Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Por Joacenira Oliveira
A visão médica e a visão
espírita da doença:
impasses e possibilidades
São Pedro do Sul RS BR
Graduada em Ciências Econômicas (UFSM), Especialização em Ciências da Religião (UFS) e Mestrado em Sociologia (UFS).
Palestrante espírita e monitora de estudos espíritas vinculados à Federação Espírita Brasileira. Acadêmica da Academia de
Letras Espíritas do Estado de Sergipe (ALEESE).
A visão da biomedicina e a visão religiosa apoiam-se em
conhecimentos construídos ao longo do tempo e fornecem,
cada uma à sua maneira, fundamentadas em suas lógicas, formas
diferentes de interpretar o fenômeno do adoecimento. Na
primeira, tem-se uma visão acadêmica, enquanto na segunda
tem-se a interpretação popular, religiosa.
O primeiro modelo explica a doença como uma disfunção
orgânica: leva em conta os sinais físicos e os interpreta
como sintomas desta disfunção, sendo o médico o agente de
cura. Na visão da biomedicina, a doença é objeto da prática
médica, isenta de conotações religiosas. Pode-se dizer, assim,
que os profissionais de saúde, por motivos relacionados à sua
formação acadêmica, adotam de forma privilegiada o paradigma
“biomédico”, no qual acredita-se ser fundamental explicar
a doença e promover a cura. Para esse tipo de medicina,
o homem é um ser composto de órgãos materiais, em que
todo o funcionamento biológico é determinado pelas funções
químicas.
O Profissional de saúde tenta decifrar a entidade mórbida
e, assim, esclarecer o enigma da queixa, ao passo que nas
“terapêuticas religiosas” o que se desvenda para a pessoa que
sofre, sejam perturbações de ordem física ou espiritual, é a
dimensão transcendente da vida. Para o espírita, a doença
é interpretada à luz de uma visão cósmica, e, nessa visão, a
própria experiência encontra seu lugar e sentido.
Na codificação de Kardec existe intrínseca relação entre o
corpo físico e a alma, pois o que aparece em um é nitidamente
visível em outro. A compreensão fundamental, neste contexto,
é a de que o homem é um composto de três partes essenciais:
o espírito, o perispírito e o corpo físico. Essas partes atuam de
forma harmônica e inseparável. A alma corresponde à essência,
permanente, indissolúvel, é nossa individualidade que tem
sua expressão por meio do invólucro material. O perispírito é
o corpo intermediário que acompanha tanto a alma (espírito
encarnado) como o espírito desencarnado e serve de modelo
22 Atração_ agosto de 2022
do corpo físico com todos os seus órgãos. Na lógica do pensamento
espírita, muitas doenças que se concretizam no corpo
físico são reflexos do grau de evolução do espírito, pois estão
estritamente ligadas ao estágio evolutivo em que se encontra
o espírito.
Nesse sentido, a própria negatividade da doença, quando
vista sob o prisma da medicina oficial – que considera a doença
somente como ausência de saúde –, é neutralizada pelo pensamento
religioso do Espiritismo, quando esse lhe confere um
propósito positivo.
Sofrimento é o remédio para as imperfeições do Espírito,
para as enfermidades da alma. O sofrimento, longe de ser uma
desgraça, tem função preciosa nos planos da alma, pois por
detrás das dores e experiências difíceis estão as luzes, está ali
a água viva que haverá de nos trazer sempre a saciedade de
paz a que aspiramos. 1
O que se buscou demonstrar neste artigo é que, tanto
na perspectiva erudita como religiosa, no trato das doenças,
ambas não devem ser entendidas de forma antagônica, mas
diferentes. As terapias religiosas e as práticas médicas, neste
sistema de pensamento, completam-se mutuamente. O doente
vai se utilizar da medicina química juntamente ao tratamento
oferecido pelo Espiritismo.
Mesmo assim, existe um “descompasso” visível entre
estes dois paradigmas, na medida em que o paradigma biomédico
não é suficiente para abordar toda a problemática da
doença, e, por isso, os processos de cura têm levado muitos
profissionais de saúde a pensar as dimensões social, cultural
e espiritual implicadas na doença e nos próprios processos de
cura.
Referências:
BERGER, Peter Ludwing. A construção social da realidade: tratado de sociologia
do conhecimento. Petrópolis/RJ: Vozes, 1978.
______. O Dossel Sagrado: elementos para uma teoria sociológica da religião.
São Paulo: Paulus, 1985.
1. EMMANUEL. Justiça Divina. Psicografia de Francisco Cândido Xavier. Brasília:
FEB, 2013