavam anatureza selvagem ao seuimaginário, viria a licenciarseem Biologia e em BiologiaMolecular. Foi presidente daDireção Nacional da Quercus-Associação Nacional deConservação da Natureza,entre 2003 e 2009, e desde2007 que desenvolve a suaatividade profissional comoprofessor e investigador naUniversidade da Madeira.Depois de algum tempo ainvestigar na área da genéticahumana, com trabalhosrelativos à caracterizaçãogenética das populações e àassociação de polimorfismosgenéticos à suscetibilidadea doenças, nos últimos dezanos, Hélder Spínola tem sededicado à compreensão dosmecanismos educativos e, emparticular, socioeducativosque visam facilitar apromoção da literacia e dacultura ambiental.Dulcina BrancoFacebook Hélder SpínolaO conhecimentocientífico maisatualizado diz-nosque chegamos aoponto em que, se aatual geração nãofizer o suficiente ejá, entraremos numcaminho sem retornoQuando olha para o Planeta Terra naatualidade, o que vê e o que o preocupamais?- Estamos atualmente a viver uma grave criseecológica ao nível planetário decorrente dainfluência humana. O conhecimento científicomais atualizado diz-nos que chegamos aoponto em que, se a atual geração não fizero suficiente e já, entraremos num caminhosem retorno, e as condições de suporte devida, para nós e para outras espécies, começarãoa ficar cada vez mais deterioradas,influenciando negativamente a nossa sobrevivência,segurança e qualidade de vida. Ogrande desafio que temos em mãos nestepreciso momento é conseguir responder àsnossas necessidades sem pôr em causa oequilíbrio do Planeta, ou seja, viver sem ultrapassaros limites da natureza. Preocupa--me que não estejamos a fazer o suficiente,e nem sequer aquilo que está perfeitamenteao nosso alcance, para ganhar este importantedesafio.As alterações climáticas estão aí, à vistade todos. O que aconteceu recentementena Europa (inundações na Alemanha, Bélgicae Países Baixos) são resultado destasalterações? O que falhou?- Há 30 anos falava-se em alterações climáticascomo algo que nos iria afetar numfuturo relativamente distante. Há 20 anoscomeçamos a perceber que esse problemajá começava a nos atingir e, hoje, os seusefeitos são notórios e evidentes, não sópara a comunidade científica mas tambémpara o cidadão comum. Cheias, vagas de calor,incêndios, furacões e outras catástrofesbatem-nos à porta de forma cada vez maisviolenta e frequente. Durante décadas a humanidadenão quis ouvir os avisos, foi esseo nosso grande erro. Agora estamos a pagaro preço, mas ainda vamos a tempo de evitarmales maiores se começarmos já e a sério.Como é que a humanidade pode tentarminizar os efeitos destas alterações e sesão suficientes medidas anunciadas pelosgovernos, como os carros elétricos eredução do plástico?- Os objetivos que foram definidos internacionalmente,nomeadamente através doprotocolo de Paris assinado em 2015, seforem alcançados, permitem conter estasalterações climáticas a níveis suportáveis,o que implica, até 2050, garantir a neutralidadecarbónica. Efetivamente, nos últimosanos, temos sentido um impulso ao níveldas medidas públicas e da participação doscidadãos, mas sejamos sinceros, não são suficientes,é preciso mais, muito mais… Paratermos uma ideia do desafio que temos pelafrente, no ano de 2020 conseguimos reduzirglobalmente as emissões de gases com efeitode estufa em cerca de 6% porque fomosobrigados a parar devido à pandemia daCOVID19. Pois bem, esse é justamente o valorque temos de reduzir por ano para conseguiratingir a neutralidade carbónica em2050. No entanto, entretanto, à medida quevamos aprendendo a viver com a pandemia,estamos a voltar aos valores de poluição anterioresaos de 2020 e, por isso, a desviarmo--nos do que 2020 nos ensinou, ou seja, que,se quisermos, se existir vontade por partedas sociedades, conseguimos fazer o caminhocerto. Mas será que queremos fazê-lo?Estamos disponíveis para isso? As mudançasque temos de fazer são profundas, mexemna forma como a sociedade está organizadae funciona, mexem nos nossos valores,expetativas, hábitos, implica que as comunidadesvivam à luz de uma cultura ambientale nunca de uma cultura de consumo comoacontece há demasiado tempo.A Madeira está preparada para enfrentaras alterações climáticas e que áreas sãomais sensíveis e/ou poderão ser mais afetadas?- Ainda ninguém está preparado para estasalterações climáticas e para outros desequilíbriosambientais que estamos a provocar.As mudançasque temos de fazersão profundas,mexem na formacomo a sociedadeestá organizada efuncionasaber outubro 20215