12.04.2013 Views

ik O neoliberalismo e os desafios dos trabalhadores ik Combate ao ...

ik O neoliberalismo e os desafios dos trabalhadores ik Combate ao ...

ik O neoliberalismo e os desafios dos trabalhadores ik Combate ao ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

228<br />

30/04/96<br />

^3 M/il 19^<br />

<strong>ik</strong> O <strong>neoliberalismo</strong> e <strong>os</strong> desafi<strong>os</strong><br />

d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong><br />

<strong>ik</strong> <strong>Combate</strong> <strong>ao</strong> desemprego e seus<br />

dilemas<br />

<strong>ik</strong> Mínimo terá reajuste abaixo da<br />

inflação<br />

<strong>ik</strong> Reforma Agrária Sim!<br />

Massacre Não!<br />

<strong>ik</strong> Multinacionais: elefantes sutis<br />

<strong>ik</strong> Mudou o país, ou mudam<strong>os</strong> nós?<br />

Custo unitário desta edição: R$ 2,50


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 Trabalhadores<br />

Interativa - Mar/Abr/Maio/96 - N° 4<br />

O <strong>neoliberalismo</strong> e <strong>os</strong> desafi<strong>os</strong><br />

d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong><br />

Terceirização, reengenharia, reestruturação produtiva, TQC. Term<strong>os</strong> desconhecid<strong>os</strong> até alguns an<strong>os</strong> atrás, hoje fazem<br />

parte do dia-a-dia e do pesadelo d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>, obrigad<strong>os</strong> a conviver com um mundo de trabalho transformado conforme<br />

a ótica neoliberal, que pôs de lado <strong>os</strong> model<strong>os</strong> fordistas e taylorista e deu lugar <strong>ao</strong> modelo japonês, expresso no culto à<br />

qualidade e produtividade total. Essa mudança no mundo do trabalho, representada pela introdução de novas tecnologias,<br />

de desemprego em massa, de desaparecimento de tradicionais funções e o surgimento de centenas de outras novasj impõe<br />

uma série de desafi<strong>os</strong> a<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>. Nessas páginas, Ricardo Antunes e Maria Lidia Silveira abordam esses desafi<strong>os</strong>,<br />

enquanto J<strong>os</strong>é Luiz Barb<strong>os</strong>a analisa <strong>os</strong> prós e <strong>os</strong> contras d<strong>os</strong> programas de qualidade implantad<strong>os</strong> pela Telerj.<br />

Criar laç<strong>os</strong> entre <strong>os</strong> oprimid<strong>os</strong><br />

Nas últimas décadas o movimento<br />

operário vivenciou a situação mais críti-<br />

ca, em toda a sua história. Crise que se<br />

deveu à confluência de um conjunto de<br />

metamorf<strong>os</strong>es que afetaram tanto a sua<br />

materialidade, quanto a sua esfera mais<br />

propriamente subjetiva. Dois element<strong>os</strong><br />

constitutiv<strong>os</strong> dessa crise, podem<strong>os</strong> sinte-<br />

ticamente destacar:<br />

Primeiro - o desmoronamento do Leste<br />

Europeu (e de conjunto de paises que ten-<br />

taram uma transição socialista),<br />

propagandeia-se, no interior do mundo<br />

do trabalho, a falsa idéia do "fim do so-<br />

cialismo". Embora a longo prazo as<br />

conseqüências deste fato sejam eivadas<br />

de p<strong>os</strong>itividades, pois coloca-se a p<strong>os</strong>si-<br />

bilidade da retomada, em bases inteira-<br />

mente novas, de um projeto socialista de<br />

novo tipo, no plano mais imediato hou-<br />

ve, em significativ<strong>os</strong> contingentes da clas-<br />

se trabalhadora, a assimilação da mani-<br />

pulada e equivocada tese do "fim do so-<br />

cialismo".<br />

Segundo - paralelamente <strong>ao</strong> desmo-<br />

ronamento da esquerda tradicional, vin-<br />

culada a<strong>os</strong> PCs da era stalinista, deu-se<br />

um agudo processo de social-democrati-<br />

zação da esquerda, e a sua conseqüente<br />

atuação subordinada à ordem do capital.<br />

Esta acomodação social-democrática<br />

atingiu fortemente a esquerda sindical e<br />

partidária, repercutindo, consequente-<br />

mente, no interior da classe trabalhadora<br />

e do movimento operário.<br />

Terceiro - com a crise do welfare state,<br />

durante a expansão do projeto neoliberal,<br />

deu-se um processo de regressão da pró-<br />

pria social-democracia, que passou a atu-<br />

ar de maneira muito próxima da agenda<br />

neoliberal.<br />

Quarto - (e é aquele ponto para o qual<br />

tentarem<strong>os</strong> dizer "duas palavras", pois ele<br />

n<strong>os</strong> parece decisivo) - nas últimas déca-<br />

Kicardíf Aníuttcs<br />

das, como resp<strong>os</strong>tas do capital á crise d<strong>os</strong><br />

an<strong>os</strong> 70, intensificaram-se as transforma-<br />

ções no próprio processo produtivo, atra-<br />

vés do avanço tecnológico, da constitui-<br />

ção das formas de acumulação flexível e<br />

d<strong>os</strong> model<strong>os</strong> alternativ<strong>os</strong> <strong>ao</strong> binômio<br />

taylonsmo/fordismo, onde se destaca, pa-<br />

ra o capital, o modelo "toyotista". Estas<br />

transformações afetaram fortemente a<br />

classe trabalhadora e, num universo já<br />

marcado pel<strong>os</strong> element<strong>os</strong> acima mencio-<br />

nad<strong>os</strong>, afetaram fortemente o movimen-<br />

to operário.<br />

Daitre as transformações mais impor-<br />

tantes, vivenciadas no intenor d<strong>os</strong> paises<br />

capitalistas avançad<strong>os</strong>, porém com for-<br />

tes repercussões n<strong>os</strong> paises do Terceiro<br />

Mundo industrializado e intermediário,<br />

como Brasil, México, Argentina, entre<br />

tant<strong>os</strong> outr<strong>os</strong>, deve-se mencionar a dimi-<br />

nuição do operário manual, fabril, tipico<br />

do fordismo; a expansão das inúmeras<br />

fonnas de subproletarização do trabalho,<br />

decorrentes da expansão do trabalho pre-<br />

cário, parcial, temporário etc; houve uma<br />

enorme expansão d<strong>os</strong> assalariad<strong>os</strong> médi-<br />

<strong>os</strong>, especialmente no "setor de serviç<strong>os</strong>";<br />

tem-se a exclusão d<strong>os</strong> jovens no centro e<br />

a sua inclusão precoce no trabalho, n<strong>os</strong><br />

paises subordinad<strong>os</strong>, entre outras meta-<br />

morf<strong>os</strong>es. A classetrabalhadora fragmen-<br />

tou-se, heterogeneizou-se e complexifi-<br />

cou-se ainda mais.<br />

Ao contrário, entretanto, daqueles que<br />

propugnaram pelo "fim do proletariado",<br />

o desafio maior da classe trabalhadora e<br />

do movimento operário, nesta virada do<br />

século XX para o XXI, é soldar <strong>os</strong> laç<strong>os</strong><br />

de classe existentes entre <strong>os</strong> divers<strong>os</strong> seg-<br />

ment<strong>os</strong> que compõem o mundo do traba-<br />

lho, procurando articular desde aqueles<br />

segment<strong>os</strong> que exercem um papel central<br />

no processo de criação de valores, até<br />

aqueles segment<strong>os</strong> que estão, mais na<br />

'SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

margem do processo produtivo, mas que,<br />

pelas condições precárias em que se en-<br />

contram, constituem-se como contingen-<br />

tes sociais potencialmente em choque com<br />

o capital e suas formas de sociabilidade.<br />

Mais do que nunca o sistema produ-<br />

tor de mercadorias, vigente em pratica-<br />

mente todas as partes do mundo, com<br />

poucas exceções que não conseguem<br />

obstá-lo, m<strong>os</strong>tra seu enorme caráter<br />

destrutivo: sua lógica destrói, entre tan-<br />

tas coisas, a própria força do trabalho.<br />

O baital desemprego estrutural, que atin-<br />

ge o mundo em escala global, é uma evi-<br />

dência deste caráter destrutivo. Isso co-<br />

loca, no final do século, um desafio para<br />

totalidade do mundo do trabalho: é pre-<br />

ciso criar laç<strong>os</strong> entre aqueles contingen-<br />

tes sociais que ainda detêm a centralidade<br />

do processo de criação de valores, é pre-<br />

ciso que esta classe-que-vive-do-trabalho<br />

rompa radicalmente com esta lógica<br />

destrutiva, que tem como conseqüência<br />

mais direta a sua própria destruição ou<br />

desestruturação.<br />

Não é um desafio simples: trata-se de<br />

uma revolução no trabalho, na medida<br />

em que se deve necessanamente abolir o<br />

trabalho fetichizado e estranho; mas é<br />

também uma revolução do trabalho, uma<br />

vez que encontra, neste amplo leque de<br />

indivídu<strong>os</strong> que compreendem a classetra-<br />

balhadora, o sujeito coletivo capaz de ir<br />

para além do capital. □<br />

Ricardo Antunes, é professor de Soci-<br />

ologia do Instituto de Fiol<strong>os</strong>ifia e Ci-<br />

ências Humanas da Universidade de<br />

Campinas (IFCH/Unicamp). Publicou<br />

recentemente "Adeus <strong>ao</strong> Trabalho?<br />

(Ensaio sobre as Metamorf<strong>os</strong>es e a<br />

Centralidade do Mundo do Trabalho) ",<br />

Ed Cortez/Unicamp e "O Novo Sindi-<br />

calismo no Brasil" (Ed Pontes).


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 Trabalhadores<br />

A pós-modemidade desse final de século<br />

está na ordem do dia. Pós-modemidade<br />

neoliberal, que amplia a naturalidade<br />

perante as imensas desigualdades soci-<br />

ais, econômicas e culturais, que vê com<br />

olh<strong>os</strong> de habitualidade e indiferença a<br />

miséria e o não-trabalho a se ampliarem,<br />

que encara como algo pré-determinado e<br />

originário de um poder acima do bem e<br />

do mal, e do próprio homem, o fato de<br />

que alguns entre tod<strong>os</strong> nós, n<strong>os</strong> tomare-<br />

m<strong>os</strong> "pessoas", com sensibilidade, emo-<br />

ção, conhecimento acumulado, g<strong>os</strong>to pe-<br />

las coisas que fazem <strong>os</strong> homens se<br />

humanizarem e, outr<strong>os</strong>, máxima do pen-<br />

samento neoliberal, por sua própria<br />

natueza social não vão ser "tocad<strong>os</strong>" pe-<br />

l<strong>os</strong> outr<strong>os</strong> homens, pela vida mais "am-<br />

pla", e se manterão n<strong>os</strong> limites biológi-<br />

c<strong>os</strong> da sobrevivência.<br />

Não há como negar a competência da<br />

hegemonia burguesa.<br />

O processo produtivo no interior da<br />

ordem capitalista, no seu desenvolvimen-<br />

to histórico, através do salário, expropria<br />

para além do trabalho não pago, o pró-<br />

prio saber do trabalhador, o seu poder, o<br />

seu tempo.<br />

Exploração e dominação, que combi-<br />

nadas se alastram para outras esferas da<br />

vida d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>, se estendendo às<br />

suas relações pessoais, familiares, sexu-<br />

ais, no interior d<strong>os</strong> própri<strong>os</strong> indivídu<strong>os</strong><br />

(Berger, 1947).<br />

A Qualidade Total não é novíssima<br />

ou original. Muito dela sempre fez pe-<br />

quena ou grande figuração em outr<strong>os</strong> es-<br />

forç<strong>os</strong> teóric<strong>os</strong> da Administração e<br />

Gerenciamento do Trabalho.<br />

Evidentemente que hoje a competição<br />

globalizada, o avanço das oiganizações de<br />

<strong>trabalhadores</strong>, a tecnologia do consumo,<br />

a expansão da democracia e principalmai-<br />

te as legislações de direit<strong>os</strong> d<strong>os</strong> consumi-<br />

dores sedimentam um cenário complexo<br />

a exigir a chamada Qualidade Intrínseca<br />

(customização) de produt<strong>os</strong>/serviç<strong>os</strong>.<br />

A despeito de ser modismo da crise<br />

para inúmer<strong>os</strong> empresári<strong>os</strong> brasileir<strong>os</strong>, a<br />

Qualidade vem, ainda quefil<strong>os</strong>ofícamen-<br />

te, propor a transformação das relações<br />

de trabalho com pelo men<strong>os</strong> uma impor-<br />

A desconstrução do trabalhador<br />

Maria Lídia Silveira<br />

É esse ordenamento forjado pelo ca-<br />

pital, compreendido e explicado por<br />

Marx, n<strong>os</strong> dá a dimensão de como essa<br />

transformação do trabalho - ato de esta-<br />

belecimento de relação do homem com a<br />

natureza, modificando-a para o bem es-<br />

tar humano, ato que coloca <strong>os</strong> homens<br />

em relação com <strong>os</strong> outr<strong>os</strong> homens <strong>ao</strong><br />

mesmo tempo que permite o seu próprio<br />

conhecimento e de suas habilidades e<br />

criatividade - <strong>ao</strong> se transmudar em tra-<br />

balho assalariado, altera essa relação<br />

original; e o seu trabalho é para outrem,<br />

não há mais o entendimento do seu pro-<br />

cesso criador, a nova relação se instaura<br />

sob o marco de relações mercantis: a pró-<br />

pria força de trabalho nada mais é que<br />

mercadoria, com preço disponível no<br />

mercado. Este homem-mercadoria, nes-<br />

se processo se toma coisa, se fragmenta<br />

nas suas capacidades humanas, se<br />

subaltemiza, pois é exatamente a subjeti-<br />

vidade que o capital vai consturando para<br />

aprisionar não só o corpo, mas também<br />

a sensibilidade, inteligência, a afetividade<br />

do trabalhador.<br />

N<strong>os</strong> manuscrit<strong>os</strong> de 1844 e no livro 1<br />

de O Capital, Marx n<strong>os</strong> ajuda a perce-<br />

ber, a partir da análise que faz da merca-<br />

doria, como a indivídualização do Ho-<br />

mem e sua personalização é produto de<br />

ura processo histórico. E na particulari-<br />

dade do capitalismo, esse sistema orga-<br />

niza o poder e sua representação pari<br />

Em defesa da Qualidade<br />

J<strong>os</strong>é I.uiz liarh<strong>os</strong>a<br />

tante novidade: não parte do pressup<strong>os</strong>to<br />

taylorista da preguiça e da má vontade<br />

atribuídas à natureza humana. Aliás, <strong>ao</strong><br />

contrário, há intensa quebra de<br />

paradigmas estéreis como o da submis-<br />

são ("manda quem pode; obedece quem<br />

tem juizo") e o da supremacia da experi-<br />

ência (an<strong>os</strong> de trabalho rotineiro) sobre<br />

a capacidade de aprender (atualizar-se),<br />

que sempre trouxeram obsolescência e<br />

infelicidade às organizações. Agora,<br />

quer-se não mais a mão-de-obra mas a<br />

cabeça-de-obra, a criatividade, o auto-<br />

gerenciamento com todas as soas impli-<br />

cações emn relação, por exemplo, à<br />

flexibilização de horári<strong>os</strong>, à autonomia<br />

responsável, à gerência participativa etc.<br />

Entretanto, vê-se daqui (empresa).<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO! 1<br />

passu com a expropriação do trabalho e<br />

seu simultâneo encobrimento através de<br />

formas jurídicas, aniquilamento da me-<br />

mória histórica das classes subalternas e<br />

interdição de quaisquer esboç<strong>os</strong> e embri-<br />

ões de nova racionalidade.<br />

Evidencia-se assim que a alienação<br />

atinge o hom^m na sua globalídade. Des-<br />

sa forma, a sua relação consigo mesmo,<br />

com o mundo e com <strong>os</strong> demais homens,<br />

enfim, todas as suas relações humanas<br />

são a si mesmo, estranhas. A dimensão<br />

de sujeito fica subordinada às formas<br />

metamorf<strong>os</strong>eadas do capital: dinheiro,<br />

troca, mercadoria (...) "e<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> como<br />

p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> pela coisa, isto é, sujeitad<strong>os</strong>".<br />

(Gianotti Apude Dorsay, 1989: 47).<br />

Talvez seja este um d<strong>os</strong> desafi<strong>os</strong> p<strong>os</strong>-<br />

t<strong>os</strong> a<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>. Recuperarem a sua<br />

dimensão de sujeito, recolocando no rol<br />

das p<strong>os</strong>sibilidades a dimensão de um ou-<br />

tro porvir, com certeza, assentado em<br />

relações absolutamente distintas das<br />

constituídas pelo capital. Relações de<br />

superação do esfacelamento das referên-<br />

cias coletivas, a constituir uma subjeti-<br />

vidade também nova.<br />

Mari Lidia Souza da Silveira, i pro-<br />

fessora titular da Escola de Serviço So-<br />

cial da Universidade Federal<br />

Fluminense e doutoranda em Ciências<br />

Sociais na Universidade de Campinas<br />

(Unicamp).<br />

onde as coisas acontecem, que sobeja uma<br />

grande disp<strong>os</strong>ição à desconfiança entre<br />

Capital (dirigentes) e Trabalho, mormente<br />

onde este é organizado, ainda que tenha-<br />

m<strong>os</strong> melhorado muito nesses últim<strong>os</strong> tem-<br />

p<strong>os</strong>, n<strong>os</strong>sa convivência interpessoal e com<br />

a própria empresa.<br />

Na Telerj, o Programa de Qualidade<br />

Total (1990) conta com um grande<br />

marketing. É inegável, a despeito disso,<br />

algumas mudanças substanciais no am-<br />

biente interno, como: portas um pouco<br />

men<strong>os</strong> fechadas, fim do cartão de ponto,<br />

treinament<strong>os</strong> voltad<strong>os</strong> para a ecologia do<br />

ser (RI, PSA, VQDT, TEAL) Mas, per-<br />

cebe-se que que a imagem da empresa,<br />

na leitura d<strong>os</strong> colaboradores, é de ilusó-<br />

ria sensação de mudança, parcialmente


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 Trabalhadores<br />

explicável pela síndrome evolucional (que<br />

faz a humanidade caminhar), do "querer<br />

sempre mais", que acaba vislumbrando<br />

maior valor no que ainda não se tem. Por<br />

outro lado, o d<strong>os</strong> usuári<strong>os</strong>, a imagem<br />

institucional, construída na mídia por in-<br />

teresses nem tão divers<strong>os</strong> quanto identi-<br />

ficad<strong>os</strong> mas, inegavelmente também,<br />

como fruto da realidade, ainda é de inefi-<br />

ciência. Há também a verdade gerencial,<br />

que distorce muito, na prática, o dis-<br />

curso, men<strong>os</strong> pro despreparo ideológi-<br />

co à fil<strong>os</strong>ofia da Qualidade do que por<br />

casuísm<strong>os</strong> acomodatíci<strong>os</strong> deliberad<strong>os</strong>.<br />

Não estam<strong>os</strong>, por tudo isso, na contra-<br />

mão da Qualidade. Fazer emergir do pro-<br />

cesso de implantação estas distorções,<br />

propiciando uma auto-avaliação séria e<br />

um debate democrático, é construir a<br />

Qualidade que querem<strong>os</strong>, isto é, auto-re-<br />

alização do ser humano: a felicidade.<br />

De qualquer forma, a utopia de fazer<br />

Qualidade (atender às necessidades das<br />

pessoas todas) caminha em n<strong>os</strong>so hori-<br />

zonte (afastando-se ou aproximando-se<br />

de nós) tant<strong>os</strong> pass<strong>os</strong> quanto represen-<br />

tam n<strong>os</strong>so individualismo, n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> própri-<br />

<strong>os</strong> valores sociais, n<strong>os</strong>so corporativismo,<br />

n<strong>os</strong>sa qualidade pessoal, n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> gover-<br />

n<strong>os</strong>, n<strong>os</strong>sa visão e foco, mas sobretudo e<br />

decididamente n<strong>os</strong> aproximarm<strong>os</strong> dela na<br />

velocidade e na medida da n<strong>os</strong>sa vontade<br />

de realizá-la. D<br />

J<strong>os</strong>é Luiz Barb<strong>os</strong>a, trabalha há 8 an<strong>os</strong><br />

na Telerj, onde é agente comercial.<br />

É professor de Literatura Brasileira<br />

e Orientação para o Trabalho na<br />

Rede MV-1.<br />

Boletim Unificado - Sindipetro - Abril/96<br />

Reestruturação produtiva, a saída<br />

As mudanças nas relações de traba-<br />

lho e no padrão de acumulação de capi-<br />

tal que estam<strong>os</strong> presenciando exigem es-<br />

tudo e clareza de n<strong>os</strong>sa parte, para que<br />

p<strong>os</strong>sam<strong>os</strong> enfrentá-las. Este processo,<br />

conhecido como reestruturação produ-<br />

tiva, é a resp<strong>os</strong>ta do capitalismo a sua<br />

própria crise.<br />

Para anunciar o acúmulo de capital,<br />

o capitalismo está substituindo as atuais<br />

relações de trabalho, já tão injustas para<br />

<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>, por outras mais selva-<br />

gens. As mudanças estão se dando no<br />

mundo inteiro e dentro da Petrobrás não<br />

é diferente.<br />

Terceirização, nov<strong>os</strong> métod<strong>os</strong> de tra-<br />

balho, programas de qualidade total, di-<br />

minuição do efetivo mínimo e novas<br />

tecnologias fazem parte desta ofensiva do<br />

capitalismo para aumentar seus lucr<strong>os</strong>.<br />

Para enfrentar o avanço do processo<br />

de reestruturação produtiva é necessário<br />

estudarm<strong>os</strong> e compreenderm<strong>os</strong> <strong>os</strong> prin-<br />

cipais fat<strong>os</strong> que marcaram a humanida-<br />

de n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong>. O fim da divisão do<br />

mundo em dois bloc<strong>os</strong> econômic<strong>os</strong> (EUA<br />

x ex. URSS); globalização da economia<br />

mundial; acúmulo de produção; satura-<br />

ção d<strong>os</strong> mercad<strong>os</strong> e por conseqüência um<br />

aumento selvagem da competição para se<br />

manter ou ocupar espaço no mercado<br />

capitalista. Para responder a esta situa-<br />

ção mundial, o capitalismo necessita ata-<br />

car as conquistas que <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong><br />

arrancaram d<strong>os</strong> patrões <strong>ao</strong> longo de qua-<br />

se dois sécul<strong>os</strong>.<br />

O capital busca aumentar a produção<br />

com mais qualidade, mas reduzindo o tra-<br />

selvagem do capitalismo<br />

balho humano. Traduzindo em miúd<strong>os</strong>,<br />

significa aumentar o exército de desem-<br />

pregad<strong>os</strong>, sem macular <strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> das<br />

grandes empresas. O que não implica que<br />

aqueles que continuarão empregad<strong>os</strong> te-<br />

rão melhores condições de trabalho.<br />

Veja abaixo, um breve esboço do<br />

significado destas mudanças para <strong>os</strong> pe-<br />

troleir<strong>os</strong>.<br />

O que aumentou:<br />

♦ Terceirização: só no terminal de<br />

Guarulh<strong>os</strong> existe cerca de 30<br />

empreiteiras, com 364 empregad<strong>os</strong>. Vale<br />

lembrar que o terminal tem 67 emprega-<br />

d<strong>os</strong> que são petroleir<strong>os</strong>.<br />

♦ Produção: a produção nacional<br />

do petróleo, no dia 28.02.96, atingiu novo<br />

recorde: 825 mil barris por dia.<br />

♦ Acidentes: o número de aciden-<br />

tes aumentou. Trabalhadores das<br />

empreiteiras, como <strong>os</strong> própri<strong>os</strong> petrolei-<br />

r<strong>os</strong>, trabalham hoje sob um risco maior<br />

de acidente. Recentemente, presenciam<strong>os</strong><br />

acidentes na RBPC, na Revap e em<br />

Paulinea.<br />

O que diminuiu:<br />

♦ Empreg<strong>os</strong> diret<strong>os</strong>: em dois an<strong>os</strong>,<br />

de 94 a 96, só na base do Sindipetro/SP,<br />

cerca de 100 petroleir<strong>os</strong> se desligaram da<br />

estatal. Na maioria d<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>, o motivo<br />

foi a ap<strong>os</strong>entadoria pelo programa de in-<br />

centivo.<br />

♦ Salári<strong>os</strong>: o salário base de um<br />

petroleiro, com 8 an<strong>os</strong> de empresa, está<br />

em tomo de R$ 800,00 (Mar/96). O últi-<br />

mo concurso público, em nível nacional,<br />

para ingressar na Petrobrás foi em 1988.<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

Reestruturação<br />

produtiva<br />

na Petrobrás<br />

Terceirização<br />

Há quase dez an<strong>os</strong>, a Petrobrás não<br />

contrata ninguém e devido as mudanças<br />

na Previdência Pública, muit<strong>os</strong> petrolei-<br />

r<strong>os</strong> se ap<strong>os</strong>entaram, sem que tenha havi-<br />

do substituição desse pessoal. A deman-<br />

da de pessoal está saído suprida via con-<br />

tratação de empreiteiras.<br />

A terceirização de vári<strong>os</strong> setores da<br />

Petrobrás tem acarretado, num primeiro<br />

momento, dois tip<strong>os</strong> de problemas. Pri-<br />

meiro: <strong>os</strong> salári<strong>os</strong> e as condições de tra-<br />

balho d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> das empresas que<br />

prestam serviç<strong>os</strong> dentro da Petrobrás são<br />

inferiores as d<strong>os</strong> petroleir<strong>os</strong>. Quer dizer:<br />

eles não são treinad<strong>os</strong> para exercer a fun-<br />

ção e no caso da Petrobrás, as funções<br />

sempre são cercadas de pericul<strong>os</strong>idade.<br />

Segundo: eles não têm direito as con-<br />

quistas trabalhistas da categoria e ainda<br />

exercem um serviço temporário. Isto cer-<br />

tamente desqualifica o trabalho desenvol-<br />

vido dentro da empresa, além de aumen-<br />

tar <strong>os</strong> risc<strong>os</strong> de acidentes.<br />

A terceirização tem significado uma<br />

redução d<strong>os</strong> cust<strong>os</strong> com o trabalho, por<br />

parte da estatal. A empresa está transfe-<br />

rindo para terceir<strong>os</strong> a maior parte de seus<br />

serviç<strong>os</strong>. O resultado é a fragmentação<br />

da unidade d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> dentro da<br />

Petrobrás, uma vez que dentro da mes-<br />

ma empresa, existem outras centenas<br />

de empresas. Na prática isso significa


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 Trabalhadores<br />

a desconcentração da produção. Para <strong>os</strong><br />

<strong>trabalhadores</strong>, esta nova realidade só<br />

impõem prejuíz<strong>os</strong>. Por exemplo: se <strong>os</strong><br />

petroleir<strong>os</strong> resolvem deflagrar uma mo-<br />

vimento reivindicatório, vári<strong>os</strong> trabalha-<br />

dores dentro da Petrobrás não participa-<br />

rão, por não serem empregad<strong>os</strong> da esta-<br />

tal, fato que divide <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>. Ou<br />

ainda, se <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> de uma em-<br />

presa terceirizada realizam um movimai-<br />

to reivindicatório, <strong>os</strong> empregad<strong>os</strong> de uma<br />

outra empreiteira não entrarão no movi-<br />

mento por pertencerem a outra empresa.<br />

Dessa forma <strong>os</strong> patrões atingem um de<br />

seus objetiv<strong>os</strong> centrais: alimentar a divi-<br />

são entre <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>.<br />

Atercerização colabora para diminuir<br />

<strong>os</strong> gast<strong>os</strong> da empresa com seus funcio-<br />

nári<strong>os</strong> e por outro lado desqualifica o tra-<br />

balho do profissional petroleiro,<br />

desregulamentando totalmente <strong>os</strong> direi-<br />

t<strong>os</strong> trabalhistas.<br />

O resultado deste processo é que au-<br />

mentou, no pais, o número de trabalha-<br />

dores que não tem carteira assinada, não<br />

tem direit<strong>os</strong>, não tem nada.<br />

Hoje, na Petrobrás, <strong>os</strong> setores de se-<br />

gurança e de manutenção d<strong>os</strong> oleodut<strong>os</strong><br />

estão sobre a responsabilidade de empre-<br />

sas terceirizadas, gerando constantemaite<br />

risc<strong>os</strong> de acidentes.<br />

Programas de<br />

qualidade total e a<br />

diminuição do efetivo<br />

mínimo<br />

A diminuição de efetiv<strong>os</strong> operacionais<br />

é outro elemento dentro da prop<strong>os</strong>ta da<br />

reestruturação produtiva. Sua implemen-<br />

tação tem sido feita através d<strong>os</strong> progra-<br />

mas de qualidade total. Quer dizer: uma<br />

atividade que era desenvolvida por 2 ou<br />

3 petroleir<strong>os</strong>, agora é exigida de um só.<br />

E deste trabalhador, que ficou só para<br />

desenvolver várias funções, a empresa<br />

exige desempenho dentro das regras do<br />

programa de qualidade total.<br />

As conseqüências da diminuição do<br />

efetivo operacional são imediatas. O pe-<br />

troleiro desenvolve seu serviço sobre um<br />

grau de pressão e nerv<strong>os</strong>ismo prejudici-<br />

ais <strong>ao</strong> bom desempenho do trabalho, o<br />

que fatalmente faz aumentar as p<strong>os</strong>sibi-<br />

lidades de acidentes do trabalho.<br />

Se por um lado, <strong>os</strong> programas de qua-<br />

lidade total, gerenciad<strong>os</strong> e implementad<strong>os</strong><br />

pela direção da empresa, exigem 100%<br />

da capacidade do profissional, por outro<br />

lado, no que diz respeito a valorização<br />

de seu trabalho, a empresa só o tem<br />

desqualificado. No caso especifico d<strong>os</strong><br />

petroleir<strong>os</strong>, que já tiveram sua capacida-<br />

de profissional reconhecida mundialmen-<br />

te, a direção da Petrobrás não tem pro-<br />

gramas de estímulo profissional e valori-<br />

zação do empregado. Além do mais, se<br />

mencionarm<strong>os</strong> as condições econômicas<br />

precárias nas quais a empresa insiste em<br />

jogar <strong>os</strong> petroleir<strong>os</strong>, constatarem<strong>os</strong> que<br />

para o trabalhador não existe nenhum<br />

programa de qualidade total.<br />

Avanç<strong>os</strong> Tecnológic<strong>os</strong><br />

O que poderia ser uma maravilha a<br />

ser desfrutada pela humanidade, virou um<br />

pesadelo para milhares de <strong>trabalhadores</strong>.<br />

Os avanç<strong>os</strong> tecnológic<strong>os</strong> conquistad<strong>os</strong><br />

pelo cérebro humano, neste século XX,<br />

pouco tem servido para qualificar a vida<br />

d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>. A contradição está<br />

instalada. Avanço tecnológico versus de-<br />

semprego e barbárie.<br />

O desemprego estrutural, imp<strong>os</strong>to<br />

pelo desenvolvimento da tecnologia, po-<br />

deria ser evitado se o sistema de produ-<br />

ção do mundo em que vivem<strong>os</strong> f<strong>os</strong>se vol-<br />

tado para satisfazer as necessidades so-<br />

ciais e não somente para gerar lucro. Isso<br />

significaria garantir a produção necessá-<br />

ria, sem excedentes e permitir <strong>ao</strong> ser hu-<br />

mano ter mais tempo e condições para se<br />

desenvolver enquanto indivíduo.<br />

Porém, o que vivem<strong>os</strong> é o contrário.<br />

A destruição do ser humano pode ser vista<br />

através das condições de indigência em<br />

que são jogad<strong>os</strong> e através da completa<br />

falta de perspectiva no futuro.<br />

O que fazer<br />

A reestruturação produtiva capitalis-<br />

ta, além de aumentar a produtividade e o<br />

lucro, tem por objetivo central fragmen-<br />

tar e destruir qualquer reação e luta por<br />

parte d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>. E neste sentido,<br />

enfraquecer <strong>os</strong> sindicat<strong>os</strong> que representam<br />

<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>. Entre nós petroleir<strong>os</strong>,<br />

estam<strong>os</strong> vivenciando na prática a ação sin-<br />

cronizada da reestruturação produtiva. Por<br />

um lado, dentro da estatal, o processo de<br />

terceirização, qualidade total e nov<strong>os</strong> mé-<br />

tod<strong>os</strong> de trabalho avançam, e por outro<br />

lado, a organização sindical da categoria<br />

sofre brutais ataques por parte do gover-<br />

no e da direção da empresa.<br />

Diante de uma situação tão delicada, o<br />

trabalho de base em estruturas ganhaainda<br />

mais importância. Significa que n<strong>os</strong>so Sin-<br />

dicato, mais do quenunca estará dando uma<br />

batalha para uma maior participação d<strong>os</strong><br />

<strong>trabalhadores</strong> na condução das decisões em<br />

relação a categona.<br />

Significa que a luta pela redução da<br />

jornada de trabalho ganha mais força, tem<br />

que ser uma de n<strong>os</strong>sas principais reivin-<br />

dicações. O avanço tecnológico conquis-<br />

tado neste século já permite que a jorna-<br />

da de trabalho seja de 4 horas diárias.<br />

Bastaria que a produção tivesse função<br />

de atender as necessidades sociais e não<br />

somente objetivar o lucro.<br />

Outra medida implicaria em campa-<br />

nhas unificadas d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> que<br />

derrnta^gn OGpJarasdDgDveiix). D<br />

MERCADO PE TRA^AtPfO<br />

ALfONSO-^OBMaPO EM ADVOCACIA,<br />

MflÇ, ATUA NO SCTOK IMOBILIÁRIO<br />

COMO CORRETOR<br />

JOSEâUüUSIO-Pitn-OMAoo BM<br />

APMiNIST RAÇÃO E PUBUCU-At'^<br />

T^-BAlHA EM UMA KEVENPEPüKA<br />

PE CARKOÍ<br />

^-*^*á^<br />

TÂNIA- PHD f M PsicotOülA.viue<br />

HO.TF- DE SEUS tíCNPIMEMTOS<br />

COMO PE&queADcxaA PO ie&e.<br />

FfRNiMPO HENRIQUE- FOKMAPO<br />

EM SOCIOl-Oâtík.<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"


Quinzena N 0 228 - 30/04/96<br />

Folha da Sexta - SINTTEL-RJ - Março/96 - N' 160<br />

Produtividade? Participação n<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong>? Ou o quê?<br />

Na assembléia do último dia 14, o que<br />

mais <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> cobraram foi ex-<br />

plicações sobre a produtividade, partici-<br />

pação n<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> e se vão receber <strong>os</strong> dois.<br />

Uma coisa é certa, a categoria sabe que<br />

a produtividade é devida desde 92 pelo<br />

Sistema e não quer mais rolar esta dívi-<br />

da. Para tentar esclarecê-l<strong>os</strong>, a Imprensa<br />

do Sinttel solicitou informações <strong>ao</strong> téc-<br />

nico do DIEESE, J<strong>os</strong>é Luiz. Confira nesta<br />

edição o que ele diz sobre produtividade<br />

e no jornal do Sinttel, sobre a participa-<br />

ção n<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong>.<br />

Produtividade: o que é isso?<br />

Chamam<strong>os</strong> de ganh<strong>os</strong> de produtivi-<br />

dade o aumento da eficiência de um<br />

dado processo produtivo entre dois pe-<br />

ríod<strong>os</strong> de tempo.<br />

Aumento da eficiência, o que signi-<br />

fica isso?<br />

Se a quantidade de fatores de produ-<br />

ção (por exemplo, mão-de-obra,<br />

materiais, máquinas, equipament<strong>os</strong>, ser-<br />

viç<strong>os</strong>, etc.) utilizad<strong>os</strong> em um determina-<br />

Jornal do SINTUFRJ - 30/01/96 - N 0 201<br />

A terceirização, sistema de trabalho<br />

sem carteira assinada e coordenado por<br />

empreiteir<strong>os</strong> intermediári<strong>os</strong>, chegou a<br />

várias cidades do Triângulo Mineiro.<br />

Todas as produtoras de laranja. Duran-<br />

te o pico de safra, de maio a outubro, do<br />

ano passado, cerca de 25 mil crianças<br />

catavam com <strong>os</strong> pais. Os contratad<strong>os</strong><br />

recebiam na carteira por produção, le-<br />

vavam toda a família para ajudar, con-<br />

seguiam juntar 70 caixas de laranja e<br />

ganhavam uma média de sete reais por<br />

dia. Ou seja, uma família trabalha\'a o<br />

dia inteiro na colheita para receber R$<br />

0, l/caixa! E difícil imaginar situação<br />

pior do que esta Mas a terceirização<br />

levou o desemprego à região.<br />

Cerca de 16% da mão-de-obra assa-<br />

lariada no campo, em Minas Gerais, já<br />

não têm carteira assinada. No setor da<br />

laranja, no Triângulo Mineiro, a<br />

terceirização já atinge 80% d<strong>os</strong> trabalha-<br />

dores rurais. Até o ano passado, a Suco<br />

Citrico Cutrale Ltda. tinha cerca de 2.300<br />

<strong>trabalhadores</strong> contratad<strong>os</strong> diretamente ou<br />

através de suas diversas fazendas, como<br />

do processo de produção permaneceu a<br />

mesma entre dois períod<strong>os</strong>, mas a quan-<br />

tidade d<strong>os</strong> produt<strong>os</strong> e serviç<strong>os</strong> produzi-<br />

d<strong>os</strong> aumentou, então ocorreu um aumen-<br />

to de eficiência neste processo.<br />

Havaido aumento de eficiência e, por-<br />

tanto, de produtividade, há consequente-<br />

mente um ganho que será inevitavelmente<br />

apropriado por algum agente econômi-<br />

co. Se este ganho não for repassado a<strong>os</strong><br />

salári<strong>os</strong> será apropriado pela empresa<br />

(via aumento de lucr<strong>os</strong>), ou pelo Estado<br />

(via aumento de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>), ou transferi-<br />

do a<strong>os</strong> consumidores (através de redu-<br />

ção de preç<strong>os</strong> em situações não inflacio-<br />

nárias, ou de aument<strong>os</strong> de preç<strong>os</strong> abaixo<br />

da inflação em situações inflacionárias).<br />

Desde o acordo coletivo 92/93, <strong>os</strong> sin-<br />

dicat<strong>os</strong> filiad<strong>os</strong> à Fittel vêm assinando<br />

cláusulas de repasse d<strong>os</strong> ganh<strong>os</strong> de pro-<br />

dutividade a<strong>os</strong> salári<strong>os</strong>, com o objetivo<br />

de fundamentar aument<strong>os</strong> reais de salá-<br />

rio. Quando há aumento de eficiência no<br />

processo de produção toma-se p<strong>os</strong>sível<br />

Laranja: do suor <strong>ao</strong> suco<br />

a Fazenda América, em Camp<strong>os</strong> Flori-<br />

d<strong>os</strong>; a Rio Verde em Prata; e a Cocais,<br />

em Comendador Gomes.<br />

Hoje, a Cooperativa de Trabalhado-<br />

res Rurais do Triângulo Mineiro Ltda.<br />

monopoliza o trabalho e tem apenas mil<br />

associad<strong>os</strong>. Na mudança para a terceiri-<br />

zação, entre uma safra e outra, ura bóia-<br />

fna explica que "muita gente ficou só com<br />

o bagaço da laranja. Mais de mil traba-<br />

lhadores largaram a laranja e foram tra-<br />

balhar na colheita da batata e de cebo-<br />

la". Se nessas culturas o trabalho infan-<br />

til ainda é aceito, o valor pago é igual-<br />

mente baixo <strong>ao</strong> da laranja.<br />

O último acordo coletivo de trabalho<br />

assinado entre <strong>os</strong> catadores de laranja de<br />

Minas Gerais e <strong>os</strong> don<strong>os</strong> da colheitas é o<br />

mesmo acertado em São Paulo. Por cada<br />

caixa, que tem em média 180 laranjas,<br />

com cerca de 40 kg, um trabalhador rece<br />

be R$ 0,0737. Este valor surreal merece<br />

até ser escrito por extenso: setecent<strong>os</strong> e<br />

trinta e sete milésim<strong>os</strong> de real! Segundo<br />

J<strong>os</strong>é de Anchieta, diretor da Federação<br />

d<strong>os</strong> Trabalhadores na Agricultura do Es-<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

Trabalhadores<br />

ganh<strong>os</strong> reais de salário sem aumentar<br />

<strong>os</strong> preç<strong>os</strong> d<strong>os</strong> produt<strong>os</strong> (ou das tarifas<br />

d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> de telecomunicações, no<br />

n<strong>os</strong>so caso). Além disto, argumenta-se<br />

que quando o repasse d<strong>os</strong> ganh<strong>os</strong> de<br />

produtividade a<strong>os</strong> salári<strong>os</strong> toma-se uma<br />

norma generalizada em um determinado<br />

país, esta passa a impedir que o aumen-<br />

to da eficiência d<strong>os</strong> process<strong>os</strong> produti-<br />

v<strong>os</strong> venha a acarretar piora crescente<br />

da distribuição de renda entre empresa<br />

e empregad<strong>os</strong> (ou seja entre lucr<strong>os</strong> e<br />

salári<strong>os</strong>).<br />

Como geralmente o aumento de efici-<br />

ência n<strong>os</strong> process<strong>os</strong> produtiv<strong>os</strong> decorre<br />

principalmaite de inovações tecnológicas<br />

n<strong>os</strong> mei<strong>os</strong> de produção, na organização<br />

d<strong>os</strong> process<strong>os</strong> de trabalho e nas relações<br />

interempresariais, e como estas inovações<br />

dão origem a process<strong>os</strong> de ganh<strong>os</strong> de efi-<br />

ciência cumulativ<strong>os</strong>, <strong>os</strong> ganh<strong>os</strong> de pro-<br />

dutividade são geralmente incorporad<strong>os</strong><br />

a<strong>os</strong> salári<strong>os</strong> de forma definitiva, através<br />

de aument<strong>os</strong> salariais reais. □<br />

tado de Minas Gerais, <strong>os</strong> argument<strong>os</strong><br />

usad<strong>os</strong> pel<strong>os</strong> empresári<strong>os</strong> foi o de que<br />

houve desvalorização cambial de 17%,<br />

causada pela queda do dólar diante do<br />

real; diminuição da produção devido à<br />

geada do ano passado e o fato d<strong>os</strong> maio-<br />

res importadores, <strong>os</strong> Estad<strong>os</strong> Unid<strong>os</strong>, te-<br />

rem passado a produzir laranja.<br />

Estud<strong>os</strong> do economista Emerson Car-<br />

valho da Silva, do Conselho Regional de<br />

Economia de Minas Gerais, provam que<br />

as perdas salariais d<strong>os</strong> catadores de la-<br />

ranja, de março de 1988 a março de 1995,<br />

foram de 115,73%. Em relação <strong>ao</strong> salá-<br />

rio mínimo, a perda, entre julho de 1987<br />

e julho 1994, foi de 60,66%. A noção<br />

dessa cadeia produtiva, ciclo desde o pro-<br />

dutor <strong>ao</strong> consumidor, fica mais clara<br />

quando verificam<strong>os</strong> que um pé de laran-<br />

ja resulta em média três caixas colhidas<br />

e cada caixa tem cerca de 180 laranjas.<br />

A Cutrale produz 3,7 milhões de caixas<br />

por safra no Triângulo Mineiro. Nas<br />

máquinas automáticas, encontradas fa-<br />

cilmente n<strong>os</strong> grandes centr<strong>os</strong> urban<strong>os</strong>,<br />

faz-se um litro de suco com oito laranjas


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 Trabalhadores<br />

em média. Alguns como o Santal da Yolat<br />

Ind. e Com. de Laticíni<strong>os</strong> Ltda., de<br />

Itamonte-MG, são vendid<strong>os</strong> a<strong>os</strong> comerci-<br />

antes do Rio de Janeiro, por exemplo, por<br />

R$ 1,00. O preço repassado <strong>ao</strong> consumi-<br />

dor varia de R$ 1,80 a R$ 2,40. Isto quer<br />

dizer que um litro de suco comprado no<br />

mercado das grandes cidades vale 300<br />

vezes o valor do trabalho de quem colheu<br />

a laranja. E só não é muito porque <strong>os</strong><br />

catadores estão conseguindo R$ 0,18 por<br />

caixa, superando aquele ridículo acordo<br />

de milésim<strong>os</strong>...<br />

Embora estejam<strong>os</strong> falando de distribui-<br />

ção e preç<strong>os</strong> no mercado nacional, sabe-<br />

m<strong>os</strong> que a defasagem entre o lucro de quem<br />

produz com o de quem atravessa a mer-<br />

cadoria é muito maior quando se fala de<br />

exportação. E, no caso da laranja, a mai -<br />

Carta Capital - 29/Março/96 ■ N 0 20<br />

oria da produção d<strong>os</strong> suc<strong>os</strong> é destinada<br />

<strong>ao</strong> mercado externo. Por tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> luga-<br />

res da região, escuta-se falar da estatís-<br />

tica de que "para cada dois cop<strong>os</strong> de suco<br />

exportad<strong>os</strong>, um é de Suco Citrico<br />

CutraleLtda".<br />

"Cor de burro quando foge"<br />

Em Pianura, uma das cidades do<br />

Triângulo Mineiro, <strong>os</strong> fazendeir<strong>os</strong> cul-<br />

tivam laranja, batata e cebola. Nas pou-<br />

cas ruas, a maioria de terra batida, não<br />

é difícil encontrar algumas famílias vol-<br />

tando para casa depois de um dia de<br />

trabalho. Roupas sujas, r<strong>os</strong>t<strong>os</strong> cansa-<br />

d<strong>os</strong>, andar arrastado, como quem não<br />

exige muito mais da vida, como Maria<br />

Aparecida e Francisco Augusto<br />

Collares, amb<strong>os</strong> de 27 an<strong>os</strong>, pais de<br />

Francisco Welder, de 11. Eles, por<br />

exemplo, estão retomando da colheita de<br />

batatinhas do vice-prefeito Alcidez<br />

Tomaia.<br />

A família Collares se completa com<br />

as meninas Eudinete, de seis an<strong>os</strong>, e<br />

R<strong>os</strong>inete, de dois. O irmão Francisco sabe<br />

que ambas ainda são muito pequenas para<br />

trabalhar na colheita. Ele conta que "pa-<br />

pai e mamãe ganhavam melhor antes da<br />

cooperativa, agora ficou mais difícil" e<br />

brinca dizendo que a terra é da "cor do<br />

burro quando foge". Depois sai corren-<br />

do, com seu boné, lembrando o menino<br />

pixote, cujo futuro, na vida real, foi trá-<br />

gico. Francisco estuda de manhã na Es-<br />

cola João Alves de Paiva, cursa a 4 o sé-<br />

rie do Primeiro Grau e é considerado uma<br />

exceção, pois, apesar das faltas, nunca<br />

ficou reprovado. G<br />

Tod<strong>os</strong> perdem com a flexibilização<br />

O Brasil é um país extr<strong>ao</strong>rdinário e<br />

cheio de surpresas. A confusão pré-car-<br />

navalesca armada no Congresso com a<br />

reforma da seguridade social, afinai recu-<br />

sada, alienou algumas lideranças sindicais.<br />

Estas, em resp<strong>os</strong>ta, se dispuseram a uma<br />

medida heróica: discutir e aceitar a com-<br />

pleta flexibilização das relações de traba-<br />

lho. Habilmente, <strong>os</strong> empresári<strong>os</strong> aceitaram<br />

o desafio e em pouco tempo a opinião<br />

pública foi ocupada pelo novo tema. Em-<br />

presári<strong>os</strong> e sindicalistas assinaram um<br />

acordo de nenhum efeito jurídico, mas com<br />

tremendas implicações práticas e morais:<br />

<strong>os</strong> desempregad<strong>os</strong> em estado de desespe-<br />

ro aceitariam a completa fragilização das<br />

relações de trabalho!<br />

Não deixa de ser interessante assistir<br />

<strong>ao</strong> espetáculo. Leva-se a sério o documen-<br />

to e afirma-se que o acordo é ilegal, que é<br />

mesmo inconstitucional! Ora, nenhum d<strong>os</strong><br />

participantes do conchavo é jejuno. Ao<br />

contrário, são tod<strong>os</strong> hábeis negociadores<br />

com velha e comprovada experiàicia. Eles<br />

sabiam que o acordo não tinha valor jurí-<br />

dico e nunca tiveram qualquer esperança<br />

de que ele pudesse pr<strong>os</strong>perar sem uma<br />

modificação constitucional acompanhada<br />

por mudanças na legislação ordinária. O<br />

que eles fizeram foi colocar uma grave<br />

questão moral: o que vam<strong>os</strong> fazer com<br />

n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> desempregad<strong>os</strong>? E propor uma<br />

solução discutível: flexibilizar <strong>os</strong> salári<strong>os</strong><br />

reais (o que parece correto) pela<br />

fragilização das relações de trabalho (o<br />

que não parece tão correto).<br />

A questão moral é da maior pertinência<br />

se pretendem<strong>os</strong> ser uma sociedade civili-<br />

Anliniii) Delfim Nello<br />

zada. E por isso que a solução sugerida<br />

deve ser cuidad<strong>os</strong>amente escrutinada.<br />

A hipótese que sustenta a prop<strong>os</strong>ta<br />

em discussão é a de que a principal cau-<br />

sa do desemprego atual é a inflexibilida-<br />

de do salário real produzido pela anti-<br />

quada CLT. Raciocina-se como se, de<br />

fato, a "legislação fascista, antiliberal e<br />

antidemocrática", se aplicasse a um<br />

corpo monolítico de <strong>trabalhadores</strong> - to-<br />

d<strong>os</strong> com sua preci<strong>os</strong>a carteira de traba-<br />

lho -, organizad<strong>os</strong> em fortíssim<strong>os</strong> sindi-<br />

cat<strong>os</strong>, que controlam a oferta de traba-<br />

lho e "preferem" o desemprego a uma<br />

baixa de salário real.<br />

A discussão parece sugerir no Brasil<br />

<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> de trabalho são peças sa-<br />

gradas, que fixam o salário nominal por<br />

praz<strong>os</strong> long<strong>os</strong> e, portanto, tem embuti-<br />

da uma expectativa de inflação: quando<br />

a inflação é menor do que a esperada<br />

aumenta o salário real ehá dispensa. E<br />

mais, queexistetoda uma "cultura" den-<br />

tro das empresas que respeita o direito<br />

não escrito d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> (por exem-<br />

plo, não dispensar por telegramas) e uma<br />

"cultura" d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> que respei-<br />

ta o direito das empresas (por exemplo,<br />

não sabotar seus equipament<strong>os</strong>).<br />

Existe alguma evidência empírica de<br />

que é a inflexibilidade do salário real a<br />

principal causa do atual aumento do de-<br />

semprego no Brasil? Um d<strong>os</strong> indicado-<br />

res mais usad<strong>os</strong> para medir a flexibili-<br />

dade do mercado de trabalho é a distân-<br />

cia entre o salário médio d<strong>os</strong> 10% mais<br />

bem pag<strong>os</strong> e <strong>os</strong> 10% mais malpag<strong>os</strong> da<br />

força de trabalho. A medida em que <strong>os</strong><br />

'SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

<strong>trabalhadores</strong> vão aceitando salário mais<br />

baixo para manterem-se empregad<strong>os</strong>, vai-<br />

se ampliando esse diferencial. Medido por<br />

esse indicador, o Brasil parece ser um cam-<br />

peão mundial da flexibilidade. O nível do<br />

tumover da mão-de-obra na empresa na-<br />

cional aponta na mesama direção. No cur-<br />

to prazo a flexibilização do salário real<br />

pela rápida desqualificação do trabalho<br />

(um bom torneiro mecânico com 40 an<strong>os</strong><br />

de idade vai ser balconista num bar de<br />

subúrbio ou um bom pintor transforma-<br />

se num borracheiro de periferia) encolhe<br />

o nível do desemprego piorando a quali-<br />

dade do emprego e reduzindo a habilidade<br />

do trabalhador. Num prazo mais longo,<br />

entretanto, ela é exatremamente pen<strong>os</strong>a<br />

para o indivíduo e dan<strong>os</strong>a para a empresa<br />

e para a sociedade. Pen<strong>os</strong>a para o indiví-<br />

duo porque ele não se sente seguro dentro<br />

do organismo em que vive e porque, não<br />

taido uma ocupação permanente, não p<strong>os</strong>-<br />

sibilidade nem estímulo para aperfdçoar-<br />

se. Dan<strong>os</strong>a para a empresa porque ela não<br />

investe na melhoria do capital humano que<br />

não pretende reter: a empresa só educa e<br />

prepara mão-de-obra na medida em que<br />

espera internalizar o retomo dessa educa-<br />

ção como aumento de produtividade. A<br />

flexibilização é mais dan<strong>os</strong>a, ainda, para<br />

a sociedade, que assiste à deterioração do<br />

seu escasso capital humano.<br />

Nada disso, entretanto, ilide o proble-<br />

ma levantado pelo "acordo", que é<br />

imporatnte e precisa ser enfrentado. O<br />

que parece difícil é aceitar a solução pro-<br />

p<strong>os</strong>ta, claramente inadequada do ponto<br />

de vista do longo prazo. □


■Wttttttw*^<br />

Quinzena N 0 228 - 30/04/96 Trabalhadores<br />

O Trabalho - 27 de Março à 10 de Abril/96 - N 0 390<br />

Direit<strong>os</strong> trabalhistas estão na<br />

FHC pretende acabar com direit<strong>os</strong> d<strong>os</strong><br />

<strong>trabalhadores</strong>, com o pretexto de que <strong>os</strong><br />

"encarg<strong>os</strong> trabalhistas" são alt<strong>os</strong>. Esta é<br />

a tradução no Brasil, da ofensiva que<br />

govern<strong>os</strong> e capitalistas desenvolvem em<br />

nível mundial. Em nome da "globalização<br />

da economia" e da "competitividade",<br />

querem reduzir o "custo do trabalho".<br />

Os patrões fazem campanha pela di-<br />

minuição do "custo Brasil", como forma<br />

de combater o desemprego. O que, como<br />

se viu na Argentina ou em paises euro-<br />

peus que adotaram políticas do tipo, além<br />

de não reduzir o desemprego, termina por<br />

achatar as médias salariais.<br />

A chamada "flexibilização" d<strong>os</strong> direi-<br />

t<strong>os</strong> trabalhistas é apresentada como so-<br />

lução. A primeira intenção do governo,<br />

expressa em declarações do ministro do<br />

Trabalho, Paulo Paiva, era simplesmen-<br />

te retirar da Constituição várias garanti-<br />

as. Questões hoje previstas em lei de fé-<br />

rias, descanso semanal remunerado, au-<br />

xilio maternidade - seriam remetidas para<br />

<strong>os</strong> acord<strong>os</strong> coletiv<strong>os</strong>.<br />

Isso significa que uma categoria for-<br />

te e organizada poderia ter condições de<br />

mantê-l<strong>os</strong>, mas as categorias dispersas<br />

certamente perderiam estes direit<strong>os</strong>. De<br />

conjunto, isso significaria um rebaixa-<br />

mento, como reflex<strong>os</strong> para tod<strong>os</strong>.<br />

O governo estimulou a Força Sindi-<br />

cal a propor um acordo de contrato tem-<br />

porário sem registro em carteira (vide<br />

BOT 388). Ele era tão escandal<strong>os</strong>o, no<br />

entanto, que a própria Justiça do Traba-<br />

lho contestou.<br />

Agora, é anunciado um projeto de lei<br />

de flexibilização de contrat<strong>os</strong> de trabalho,<br />

que sugere o mesmo objetivo de precanzar,<br />

destruindo direit<strong>os</strong>. O projeto altera a CLT<br />

(Consolidação das Leis do Trabalho) e,<br />

segundo Paiva, deverá ser negociad<strong>os</strong> com<br />

as centrais sindicais. Uma batalha em de-<br />

fesa d<strong>os</strong> direit<strong>os</strong>, contra o governo FHC e<br />

<strong>os</strong> picaretas do Congresso, é tarefa do<br />

movimento sindical, do PT e de tod<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />

que se reivindicam d<strong>os</strong> interesses d<strong>os</strong> tra-<br />

balhadores e do povo.<br />

Projeto do Governo<br />

Ampliação do contrato por tempo<br />

determinado - Pela CLT, tais contrat<strong>os</strong><br />

mira do governo FHC<br />

hoje só podem ser feit<strong>os</strong> em trabalh<strong>os</strong><br />

comprovadamaite transitóri<strong>os</strong>. O governo<br />

quer que qualquer empresa p<strong>os</strong>sa contra-<br />

tar por tempo detenninado (até dois an<strong>os</strong>),<br />

pagando mai<strong>os</strong> encarg<strong>os</strong>. Em caso de de-<br />

missão, o trabalhador não teria direito a<br />

aviso prévio nem à multa de 40% sobre o<br />

FGTS. Alega que isso "não reduz direit<strong>os</strong>",<br />

porque <strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> só valenam para no-<br />

vas vagas, e não para substituições.<br />

Jornada de trabalho flexível - O con-<br />

trato por tempo determinado teria uma<br />

média de horas a serem trabalhadas por<br />

ano, e não uma jornada semanal, como<br />

atualmente. Ao fim de um ano, a média<br />

semanal deveria ser de 44 horas. Por meio<br />

de acordo com <strong>os</strong> sindicat<strong>os</strong>, as empre-<br />

sas poderiam criar "banc<strong>os</strong> de horas".<br />

Redução d<strong>os</strong> encarg<strong>os</strong> sociais - Al-<br />

gumas contribuições pagas pelas empre-<br />

sas, como saláno-educação, auxilio para<br />

acidentad<strong>os</strong>, Sebrae, Sesi e Senactenam<br />

suas alíquotas reduzidas a valores quase<br />

simbólic<strong>os</strong>. Isso resultaria na redução<br />

geral de cerca de 18% d<strong>os</strong> encarg<strong>os</strong> nes-<br />

te novo tipo de contrato.<br />

Conseqüências<br />

E o inicio da precarização de tod<strong>os</strong><br />

<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> de trabalho. Se a empresa<br />

pode contratar parte de sua mão-de-obra<br />

temporariamente, pagando men<strong>os</strong> encar-<br />

g<strong>os</strong>, por que contraria pagando tod<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />

direit<strong>os</strong>? Em pouco tempo, o contrato por<br />

tempo determinado o "padrão" e rebai-<br />

xaria o conjunto de direit<strong>os</strong> d<strong>os</strong> traba-<br />

lhadores. Dizer que não acaba com di-<br />

reit<strong>os</strong> porque só valeria para "novas va-<br />

gas" é mentira. O efeito d<strong>os</strong> nov<strong>os</strong> con-<br />

trat<strong>os</strong> se verificaria em toda a mão-de-<br />

obra. Isso porque a média salarial cairia<br />

e consequentemente o poder aquisitivo<br />

d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>. As camadas popula-<br />

res iriam cada vez consumir men<strong>os</strong>, en-<br />

quanto <strong>os</strong> patrões, pagando men<strong>os</strong> encar-<br />

g<strong>os</strong>, aumentariam seus lucr<strong>os</strong> na produ-<br />

ção e principalmente na especulação fi-<br />

nanceira.<br />

Esta prop<strong>os</strong>ta segue <strong>os</strong> acord<strong>os</strong> feit<strong>os</strong><br />

pelo Sindicato d<strong>os</strong> Metalúrgic<strong>os</strong> do ABC<br />

com as montadoras. Dependendo das<br />

necessidades das empresas, a jornada de<br />

trabalho teria mais ou men<strong>os</strong> tempo. Se<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

trabalha mais, isso compaisa o período<br />

anterior. Quer dizer: <strong>os</strong> patrões não tân que<br />

pagar hora extra e dispõem d<strong>os</strong> trabalha-<br />

dores de acordo com suas convaiiências.<br />

Estes valores são aplicad<strong>os</strong> basica-<br />

mente no treinamaito profissional. As<br />

empresas, que têm necessidade de mão-<br />

de-obra especializada, recolhem recurs<strong>os</strong><br />

que são utilizad<strong>os</strong> para formar <strong>os</strong> traba-<br />

lhadores. Reduzir as alíquotas significa<br />

desmantelar <strong>os</strong> curs<strong>os</strong> profissionalizan-<br />

tes, que o Estado abandona.<br />

A multa de 40% sobre o valor do<br />

FGTS tem como função inibir as demis-<br />

sões (o patrão pensaria duas vezes antes<br />

de mandar embora um trabalhador e ter<br />

de pagar esta multa). Reduzir o FGTS e<br />

acabar com a multa são medidas que ape-<br />

nas contribuem para a precarização ge-<br />

ral d<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> de trabalho, favorecai-<br />

do a demissão d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> e sua<br />

contratação em novas bases, rebaixadas.<br />

Comparo o cnslo<br />

médio cia mão-de-obra<br />

Por hora trabalhada na indús-<br />

tria de transformação, em USS<br />

Alemanha 21,30<br />

Suécia 20,93<br />

Suíça 20,86<br />

Ittlla 16,28<br />

França 16,25<br />

EUA 14,83<br />

Japão 12,84<br />

Grí-Bratanha 12,42<br />

Espanha 11,86<br />

Cortía 4,16<br />

Taiwan 3,98<br />

BRASIL 2,79<br />

Fonte: "Buurciu of L*bor Siitmic, BLS<br />

feport" reproduzido no "'Anuirio do* Tr»h«-<br />

Uudoret de 1993" do Díeete (dad<strong>os</strong> de 1990)<br />

Altas taxas de<br />

desemprego<br />

(em % da população<br />

economicamente ativa)<br />

Espanha 23<br />

Argentina 17<br />

Mia 12<br />

França 12<br />

Suécia 9<br />

IMxico 7<br />

EUA 6<br />

BRASIL 5<br />

Japão 3<br />

>: Eur<strong>os</strong>tat/OCDE/OIT (dado* do 1995)<br />

6


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 Trabalhadores<br />

A CUT anunciou a campanha "Diz<br />

Emprego", dizendo-se contrária <strong>ao</strong> pro-<br />

jeto apresentado pelo ministro Paiva. A<br />

campanha apresenta reivindicações tra-<br />

dicionais com as quais tod<strong>os</strong> concordam<br />

- como a redução da jornada semanal<br />

para 40 horas, o fim das horas extras e<br />

o assentamento de 2 milhões de famíli-<br />

as de sem-terra.<br />

Ao lado disso, propõe a retomada das<br />

câmaras setoriais, que já provaram que<br />

podem ser muito úteis - para <strong>os</strong> patrões.<br />

No caso da indústria automobilística, eles<br />

tiveram redução d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> pag<strong>os</strong> e<br />

aumentaram a produção. Isso não <strong>os</strong> ini-<br />

biu de demitir em massa (como <strong>os</strong> 1.600<br />

na Mercedes, em outubro passado) quan-<br />

do <strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> caem.<br />

Vicentinho diz que "estam<strong>os</strong> disp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />

a enfretanr qualquer debate". "Segundo<br />

ele, até mesmo model<strong>os</strong> como que sugere<br />

o afastamaito de empregad<strong>os</strong> em período<br />

de baixa produção, com redução de salá-<br />

ri<strong>os</strong>, desde que garantido o seu retomo <strong>ao</strong><br />

p<strong>os</strong>to". (O Estado de São Paulo, 20/03).<br />

Trata-se da mesma idéia contida no<br />

programa "Mais e Melhores Empreg<strong>os</strong>",<br />

da campanha Lula em 94, que a direção<br />

do PT está relançando. No documento de<br />

94, propõe-se um fundo para a<br />

Reestruturação Produtiva. Um de seus<br />

objetiv<strong>os</strong> sena "permitir que a empresa,<br />

durante o processo de reestruturação,<br />

mantenha <strong>os</strong> compromiss<strong>os</strong> com a mão-<br />

No dia 14 de fevereiro, foi assinado<br />

um "protocolo" entre <strong>os</strong> ministéri<strong>os</strong> do<br />

Planejamento e do Trabalho sup<strong>os</strong>tamen-<br />

te para geração de empreg<strong>os</strong>. Mais uma<br />

enganação do govemo.<br />

O protocolo prevê financiamento pelo<br />

BNDES, a jur<strong>os</strong> menores, para projet<strong>os</strong><br />

que criem p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> de trabalho. Mas <strong>os</strong><br />

demais também vão receber ajuda: "N<strong>os</strong><br />

projet<strong>os</strong> que gerem demissões (como fu-<br />

sões e incorporações) a liberação do di-<br />

nheiro está condicionada á apresentação<br />

de programa de reitrenamento d<strong>os</strong> em-<br />

pregad<strong>os</strong> que forem demitid<strong>os</strong>" (O Glo-<br />

bo, 15/02). E o estimulo á demissão, apre-<br />

sentado como se f<strong>os</strong>se o contrário.<br />

O ministro do Trabalho anunciou às<br />

centrais sindicais a utilização de recur-<br />

s<strong>os</strong> do FAT (Fundo de Amparo <strong>ao</strong> Tra-<br />

balhador) nestes programas. Prevê-se R$<br />

1,5 bilhão do fundo para retreinar <strong>os</strong> fun-<br />

cionári<strong>os</strong> atingid<strong>os</strong> pel<strong>os</strong> cortes, prin-<br />

Que saídas para o desemprego?<br />

de-obra empregada. Nesse sentido, com<br />

a manutenção do vinculo empregaticio e<br />

com a participação d<strong>os</strong> empregad<strong>os</strong> em<br />

programas de reciclagem profissional,<br />

esse fundo poderá integralizar tempora-<br />

riamente o salário da jomada-mês cum-<br />

prida na empresa".<br />

Isso significa aceitar que a<br />

"reestruturação", <strong>ao</strong> reduzir a produção,<br />

tenha seus cust<strong>os</strong> jogad<strong>os</strong> sobre as con-<br />

tas d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>. Estes seriam obri-<br />

gad<strong>os</strong>, em períod<strong>os</strong> de baixa na ativida-<br />

de das empresas, a aceitar um salário<br />

menor - custeado por um fundo bancado<br />

pelas empresas, governo e também por<br />

um desconto n<strong>os</strong> salári<strong>os</strong> -, enquanto se<br />

"reciclam" ou "retreinam" para se ajus-<br />

tar às novas exigências.<br />

"Compromisso" - A política da<br />

direção da CUT tem sido a de procurar<br />

"soluções" em conjunto com <strong>os</strong> empresá-<br />

ri<strong>os</strong>. Em ag<strong>os</strong>to do ano passado, no ABC,<br />

lançou o "Brasil, caí na Real", em um ato<br />

com empresán<strong>os</strong> e prefeituras da região.<br />

O manifesto de convocação colocava a<br />

"estabilidade econômica" como algo a ser<br />

defendido, aiquanto não dizia nada sobre<br />

<strong>os</strong> cortes de verbas do govemo federal, a<br />

necessidade de unia política voltada para<br />

a produção ou o reajuste de salán<strong>os</strong>.<br />

Pior ainda: sindicat<strong>os</strong> cutistas, como o<br />

do ABC, logo em seguida assinaram com<br />

empresán<strong>os</strong> o manifesto "Reformas sim -<br />

Recessão não", admitindo a necessidade<br />

Projet<strong>os</strong> não criam nov<strong>os</strong> empreg<strong>os</strong><br />

cipalmente das estatais a serem<br />

privatizadas.<br />

Em resumo, não se pretende criar ne-<br />

nhum emprego. Fucionári<strong>os</strong> demitid<strong>os</strong><br />

seriam "retreinad<strong>os</strong>", o que não quer di-<br />

zer que conseguirão nova colocação. O<br />

dinheiro para isso não viria das empre-<br />

sas, que são as interessadas na mão-de-<br />

obra "retreinada", mas do FAT - fundo-<br />

desemprego, que ficaria assim<br />

desguarnecido.<br />

Ajuda às empresas - O FAT, ali-<br />

ás, é sempre lembrado pelo governo ou<br />

pel<strong>os</strong> patrões para ajudar empresas a sa-<br />

írem de dificuldades, com a desculpa de<br />

que sua utilização vai gerar empreg<strong>os</strong>.<br />

Foi assim há três an<strong>os</strong>, na Câmara<br />

Setorial da indústria naval. Os estalei-<br />

r<strong>os</strong> tiveram acesso a recurs<strong>os</strong> do fundo.<br />

Isso não impediu as demissões no setor,<br />

como as que ocorreram há um mês na<br />

Verolme, em Angra d<strong>os</strong> Reis (RJ): 800<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

de "reformas", quando o govemo estava<br />

empenhado em acabar com o monopólio<br />

do petróleo e das telecomunicações.<br />

, Mesmo a prop<strong>os</strong>ta do ministro Paiva<br />

de contrato de trabalho por tempo deter-<br />

minado recebeu de Guiba, presidente do<br />

Sindicato do ABC, uma aprovação: "Se<br />

for para gerar emprego e se houver um<br />

compromisso do govemo e d<strong>os</strong> empresá-<br />

ri<strong>os</strong> nesse sentido, é p<strong>os</strong>sível discutir esse<br />

tal de contrato especial" (Folha de<br />

S.Paulo, 15/03). Mas que "compromis-<br />

so"? O mesmo que eles empenharam e<br />

não cumpriram nas câmaras setoriais?<br />

A única saída na luta contra o desem-<br />

prego é <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> contarem com<br />

suas próprias forças. É avançar na uni-<br />

dade com <strong>os</strong> demais setores, como <strong>os</strong><br />

sem-terra, que sofrem <strong>os</strong> efeit<strong>os</strong> da mes-<br />

ma política de ajuste que arrasa com<br />

empreg<strong>os</strong> e destrói conquistas.<br />

S é urgente lutar por "mais e melho-<br />

res empreg<strong>os</strong>", o primeiro passo é exigir<br />

o fim das demissões e a redução da jor-<br />

nada de trabalho sem redução d<strong>os</strong> salán-<br />

<strong>os</strong>. O reajuste automático de salári<strong>os</strong> é<br />

condição para relançar o consumo popu-<br />

lar e a produção de bens que atendam as<br />

necessidades das amplas massas. O con-<br />

fisco d<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> especulativ<strong>os</strong> e o fim do<br />

pagamento da dívida extema liberariam<br />

bilhões para uma política de investimento<br />

na produção, assegurando empreg<strong>os</strong> sem<br />

redução de direit<strong>os</strong>.<br />

metalúrgic<strong>os</strong> (quase 1/3 do estaleiro) fo-<br />

ram colocad<strong>os</strong> na rua.<br />

O presidente da Fiesp agora propõe<br />

que recurs<strong>os</strong> do FAT sejam jogad<strong>os</strong> para<br />

o Sesi, Senai e outr<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> de treina-<br />

mento de mão-de-obra, desonerando as<br />

empresas de arcar com isso.<br />

Além de tudo, o govemo saqueia re-<br />

curs<strong>os</strong> do FAT através do Fundo de Es-<br />

tabilização Fiscal (FEF). Uma medida<br />

Provisória estabelece esta transferên-<br />

cia. Segundo Delúbio Soares Castro,<br />

representante da CUT no Conselho de<br />

Administração do FAT, "este ano o FEF<br />

vai levar R$ 1,6 bilhão da receita de<br />

cerca de R$ 6 bilhões, dinheiro que sai<br />

de um fundo que é do trabalhador e que<br />

não sabem<strong>os</strong> onde é gasto"(0 Estado<br />

deS. Paulo, 24/2).<br />

E o governo ainda diz que o fundo<br />

será deficitário porque há muit<strong>os</strong> saques<br />

do seguro-desemprego! G


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 10 Trabalhadores<br />

Alquimia - CNQ-CUT - Mar/Jun/96 - N 0 7<br />

<strong>Combate</strong> <strong>ao</strong> desemprego e seus dilemas<br />

Avanç<strong>os</strong> tecnológic<strong>os</strong> conduzem à "morte do trabalho"<br />

e ameaçam desagregar a classe trabalhadora, que apresenta<br />

O século 21 vai assistir, no mundo<br />

todo, <strong>ao</strong> agravamento de uma questão<br />

social expl<strong>os</strong>iva: o desemprego "tecnoló-<br />

gico", provocado por um aumaito da pro-<br />

dutividade a níveis jamais vist<strong>os</strong>, graças<br />

à incorporação cada vez mais intensa da<br />

automação, da microeletrônica, das tele-<br />

comunicações e toda sorte de nov<strong>os</strong><br />

materiais e métod<strong>os</strong> de produção. N<strong>os</strong><br />

países ric<strong>os</strong> e desenvolvid<strong>os</strong>, o processo<br />

de extinção do trabalho, que ameaça ar-<br />

rastar consigo a própria classe trabalha-<br />

dora, desagregando-a, já se instalou em<br />

profundidade, a ponto de o G-7 (EUA,<br />

Canadá, Japão, Alemanha, França, Itá-<br />

lia e Inglaterra) considerar a eliminação<br />

de p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> de trabalho "o mais grave pro-<br />

blema atual do Ocidente".<br />

Segundo estimativas do recém-encer-<br />

rado Fórum Econômico de Dav<strong>os</strong>, reali-<br />

zado na Suíça, hoje, cerca de 800 milhões<br />

de pessoas estão desempregadas ou<br />

subempregadas no mundo. E volta e meia<br />

anuncia-se a queima de mais p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> de<br />

trabalho, como recentemente fez a gigan-<br />

tesca empresa de telecomunicações<br />

AT&T, que pretende eliminar 40 mil va-<br />

gas. Os process<strong>os</strong> de fusão de megaem-<br />

presas e concentração oligopolista de<br />

mercad<strong>os</strong>, geralmente acompanhad<strong>os</strong> de<br />

salt<strong>os</strong> tecnológic<strong>os</strong>, aceleram o processo<br />

de eliminação de empreg<strong>os</strong>.<br />

O desemprego tecnológico é implacá-<br />

vel. Ele "desembarcou" no Brasil há al-<br />

guns an<strong>os</strong> e, deforma mais acentuada, a<br />

partir da década de 90, vem-se fazendo<br />

sentir em divers<strong>os</strong> setores da economia,<br />

especialmente nas montadoras de auto-<br />

móveis, na indústria de autopeças e no<br />

sistema bancário. "Esse fator, que em<br />

1983 compensava 26,9 cheques por fun-<br />

cionário, passou a 107,8 em 1993, ou<br />

seja, 300% de ganho de produtividade,<br />

obtid<strong>os</strong> pela introdução da automação,<br />

eliminando milhares de p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> de traba-<br />

lho", informa o engenheiro de produção<br />

Nilson Tadashi Oda, do Dieese.<br />

Reestruturação - Entre 1989 e<br />

1995, a indústria automobilística cortou<br />

30 mil p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> de trabalho, <strong>ao</strong> mesmo tem-<br />

po em que sua produção física saltou de<br />

suas alternativas<br />

1,2 milhão para 1,7 milhão de unidades<br />

por ano, e a produtividade por trabalha-<br />

dor passou de 9,5 veícul<strong>os</strong> para 15,7 ve-<br />

ícul<strong>os</strong> por ano "Este é, claramente, um<br />

desemprego tecnológico" afirma o enge-<br />

nheiro deprodução Luis Paulo Bresciani,<br />

do Dieese. A Volks Anchieta reduziu seu<br />

quadro de 46 mil <strong>trabalhadores</strong>, em 1980,<br />

para 24 mil, e a Mercedes-Benz de 18<br />

mil para 12 mil. "A única empresa que<br />

introduziu mudanças e aumaitou o níveol<br />

de emprego foi a Fiat", explica Bresciani.<br />

O setor de autopeças, por sua vez, cor-<br />

tou 70 mil empreg<strong>os</strong> desde 1989.<br />

No ramo quimico não é diferente. De<br />

1986 a 1W1, segundo dad<strong>os</strong> fornecid<strong>os</strong><br />

pela RA1S (Relatório Anual de Informa-<br />

ções Sociais) nas indústrias de papel e<br />

papelão houve uma queda de 19% no ní-<br />

vel de emprego. A redução de p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> de<br />

trabalho no setor plástico foi de 14%,<br />

borracha 11%, química 12%. No setor<br />

vidreiro a automação também é respon-<br />

sável pela redução de milhares de p<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />

de trabalho, como vem ocorrendo na<br />

Blindex, Santa Marina e outras.<br />

A eliminação de p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> de trabalho<br />

causada pel<strong>os</strong> avanç<strong>os</strong> tecnológic<strong>os</strong> é um<br />

fenômeno mundial, mas é preciso não<br />

mistificar esse fato, como o fazem o pre-<br />

sidente Fernando Henrique e seus defen-<br />

sores, com o intuiuto dejustificar a inér-<br />

cia governamental diante do desempre-<br />

go. Primeiro, porque o pais tem condi-<br />

ções excepcionais para enfrentar o pro-<br />

blema, diferentemente d<strong>os</strong> países euro-<br />

peus, por exemplo. Em segundo lugar, o<br />

alto nível de desemprego existente hoje<br />

no Brasil relaciona-se muito mais á polí-<br />

tica econômica do que à incorporação de<br />

novas tecnologias pelo conjunto da eco-<br />

nomia nacional.<br />

E praticamente imp<strong>os</strong>sível quantificar,<br />

na taxa de desemprego total, o percentual<br />

correspondente a razões estaiturais. "De-<br />

sagregar o desemprego em seus motiv<strong>os</strong><br />

deordem conjuntural (recessão, jur<strong>os</strong> ele-<br />

vad<strong>os</strong>) e estrutural (reestruturação pro-<br />

dutiva, terceirização espúria, liberação<br />

das importações), na economia de um<br />

país como o Brasil, requer o desenvolvi-<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

mento de nov<strong>os</strong> métod<strong>os</strong> e técnicas de<br />

análise e pesquisa, pois a heterogeneidade<br />

é muito grande. Aqui convivem trabalh<strong>os</strong><br />

artesanais (pré-tayloristas epré-fordistas)<br />

que constrastam com atividades<br />

automatizadas, infonnatizadas e com for-<br />

mas de organização mais contemporâne-<br />

as, além da instabilidade, recessão e<br />

reestruturação produtiva que caminham<br />

juntas <strong>ao</strong> longo d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 80/90", argu-<br />

menta Tadashi Oda. "Mas, em suma,<br />

pode-se dizer que, hoje, o trabalhador está<br />

sendo demitido pela recessão e, em ra-<br />

zão do aumento da produtividade, ele não<br />

encontrará mais emprego quando a eco-<br />

nomia voltar a crescer".<br />

Impacto - Como <strong>os</strong> demais países<br />

atrasad<strong>os</strong> ou em desenvolvimento, o Bra-<br />

sil tem grandes chances de absorver sua<br />

força de trabalho e retardar ou amenizar<br />

o impacto negativo do desemprego<br />

tecnológico. Parte da indústria ainda não<br />

chegou á "terceiro onda" da revolução in-<br />

dustrial. O déficit habitacional do país re-<br />

quer a constaição de milhões de moradias<br />

e a agricultura pode incorporar milhões<br />

de braç<strong>os</strong> por meio da reforma agrária.<br />

"A prioridade da Central Única d<strong>os</strong><br />

Trabalhadores no período 1994/97 é o<br />

emprego. Reestruturação produtiva com<br />

desenvolvimento social é o n<strong>os</strong>so lema",<br />

diz o metalúrgico Sebastião Lopes Neto,<br />

membro da executiva nacional da CUT.<br />

"Batem<strong>os</strong> de frente com a política do<br />

Estado mínimo e seu projeto excludente"<br />

Como exemplo da devastação provocada<br />

no pais pelo modelo econômico e social<br />

vigente n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong>, ele observa que<br />

83% d<strong>os</strong> jovens não conseguem concluir<br />

o segundo grau: "E um crime organizado<br />

contra a juventude. Tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> países que<br />

executaram políticas industriais consis-<br />

tentes investiram na educação".<br />

Nesse contexto, afirma Neto, a luta<br />

pela redução da jornada de trabalho as-<br />

sume um caráter fundamental, <strong>ao</strong> lado<br />

da exigência de políticas de desenvolvi-<br />

mento social, reforma agrária e criação<br />

ou ampliação de centr<strong>os</strong> públic<strong>os</strong> de for-<br />

mação profissional, incumbid<strong>os</strong> não ape-<br />

nas de formar <strong>os</strong> jovens, mas também de


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 11 Trabalhadores<br />

requalificar <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> empregad<strong>os</strong><br />

e qualificar <strong>os</strong> desempregad<strong>os</strong>.<br />

Renda básica - Como uma das for-<br />

mas de enfrentar o desemprego estrutu-<br />

ral, o escritor Wladimir Pomar também<br />

destaca que: "A bandeira da redução da<br />

jornada de trabalho passa a ter uma<br />

principalidade que estava esquecida,<br />

acoplada à exigência de que <strong>os</strong> salári<strong>os</strong><br />

não sejam reduzid<strong>os</strong>".<br />

Ele menciona, ainda, a luta pela re-<br />

forma agrária e pela retirada de restri-<br />

ções legais e fiscais às pequenas e<br />

microempresas. E inclui a exigência de<br />

uma renda básica para <strong>os</strong> desemprega-<br />

d<strong>os</strong>, sem limite de duração. "Esta renda<br />

deve garantir tanto o necessário para ali-<br />

mentação, vestuário, moradia e transpor-<br />

te, quanto o indispensável para ingressar<br />

em curs<strong>os</strong> de reciclagem profissional.<br />

Não se trata de uma renda mínima, mas<br />

de um valor que coloque <strong>os</strong> desemprega-<br />

d<strong>os</strong> num patamar digno para enfrentar a<br />

reeducação", diz Pomar, rejeitando o se-<br />

guro-desemprego existente n<strong>os</strong> moldes<br />

atuais.<br />

"Apesar das inúmeras afirmações de<br />

que a alternativa <strong>ao</strong> desemprego<br />

tecnológico deva ser a educação e for-<br />

Via Operária - Jornal da Op<strong>os</strong>ição Operária - 04/96<br />

mação, muito pouco tem sido feito nesse<br />

sentido pel<strong>os</strong> governantes. As altas ta-<br />

xas de rotatividade nas indústrias já de-<br />

monstraram, por si, que há pouca serie-<br />

dade e compromisso relativ<strong>os</strong> a tais in-<br />

formações", ressalta Tadashi Oda, do<br />

Dieese. "E, para <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> que<br />

engr<strong>os</strong>sam a massa de desempregad<strong>os</strong>,<br />

nenhuma ação concreta tem sido desen-<br />

volvida nesse sentido pel<strong>os</strong> empregado-<br />

res", acrescenta.<br />

O desafio representado pela morte do<br />

trabalho, deve ser enfrentado tanto na<br />

perspectiva da sobrevivência da classe<br />

trabalhadora, quanto na criação de alter-<br />

nativas que apontem para uma socieda-<br />

de mais avançada<br />

Trabalho - Pomar adverte que a<br />

substituição da mão-de-obra humana por<br />

máquinas e equipament<strong>os</strong> cada vez mais<br />

complex<strong>os</strong> c sofisticad<strong>os</strong> transforma o<br />

ideai de pleno emprego em algo<br />

irrealizavel, "uma quimera", e que as<br />

conseqüências sociais da morte do tra-<br />

balho podem desembocar em situações<br />

de conflito aberto, como já vem ocorren-<br />

do em regiões mais popul<strong>os</strong>as. "Neste<br />

cenário, o Estado, ou assume o papel de<br />

protetor do capital reprimindo e apres-<br />

sando a morte d<strong>os</strong> excluíd<strong>os</strong> do trabalho,<br />

ou se transforma no gestor de uma nova<br />

forma de organização social para garan-<br />

tir a sobrevivência d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong><br />

como seres human<strong>os</strong>, introduzindo me-<br />

canism<strong>os</strong> que transformem o lucro pri-<br />

vado em lucro social", observa.<br />

"A medida que quase toda a atividade<br />

produtiva direta, o intercâmbio e <strong>os</strong> ser-<br />

viç<strong>os</strong>, passem a ser realizad<strong>os</strong> por traba-<br />

lho morto (máquinas informatizadas), <strong>os</strong><br />

<strong>trabalhadores</strong> têm condições de se tomar<br />

cidadã<strong>os</strong> plen<strong>os</strong>".<br />

Emancipad<strong>os</strong> do trabalho e com ren-<br />

da básica, o tempo livre seria utilizado<br />

para conquistar conheciment<strong>os</strong> e "trans-<br />

formar o Estado numa administração<br />

pública operada por voluntári<strong>os</strong> em ro-<br />

dízio" . Essa hipótese, no aitanto, "só pode<br />

tomar-se realidade se for o resultado de<br />

uma persistente e massiva luta de classe<br />

d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> e setores excluíd<strong>os</strong> pelo<br />

capitalismo".<br />

O desafio representado pela morte do<br />

trabalho, raciocina o escritor, deve ser<br />

enfrentado tanto na perspectiva da sobre-<br />

vivência da classe trabalhadora, quanto<br />

na criação de alternativas que apontem<br />

para uma sociedade mais avançada. Li<br />

Contra o desemprego, a exploração<br />

e o pacto social!<br />

Tem<strong>os</strong> chamado a atenção em n<strong>os</strong>-<br />

s<strong>os</strong> boletins para o fenômeno da crise<br />

econômica que a sociedade capitalista<br />

está passando.<br />

Hoje em dia, até mesmo a midia tem<br />

chamado atenção sobre esse fato. Porém,<br />

com o objetivo claro de confundir e<br />

desmobilizar as lutas d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>.<br />

E o que é pior, com ajuda daqueles que<br />

se dizem representantes da n<strong>os</strong>sa classe<br />

(SINDICATOS, CUT, PT, FORCA SIN-<br />

DICAL, etc )<br />

O capitalismo no Brasil e no mundo<br />

atingiu um grau de produção de merca-<br />

dorias tão elevado que se contradiz com<br />

a falta de mercad<strong>os</strong> para consumo des-<br />

ses mesm<strong>os</strong> produt<strong>os</strong>. E isto que chama<br />

de crise de superprodução.<br />

Diante desse quadro, o capitalista (pa-<br />

trão) procura desesperadamente encon-<br />

trar saldas para manter seus LUCROS<br />

em patamares superiores, sempre visan-<br />

do baratear <strong>os</strong> cust<strong>os</strong> da produção das<br />

mercadorias c serviç<strong>os</strong>.<br />

As medidas tomadas vão sempre con-<br />

tra <strong>os</strong> interesses d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>: im-<br />

plantação de tecnologia de ponta, substi-<br />

tuindo <strong>os</strong> operári<strong>os</strong>, pois assim, garante<br />

um aumento na produção com número<br />

reduzido de força de trabalho; impõem<br />

novas formas de organização da produ-<br />

ção ("qualidade total", ISO 9000,<br />

toyotismo, etc.) para intensificar a pro-<br />

dutividade; e por fim, o arrocho salarial,<br />

método utilizado para elevar a explora-<br />

ção, através do rebaixamento do tão min-<br />

guado salário.<br />

Mas, tudo isso não resolve a contra-<br />

dição da superprodução, muito pelo con-<br />

trário, aprofunda mais ainda a cnse, pois,<br />

diminui o consumo com o desemprego.<br />

Como se diz na anedota: "Se correr o bi-<br />

cho pega, se ficar o bicho come!". A so-<br />

ciedade capitalista não consegue resol-<br />

'SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

ver seus problemas e aprofunda a misé-<br />

ria da classe que "vive" do trabalho.<br />

O desenvolvimento<br />

tecnológico a serviço da<br />

burguesia<br />

Estes expedientes acima, usad<strong>os</strong> na<br />

tentativa vã de salvar a economia capita-<br />

lista, expõem as feridas desse doente em<br />

estágio terminal.<br />

O número de desempregad<strong>os</strong> e<br />

subempregad<strong>os</strong> no mundojá passa de 800<br />

milhões. Paises como o Japão, terceira<br />

economia do planeta, onde mais se in-<br />

vestiu n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> 30 an<strong>os</strong> em tecnologia<br />

avançada, a taxa de desemprego chegou<br />

a 3,2% em 95. Isto eqüivale a mais de 3<br />

milhões de pessoas. N<strong>os</strong> principais paí-<br />

ses da Europa e que formam a União<br />

Européia a taxa média, chega a 13,4%:<br />

Espanha: 22,7%<br />

Alemanha: 10,8%


;::::::::;:::;:;:;:;;;;;;:;■:■;:■:■:■;■;■:■:;<br />

Quinzena N 0 228 - 30/04/96 12 Trabalhadores<br />

Inglaterra: 8,3%<br />

França: 11,7%<br />

Essa substituição de homens por má-<br />

quinas, feita pela burguesia, trás mais um<br />

agravante: o desemprego estaitural. Quer<br />

dizer que, de um lado a economia cresce,<br />

e de outro o desemprego também. Só n<strong>os</strong><br />

Estad<strong>os</strong> Unid<strong>os</strong> entre <strong>os</strong> an<strong>os</strong> 70 e 92, a<br />

economia cresceu 76%, por outro lado o<br />

emprego não passou da taxa de 45%. Na<br />

Europa, nesse mesmo período, o indice<br />

de crescimento chegou a 73%, enquanto<br />

que <strong>os</strong> nov<strong>os</strong> p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> de trabalho, ficaram<br />

em apenas 7%, No Brasil, o problema<br />

não é diferente. Na grande São Paulo,<br />

região mais industrializada do país, a taxa<br />

está na casa d<strong>os</strong> 13,2%. Isto em um pais<br />

que lança no mercado de trabalho 1,6<br />

milhão de pessoas a cada ano.<br />

"Qualidade total"<br />

mata <strong>trabalhadores</strong><br />

Só por esses element<strong>os</strong> acima, já terí-<br />

am<strong>os</strong> muita razão para lutar contra <strong>os</strong><br />

interesses d<strong>os</strong> patrões. Mas, como eles<br />

querem sugar até a última gota de san-<br />

gue do trabalhador, implantaram a "qua-<br />

lidade total", o toyotismo, etc, como for-<br />

ma de intensificar o ritmo da produção e<br />

aumentar a produtividade.<br />

Estes métod<strong>os</strong> que segundo <strong>os</strong> capita-<br />

listas "melhora a qualidade de vida do tra-<br />

balhador" tem provocado doenças como<br />

a LER (lesões por esforço repetitivo), a<br />

KAROCH (morte súbita) e muitas outras<br />

doenças ocupacionais, além de aumentar<br />

o nível do Stress e do suicídio.<br />

O Plano Real e seu<br />

objetivo: arrocho salarial<br />

Um terceiro expediente muito comum<br />

e que aigorda <strong>os</strong> bols<strong>os</strong> d<strong>os</strong> burgueses, é<br />

o arrocho salarial. O Estado capitalista,<br />

por meio de qualquer governo, lança pla-<br />

n<strong>os</strong> emais plan<strong>os</strong> com o objetivo de aper-<br />

tar mais ainda a corda no pescoço do tra-<br />

balhador. Isto aconteceu com o Caizado<br />

de Samey, o Plano Collor, e como não<br />

poderia deixar de ser, com o Plano Real.<br />

Apesar da propaganda que toda a<br />

imprensa burguesa vem fazendo, o pla-<br />

no deu <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> pass<strong>os</strong> d<strong>os</strong> anteriores.<br />

Primeiro, em março de 94, nivelou o sa-<br />

lário pela média d<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> quatro me-<br />

ses, enquanto que <strong>os</strong> preç<strong>os</strong> subiram li-<br />

vremente e continuaram subindo no pe-<br />

ríodo da URV e do Real. Para piorar mais<br />

ainda as coisas do lado do trabalhador, o<br />

segundo passo foi dado em julho de 95,<br />

o governo acabou com a indexação, trans-<br />

ferindo para <strong>os</strong> patrões, parte do salário<br />

através da inflação não repassada.<br />

Como se não bastasse tudo isso, a<br />

burguesia procura impulsionar o arrocho,<br />

através da redução d<strong>os</strong> "encarg<strong>os</strong> traba-<br />

lhistas". Na verdade, diferente do que<br />

pensa e defende o presidente do Sindica-<br />

to d<strong>os</strong> Metalúrgic<strong>os</strong> e d<strong>os</strong> dirigentes da<br />

Força Sindical, o 13°, o descanso sema-<br />

nal, <strong>os</strong> feriad<strong>os</strong> pag<strong>os</strong>, etc, fazem parte<br />

do salário do trabalhador, que no Brasil<br />

tem a hora média mais baixa do mundo<br />

(US$ 2,9 horas) perdendo apenas para a<br />

China. Além do mais, a redução não au-<br />

menta o número de empreg<strong>os</strong>. Basta ver<br />

o exemplo da França de Jacques Chírac<br />

que implantou essa prop<strong>os</strong>ta e não hou-<br />

ve nenhum acréscimo na taxa de empre-<br />

go, ou se preferir, o exemplo da Inglater-<br />

ra, que na época da Margareth Tatcher,<br />

a taxa de desemprego era de 2% e depois<br />

da diminuição d<strong>os</strong> "aicarg<strong>os</strong>" o indice do<br />

desemprego pulou para 8,3%.<br />

A reforma do Estado<br />

Dando continuidade <strong>ao</strong> rebaixamen-<br />

to das condições de vida d<strong>os</strong> trabalhado-<br />

res, o governo FHC vem construindo a<br />

tão anunciada "reforma do Estado". E<br />

tod<strong>os</strong>, sem excessão, do governo à mídia,<br />

passando pel<strong>os</strong> parlamentares e empre-<br />

sári<strong>os</strong>, esforçam-se por vender a idéia de<br />

demitir funcionári<strong>os</strong> públic<strong>os</strong> federais,<br />

estaduais e municipais, como meio de<br />

reduzir o déficit.<br />

Mas é bom lembrar que o rombo hoje<br />

existente não foi feito com a folha de pa-<br />

gamento de funcionário, e sim, através<br />

da montagem da infraestrutura necessá-<br />

ria <strong>ao</strong> desaivolvimento do capitalismo no<br />

país, como o parque siderúrgico,<br />

petroquímico, hidreeiétncas, estradas,<br />

Petrobrás, Vale do Rio Doce entre outras<br />

que já estão sendo transferidas para a<br />

iniciativa privada, com argumento de que<br />

o Estado é um péssimo patrão.<br />

O que realmente está em jogo, na ver-<br />

dade, é a capacidade do Estado recom-<br />

por suas finanças. A venda dessas esta-<br />

tais (exploradoras como um patrão pri-<br />

vado), diga-se de passagem a preç<strong>os</strong> ir-<br />

risóri<strong>os</strong>, foi a fórmula encontrada para<br />

diminuir a dívida do Estado, e <strong>ao</strong> mesmo<br />

tempo, promover "doações" a<strong>os</strong> grandes<br />

gaip<strong>os</strong>, como é o caso do PROER (Pro-<br />

grama de Estímulo à Reestruturação Fi-<br />

nanceira Nacional), que somaite n<strong>os</strong> ban-<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO! 1<br />

c<strong>os</strong> Econômico e Nacional já injetou mais<br />

de 16 bilhões de reais, sem falar no pro-<br />

jeto Sivam (5 bilhões) e muit<strong>os</strong> outr<strong>os</strong>.<br />

E ainda vem o governo fazer a "Re-<br />

forma da Previdência" e a "Reforma Ad-<br />

ministrativa" com discurso de contenção<br />

do déficit para investir na área social e<br />

no aumento do emprego. Isto na verdade<br />

é mais uma grande farsa que tem a cola-<br />

boração do "senhor" Vicentinho e de ou-<br />

tr<strong>os</strong> líderes, que iguais a ele, procuram<br />

ajudar a burguesia controlando <strong>os</strong> traba-<br />

lhadores através de mentiras e do PAC-<br />

TO SOCIAL.<br />

Como colocar o<br />

desenvolvimento tecnológico<br />

à serviço do trabalhador<br />

O que tem que ficar claro para nós<br />

<strong>trabalhadores</strong>, é que toda a Reforma do<br />

Estado objetiva restabelecer as condições<br />

de continuidade do sistema de explora-<br />

ção. Daí, o governo convidar a CUT, a<br />

Força Sindical e Sindicat<strong>os</strong>, para cola-<br />

borarem nesta ação, passando a imagem<br />

de que tudo isto é para defender um inte-<br />

resse comum. Uma grande mentira que<br />

não podem<strong>os</strong> aceitar. Onde já se viu, tra-<br />

balhador ficar contente com aumento de<br />

demissões e o roubo de suas conquistas?!?<br />

A Central Única d<strong>os</strong> Trabalhadores<br />

está apoiando tudo isto, apesar do jogo<br />

de cena para disfarçar o entreguismo,<br />

porque já não representa <strong>os</strong> INTERES-<br />

SES d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>, porque fez um<br />

pacto social com a burguesia e rompeu<br />

na prática com a classe labori<strong>os</strong>a.<br />

Pois bem companheir<strong>os</strong>, n<strong>os</strong>sa luta<br />

neste momento passa a ser por uma de<br />

suas bandeiras mais importantes desde o<br />

inicio da história da classe operária: a<br />

bandeira da redução da jornada de tra-<br />

balho sem redução de salário. Não uma<br />

redução qualquer, como citam timida-<br />

mente alguns, mas de fato, uma redução<br />

que garanta o emprego atual, como tam-<br />

bém abra espaç<strong>os</strong> para que nov<strong>os</strong> traba-<br />

lhadores sejam incorporad<strong>os</strong> com a<br />

conseqüente diminuição n<strong>os</strong> níveis de<br />

exploração.<br />

Esta luta, porém, não pode ser feita<br />

pel<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> isolad<strong>os</strong>, enquanto<br />

"categonas". Não podem<strong>os</strong> partir para ela<br />

enquanto metalúrgic<strong>os</strong>, ou bancári<strong>os</strong>, ou<br />

químic<strong>os</strong>, ou petroleir<strong>os</strong>. Esta luta é do<br />

conjunto d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>, é uma luta<br />

de classe e da classe exige uma ação<br />

unitária, coesa.


SWÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍÍ:<br />

Quinzena N 0 228 - 30/04/96 13 Trabalhadores<br />

Precisam<strong>os</strong> dar um basta a todas as<br />

prop<strong>os</strong>tas divisionistas que buscam frag-<br />

mentar o movimento, enfraquecendo-o e,<br />

com isso facilitando a vida d<strong>os</strong> explora-<br />

dores e do seu Estado.<br />

Para unificar toda a classe trabalha-<br />

dora hoje, tem<strong>os</strong> que criar novas formas<br />

de ORGANIZAÇÃO, que rompa com<br />

essas atuais (sindicat<strong>os</strong> e centrais), liga<br />

das a ordem capitalista. Tem<strong>os</strong> que res-<br />

suscitar a independência da n<strong>os</strong>sa clas-<br />

se, tem<strong>os</strong> que romper com a estrutura<br />

pesada que são <strong>os</strong> sindicat<strong>os</strong>.<br />

Unificar a luta, entender como se dá a<br />

exploração do trabalho, aponta para a<br />

necessidade de começarm<strong>os</strong> agora a cons-<br />

trução de uma sociedade onde <strong>os</strong> traba-<br />

lhadores sejam de fato produtores e <strong>ao</strong><br />

mesmo tempo don<strong>os</strong> de tudo aquilo que<br />

produzem. E esta sociedade é conhecida<br />

como socialista. □<br />

Os companheir<strong>os</strong> que concordam com<br />

n<strong>os</strong>sas idéias e querem discutir con<strong>os</strong>co,<br />

pode entrar em contato pelo:<br />

Telefone: 895-6587 e Caixa P<strong>os</strong>tal:<br />

69043-0 / Parque Eduardo - Ermelino<br />

Matarazzo.<br />

Jornal do DIAP - Fev/Mar/96 - N 9 112<br />

Trabalhadores iniciam campanha pela<br />

recuperação do salário mínimo<br />

Já está nas ruas a campanha nacional<br />

de coleta de assinaturas para a "Emen-<br />

da Popular pela Recuperação do Salário<br />

Minimo". A prop<strong>os</strong>ta, elaborada pelas<br />

centrais sindicais com apoio técnico do<br />

Dieese, prevê a recuperação semestral até<br />

atingir o patamar de R$ 579,00. O obje-<br />

tivo é recolher 900 mil assinaturas para<br />

a emenda, que será entregue no Congres-<br />

so Nacional numa grande marcha a<br />

Brasília em I o de Maio, Dia Internacio-<br />

nal do Trabalhador. De imediato, a cam-<br />

panha estará voltada para o reajuste do<br />

mínimo para R$ 180,00 a partir de maio,<br />

como propõe o projeto de lei do deputa-<br />

do Paulo Paim (PT-RS).<br />

Jornal do DIAP - Mar/Abr/96 - N» 113<br />

A emenda tem o objetivo de recupe-<br />

rar a dignidade do trabalhador, assegu-<br />

rando a ele e á sua família a satisfação<br />

das necessidades vitais básicas como<br />

moradia, alimentação, educação, saúde,<br />

lazer, vestuário, higiene, transporte e pre-<br />

vidência, n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> do inciso FV do ar-<br />

tigo T da Constituição. A recuperação<br />

passaria pelo aumento real do salário n<strong>os</strong><br />

meses de maio e novembro de cada ano,<br />

com base na variação acumulada do Pro-<br />

duto Interno Bruto (PEB) verificada no<br />

ano anterior, se p<strong>os</strong>itiva. A aplicação se<br />

estende a<strong>os</strong> beneficies assistenciais e <strong>os</strong><br />

mantid<strong>os</strong> pela Previdência Social.<br />

Segundo justificativa do projeto de lei<br />

de iniciativa popular, a recomp<strong>os</strong>ição se<br />

baseia no cálculo da cesta básica cor-<br />

respondente a uma família comp<strong>os</strong>ta por<br />

dois adult<strong>os</strong> e duas crianças, realizado<br />

pelo Dieese. "O aumento gradual pro-<br />

p<strong>os</strong>to visa assegurar a recuperação do<br />

mínimo de forma planejada para que<br />

p<strong>os</strong>sa ser absorvida pela economia, as-<br />

segurando-se o controle inflacionário e<br />

a manutenção do poder de compra. Além<br />

de assegurar um mecanismo de<br />

distribuiçãode renda, p<strong>os</strong>sibilita o cres-<br />

cimento do mercado interno e a econo-<br />

mia nacional, por conseguinte, a manu-<br />

tenção e ampliação d<strong>os</strong> p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> de traba-<br />

lho", explica o abaixo-assinado. O<br />

Mínimo terá reajuste abaixo da inflação<br />

Os ministr<strong>os</strong> da Fazenda, Pedro<br />

Malan, e do Planejamento, J<strong>os</strong>é Serra,<br />

já deram o veredicto: o governo não pode<br />

conceber nenhum reajuste <strong>ao</strong> salário mí-<br />

nimo em maio. No máximo, poderá ha-<br />

ver um repasse, mesmo assim, com índi-<br />

ce abaixo da inflação acumulada no pe-<br />

ríodo de maio de 1995 a abril deste ano,<br />

que deve ficar em tomo de 20%. O mes-<br />

mo aumento será concedido às ap<strong>os</strong>en-<br />

tadorias e pensões. E isso se houver von-<br />

tade política do presidente Fernando<br />

Henrique, que deverá enviar medida pro-<br />

visória <strong>ao</strong> Congresso.<br />

A maior preocupação é com <strong>os</strong> efei-<br />

t<strong>os</strong> do aumento nas despesas da Previ-<br />

dência, pois d<strong>os</strong> 15,7 milhões de ap<strong>os</strong>en-<br />

tad<strong>os</strong> e pensionistas do país, 10,8 milhões<br />

recebem o salário mínimo. Segundo cál-<br />

cul<strong>os</strong> da equipe econômica, o repasse da<br />

inflação vai aumentar em R$ 500 milhões<br />

as despesas do Instituto Nacional da<br />

Seguridade Social (ENSS) e isso vai agra-<br />

var ainda mais o déficit do setor Outra<br />

prop<strong>os</strong>ta é conceder somente o repasse do<br />

Índice de Preç<strong>os</strong> <strong>ao</strong> Consumidor - real (IPCr)<br />

acumulado em maio e junho de 1995 - o ín-<br />

dice foi extinto em 1° de julho - de 4,44%.<br />

O governo usa o atgumento de que a<br />

Constituição só exige reajuste periódico que<br />

preserve o poder aquisitivo, sem fixar uma<br />

data-base, para o caso de não reajustar o<br />

salário. "A p<strong>os</strong>tura do govemo é irregular,<br />

arbitrária eprepotente. Alei manda dar, no<br />

mínimo, a inflação d<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> 12 meses",<br />

criticou o deputado Paulo Paim (PT-RS).<br />

Segundo ele, a p<strong>os</strong>ição govemistas só será<br />

revertida se houver uma mobilização po-<br />

pular, com o que concorda o deputado<br />

Miguel R<strong>os</strong>seto (PT-RS), um d<strong>os</strong> coorde-<br />

nadores da campanha pela Emenda Popu-<br />

lar para recuperação do mínimo.<br />

"E inaceitável que não tenha reajuste.<br />

Se faz necessário não só a recuperação<br />

de toda a inflação como a adoção de uma<br />

política de recomp<strong>os</strong>ição, com elevação<br />

ral do valor do mínimo", disse R<strong>os</strong>seto.<br />

A Emenda Popular propõe que, em<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO! 1<br />

quatro an<strong>os</strong>, o mínimo atinja o valor de<br />

R.$ 579,00, definido pelo Dieese como ne-<br />

cessário para o sustento de uma família<br />

comp<strong>os</strong>ta por dois adult<strong>os</strong> e duas crian-<br />

ças. A recuperação passaria por reajustes<br />

semestrais, n<strong>os</strong> meses de maio e novem-<br />

bro de cada ano, com base na variação<br />

acumulada do Produto Interno Bruto (PIB)<br />

verificada no ano anterior, se p<strong>os</strong>itiva.<br />

O projeto do deputado, que estabele-<br />

ce o aumento do mínimo para R$ 180,00,<br />

está engavetado na Comissão de Traba-<br />

lho. E o novo presidente, deputado Nel-<br />

son Otoch (PSDB-CE), reza na cartilha<br />

do govemo, no sentido de que é mais<br />

importante é manter a estabilidade d<strong>os</strong><br />

preç<strong>os</strong> do que reajustar salári<strong>os</strong>. Outro<br />

projeto em tramitação é o do deputado<br />

Welson Gasparine (PSDB-SP), que pre-<br />

vê reajuste trimestral, de acordo com a<br />

inflação do período, além de um aumen-<br />

to real de 5% para cada reajuste. "O sa-<br />

lário de R$ 100,00 é a vergonha nacio-<br />

nai^avalaga^arre. O


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 14 Trabalhadores<br />

Jornal do PSTU -12/04 a 26/04/96 - N» 82<br />

Venceu em Campinas o sindicalismo<br />

classista, de luta e democrático<br />

JPSTU - Por que a Articulação lan-<br />

çou uma chapa própria na eleição d<strong>os</strong><br />

metalúrgic<strong>os</strong> de Campinas?<br />

G ecaüo - A Articulação não quer<br />

conviver com as diferenças, com a demo-<br />

cracia, querem um sindicato onde só eles<br />

taiham controle. Eles sempre foram fra-<br />

c<strong>os</strong> aqui, mas desta vez se prepararam para<br />

a disputa desde o ano passado com bole-<br />

tins na categoria para lançar sua própria<br />

chapa 1 que na prática era para dividir a<br />

CUT. Eles sinalizaram que sequer iriam<br />

participar da convenção cutista. Na con-<br />

venção cutista que definiu a Chapa 1 es-<br />

tavam presentes 654 metalúrgic<strong>os</strong>. Na reu-<br />

nião da Articulação realizada na mesma<br />

hora foram 30 da categoria.<br />

JPSTU - £ como foi a disputa com<br />

a chapa da Articulação? Como eles se<br />

comportaram?<br />

Geraldo - A campanha da Chapa 2<br />

teve dois cortes que foram importantes.<br />

O primeiro é que eles ap<strong>os</strong>taram tudo na<br />

vinda de figurões de fora. O Vicentinho<br />

chegou aqui às vésperas das eleições, di-<br />

zendo que haveria fraude. Fom<strong>os</strong> obri-<br />

gad<strong>os</strong> a entrar com uma interpelação ju-<br />

dicial para que Vicentinho provasse as<br />

suas acusações e calúnias contra o pro-<br />

cesso eleitoral do Sindicato, o que ele não<br />

tratou de fazer, até porque, entre outras<br />

coisas, a comissão eleitoral foi tirada<br />

numa assembléia massiva.<br />

O outro corte nestas eleições foi o dis-<br />

curso da Articulação em relação <strong>ao</strong> em-<br />

prego. Ela dizia que o desemprego era<br />

culpa do sindicato e d<strong>os</strong> própri<strong>os</strong> traba-<br />

lhadores que não sabiam discutir e nego-<br />

ciar as demissões. Nunca a chapa deles<br />

culpou o governo e <strong>os</strong> patrões.<br />

JPSTU - O que na sua opinião esta-<br />

va em disputa nestas eleições?<br />

Geraldo - Os metalúrgic<strong>os</strong> de Cam-<br />

pinas m<strong>os</strong>traram que é p<strong>os</strong>sível fazer um<br />

sindicalismo classista, que não é preciso<br />

fazer a flexibilização da jornada de tra-<br />

balho para "combater o desemprego". Há<br />

outro caminho, que é o modelo de sindi-<br />

calismo de luta, democrático, que busca<br />

se articular com <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> do cam-<br />

po, com o movimento popular, com <strong>os</strong><br />

Entrevista - Geraldo Mendes de Melo<br />

estudantes, <strong>os</strong> camelôs e as donas de casa<br />

para lutar e defender <strong>os</strong> direit<strong>os</strong> e inte-<br />

resses d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>. Enfim, um sin-<br />

dicalismo que organiza a resistência d<strong>os</strong><br />

<strong>trabalhadores</strong>. Isto é o que venceu aqui<br />

n<strong>os</strong> metalúrgic<strong>os</strong> de Campinas.<br />

JPSTU - Houve o debate sobre o<br />

problema do emprego nestas eleições.<br />

Como vocês responderam às acusações<br />

da Articulação? O que vocês propõem<br />

para combater o desemprego?<br />

Geraldo - Para resolver o problema<br />

do desemprego, nós acham<strong>os</strong> que em pri-<br />

meiro lugar tem<strong>os</strong> que lutar pela redução<br />

da jornada sem redução do salário e sem<br />

flexibilização. Por exemplo, se a jornada<br />

é de 44 horas e é reduzida para 40, novas<br />

pessoas serão contratadas pra manter a<br />

produção. Qual é o problema da flexibili-<br />

zação que a Articulação está negocian-<br />

do? Ela resolve única e exclusivamente o<br />

problema da produção Tem produção,<br />

você trabalha 54 horas; não tem, você<br />

trabalha 36 horas e ainda pode ficar de-<br />

vendo horas. Isto só interessa <strong>ao</strong> patrão.<br />

Nós não querem<strong>os</strong> apenas manter o nível<br />

de emprego, nós querem<strong>os</strong> lutar para ge-<br />

rar nov<strong>os</strong> empreg<strong>os</strong>.<br />

Outro ponto é como investir. Tem que<br />

existir investimento na produção e não<br />

na especulação. E investir na produção<br />

não significa tirar direit<strong>os</strong>, como esta<br />

prop<strong>os</strong>ta absurda que estão discutindo de<br />

flexibilização d<strong>os</strong> encarg<strong>os</strong> e regras para<br />

contratar <strong>trabalhadores</strong>. Na verdade só<br />

serve para facilitar as demissões, porque<br />

vai diminuir <strong>os</strong> cust<strong>os</strong> nas demissões. Nós<br />

acham<strong>os</strong> também que a reforma agrária,<br />

a fixação do homem no campo, é uma<br />

política fundamental para combater o<br />

desemprego.<br />

JPSTU - Que balanço você faz da<br />

política de negociações que a direção<br />

majoritária da CUT está adotando?<br />

Geraldo - O debate em tomo de que<br />

tipo de sindicato precisam<strong>os</strong> fica muito<br />

claro no problema das negociações. Por<br />

exemplo, quando o Sindicato d<strong>os</strong> Meta-<br />

lúrgic<strong>os</strong> do ABC lançou o movimento<br />

Brasil Cai na Real no ano passado, o<br />

grande discurso da Articulação era de que<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

o problema do desemprego era sério e que<br />

então tinha que jimtar patrão e emprega-<br />

do no mesmo palanque. Aqui em Campi-<br />

nas nós fizem<strong>os</strong> um ato com mais de 3<br />

mil <strong>trabalhadores</strong> e não botam<strong>os</strong> patrão<br />

no palanque. Em São Bernardo botaram<br />

e no dia seguinte daquele ato a Cofap<br />

demitiu um monte.<br />

Claro que o Sindicato negocia. Mas<br />

nós não negociam<strong>os</strong> de portas fechadas<br />

e sem preparar a resistência d<strong>os</strong> traba-<br />

lhadores. E, mais importante, o Sindica-<br />

to tem que negociar a partir de uma pau-<br />

ta discutida pel<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> e não a<br />

pauta do governo ou d<strong>os</strong> patrões. O<br />

Vicentinho pega a pauta do governo e<br />

negocia a partir dela e depois diz: "Tá<br />

vendo, eles iam tirar tudo, agora vão<br />

tirar men<strong>os</strong> ".<br />

O caminho de negociar a partir d<strong>os</strong><br />

n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> e interesses significa pre-<br />

parar a resistâicia. O exemplo melhor<br />

nesse sentido é o d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> fran-<br />

ceses. Eles impuseram a negociação a<br />

partir da sua luta e negociaram aquilo<br />

que era do seu interesse e não o que o<br />

governo queria. Querem<strong>os</strong> criar direit<strong>os</strong><br />

enão tirar direit<strong>os</strong>.<br />

JPSTU - O que você acha que deve<br />

ser feito na CUT para mudar a atual<br />

política da Central?<br />

Geraldo - A esquerda da CUT deve<br />

formular políticas claras em relação a<strong>os</strong><br />

aim<strong>os</strong> da central. Isto significa, além da<br />

questão da democracia no interior da CUT,<br />

defender a perspectiva de combater o pro-<br />

jeto neoliberal, lutar por um sindicato e<br />

uma central que não entrega direit<strong>os</strong>, que<br />

combate o desemprego a partir de uma<br />

ótica do trabalhador e não do patrão. Te-<br />

m<strong>os</strong> que batalhar pela unidade da cidade<br />

e do campo, que hoje é mais do que ur-<br />

gente; batalhar por um sindicato que re-<br />

presente tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> da sua<br />

base e também <strong>os</strong> desempregad<strong>os</strong>, e não<br />

apenas <strong>os</strong> filiad<strong>os</strong>. A esquerda da CUT<br />

precisa apresentar políticas no sentido de<br />

defaider a independência de classe, a<br />

perspectiva do socialismo, da democra-<br />

cia da CUT e da organização da resis-<br />

tência contra o governo e <strong>os</strong> patrões. G


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 15 Trabalhadores<br />

Jornal do PSTU -12/04 a 26/04/96 - N 0 82<br />

Chapa d<strong>os</strong> metalúrgic<strong>os</strong><br />

do ABC exclui descontentes<br />

Rolo compressor de São Bernardo se impôs nas convenções<br />

Com a presença de aproximadamente<br />

2.500 metalúrgic<strong>os</strong> foi realizada em São<br />

Bernardo, no último dia 31 de março, a<br />

convenção geral da categoria que definiu<br />

a chapa da CUT para as eleições do Sin-<br />

dicato s<strong>os</strong> Metalúrgic<strong>os</strong> do ABC, que<br />

ocorrerão em maio próximo. O grupo de<br />

15 diretores do Sindicato da região de<br />

Santo André, liderad<strong>os</strong> por Cicero<br />

Firmino, o Martinha, não compareceu à<br />

convenção e consolidou assim a divisão<br />

na atual diretoria do Sindicato.<br />

Dois dias antes da convenção final,<br />

uma assembléia realizada em Santo<br />

André, convocada pelo setor de São<br />

Bernardo para definir se o sindicato ia<br />

continuar unido ou se Santo André iria<br />

separar-se, terminou em tumulto e pan-<br />

cadaria. A assembléia, que contou com<br />

mais de mil <strong>trabalhadores</strong>, votou por<br />

ampla maioria manter a unificação, como<br />

defendia o núcleo central da diretoria de<br />

São Bernardo. Acontece que essa assem-<br />

bléia foi convocada à revelia d<strong>os</strong> direto-<br />

res de Santo André, que já tinham con-<br />

A convenção final expressou a insa-<br />

tisfação de um expressivo setor de meta-<br />

lúrgic<strong>os</strong> de Diadema e um importante<br />

grupo da Volks com o processo de defi-<br />

nição da chapa do Sindicato.<br />

A apresentação e votação d<strong>os</strong><br />

indicat<strong>os</strong> na convenção era nome a nome.<br />

Primeiro foi votado o cabeça da chapa.<br />

Luis Marinho, o atual vice-presidente do<br />

Sindicato, Vicentinho, que conduziu o<br />

evento, leu tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> outr<strong>os</strong> 63 nomes que<br />

entraram na diretoria. Se alguém quises-<br />

se propor a substituição de um deles pe-<br />

dia um destaque, propunha um novo<br />

nome e em seguida era feita uma defesa<br />

para cada nome em votação.<br />

Cinco nomes foram prop<strong>os</strong>t<strong>os</strong> contra<br />

<strong>os</strong> que foram indicad<strong>os</strong> pela diretona. Os<br />

mais importantes eram Zacarias,<br />

metalúrgico da empresa Krones de<br />

Diadema, Xepa e Nanz, da Volks. O prin-<br />

cipal embate se deu logo no primeiro<br />

nome, entre Aleto de Souza, indicado pela<br />

Fertiandii Silva<br />

vocado uma assembléia na região para o<br />

dia 31 de março.<br />

A diretoria do Sindicato d<strong>os</strong> Metalúr-<br />

gic<strong>os</strong> do ABC conseguiu duas liminares<br />

que tomaram nula a assembléia de Santo<br />

André para refundar o Sindicato da re-<br />

gião. Porém, esta briga não está encerra-<br />

da, por o setor liderado por Maitinha<br />

pretende refundar o Sindicato.<br />

Consultar a base<br />

Pel<strong>os</strong> men<strong>os</strong> até agora, acabou preva-<br />

lecendo o rolo compressor de São Bernardo<br />

e o seu desprezo pel<strong>os</strong> setores da própna<br />

base que não paisam igual á direção. Por<br />

trás de um processo aparaitemente demo-<br />

crático, o núcelo de São Bernardo impôs<br />

sua vontade sobre a maiona d<strong>os</strong> diretores<br />

de Santo André utilizando-se da maiona<br />

que de fato tem nas outras regiões (a as-<br />

sembléia de Santo André, onde foi referai-<br />

dada a unificação não era comp<strong>os</strong>ta só por<br />

<strong>trabalhadores</strong> dessa região).<br />

Vale lembrar que a decisão de São<br />

Bernardo de renovar um terço d<strong>os</strong> dire-<br />

tores, mudar a comp<strong>os</strong>ição numérica da<br />

Diretoria do Sindicato sofre desgaste<br />

diretona do Sindicato e Zacanas que con-<br />

tava com o apoio de um expressivo setor<br />

de metalúrgic<strong>os</strong> na convenção. A direto-<br />

ria do Sindicato, exerceu muita pressão<br />

para que Zacarias, retirasse a sua candi-<br />

datura que, no final, ela não agüentou o<br />

cerco e acabou retirando o seu nome.<br />

O mesmo acabaram fazendo <strong>os</strong> dois<br />

da Volks logo em seguida.<br />

Embora bastante representativo (as<br />

convenções prévias reuniram mais de<br />

4.500 <strong>trabalhadores</strong>), o processo de de-<br />

finição da chapa m<strong>os</strong>trou que o núcleo<br />

de São Bernardo não consegue compor a<br />

diretoria do Sindicato com tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> seto-<br />

res que têm expressão na categoria. Com<br />

isso, as vozes discordantes e desconten-<br />

tes acabam sendo marginalizadas da di-<br />

reção da entidade.<br />

Todo o processo não foi organizado<br />

com nomes de candidat<strong>os</strong> que expressas-<br />

sem plataformas, chapas e idéias claras.<br />

Pelo contrário, foi concentrado na dispu-<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

diretoria por região, aliada à falta de<br />

proporcionalidade nas convenções de<br />

base e à insatisfação de setores da cate-<br />

goria com o burocratismo do núcleo cen-<br />

tral, detonaram esta ruptura e <strong>os</strong> tumul-<br />

t<strong>os</strong> em algumas convenções de base.<br />

Mas não se pode ignorar que o setor<br />

de Maitinha nunca questionou o critério<br />

de eleição nas convenções de base (onde<br />

não havia proporcionalidade), e no final<br />

deixou que a bnga terminasse numa vio-<br />

lenta disputa burocrática, perdendo de<br />

vista que a principal luta na categoria<br />

neste processo era a exigência de demo-<br />

cracia nas decisões, que são controladas<br />

por São Bernardo.<br />

Diante de uma situação tão compli-<br />

cada, onde São Bernardo, apoiado num<br />

justo sentimento de unidade na maiona<br />

da categoria impôs a sua unidade goela<br />

abaixo d<strong>os</strong> dissidentes, a melhor saida<br />

deveria ser a realização de um plebiscito<br />

na base de Santo André para que ela pu-<br />

desse decidir se quer ou não o Sindicato<br />

unificado.<br />

ta simples de nomes, sem direito de<br />

representação proporcional, resultando<br />

em violent<strong>os</strong> choques que terminaram<br />

numa aiptura de um setor da atual di-<br />

retoria. Por um lado, isto dará desgas-<br />

te à direção do Sindicato. Porém, o sen-<br />

timento de unidade da categoria sai en-<br />

fraquecido. Isto se expressou no esvazi-<br />

amento <strong>ao</strong> final da convenção, onde a<br />

maioria não ficou para ouvir o discurso<br />

de Luiz Marinho. □


íí: íí;;í: íí: ííí: ;;:: x v;::;;;.:::::;;;; íí"!: íí; íí ííí: : íííííííííííííí:<br />

Quinzena N 0 228 - 30/04/96 16<br />

Declaração de Belo Horizonte -10/03/96<br />

Unificar a esquerda da CUT<br />

par a fortalecer a luta contra as reformas<br />

neoliberais por emprego e terra<br />

O Governo FHC, apesar da derrota<br />

sofrida na primeira votação da reforma<br />

da previdência, segue empenhado em<br />

aprovar essa e as outras reformas<br />

neoliberais, cumprindo à risca <strong>os</strong> dita-<br />

mes d<strong>os</strong> grandes grup<strong>os</strong> econômic<strong>os</strong> in-<br />

ternacionais. Na esteira da reforma da<br />

previdência, o governo quer aprovar a<br />

reforma administrativa e a reforma tra-<br />

balhista. Com isso pretende retirar direi-<br />

t<strong>os</strong> históric<strong>os</strong> d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> brasilei-<br />

r<strong>os</strong>, como a ap<strong>os</strong>entadona por tempo de<br />

serviço, o direito à férias e décimo ter-<br />

ceiro, a estabilidade d<strong>os</strong> servidores pú-<br />

blic<strong>os</strong>, etc, etc. A retirada desses direi-<br />

t<strong>os</strong>, o sucateamento e a privatização do<br />

serviço público visam justamente repas-<br />

sar recurs<strong>os</strong> a<strong>os</strong> grandes grup<strong>os</strong> econô-<br />

mic<strong>os</strong>, aumentando ainda mais a concen-<br />

tração de renda e a exclusão social exis-<br />

tente no n<strong>os</strong>so pais.<br />

O mesmo governo que afirma não ter<br />

dinheiro para manter o direito à ap<strong>os</strong>en-<br />

tadoria d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> nas condições<br />

atuais, que diz não ter recurs<strong>os</strong> para rea-<br />

lizar a reforma agrária ou para aumentar<br />

o salário do funcionalismo, torrou pelo<br />

men<strong>os</strong> 16 bilhões de reais com duas ou<br />

três famílias de banqueir<strong>os</strong>, num verda-<br />

deiro escândalo digno do outro Fernando,<br />

o Collor.<br />

No entanto a derrota sofrida pelo go-<br />

verno na primeira votação da previdên-<br />

cia, bem como a expl<strong>os</strong>ão da crise do sis-<br />

tema financeiro, com a aprovação da CPI<br />

d<strong>os</strong> Banc<strong>os</strong>, são expressões de que o<br />

governo enfrenta dificuldades dentro da<br />

sua própria base de sustentação. E co-<br />

meça a cair o mito de que "é imp<strong>os</strong>sivel<br />

derrotar esse governo" Podem<strong>os</strong> e deve-<br />

m<strong>os</strong> aproveitar esse momento político<br />

para buscar impor uma derrota mais de<br />

fundo à ofensiva neoliberal de FHC. Para<br />

isso é preciso que a classe trabalhadora<br />

entre efetivamente nessa luta. É preciso<br />

o povo nas ruas.<br />

Em praticamente tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> países do<br />

mundo <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> enfrentam uma<br />

situação parecida com a n<strong>os</strong>sa. E lutam<br />

para resistir à ela. E o caso da heróica<br />

luta d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> franceses, do povo<br />

boliviano, argentino, etc. Em n<strong>os</strong>so país,<br />

as dificuldades naturais para a<br />

mobilização estão sendo profundamente<br />

agravadas pela política levada adiante<br />

pela direção da n<strong>os</strong>sa Central, a CUT.<br />

A direção da n<strong>os</strong>sa Central, frente à<br />

ofensiva neoliberal de FHC, preferiu o<br />

caminho da negociação, da conciliação<br />

que levou <strong>ao</strong> chamado "entendimento"<br />

sobre a reforma da previdência, que acei-<br />

tava a retirada de vári<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> d<strong>os</strong> tra-<br />

balhadores Além disso, que já é um ab-<br />

surdo, essa política acabou por<br />

inviabilizar um processo mais generali-<br />

zado de luta contra as reformas do go-<br />

verno. Infelizmente, apesar da mudança<br />

da p<strong>os</strong>ição da direção da Central na vés-<br />

pera da votação na Câmara, <strong>ao</strong> que tudo<br />

indica a política continua a mesma.<br />

O presidente da n<strong>os</strong>sa Central segue<br />

dando declarações e mais declarações<br />

reafirmando que quer negociar com o<br />

governo a reforma da previdência, a ad-<br />

ministrativa, etc, etc. E não saiu nenhum<br />

chamado, nenhuma orientação concreta<br />

para que n<strong>os</strong>sa classe se levante e vá para<br />

as ruas para derrotar definitivamente esse<br />

governo. Já tem<strong>os</strong> também importantes<br />

dirigentes da n<strong>os</strong>sa Central (como o pre-<br />

sidente da CNM/CUT) que está decla-<br />

rando que aceita negociar a prop<strong>os</strong>ta de<br />

"contrato especial" apresentada pelo mi-<br />

nistro do trabalho. A concepção com que<br />

esses companheir<strong>os</strong> tem trabalhado aban-<br />

dona a concepção de uma CUT de luta e<br />

a substitui por uma espécie de escritório<br />

de negociação, que negocia de tudo, e<br />

dentro da lógica da elite dominante.<br />

E frente à esse quadro, que <strong>os</strong> diri-<br />

gentes e ati vidas reunid<strong>os</strong> em Belo Hori-<br />

zonte, decidim<strong>os</strong> continuar e reforçar a<br />

luta para mudar esse quadro.<br />

A primeira grande tarefa nesse senti-<br />

do é intensificar <strong>os</strong> esforç<strong>os</strong> das entida-<br />

des, dirigentes e ativistas para construir<br />

a mobilização contra as reformas de<br />

FHC. Esse componente, a mobilização<br />

de massas, é essencial para aprofundar a<br />

crise do governo e para derrotá-lo.<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

Wí sí ■■ -í ■«■ íí %<br />

Trabalhadores<br />

Sem isso ele se recompõe e continua<br />

aplicando seu projeto.<br />

Devem<strong>os</strong> tratar a luta contra a políti-<br />

ca do governo no seu conjunto. Por isso<br />

propom<strong>os</strong> uma jornada de lutas contra as<br />

reformas neoliberais (previdência, admi-<br />

nistrativa e trabalhista), pelo emprego e<br />

pela reforma agrária. Precisam<strong>os</strong> impe-<br />

dir a aprovação das reformas, combater<br />

o desemprego (com redução da jornada<br />

de trabalho sem redução de salário e re-<br />

forma agrária) e lutar pela reforma agrá-<br />

ria apoiando as ocupações e a luta do<br />

MST, e exigindo a liberação de Diolinda<br />

e demais pres<strong>os</strong>. Não podem<strong>os</strong> aceitar a<br />

flexibilização trabalhista. Mais emprego<br />

sim, men<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> não. A denúncia das<br />

falcatruas desse governo é parte impor-<br />

tante dessa luta, como agora no escânda-<br />

lo do sistema financeiro, onde devem<strong>os</strong><br />

estar exigindo cadeia para Malan, Loyola<br />

e banqueir<strong>os</strong>.<br />

Nesse momento, devem<strong>os</strong> dar parti-<br />

cular atenção á tentativa do governo de<br />

tentar novamente a aprovação da refor-<br />

ma da previdência. E preciso retomar<br />

imediatamente as manifestações, a pres-<br />

são sobre <strong>os</strong> deputad<strong>os</strong>, etc.<br />

Em paralelo a isso devem<strong>os</strong> seguir<br />

exigindo da direção da n<strong>os</strong>sa Central que<br />

se retire de qualquer negociação com o<br />

governo sobre as reformas neoliberais, e<br />

contra seus esforç<strong>os</strong> na construção da<br />

mobilização para derrotá-l<strong>os</strong><br />

Devem<strong>os</strong> apoiar todas as lutas e mo-<br />

bilizações que estão se desenvolvendo<br />

nesse momento, trabalhando pela sua<br />

unificação em um único processo de lu-<br />

tas contra o governo. Nesse sentido é par-<br />

ticularmente importante o apoio e a soli-<br />

dariedade á greve que está sendo prepa-<br />

rada pel<strong>os</strong> servidores públic<strong>os</strong> federais,<br />

que será sem dúvida um momento<br />

imporante dessa luta mais geral.<br />

Por outro lado é importante que o con-<br />

junto das entidades somem forças a<strong>os</strong><br />

calendári<strong>os</strong> de luta em curso, no campo e<br />

na cidade. O n<strong>os</strong>so esforço no sentido de<br />

impulsionar as lutas e buscar unificá-las<br />

se enquadra dentro do objetivo mais ge-


: síiiííiíís ■■;■;■■;■; vm :í::;íí vim í?; :íí;<br />

Quinzena N 0 228 - 30/04/96 17<br />

ral de ir criando as condições para a reali-<br />

zação de uma Greve Geral em defesa d<strong>os</strong><br />

direit<strong>os</strong> e das reivindicações d<strong>os</strong> trabalha-<br />

dores. Para tomar tudo isso em realidade é<br />

preciso um minimo de organização.<br />

Conclamam<strong>os</strong> que, em cda estado da fede-<br />

ração, Se realiza em encontr<strong>os</strong> com o mes-<br />

mo caráter dessa reunião nacional, para<br />

encaminhar as tarefas aqui prop<strong>os</strong>tas e,<br />

Atenção - Ano 2 -1996 - N 0 4<br />

Ao men<strong>os</strong> trinta empresas quebradas<br />

por patrões foram assumidas pel<strong>os</strong> em-<br />

pregad<strong>os</strong> que se tornaram don<strong>os</strong> das má-<br />

quinas e de grandes dívidas.<br />

Ganhma men<strong>os</strong>. Mesmo assim, não<br />

faltam <strong>ao</strong> trabalho nem n<strong>os</strong> feriad<strong>os</strong>, se<br />

orgulham de não ter mais patrão "para<br />

encher o saco " e do clima de liberdade:<br />

"Ninguém persegue ninguém ".<br />

Segunda-feira de Carnaval. Muito ca-<br />

lor. Mana Calista, uma das novas donas<br />

da Skillcoplast abre a panela para ver se<br />

o feijão cozinhou. Cabel<strong>os</strong> encarocalad<strong>os</strong><br />

e curt<strong>os</strong>, r<strong>os</strong>to enmgado coberto de suor,<br />

é responsável pela comida d<strong>os</strong> trabalha-<br />

dores da empresa. "Queria ficar descan-<br />

sando em casa, mas vim trabalhar; se f<strong>os</strong>-<br />

se empregada não veria problema nenhum<br />

em faltar". Além de cozinhar, uma de suas<br />

tarefas da jomada que começa às 7 horas<br />

e vai até às 18 h 30 é limpar o galpão. Ela<br />

não se queixa: "Tem mês que tiram<strong>os</strong> pou-<br />

co, por exemplo, peguei 340 reais, mas<br />

prefiro assim. Pelo men<strong>os</strong> decidim<strong>os</strong> tudo<br />

junt<strong>os</strong>, e está difícil arrumar emprego para<br />

quem tem mais de 40 an<strong>os</strong>".<br />

A Skillcoplast é uma das trinta empre-<br />

sas administradas em forma de cooperati-<br />

va, associação ou autogestão pel<strong>os</strong> em-<br />

pregad<strong>os</strong> depois que <strong>os</strong> patrões faliram.<br />

Ela nasceu no final de 1993, quando a<br />

Bracofix demitiu 450 funcionári<strong>os</strong> e mu-<br />

dou-se do ABC para Sumaré, no interior<br />

de São Paulo. O Sindicato d<strong>os</strong> Químic<strong>os</strong><br />

e a comissão de fábrica, com a assessoria<br />

da Anteag (Associação Nacional d<strong>os</strong> Tra-<br />

balhadores em Empresas de Autogestão e<br />

Participação Acionária), tentaram<br />

comprá-la, mas recusaram devido <strong>ao</strong> pre-<br />

ço: 5 milhões de dólares "O projeto era<br />

um sonho, percebem<strong>os</strong> isso hoje", diz<br />

Manoel Paz da comissão de fábrica.<br />

Fato raro, a fabricante de plástic<strong>os</strong> foi<br />

dessa forma, dar continuidade à constru-<br />

ção desse movimento para construir uma<br />

direção de luta para a n<strong>os</strong>sa Central.<br />

Por último, mas não men<strong>os</strong> impor-<br />

tante, é decisivo que essa discussão seja<br />

levada à base das n<strong>os</strong>sas categorias, E<br />

preciso reproduzir e distribuir ampla-<br />

mente essa declaração. E preciso<br />

discuti-la nas instâncias das entidades.<br />

Operário patrão<br />

Adéliu Chagas e Alexandre Cnsla<br />

uma das cinco empresas geridas pel<strong>os</strong><br />

<strong>trabalhadores</strong> a receber dinheiro do<br />

BNDES, num total de I milhão e 200<br />

mil reais para financiar a produção de<br />

galões de plástico, cest<strong>os</strong> de lixo, pelí-<br />

culas de politileno e compra de<br />

maquinári<strong>os</strong><br />

Sinval Alves Pereira, um d<strong>os</strong><br />

dezesseis cooperad<strong>os</strong> da Skillcoplast,<br />

cinco an<strong>os</strong> de Bracofíx, não pulou Car-<br />

naval este ano: "Não sou obrigado a vir<br />

na terça-feira de Carnaval, mas não que-<br />

ro parar e faço de tudo". Pai de três fi-<br />

lh<strong>os</strong>, de 13, 9 e 8 an<strong>os</strong>, ele sustenta a<br />

família sozinho, a<strong>os</strong> tranc<strong>os</strong> e barran-<br />

c<strong>os</strong>. "Desde janeiro não recebo nada,<br />

mas estou tocando e acho que avança-<br />

m<strong>os</strong> muito Tem outra coisa: minha mu-<br />

lher me dá um superapoio".<br />

Ficar sem patrão trouxe uma<br />

tranqüilidade extra: "P<strong>os</strong>so falar à<br />

vontade, porque ninguém persegue<br />

ninguém"<br />

O projeto realizável<br />

Os dezesseis associad<strong>os</strong> retiram<br />

quantias de 300 a 1.500 reais por mês.<br />

As contas não são iguais. A determina-<br />

ção respeita três critéri<strong>os</strong> básic<strong>os</strong>, ava-<br />

liad<strong>os</strong> pela diretoria, participação de<br />

cada um no projeto, valores recisóri<strong>os</strong><br />

(ou seja, o tempo que cada um ficou sem<br />

receber o salário) e benefíci<strong>os</strong> indiret<strong>os</strong><br />

e a produção. Enquanto perdurar o fi-<br />

nanciamento do BNDES, <strong>os</strong> associad<strong>os</strong><br />

em tese retiram 20% do total faturado,<br />

dividem pelo número de cotas e multi-<br />

plicam pelo valor das cotas de cada um.<br />

"Ainda não conseguim<strong>os</strong> fazer isso, por-<br />

que o salário d<strong>os</strong> funcionári<strong>os</strong> não pode<br />

atrasar", explica Manoel Alvez Paz. O<br />

presidente conta que o salário de um<br />

ferramenteiro, sua função na<br />

Skillcoplast, é de 2 mil reais e não fal-<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

M í<br />

Trabalhadores<br />

pois o projetoque pretendem<strong>os</strong> desenvol-<br />

ver só será legítimo se for construído<br />

conjuntamente com n<strong>os</strong>sa base. D<br />

Belo Horizonte, 10 de Março de 1996<br />

Reunião Nacional de Dirigentes e<br />

Ativistas do Campo da CUT. (estiveram<br />

presentes 140 dirigentes, de 73 enti-<br />

dades, de 11 estad<strong>os</strong>).<br />

tam ofertas de emprego. "Apesar das di-<br />

ficuldades ap<strong>os</strong>to no projeto e sei que é<br />

um caminho sem volta". A dívidas, defi-<br />

nitivamaite, não são o único empecilho.<br />

"Não há uma cultura autogestão, o tra-<br />

balhador é legalista, paternalista e ac<strong>os</strong>-<br />

tumado a ter alguém para decidir por ele",<br />

comenta Paz. "No almoço de domingo,<br />

<strong>os</strong> parentes perguntam em qual firma tra-<br />

balho e <strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong> oferecid<strong>os</strong>. Conto<br />

da Skillcoplast e tod<strong>os</strong> acham que estou<br />

louco".<br />

Com dois an<strong>os</strong> de atividade e basean-<br />

do-se nas experiências de países como <strong>os</strong><br />

Estad<strong>os</strong> Unid<strong>os</strong> e Espanha, a Anteag as-<br />

sessora projet<strong>os</strong> de autogestão em todo o<br />

Brasil. "Todas faliram ou quebraram e<br />

agora estão sendo reerguidas", conta<br />

Aparecido de Fana, diretor técnico da<br />

Associação. Para a virada do século, a<br />

Anteag prevê mil empresas de autogestão<br />

proporcionando aproximadamente 250<br />

mil empreg<strong>os</strong>. A Federação das Indústri-<br />

as do Estado de São Paulo (Fiesp) consi-<br />

dera o levantamento otimista. "Acredita-<br />

m<strong>os</strong> que haverá uma reversão do qua-<br />

dro. Começa como cooperativa e depois<br />

<strong>os</strong> sóci<strong>os</strong> vendem as suas cotas. A ten-<br />

dência é concentrar a gerência novamen-<br />

te nas mã<strong>os</strong> de pouc<strong>os</strong>", comenta Carl<strong>os</strong><br />

Eduardo Uchôa Fagundes, diretor do de-<br />

partamento da pequena e média indús-<br />

tria. Ele acredita que em um primeiro<br />

momaito a motivação prevalece. "Depois<br />

começam <strong>os</strong> problemas como a falta de<br />

salário e de relacionamento. Nem tod<strong>os</strong><br />

pensam igual", diz Uchôa. E acrescenta<br />

sem rodeio: "Toda atitude para manter a<br />

empresa e <strong>os</strong> empreg<strong>os</strong> é louvável, mas a<br />

Fiesp sempre lamentará que a empresa<br />

seja entregue a<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>".<br />

Um d<strong>os</strong> obstácul<strong>os</strong> para o sucesso da<br />

empreitada apontad<strong>os</strong> por Uchôa é com-


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 18 Trabalhadores<br />

partilhado pel<strong>os</strong> presidentes das coope-<br />

rativas: a dificuldade de adaptação d<strong>os</strong><br />

empregad<strong>os</strong> frente <strong>ao</strong> novo negócio. Afi-<br />

nal, tod<strong>os</strong> passaram an<strong>os</strong> recebendo or-<br />

dens. A Anteag, preocupada com esse<br />

cenário e com a competitividade do mer-<br />

cado atual, investe na educação. Propõe<br />

um projeto para as cooperativas, elabo-<br />

rado pela ex-secretária de Educação de<br />

Santo André, Manlena Lakano. "O sig-<br />

nificado de autogestão precisa ser<br />

construído para <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>, porque<br />

é uma experiência recentíssima que só<br />

começa a ser consolidada agora", expli-<br />

ca Manlena. A idéia é conseguir minis-<br />

trar educação básica e profissional, com<br />

apoio de govern<strong>os</strong> e municípi<strong>os</strong>, e para-<br />

lelamente centrar dentro das fábricas se-<br />

minári<strong>os</strong> de autogestão. "E preciso lem-<br />

brar que esses <strong>trabalhadores</strong> têm uma<br />

ousadia incrível".<br />

Corrida para saldar dívidas<br />

Oito pedid<strong>os</strong> defalência, 453 protes-<br />

t<strong>os</strong> e onze execuções da Fazenda Esta-<br />

dual, quaraita process<strong>os</strong> traballiistas. A<br />

dívida foi estimada entre 8 e 9 milhões<br />

de reais. Com esses númer<strong>os</strong>, <strong>os</strong> anti-<br />

g<strong>os</strong> funcionári<strong>os</strong> da Sakai - indústria da<br />

Grande São Paulo especializada em<br />

móveis populares de cozinha - transfor-<br />

maram a empresa em uma cooperativa.<br />

A nova Sakai mantém a mesma área de<br />

59 mil metr<strong>os</strong> quadrad<strong>os</strong>, com quatro<br />

galpões e completará, em março, 1 ano<br />

de resistência.<br />

Em seu período áureo a Sakai produ-<br />

zia entre 25 a 45 mil peças de cozinha<br />

por mês. Hoje, a cooperativa fabrica ape-<br />

nas 5 mil. De 364 funcionári<strong>os</strong>, passa-<br />

ram a 107 cooperad<strong>os</strong>. Tod<strong>os</strong> descontam<br />

10% nas retiradas para completar as co-<br />

tas iguais de mil reais. Os velh<strong>os</strong> seis cli-<br />

entes grandes e quase exclusiv<strong>os</strong>, como<br />

o Ponto Frio, foram substituíd<strong>os</strong> por cen-<br />

tenas de pequen<strong>os</strong> compradores, de su-<br />

permercad<strong>os</strong> de periferia a lojinhas de<br />

bairro. Uma das alternativas encontra-<br />

das para evitai o segundo colapso<br />

Decidim<strong>os</strong> continuar o trabalho, <strong>os</strong><br />

nov<strong>os</strong> don<strong>os</strong> utilizaram o dinheiro do<br />

FGTS para adquirir material. As contri-<br />

buições resultaram em 43 mil reais com<br />

empréstim<strong>os</strong> de 500 a 5 mil reais. O di-<br />

nheiro já foi devolvido, reajustado como<br />

a poupança. Entretanto, este não foi o<br />

único entrave. Passado o entusiasmo ini-<br />

cial, de frente com a nova realidade, mais<br />

de vinte <strong>trabalhadores</strong> abandonaram o<br />

barco. Os que ficaram, retiram hoje, em<br />

média, 300 reais. Mas não alcançavam<br />

60 no primeiro mês. J<strong>os</strong>éda Silva prefe-<br />

riu tentar outro emprego. Antes da cria-<br />

ção da cooperativa, recebia um salário<br />

de 700 reais. Saiu, voltou e hoje saca 350<br />

reais. Com avental azul surrado e um<br />

grande bigode, fala de cabeça baixa sem<br />

muita certeza da situação: "Não mudou<br />

muito não, eu estou ganhando men<strong>os</strong> e<br />

acho que a responsabilidade é maior".<br />

Abandonad<strong>os</strong> pelas autoridades que<br />

garantem estar preocupadas em comba-<br />

ter o desemprego, <strong>os</strong> sóci<strong>os</strong> acham mei-<br />

<strong>os</strong> para tocar as cooperativas "Até que<br />

agora está bom N<strong>os</strong> primeir<strong>os</strong> temp<strong>os</strong>,<br />

trabalhávam<strong>os</strong> um dia e parávam<strong>os</strong> dois,<br />

porque não tinha matéria-prima", conta<br />

J<strong>os</strong>é Roberto Moura, do setor de pré-corte<br />

da Sakai, 14 an<strong>os</strong> de firma e retirada de<br />

930 reais. J<strong>os</strong>é Roberto manipula com<br />

mais cinco operári<strong>os</strong> uma grande máqui-<br />

na de corte. Hoje, ele esta parado, faltam<br />

placas para cortar. Não perde o entusi-<br />

asmo e, com um grande sorriso, olha <strong>ao</strong><br />

redor e diz: "Isso aqui vale ouro". Moura<br />

é solteiro, mas ainda assim se preocupa<br />

com <strong>os</strong> atras<strong>os</strong> de salário. "Quando não<br />

pago o aluguel em dia, ninguém perdoa.<br />

Penso no pessoal daqui que tem família".<br />

Porém, destaca como vantagem a atual<br />

transparência das contas da cooperativa:<br />

"Não tinhanias noção de que a empresa<br />

ia tão mal, quando soubem<strong>os</strong> já era tar-<br />

de". Moura avalia <strong>os</strong> nov<strong>os</strong> rum<strong>os</strong> da<br />

fábrica. "Modéstias a parte, às vezes me<br />

sinto dono e não penso em procurar ou-<br />

tro emprego". Mas não compreende qual<br />

o critério estabelecido para a sua faixa<br />

salarial: "Tinha gente que ganhava mil<br />

reais e passou para 1.400, eu não". No<br />

entanto, as cooperativas são as únicas<br />

empresas brasileiras onde as discrepân-<br />

cias salariais são de Primeiro Mundo: a<br />

maior retirada mensal não pode ultrapas-<br />

sar em seis vezes a menor<br />

O igualitarismo, entretanto, não eli-<br />

mina as contradições. Valmir Tavares da<br />

Silva fala frases curtas, olhando para o<br />

chão. Ele e auxiliar de expedição, tem 27<br />

an<strong>os</strong>, três na empresa e retira 300 reais<br />

por mês. Acha que sua responsabilidade<br />

não mudou e acredita que quando tinha<br />

patrão era mais fácil. "Só me sinto dono<br />

de uma dívida", diz. Valdir tinha medo<br />

de perder o emprego: "Hoje, mais ou<br />

mai<strong>os</strong>". Valdir começa elogiar o compor-<br />

tamento d<strong>os</strong> colegas de trabalho. Pensa,<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO! 1<br />

volta atrás e desabafa: "Não étodo mun-<br />

do que tem o mesmo empenho". Metade<br />

d<strong>os</strong> operári<strong>os</strong> são jovens como Jair Jú-<br />

lio, de 16 an<strong>os</strong>. Jair quer contar alguma<br />

coisa, não para de olhar para <strong>os</strong> repórte-<br />

res. "Não tem mais patrão para encher o<br />

saco", fala enquanto pega rapidamente<br />

as peças das gavetas d<strong>os</strong> móveis. "Vou<br />

nas assembléias mensais e não acho cha-<br />

to. Sinto que tenho mais participação,<br />

mas no início foi difícil de aitender, fi-<br />

cou todo mundo meio perdido.<br />

" Lidar com tanta responsabilidade me<br />

impressionou muito", lembra o vice-pre-<br />

sidaite da cooperativa e coordenador ge-<br />

ral da produção na fábrica, Paulo Riberiro<br />

de Andrade. A insegurança, o medo do<br />

futuro e a falta de compreensão da nova<br />

realidade são traduzid<strong>os</strong> em algumas re-<br />

clamações constantes: "Opagamaito, ora<br />

atrasa, ora adianta". Outra queixa: <strong>os</strong> di-<br />

reit<strong>os</strong> perdid<strong>os</strong>. Os empregad<strong>os</strong> recebiam<br />

unífonne, seguro saúde e almoçavam no<br />

refeitório da empresa. A cooperativa arca<br />

apenas com o auxílio-transporte. Do cor-<br />

respondente <strong>ao</strong> 13° salário, só saiu a pri-<br />

meira parcela e a segunda não tem previ-<br />

são. Os cooperad<strong>os</strong> resmugam, mas não<br />

vêem outra saída.<br />

As placas de madeira vendidas pela<br />

Duratex (60% da matéria-prima) repre-<br />

sentam, de certa forma, <strong>os</strong> dilemas vivi-<br />

d<strong>os</strong> pela Sakai. Por causa de uma dívida<br />

de quatro an<strong>os</strong> com o fornecedor, o pa-<br />

gamento precisa ser adiantado. A priori-<br />

dade passa a ser as placas, <strong>ao</strong> invés do<br />

salário. Apesar da exigência, <strong>os</strong> dirigen-<br />

tes da Duratex afirmam ap<strong>os</strong>tar no pro-<br />

jeto. "Acreditei e acredito, eles dinami-<br />

zaram o processo e as compras aumai-<br />

taram mês a mês, a Sakai é um cliente<br />

diferenciado", diz Gouveia Pereira, ge-<br />

rente regional de vendas.<br />

Banc<strong>os</strong> não perdoam<br />

São 17 horas, o apito toca. Em ques-<br />

tão de segund<strong>os</strong> o grande galpão, até a<br />

pouco lotado, fica completamente vazio.<br />

Paulo Ribeiro é um d<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> a aban-<br />

donar o seu p<strong>os</strong>to. "Você acha que o pes-<br />

soal foi embora logo 9 Antes era pior",<br />

comenta querendo justificar o comporta-<br />

mento d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>.<br />

Valdir de Paulo Silveira - atual presi-<br />

dente da cooperativa - entrou na Sakai<br />

em 1980. Se licenciou em 1988 para ocu-<br />

par o cargo de secretário do Sindicato d<strong>os</strong><br />

<strong>trabalhadores</strong> das Indústrias de Constru-<br />

ção de Mogí das Cruzes e Suzano, do


ÇÍÍÃWÍÍfííííííííí; ííííííífiíífíí:<br />

Quinzena N 0 228 - 30/04/96 19 Trabalhadores<br />

qual assumiu em seguida a presidência.<br />

O sindicato conseguiu que a Sakai f<strong>os</strong>se<br />

a única empresa da região a baixar a jor-<br />

nada semanal para 40 horas. Já como<br />

presidente da cooperativa, no final do ano<br />

passado, Valdir defendeu a prop<strong>os</strong>ta de<br />

aumentar o periodo de trabalho em l hora<br />

diária. Só assim garantiriam as encomen-<br />

das. "Sentei várias vezes nessa sala da<br />

presidência, hoje abandonada, para ne-<br />

gociar com <strong>os</strong> patrões. Percebo que, como<br />

líder sindical, muitas vezes dizia saber<br />

de cert<strong>os</strong> assunt<strong>os</strong> para não m<strong>os</strong>trar a<br />

minha falta de informação, e isso é um<br />

grande erro". Agitado, Valdir atende o<br />

telefone, assina cheques e fala com pre-<br />

cisão d<strong>os</strong> nov<strong>os</strong> compromiss<strong>os</strong>, dívidas<br />

e projet<strong>os</strong> da Sakai. "A minha vida mu-<br />

dou e muito, n<strong>os</strong> banc<strong>os</strong> me tratam como<br />

um empresário". Silveira senta quase di-<br />

ariamente com gerentes e fornecedores,<br />

buscando saída para as dívidas. "Além<br />

do pouco apoio da iniciativa privada, ás<br />

vezes penso que o próprio trabalhador<br />

emperra o projeto, pela dificuldade de<br />

assimilar a novidade".<br />

A Makerli, indústna de calçad<strong>os</strong>, tem<br />

uma história diferente. A empresa do<br />

Grupo Sândaio, em Franca, teve a auto-<br />

falência decretada em dezembro de 1991.<br />

Demitiu <strong>os</strong> 482 funcionári<strong>os</strong>. Ampara-<br />

d<strong>os</strong> pelo Sindicato d<strong>os</strong> Trabalhadores nas<br />

Indústrias de Calçad<strong>os</strong>, <strong>os</strong> profissionais<br />

descobriram que o fracasso da empresa<br />

não foi exclusivamente uma questão de<br />

finanças. Havia também motiv<strong>os</strong> admi-<br />

nistrativ<strong>os</strong>. Acreditaram, então, em uma<br />

nova saída, a autogestão. Fato inédito nas<br />

indústrias de calçad<strong>os</strong>.<br />

Uma auditoria feita pelo Dieese com-<br />

provou a tese d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> e reafir-<br />

mou a p<strong>os</strong>sibilidade de reerguer a empre-<br />

sa. Em abril de 1992, 150 funcionári<strong>os</strong><br />

voltaram a<strong>os</strong> seus carg<strong>os</strong>. No mês de ju-<br />

nho, a Makerli funcionava, novamente,<br />

com seu antigo quadro de empregad<strong>os</strong>.<br />

Para atingir o mesmo ritmo de produ-<br />

ção, <strong>os</strong> funcionári<strong>os</strong> pleitearam um em-<br />

préstimo equivalente a 440 mil reais jun-<br />

to <strong>ao</strong> Banespa. Apenas metade da verba<br />

foi liberada. E pior: oitenta dias depois.<br />

A demora atrapalhou ainda mais a já tu-<br />

multuada transição. A produção de 2 mil<br />

pares de calçad<strong>os</strong> diári<strong>os</strong> caiu para 700.<br />

A conseqüência inevitável: <strong>os</strong> trabalha-<br />

dores perderam clientes n<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong> Uni-<br />

d<strong>os</strong> e Canadá.<br />

"Além do ca<strong>os</strong> administrativo, não ul-<br />

trapassam<strong>os</strong> <strong>os</strong> limites da cultura patro-<br />

nal", analisa Jorge Luís Martins que<br />

acompanhou toda a negociação pelo Sin-<br />

dicato d<strong>os</strong> Trabalhadores de Calçad<strong>os</strong> em<br />

Franca e atualmente ocupa um p<strong>os</strong>to na<br />

CUT Nacional. Contraditoriamente, <strong>os</strong><br />

maiores desgastes começaram depois da<br />

eleição d<strong>os</strong> funcionári<strong>os</strong> para direção da<br />

associação. "Surgiram castas de dirigen-<br />

tes, apenas quatro ou cinco mandavam e<br />

desrespeitavam as decisões das assem-<br />

bléias. Pagam<strong>os</strong> um preço alto demais",<br />

analisa Jorge Luis. Sobraram vinte fun-<br />

cionári<strong>os</strong> que tentam aplicar a prop<strong>os</strong>ta<br />

em outr<strong>os</strong> locais.<br />

Suor e roupa bonita<br />

J<strong>os</strong>é Paixão Lem<strong>os</strong> de Aquino é pre-<br />

sidente da Coopervest em Aracaju (SE).<br />

Antes, trabalhava no departamento de<br />

cronometragem da antiga fábrica têxtil<br />

Vila Romana "Hoje preciso estar muito<br />

mais informado, sou convidado para fa-<br />

lar da n<strong>os</strong>sa experiência. No começo da<br />

cooperativa, minha voz nem saía", con-<br />

ta. A Coopervest surgiu em novembro de<br />

1994. A Vila Romana, sediada em São<br />

Paulo, tinha linhas de produção em<br />

Aracaju e na Paraíba. Com a falência, o<br />

grupo holandês Selling Vest se interes-<br />

sou pela loja de São Paulo e pela fábrica<br />

da Paraíba. Restou a de Aracaju.<br />

Com as máquinas da fábrica e um<br />

resto de linhas e pan<strong>os</strong> no estoque, <strong>os</strong> tra-<br />

balhadores iniciaram o trabalho 48 ho-<br />

ras depois do acerto. Coube á cooperati-<br />

va assumir a divida bancária de 6 mi-<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

lhões de reais que saltou para aproxima-<br />

damente 9,5 milhões.<br />

"Apesar do rombo financeiro, a<br />

Coopervest abriu duas lojas, uma em um<br />

distrito de Aracaju e a outra em um<br />

shopping. Contam<strong>os</strong> também com repre-<br />

sentantes em São Paulo, Minas Gerais,<br />

Rio de Janeiro, Piauí e Aracaju, e parti-<br />

cipam<strong>os</strong> de cinco feiras", conta Paixão.<br />

A produção - calças, tem<strong>os</strong>, blazers, sai-<br />

as e bermudas - saem pelo preço de fá-<br />

brica, nas feiras e nas lojas da cooperati-<br />

va. D<strong>os</strong> 1.200 funcionári<strong>os</strong> restaram 600<br />

cooperad<strong>os</strong>, d<strong>os</strong> quais 450 são mulheres.<br />

A Coopervest produz 69 mil calçasjeans<br />

e 3.500 camisas por mês. "Tem<strong>os</strong> poten-<br />

cial para realizar o dobro do que faze-<br />

m<strong>os</strong>, mas falta capital de giro", constata<br />

Paixão. A Cooperativa conseguiu crédi-<br />

to de até 90 dias para a compra da maté-<br />

ria-prima. O aumento da retirada depen-<br />

de de maior produção e de encomendas.<br />

"Pagam<strong>os</strong> o preço do mercado para<br />

uma c<strong>os</strong>tureira, 145 reais por 43 horas<br />

semanais", afirma Paixão. Os direit<strong>os</strong><br />

como 13° salário, FGTS e férias são ga-<br />

rantid<strong>os</strong> por um fundo de 30% do total<br />

faturado.<br />

Ainda é cedo para afirmar se essas<br />

experiências de autogestão significam<br />

uma luz no fim do túnel: É certo que,<br />

apesar do pouco tempo de implantação,<br />

elas estão servindo para <strong>os</strong> operári<strong>os</strong> sa-<br />

írem da defensiva, tomarem fôlego e re-<br />

cuperarem, <strong>ao</strong> men<strong>os</strong> em parte, o prazer<br />

e o orgulho de trabalhar. □


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 20 Trabalhadores<br />

Jornal do SINTUFRJ ■ 9/01/96 - N' 198<br />

Economia Metalúrgica desrespeita cidadania<br />

São panelas, talheres, chapas de automóvel, preg<strong>os</strong> e parafus<strong>os</strong>, por exemplo, que chegam a<strong>os</strong><br />

grandes centr<strong>os</strong> para serem vendid<strong>os</strong>. Nós consumim<strong>os</strong>. Mas, não sabem<strong>os</strong> que tudo teve<br />

origem no trabalho escravo, incluindo até 30% de mão-de-obra infantil A maior parte da<br />

produção é exportada por grandes empresas nacionais e multinacionais, como Petrobrás,<br />

Volkswagen, Ford, Fiat, Mercedes-Benz, General Motors, Bradesco e Nestlé. Algumas delas<br />

produzem matéria-prima para suas indústrias com mão-de-obra escrava; outras compram a<br />

produção de terceir<strong>os</strong>.<br />

Em Mnas Gerais, 100 mil pessoas<br />

trabalham produzindo 2,3 milhões de<br />

metr<strong>os</strong> cúbic<strong>os</strong> de carvão, o que repre-<br />

senta 70% da produção nacional, cerca<br />

de 75 milhões de dólares por ano. A mai-<br />

oria das pessoas trabalha em condições<br />

sub-humanas, sem carteira assinada, em<br />

condições insalubres. Enfim, esses ho-<br />

mens essenciais na economia metalúrgica<br />

brasileira sequer podem ser considerad<strong>os</strong><br />

cidadã<strong>os</strong>, e, ironicamente, a maioria se-<br />

quer sabe quem é o patrão.<br />

"O Brasil é um país que condena e<br />

mata o seu próprio futuro", diz Casimiro<br />

da Cruz, carvoeiro, 58 an<strong>os</strong>. Ele tem a<br />

voz rouca e <strong>os</strong> cabel<strong>os</strong> da barba bran-<br />

c<strong>os</strong>. Parece ser um homem bem mais ve-<br />

lho. "Que futuro esse país pode esperar<br />

<strong>ao</strong> manter crianças que chegam a<strong>os</strong> 15<br />

an<strong>os</strong> já cansadas de trabalhar?", pergun-<br />

ta Casimiro, que viveu esta realidade.<br />

Pensando frase por frase, o menino<br />

Duarte de Oliveira responde: "Agradeço<br />

a Deus estar vivo. Acho que tenho sorte<br />

pois sei que por aí estão matando meni-<br />

n<strong>os</strong> e meninas. Mas fico triste porque o<br />

Brasil não g<strong>os</strong>ta de mim!". Este diálogo<br />

aconteceu no alto de um forno. As vozes<br />

chegam entrecortadas pelo vento, entre a<br />

fumaça e a emoção.<br />

Acaba de amanhecer na carvoaria da<br />

Fazenda Nezinha, município de<br />

Bocaiúva, Norte de Mnas Gerais. Um<br />

d<strong>os</strong> melhores carvoeir<strong>os</strong> da região é o Seu<br />

Sengué, como é chamado Geraldo de<br />

Oliveira, avó do menino Duarte. Quem<br />

conta as histórias da luta de Geraldo é<br />

sua companheira, a meiga Otaviana de<br />

Jesus, carvoeira, 69 an<strong>os</strong>. Ele e o neto<br />

produzem até três caminhões por mês e<br />

conseguem retirar, junt<strong>os</strong>, até R$ 300.<br />

Geraldo, que aleijou um d<strong>os</strong> ded<strong>os</strong> da mão<br />

no trabalho, quer mudar de profissão.<br />

Duarte, que trabalha desde <strong>os</strong> 12 an<strong>os</strong>,<br />

sonha em voltar a estudar.<br />

Produção é exportada<br />

O carvão produzido na Fazenda<br />

Nezinha vai para a siderúrgica Lucape,<br />

que fabrica de 9.000 toneladas de ferro-<br />

guza e exporta aproximadamente 7.200<br />

toneladas, principalmente para <strong>os</strong> Esta-<br />

d<strong>os</strong> Unid<strong>os</strong>. O restante é utilizado em<br />

virabrequim (peça do motor de expl<strong>os</strong>ão)<br />

na Siderúrgica Belgo-Mineira ou se trans-<br />

forma em fio, prego, parafuso e chapa<br />

de automóvel na Açominas, que por sua<br />

vez vende para Volkswagen, Mercedes-<br />

Benz e Bombril.<br />

Como em Mnas, divers<strong>os</strong> municípi-<br />

'SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

<strong>os</strong> de Mato Gr<strong>os</strong>so do Sul mantêm tra-<br />

balho escravo para lucrar com a produ-<br />

ção de carvão. Mas impressiona a reali-<br />

dade d<strong>os</strong> municípi<strong>os</strong> de Ribas do Rio<br />

Pardo, Águas Claras e Três Lagoas. Lá,<br />

cerca de dez mil pessoas, sendo quatro<br />

mil crianças, trabalham como escrav<strong>os</strong><br />

em 600 mil hectares de pin<strong>os</strong> e eucalipt<strong>os</strong><br />

(extensão maior que o Distrito Federal).<br />

Tudo começou na década de 70, quan-<br />

do, com o objetivo de instalar fábricas<br />

de papel e celul<strong>os</strong>e, o governo federal<br />

investiu US$ 175 milhões num fenome-<br />

nal projeto de reflorestamento.<br />

Treze empresas, entre elas a Nestlé,<br />

receberam incentiv<strong>os</strong> fiscais por pelo<br />

men<strong>os</strong> dez an<strong>os</strong>. Hoje, mais de vinte an<strong>os</strong><br />

depois, não existem as fábricas, mais de<br />

um bilhão de árvores já viraram carvão<br />

e a região abriga a maior senzala do<br />

mundo.<br />

Uma família de quatro pessoas (pai,<br />

mãe e dois filh<strong>os</strong>) pode produzir em mé-<br />

dia 400 metr<strong>os</strong> cúbic<strong>os</strong> de lenha, prove-<br />

nientes de dois hectares de floresta, cer-<br />

ca de 3.332 árvores por semana. Em um<br />

mês, são 13.328 árvores que viram car-<br />

vão e nas siderúrgicas se transformam n<strong>os</strong><br />

mais divers<strong>os</strong> materiais de consumo de<br />

ferro e metais. O


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 21 Trabalhadores<br />

Documento-04/96<br />

O governo crimin<strong>os</strong>o de Fernando<br />

Henrique abriu a colheira da safra 96.<br />

Até a noite de ontem, foram contad<strong>os</strong> 21<br />

mort<strong>os</strong>, 18 <strong>trabalhadores</strong> sem-terra e 3<br />

policiais, na região de Curionópolis-PA<br />

A colheita anterior se deu em Corumbiara<br />

- Rondônia, em ag<strong>os</strong>to último e deisxou<br />

o país estarrecido De ag<strong>os</strong>to a esta data,<br />

sequer o inquérito policial foi concluido.<br />

No que diz respeito às iniciativas sobre a<br />

Reforma Agrária, a única medida impor-<br />

tante tomada pelo governo foi a demis-<br />

são do ex-presidente do 1NCRA, Fran-<br />

cisco Graziano Neto. O significado prin-<br />

cipal deste gesto é que o governo, a par-<br />

tir de então, deixou de ter uma politica<br />

fundiária. Desde a retirada de Graziano,<br />

<strong>os</strong> dirigentes do 1NCRA só vieram a pú-<br />

blico para mentir descaradamente sobre<br />

o número de assentament<strong>os</strong>, ou para se-<br />

rem denunciad<strong>os</strong> por sobrevalonzaçào de<br />

terras desapropriadas.<br />

Foram inúteis as gestões das entida-<br />

des da sociedade civil que entregaram o<br />

Memorial Pela Reforma Agrária e Pela<br />

Justiça no Campo a<strong>os</strong> representantes d<strong>os</strong><br />

O pesadelo está de volta<br />

três poderes, reivindicando algumas me-<br />

didas singelas para fazer avançar o pro-<br />

cesso de Reforma Agrária e combater a<br />

violência no campo. Medidas que depen-<br />

diam e dependem exclusivamente da von-<br />

tade de politica d<strong>os</strong> governantes.<br />

O massacre de Cunonópolis revela a<br />

face mais nefasta do governo Fernando<br />

Henrique: um governo que não tolera em<br />

qualquer dimensão, iniciativas da<br />

socidade organizada. Moviment<strong>os</strong> soci-<br />

ais que aspirem organizada mente a cida-<br />

dania. A sociedade brasileira aprendeu a<br />

conviver e a respeitar o Movimento d<strong>os</strong><br />

Sem Terra. Este movimento demonstrou<br />

há pouc<strong>os</strong> dias sua capacidade de mobi-<br />

lizar pacificamente dezenas de milhares<br />

de <strong>trabalhadores</strong>, em várias capitais bra-<br />

sileiras, para exigir das autoridades so-<br />

luções para a grave crise agraria e agrí-<br />

cola em que fom<strong>os</strong> mergulhad<strong>os</strong> n<strong>os</strong> úl-<br />

tim<strong>os</strong> an<strong>os</strong> Para quem reivindicava ter-<br />

ra e justiça a resp<strong>os</strong>ta do governo<br />

Fernando Henrique foram <strong>os</strong> fuzis.<br />

A sociedade brasileira não pode per-<br />

manecer paralizada pelo terror e pela in-<br />

CMP - Central Moviment<strong>os</strong> Populares - 04/96<br />

Reforma Agrária, Sim!<br />

Massacre, Não!<br />

O massacre contra <strong>os</strong> Trabalhadores<br />

Rurais Sem Terra do dia 17 de abril de<br />

1996, em Eldorado Carajás, estarreceu o<br />

país e o mundo, deixando pelo mai<strong>os</strong> 23<br />

mort<strong>os</strong> e mais de 50 ferid<strong>os</strong>, além de inú-<br />

meras pessoas torturadas e desaparecidas.<br />

Essa chacina não é um fato novo. Da<br />

Candelária para Vigário Geral, do<br />

Carandirú para Corumbiara, de Caruaru<br />

para Eldorado do Carajás, sem contar as<br />

centenas de <strong>trabalhadores</strong> assassinad<strong>os</strong><br />

diariamente n<strong>os</strong> grandes centr<strong>os</strong> urban<strong>os</strong>.<br />

Essas chacinas reprimem com extrema<br />

violência a resistência popular contra o<br />

sistema capitalista que exclui a maioria<br />

do povo brasileiro, concentrando renda,<br />

terra e poder nas mã<strong>os</strong> de pouc<strong>os</strong>.<br />

Sempre que acontecem essas<br />

barbáries, o Governo Federal responsa-<br />

biliza descaradamente um ou outro qual-<br />

quer, sem punir ninguém, omitindo-se de<br />

sua própria responsabilidade. A Central<br />

de Moviment<strong>os</strong> Populares (CMP) vem a<br />

público responsabilizar integralmente<br />

Almir Gabriel e Fernando Henrique Car-<br />

d<strong>os</strong>o pelo massacre ocorrido contra <strong>os</strong><br />

Trabalhadores Rurais do Para, exigindo<br />

a realização imediata da Reforma Agrá-<br />

ria, bem como a implementação de polí-<br />

ticas sociais, como o combate a miséria<br />

e a violência urbana<br />

LUTO<br />

pelo arrocho,<br />

desemprego,<br />

impunidad<br />

dignação. A indiferença diante da dor, da<br />

tragédia que alcança hoje milhões de bra-<br />

sileir<strong>os</strong> nas cidades e n<strong>os</strong> camp<strong>os</strong>, abre<br />

caminho para o autoritarismo como for-<br />

ma de governar, ainda que seja mascara-<br />

do pelo charme, pela elegância anstocrá-<br />

tica de Fernando Henrique.<br />

A exigência de punição d<strong>os</strong> culpad<strong>os</strong><br />

se converteu num ritual para apaziguar a<br />

consciàicia d<strong>os</strong> cidadã<strong>os</strong>. Não basta afas-<br />

tar, processar, condenar e prender o ofi-<br />

cial que ordenou o massacre, e <strong>os</strong><br />

soldade<strong>os</strong> que apertaram <strong>os</strong> gatilh<strong>os</strong>. O<br />

responsável número um pelo massacre de<br />

Curionópolis tem nome e endereço co-<br />

nhecid<strong>os</strong>: Fernando Henrique Card<strong>os</strong>o.<br />

E a ele que deve se dirigir a denúncia e a<br />

sentença.<br />

O Partido d<strong>os</strong> Trabalhadores traz o<br />

público sua solidariedade incondicional<br />

<strong>ao</strong> Movimento d<strong>os</strong> Sem Terra, a<strong>os</strong> tra-<br />

balhadores mrais do Pará e a<strong>os</strong> familia-<br />

res das vítimas desse crime hediondo. As<br />

organizações democráticas e populares<br />

não podem se calar diante desse massa-<br />

cre. "Se calarm<strong>os</strong>, as pedras gritarãol"G<br />

A CMP convoca todas (<strong>os</strong>) as (<strong>os</strong>)<br />

militantes do Movimento Popular a se<br />

juntarem às organizações populares na<br />

realização de at<strong>os</strong> de protest<strong>os</strong>, desmas-<br />

carando FHC e sua política neoliberal.<br />

Toda solidariedade <strong>ao</strong> Movimento d<strong>os</strong><br />

Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)<br />

e a<strong>os</strong> familiares da vítimas do massacre<br />

de Eldorado do Carajás! □<br />

LUTA<br />

por aumento<br />

real, estabilidade,<br />

reforma agrária já<br />

Em defesa da Reforma Agrária e Urbana!<br />

CMP - Central de Moviment<strong>os</strong> Populares<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 22 Nacional<br />

Fórum Pela Reforma Agrária e Pela Justiça no Campo - Tocantins<br />

Manifesto pela reforma agrária e<br />

pela justiça no campo<br />

Há no Brasil, atualmente, 585 confli-<br />

t<strong>os</strong> de terra, envolvendo 88.240 familias<br />

acampandas à margem de estradas ou em<br />

terren<strong>os</strong> cedid<strong>os</strong> a titulo precário. No<br />

Tocantins, 55.58% das terras são de gran-<br />

des proprietári<strong>os</strong> acima de mil hectares e<br />

existem mais de 60 conflit<strong>os</strong> de terra en-<br />

volvendo cerca de 3 000 famílias Elas<br />

esperam que o 1NCRA as convoque para<br />

efetuar seu assentamento. Entrento, na<br />

justiça, centenas de process<strong>os</strong> de desa-<br />

propriação de área para assentament<strong>os</strong><br />

aguardam sentença.<br />

Existem também 7 áreas indígenas<br />

habitadas por 5 pov<strong>os</strong> (Apinayé, (Carajá,<br />

Javaé, Krhò e Xerente). O parque indí-<br />

gena do Araguaia (Ilha do Bananal) e a<br />

Área Boto Velho ainda não foram<br />

demarcadas e estão invadidas por fazen-<br />

deir<strong>os</strong>, assim como a terra d<strong>os</strong> Apinayé.<br />

O governo Estadual tem planejado pro-<br />

jet<strong>os</strong> nas Áreas indigenas que<br />

desestruturam a Cultura, diminuem as<br />

terras e saqueiam a natureza.<br />

A realidade brasileira impõe a ado-<br />

Movimento d<strong>os</strong> Sem Terra - MST-11/04/96<br />

ção de um novo padrão de desenvolvi-<br />

mento econômico, democrático, social-<br />

mente justo e ecologicamente equilibra-<br />

do, capaz de incorporar <strong>os</strong> milhões de<br />

excluíd<strong>os</strong> <strong>ao</strong> processo de desenvolvimen-<br />

to e cidadania.<br />

Para isso, impõe também, o fortaleci-<br />

maito da agricultura familiar e a urgente<br />

realização de um amplo programa de Re-<br />

forma Agrána, como parte de uma estra-<br />

tégia visando eliminar a pobreza, a misé-<br />

ria, a fome e a violência crescentes; redu-<br />

zir as imensas desigualdades sociais e re-<br />

gionais; gerai empreg<strong>os</strong> no campo; dimi-<br />

nuir a pressão social sobre as cidades; e<br />

produzir aliment<strong>os</strong> para o abastecimento<br />

do mercado interno. Além disso, as Áreas<br />

Indígenas devem ser demarcadas e retira-<br />

d<strong>os</strong> seus invasores. O Estado deve desai-<br />

volver uma política de apoio e incentivo<br />

a<strong>os</strong> Pov<strong>os</strong> indígenas na área de produção<br />

e comercialização, respeitando <strong>os</strong> us<strong>os</strong> e<br />

c<strong>os</strong>tumes de cada Povo<br />

Podem<strong>os</strong> afirmar que há consenso na<br />

sociedade brasileira quanto a necessida-<br />

de de medidas que combatam as causasda<br />

exclusão, da miséria e da violência no<br />

campo. Este consenso foi expresso nas<br />

prop<strong>os</strong>tas entregues a<strong>os</strong> presidentes d<strong>os</strong><br />

três poderes da República no dia 15 de<br />

setembro de 1995, sem ter resp<strong>os</strong>ta do<br />

que foi feito até o momento.<br />

Reafirmam<strong>os</strong>, neste Manifesto Pela<br />

Reforma Agrária e Pela Justiça no Cam-<br />

po do Tocantins, n<strong>os</strong>sa convicção de que<br />

a realização da Reforma Agrána, no atual<br />

contexto da Nação, passa pela organiza-<br />

ção e mobilização d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> ru-<br />

rais e urban<strong>os</strong>, pela participação de enti-<br />

dades da sociedade civil, pelo<br />

engajamento d<strong>os</strong> partid<strong>os</strong> polític<strong>os</strong> epelo<br />

compromisso do Estado, principalmente<br />

do Governo Federal, de promover ações<br />

que efetivem a Reforma Agrária. G<br />

Reforma Agrária: uma luta de tod<strong>os</strong><br />

CUT/CONTA G/Movimento Sem Ter-<br />

ra-Nacional / FETAET / SJNTET /<br />

CPT/ CIMI / IFAS/MNDH/ CDHC/<br />

CDHP /PT/ PMDB / COMSA ÚDE /<br />

APA-TO/Bispo de Cristalândia IECLB<br />

As entidades de defesa d<strong>os</strong> Direit<strong>os</strong> Human<strong>os</strong><br />

O Movimento d<strong>os</strong> Trabalhadores<br />

Rurais Sem Terra - MST, através desta,<br />

vem, á presença de V. S. informar e soli-<br />

citar v<strong>os</strong>sas manifestações junto <strong>ao</strong> Go-<br />

verno do Estado de Minas Gerais e <strong>ao</strong><br />

Presidente da República, pel<strong>os</strong> fat<strong>os</strong> e<br />

motiv<strong>os</strong> abaixo exp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>.<br />

A Polícia Militar do Estado de Minas<br />

Gerais, que está sob o comando direto<br />

do Governador, criou dois instrument<strong>os</strong><br />

com a finalidade única de atacar <strong>os</strong> Tra-<br />

balhadores Rurais Sem Terra, nas mani-<br />

festações organizadas pelo MST<br />

A utilização destes instrument<strong>os</strong> pela<br />

Polícia Militar fere a dignidade humana.<br />

A Constituição Federal brasileira, em<br />

seu 5 o , inciso lil, assegura que "ninguém<br />

será submetido a tortura nem a tratamento<br />

desumano ou degradante"<br />

Ainda, a Convenção Americana para<br />

Prevenir e Punir a Tortura, assinada em<br />

Cartagena das índias, Colômbia, em 9<br />

de dezembro de 1985, da qual o Brasil é<br />

signatário, em seu artigo I, estabelece que<br />

"Os estad<strong>os</strong> Partes obriga-se à prevenir<br />

e a punir tortura, n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> desta con-<br />

venção O Brasil é um d<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong> Par-<br />

te da Convenção. Ainda, a Convenção<br />

citada, em seu artigo 2. estabelece que<br />

"entender-se-á por tortura todo ato pelo<br />

qual são inflingid<strong>os</strong> intencionalmente a<br />

uma pessoa penas e sofriment<strong>os</strong> físic<strong>os</strong><br />

ou mentais...".<br />

A reforma agrária esta amplamente<br />

garantida pela legislação brasileira, quer<br />

pela Constituição Federal, ait 184 a<br />

191, quer pela legislação ordinária. Lei<br />

complementar n" 76/93, porém, na prá-<br />

tica ela é inexistente. O que falta é von-<br />

tade política<br />

Os trabalhdores rurais sem terra, can-<br />

sad<strong>os</strong> de esperar, estão orgamzando-se e<br />

exigindo seus direit<strong>os</strong>. Através das ma-<br />

nifestações publicas eles querem levar a<strong>os</strong><br />

centr<strong>os</strong> urban<strong>os</strong> suas reivindicações e<br />

sofriment<strong>os</strong>, para pressionar o Governo<br />

na agilização da reforma agrária. O Go-<br />

verno, por sua vez, ignora <strong>os</strong> problemas<br />

d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> rurais sem terra e man-<br />

da a Polícia Militar reprimir as manifes-<br />

tações, inclusive ferindo gravemente vá-<br />

ri<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>.<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

Diante destes fat<strong>os</strong> graves, que aten-<br />

tam contra a dignidade humana, estam<strong>os</strong><br />

solicitando as v<strong>os</strong>sas manifestações exi-<br />

gindo a agilização da reforma agrária e<br />

o fim da utilização d<strong>os</strong> instrument<strong>os</strong><br />

"aruega" e "sapezinho" pela Polícia Mi-<br />

litar do Estado de Minas Gerais por<br />

atentatóri<strong>os</strong> à dignidade do ser humano.<br />

Solicitam<strong>os</strong> ainda, que n<strong>os</strong> seja envi-<br />

ada uma cópia da manifestação, para<br />

n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> arquiv<strong>os</strong>. Agradecid<strong>os</strong> por toda a<br />

atenção que a presente merecer, firmamo-<br />

n<strong>os</strong>, cordialmente.<br />

Setor de Direit<strong>os</strong> Human<strong>os</strong> do MST.<br />

Governo do Estado de Minas Gerais<br />

Eduardo Brandão de Azeredo<br />

Praça da Liberdade<br />

30140-908 - Belo Horizonte - MG<br />

Fax: 00 55 31 230 7501<br />

Presidência da República<br />

Fernando Henrique Card<strong>os</strong>o<br />

Palácio do Planalto<br />

70160-900-Brasília-DF<br />

Fax; 00 55 61 226 7566 □


iíii: íí ííííííiíííííí: '<br />

Quinzena N 0 228 - 30/04/96 23 Economia<br />

Interação - Jan/Fev/Mar/96 - N 0 4<br />

Multinacionais: Elefantes sutis<br />

Dizer que as empresas multinacionais<br />

não são flor que se cheire virou carne de<br />

frango. Mas, como estas empresas são<br />

as forças externas mais poder<strong>os</strong>as - e<br />

avessas a qualquer tipo de controle - es-<br />

tejam onde estiverem, convém, de quan-<br />

do em quando, dar uma espiada naquilo<br />

que estão fazendo<br />

E o que fez o Instituto de Pesquisas<br />

da ONU para o Desenvolvimento Social<br />

em relatório do ano passado.<br />

O texto da ONU afirma que, apesar<br />

da influência e alcance massiv<strong>os</strong> das<br />

empresas transnacionais,<br />

estas pemianecem intocá<br />

veis ante qualquer forma<br />

de regulamentação inter-<br />

nacional, mesmo para ti<br />

instituição reguladora in-<br />

ternacional mais abran-<br />

gente, o GATT.<br />

Este quase anonimato<br />

é muito curi<strong>os</strong>o, dada a<br />

enorme expansão das em-<br />

presas transnacionais n<strong>os</strong><br />

últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong> Pelas con-<br />

tas da ONU, num prazo<br />

de 25 an<strong>os</strong>, o número de<br />

empresas transnacionais<br />

deu um acrobático salto<br />

de mais de cinco vezes<br />

Motors<br />

Indonésio<br />

Dinamarca<br />

Exxon<br />

Noruega<br />

África do Sul<br />

Ford<br />

Turquio<br />

sua altura em 1970: contavam-se, então,<br />

7.000 matrizes; em 1994, estas já eram<br />

37.000, com mais de 200.000 filiais em<br />

todo o mundo.<br />

Entre 1980 e 1992, as vendas das<br />

empresas transnacionais cresceram mais<br />

do que o dobro, indo de US$ 2,4 trilhões<br />

a US$ 5,5 trilhões Para se ter uma idéia<br />

do gigantismo financeiro dessas empre-<br />

sas, basta lembrar que muitas delas são<br />

agora mais poder<strong>os</strong>as que as economias<br />

de muitas nações: o valor das vendas<br />

anuais da General Motors, por exemplo,<br />

é supenor <strong>ao</strong> PI B da Indonésia; o da Sony<br />

eqüivale <strong>ao</strong> PIB do Egito; e o da IBM<br />

supera a soma d<strong>os</strong> PIB do Chile, C<strong>os</strong>ta<br />

Rica e Equador (ver quadro).<br />

O documento da ONU contesta <strong>os</strong><br />

partidári<strong>os</strong> das multinacionais, para quem<br />

tais empresas contribuiriam de forma<br />

substancial <strong>ao</strong> desenvolvimento econômi-<br />

co e social, p<strong>os</strong>to que proporcionariam<br />

emprego, pagariam imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> que podem<br />

ser direcionad<strong>os</strong> a programas sociais,<br />

transfeririam tecnologia, gerariam divi-<br />

sas e ajudariam a construir uma base in-<br />

dustrial em países pobres.<br />

Descontadas algumas atividades filan-<br />

trópicas geralmente oportunistas, até ago-<br />

ra a efetiva contribuição de empresas<br />

transnacionais para beneficiar um maior<br />

número de seres human<strong>os</strong> e promover o<br />

desenvolvimento sustentável tem sido<br />

"modesta e, algumas vezes, claramente<br />

negativa".<br />

Emprego - A idéia de que as empre-<br />

0 PODER DAS EMPRESAS MULTINACIONAIS<br />

Valor total das vendas X PIB (1992)<br />

Empresas/Países (emUS$ bilhões)<br />

132,4<br />

126,4<br />

123,5<br />

115,7<br />

112,9<br />

103,6<br />

100,1<br />

Shol<br />

Polônio<br />

Toyota<br />

Portugal<br />

Venezuela<br />

Malásia<br />

Umlever<br />

Paquistão<br />

94,6<br />

83,8<br />

81,3<br />

79,5<br />

64,5<br />

61,1<br />

57,6<br />

43,7<br />

41,9<br />

N<strong>os</strong>tié<br />

Sony<br />

Egito<br />

Nigéria<br />

As 5 pnmoffas<br />

empresas<br />

Oriente Médio<br />

e África do Norte<br />

Ásia Meridional<br />

África Subsoariana<br />

Fontes: Bonco Mundial: WoHd Developmenl Report 1994, Oxford Unívefsily Press, Nova York, 1944; Unclad, Wald Inveslmenl<br />

Report: Transnational Corporotíons, Employmenl and (fie Wprkploce, Noções Unid<strong>os</strong>, Nova Yorir e Genebra, 1994.<br />

.*Viiiiii'iii' : i-hrítrrri«--iiflnnf«m-ir'nilfiiiiilril'itiiili'ri»i.itil.iii« imn,..,. n . . .«»,<br />

sas transnacionais seriam a mais zelo-<br />

sa mãe do emprego é apresentada como<br />

um tabu pelo relatório da ONU. É ver-<br />

dade que, juntas, elas empregam cerca<br />

de 73 milhões de pessoas, 15 milhões<br />

das quais se encontram n<strong>os</strong> países em<br />

desenvolvimento.<br />

Esse total correponde a 2% ou 3% da<br />

força de trabalho mundial - ou 5%, se<br />

forem levad<strong>os</strong> em conta <strong>os</strong> empreg<strong>os</strong><br />

indiret<strong>os</strong>. Mas, para a ONU, isso é rela-<br />

tivamente pouco, considerando que as<br />

mudanças controlam mais de 33% do<br />

capital produtivo no mundo<br />

Os dad<strong>os</strong> m<strong>os</strong>tram que esta vocação<br />

para a parcimônia na contratação de tra-<br />

balhadores deve pr<strong>os</strong>seguir. No setor<br />

industrial, por exemplo, o emprego em<br />

manufaturas proporcionado pelas<br />

multinacionais norte-americanas n<strong>os</strong><br />

países em desenvolvimento teve um<br />

acréscimo de somente cerca de 60.000<br />

p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> de trabalho desde 1977.<br />

O relativamente baixo nível de em-<br />

prego relacionado às transnacionais<br />

deve-se, principalmente, <strong>ao</strong> fato de que<br />

seus negóci<strong>os</strong> são intensiv<strong>os</strong> em capital.<br />

As companhias c<strong>os</strong>tumam dizer que<br />

estes empreg<strong>os</strong> são bem remunerad<strong>os</strong> e<br />

oferecem condições de trabalho mais<br />

seguras e melhores pacotes de benefíci-<br />

<strong>os</strong>, em comparação com as firmas locais,<br />

tanto n<strong>os</strong> países industrializad<strong>os</strong>, quan-<br />

to naqueles em desenvolvimento.<br />

O que se vê, entretanto, é que as<br />

condições de trabalho nas fábricas das<br />

empresas transnacionais e<br />

38,4<br />

34,4<br />

33,5<br />

29,6<br />

526,1<br />

454,5<br />

297,4<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

269,6<br />

nas de seus fornecedores<br />

são freqüentemente im-<br />

perdoáveis.<br />

E sabido que nas zo-<br />

nas de produt<strong>os</strong> para ex-<br />

portação, por exemplo, o<br />

pessoal das indústrias<br />

têxtil, de aparelh<strong>os</strong> ele-<br />

trônic<strong>os</strong>, de calçad<strong>os</strong> e<br />

de produt<strong>os</strong> esportiv<strong>os</strong><br />

geralmente cumprem<br />

longas jornadas de traba-<br />

lho em condições perigo-<br />

sas, em troca de um sa-<br />

lário muito baixo.<br />

O documento menci-<br />

ona o caso da Indonésia,<br />

onde as mulheres que c<strong>os</strong>turam <strong>os</strong> tênis<br />

para a Reebok trabalham mais de 60<br />

horas por semana por somente US$ 80<br />

por mês - valor aproximado de um par<br />

de tênis da marca.<br />

Muitas companhias alegam que, em<br />

todo caso, <strong>os</strong> piores problemas não estão<br />

em suas fábricas, e sim nas sub-contrata-<br />

das. Para a ONU, a resp<strong>os</strong>ta não é<br />

satisfatória, na medida em que as<br />

transnacionais têm poder suficiente para<br />

exigir que seus fornecedores cumpram<br />

normas mais estritas, não apenas em rela-<br />

ção à qualidade do produto, mas também<br />

<strong>ao</strong> que se refere às condições de trabalho.<br />

Em 1994, em um incêndio numa fá-<br />

brica de brinqued<strong>os</strong> na Tailândia mor-<br />

reram 188 <strong>trabalhadores</strong> que estavam<br />

trancafiad<strong>os</strong> lá dentro. "Os representan-<br />

tes das empresas que visitaram esta fá-<br />

brica para comprar seus brinqued<strong>os</strong> di-<br />

ficilmente podem alegar que não tive-<br />

ram responsabilidade no caso".


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 24 Economia<br />

Tecnologia - Outro fator que c<strong>os</strong>tu-<br />

ma ser brandido em favor das empre-<br />

sas transnacionais diz respeito à trans-<br />

ferência de tecnologia <strong>ao</strong> pais anfitrião<br />

mediante a importação de equipamen-<br />

t<strong>os</strong> modern<strong>os</strong> ou pela introdução de<br />

idéias novas na produção e no desenho<br />

de produt<strong>os</strong>.<br />

As empresas transnacionais teriam<br />

o mérito de ajudar a capacitar a força<br />

de trabalho local na melhoria d<strong>os</strong> mé-<br />

tod<strong>os</strong> de administração de empresas, de<br />

mercado e de controle de qualidade,<br />

assim como de fortalecer a capacidade<br />

de pesquisa e de desenvolvimento do<br />

país anfitrião<br />

"Na prática, seus resultad<strong>os</strong> têm sido<br />

ambivalentes". Para começo de conver-<br />

sa, a maioria das multinacionais empre-<br />

ga relativamente pouco pessoal nacio-<br />

nal em p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> importantes, de maneira<br />

que lhes transfere somente um mínimo<br />

de sua experiência em administração.<br />

Já a pesquisa e o desenvolvimento<br />

podem ter também um efeito limitado:<br />

as empresas estrangeiras só levam a cabo<br />

uma pequaia fração de suas tarefas de<br />

pesquisa n<strong>os</strong> países em desenvolvimento<br />

- na maiona d<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>, trata-se de adap-<br />

tação de tecnologia já existente ás condi-<br />

ções locais, ou seja, a capacitação da po-<br />

pulação nativa é de pequeno alcance.<br />

Saúde - A ONU alerta para que, se<br />

as multinacionais não ajudam muito <strong>os</strong><br />

países em desenvolvimento, poderiam<br />

pelo men<strong>os</strong> não atrapalhá-l<strong>os</strong>. Mas é o<br />

que fazem, e seriamente, no que tange á<br />

saúde das pessoas.<br />

As companhias farmacêuticas, por<br />

exemplo, continuam vendendo a<strong>os</strong> pa-<br />

íses em desenvolvimento produt<strong>os</strong> que<br />

foram proibid<strong>os</strong> em seus própri<strong>os</strong> paí-<br />

ses, apesar das inúmeras denúncias e<br />

campanhas internacionais contrárias a<br />

isso. A companhia Sterling-Winthrop,<br />

com matriz n<strong>os</strong> EUA, por exemplo,<br />

vende a 20 países em desenvolvimento<br />

a droga dypyrona - proibida em outr<strong>os</strong><br />

23 países<br />

Mesmo que as drogas sejam efetivas<br />

quando usadas adequadamente, bulas<br />

deficientes podem acarretar perig<strong>os</strong> para<br />

a saúde d<strong>os</strong> consumidores: recente estu-<br />

do mencionado pelo relatório da ONU<br />

verificou que dois terç<strong>os</strong> d<strong>os</strong> 241 pro-<br />

dut<strong>os</strong> farmacêutic<strong>os</strong> manufaturad<strong>os</strong> por<br />

transnacionais sediadas n<strong>os</strong> EUA e que<br />

são vendid<strong>os</strong> a<strong>os</strong> países em desenvolvi-<br />

mento apresentam graves deficiências<br />

dessa natureza, deixando de proporcio-<br />

nar a<strong>os</strong> médic<strong>os</strong> a informação necessá-<br />

ria para que p<strong>os</strong>sam prescrever a droga<br />

de forma segura e efetiva.<br />

Os pesticidas são outra fonte de gra-<br />

ves risc<strong>os</strong> para a saúde. Vinte e cinco<br />

por cento de tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> pesticidas que as<br />

empresas transnacionais norte-america-<br />

nas exportaram em fins d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> 80 con-<br />

tinham substâncias químicas que havi-<br />

am sido proibidas, restringidas ou reti-<br />

radas de venda n<strong>os</strong> EUA.<br />

Estes pesticidas prejudicam não ape-<br />

nas <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> rurais que têm de<br />

manejá-l<strong>os</strong>, como também consumido-<br />

res n<strong>os</strong> própri<strong>os</strong> países produtores des-<br />

tas substâncias, através do chamado "cir-<br />

cuito do envenenamento".<br />

Ao expor as entranhas das<br />

multinacionais, a ONU repõe na pauta<br />

de discussão a necessidade de se estabe-<br />

lecer um código internacional de con-<br />

duta para estas empresas - projeto, aliás,<br />

cultivado naquela organização desde <strong>os</strong><br />

an<strong>os</strong> 70, mas abortado em 1992. O<br />

Jornal d<strong>os</strong> Economistas/RJ - Fev/96 - N 0 82<br />

O longo Século XX: estará perto do fim o<br />

atual regime de acumulação ?<br />

Que forças devem precipitar O fim (Io<br />

atual regime de acumulação em escala<br />

mundial? E quando isso deverá ocorrer,<br />

fazendo com (pie o "século americano "<br />

- o longo século XX, como ele descrwe<br />

- chegue <strong>ao</strong> fim? Conseguirá a nação<br />

mais endividada do mundo manter-se<br />

como primeira potência? O Japão terá<br />

fôlego para liderar uma reorganização<br />

global de poder? Quais são as vias de<br />

desenvolvimento alternativo <strong>ao</strong> alcance<br />

da economia mundial?<br />

Nesta entrevista <strong>ao</strong> Jornal d<strong>os</strong> Eco-<br />

nomistas, e mais ainda em seu livro, o<br />

italiano Giovanni Arrig/ti comenta es-<br />

ses e outr<strong>os</strong> temas.<br />

Jornal d<strong>os</strong> Economistas - O Sr pode<br />

n<strong>os</strong> dar uma rápida idéia de sua trajetó-<br />

ria intelectual: 1 Em que linhas de pes-<br />

quisa você traballhou e como O Longo<br />

Século XX se insere nessa trajetória'.'<br />

Giovanni Arrighi - Formei-me em<br />

economia , na Umversitá Boccom, em<br />

Milão. Em 1963, comecei a ensinar eco-<br />

nomia, primeiro no Znnbabwe, depois<br />

na Tanzânia, onde minhas pesquisas<br />

enfocavam a relação enitre <strong>os</strong> proces-<br />

s<strong>os</strong> de descolonização e o desenvolvi-<br />

mento. Voltei á Itália em 1969 e come-<br />

cei a transitar profissionalmente da eco-<br />

nomia para a sociologia Minhas pesqui-<br />

sas voltaram-se para <strong>os</strong> moviment<strong>os</strong> so-<br />

ciais diante da crise econômica mundi-<br />

al. Finalmente, em 1979, ingressei no<br />

Departamento de Sociologia e no<br />

Fernand Braudel Center, na State<br />

University of New York. Binghamton,<br />

onde meu interesse anterior em proces-<br />

s<strong>os</strong> de desenvolvimento, moviment<strong>os</strong><br />

sociais e crises foi retomado, agora na<br />

perspectiva do sistema mundial, da qual<br />

Immanuel Wallerstein foi pioneiro. Mi-<br />

nha evolução intelectual no longo desse<br />

percurso profissional e residencial pode<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

ser descrita como uma transição, atra-<br />

vés da economia política, da economia<br />

para a análise do sistema mundial. O<br />

Longo Século XX é um trabalho sobre a<br />

economia política do moderno sistema<br />

mundial, enfocando o processo da cnse<br />

capitalista.<br />

JE - O sr. menciona, como fontes de<br />

inspiração, divers<strong>os</strong> clássic<strong>os</strong> do pensa-<br />

mento social, particularmente Marx,<br />

Weber, Schumpeter e Braudel. Como o<br />

sr. combina as respectivas abordagens?<br />

Que conceit<strong>os</strong> toma de cada um e como<br />

organiza teoricamente esse material' 7 Em<br />

outras palavras, em que moldura teórica<br />

o ser. move? Seu livro contém idéias e<br />

prop<strong>os</strong>ições brilhantes, mas pode se re-<br />

conhecer nele um arcabouço teórico con-<br />

sistente?<br />

Arrighi - Minha principal fonte de<br />

inspiração em O longo século XX foi a<br />

observação de Braudel, de que as expan-


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 25<br />

soes financeiras são um fenômeno re<br />

corrente no capitalismo mundial, desde<br />

seus primórdi<strong>os</strong>, na Europa do fim da<br />

Idade Média, até o presente. Braudel<br />

considera esse fenômeno recorrente<br />

como um sinal de maturidade das gran-<br />

des expansões capitalistas mundial. No<br />

entanto, ele não desenvolve: primeiro,<br />

porque todas as grandes expansões da<br />

produção e do comércio capitalista de-<br />

sembocam num exapnsão financeira; e<br />

segundo, como as expansões financei-<br />

ras criam as condições para uma nova<br />

rodada, ampliada, de expansão de expan-<br />

são da produção e do comércio mundi-<br />

al. Buscando estabelecer uma teoria para<br />

a sucessão desses "cicl<strong>os</strong> sistêmic<strong>os</strong> de<br />

acumulação", sempre aumentad<strong>os</strong> em<br />

escala e escopo, eu busquei inspiração<br />

na teoria de Adam Smith da queda na<br />

taxa de lucro, na teoria de Marx do au-<br />

mento da concentração e da centraliza-<br />

ção do capital, e na idéia de Weber de<br />

que a competição interestatal pelo capi-<br />

tal circulante foi a força decisiva na for-<br />

mação e exapansão do capitalismo mo-<br />

derno. Ao invés de tratar essas três pro-<br />

p<strong>os</strong>ições como incompativeis entre si, eu<br />

procurei combiná-las numa moldura te-<br />

órica única, capaz de prover uma expli-<br />

cação plausível para o padrão que<br />

Braudel identificaria.<br />

JE - Ainda sobre a questão das influ-<br />

ências, seu livro tem como sub-titulo<br />

"Dinheiro, poder e as origens da n<strong>os</strong>sa<br />

época". O epilogo vem sob a forma de<br />

uma pergunta: "Pode o capitalismo so-<br />

breviver <strong>ao</strong> sucesso? O sub-título lem-<br />

bra Polanyi, o epilogo lembra<br />

Schumpeter. Como o sr. situaria sua in-<br />

terpretação do desenvolvimento capita-<br />

lista, tendo como referência a obra des-<br />

ses dois autores?<br />

Arrighi - Schumpeter e Polanyi fo-<br />

ram para mim fontes de inspiração tão<br />

importantes como Smith, Marx e Weber.<br />

Com Schumpeter, aprendi a ver o capi-<br />

talismo como um fenômeno fundamen-<br />

talmente instável, que só pode pr<strong>os</strong>pe-<br />

rar através de um processo marcado pela<br />

destruição criadora, e cuja vitalidade é<br />

minada tanto pelo sucesso quanto pelo<br />

fracasso. De Polanyi, retive a idéia de<br />

que o mercado auto-regulador é um mito,<br />

uma utopia. Ele inevitavelmente aciona,<br />

de forma progressiva, a tendência de<br />

auto-proteção da sociedade - o que in-<br />

clui a auto-proteção das próprias empre-<br />

sas. Assim como ocorreram com Smith,<br />

Marx e Weber, compreendi essas propo-<br />

sições teóricas como tijol<strong>os</strong> complemai-<br />

tares e igualmaite necessári<strong>os</strong> para com-<br />

preaider a dinâmica d<strong>os</strong> cicl<strong>os</strong> sistêmic<strong>os</strong><br />

de acumulação em geral - e para a dinâ-<br />

mica do ciclo atual, em particular.<br />

JE - Como o ser. comparana sua abor-<br />

dagem com a que foi feita por Eric<br />

Hobsbawn em O breve século XX? Quais<br />

as principais diferenças aitre <strong>os</strong> metid<strong>os</strong><br />

de análises e as conclusões d<strong>os</strong> dois livr<strong>os</strong>?<br />

Arrighi - O "breve século XX" de<br />

Hobsbawn define-se pela (e se propõe a<br />

destacar a) ascensão e queda do poder<br />

soviético na política mundial. O meu<br />

"Longo Século XX" define-se pela (e se<br />

propõe a destacar a) ascensão e queda,<br />

esta ainda em curso, da hegemonia ame-<br />

ricana no mundo e do ciclo sistêmico de<br />

acumulação liderado pel<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong> Uni-<br />

d<strong>os</strong>. Não há uma contradição fundamen-<br />

tal entre as duas abordagens. Elas<br />

enfocam a mesma época a partir de ân-<br />

gul<strong>os</strong> diferentes e, por isso, vêem coisas<br />

diferaites. Uma vê o "tempo curso", ou-<br />

tra o "tempo longo". Uma vê a queda da<br />

União Soviética como o fenômaio cai-<br />

tral da n<strong>os</strong>sa época; outra atribui essa<br />

caitralidade á ascaição do Leste da Ásia.<br />

JE - O sr. pode n<strong>os</strong> esclarecer um<br />

pouco mais sobre o conceito de "cicl<strong>os</strong><br />

sistêmic<strong>os</strong> de acumulação"? Por que eles<br />

são sistêmic<strong>os</strong>, e que lugar ocupam ne-<br />

les a acumulação produtiva e a financei-<br />

ra? Qual o papel das instituições políti-<br />

cas nessa dinâmica?<br />

Arrighi - Os cicl<strong>os</strong> sistêmic<strong>os</strong> de<br />

acumulação se definem pela alternância<br />

de fases de expansão material e de ex-<br />

pansão financeira, identificadas por<br />

Braudel. Eles são "sistêmic<strong>os</strong>" porque<br />

se referem a process<strong>os</strong> de acumulação<br />

de capital que ocorrem no nível do sis-<br />

tema mundial, e não no nível uma uni-<br />

dade qualquer desse sistema. Eles são<br />

"cicl<strong>os</strong>" porque começam e terminam<br />

com uma expansão financeira, cada uma<br />

delas sendo de maior escala e escopo que<br />

a precedente, como na fórmula geral de<br />

Marx (DMD 1 ). A expansão da produção<br />

e do comércio mundial, que ocorre na<br />

fase DM do ciclo, é simplesmente o meio<br />

que serve a um fim: o aumento da capa-<br />

cidade de comando do capital sobre as<br />

pessoas e <strong>os</strong> bens naturais. Historica-<br />

mente, o papel das instituições de go-<br />

verno na promoção e sustentação de cada<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

::::::W:W;;::;:;:;:;:;:;w;^<br />

Economia<br />

ciclo foi mais importante do que o papel<br />

das próprias instituições empresariais em<br />

si mesmas, embora as instituições go-<br />

vernamentais que lideram cada ciclo<br />

sempre tenham atuado em cooperação<br />

com um conjunto particular de institui-<br />

ções empresariais.<br />

JE - Na conclusão do livro, o sr. diz:<br />

"Cedo ou tardfe, (o processo) está fada-<br />

do a atingir uma etapa em que a crise da<br />

superacumulação não consegue criar um<br />

agente suficientemente poder<strong>os</strong>o para<br />

recompor o sistema em bases maiores e<br />

mais. amplas"p. 342). Não há aí um cer-<br />

to fatalismo a respeito d<strong>os</strong> limites do<br />

capitalismo? A expressão "cedo ou tar-<br />

de" não é vaga demais? O sr. aceitaria a<br />

idéia de que, neste ponto, sua reflexão é<br />

especulativa?<br />

Arrighi - A frase citada deve ser lida<br />

junto com a que se segue a ela no livro:<br />

"Ou então, quando ele o faz, o agente<br />

que emerge da crise pode ser tão pode-<br />

r<strong>os</strong><strong>os</strong> que põe fim á competição<br />

interestatal pelo capital circulante, que,<br />

desde o século XV, nas palavras de<br />

Weber, "tem criado as maiores oportu-<br />

nidades para o capitalismo ocidental<br />

moderno". Vistas em conjunto, ambas<br />

as frases apontam para uma contradição<br />

fundamental entre as duas condições em<br />

que se baseou desde longo tempo a<br />

recorrência d<strong>os</strong> cicl<strong>os</strong> sistêmic<strong>os</strong> de acu-<br />

mulação com aumento de escala e de<br />

escopo - de um lado, um aumento no<br />

poder do complexo empresarial d<strong>os</strong> go-<br />

vern<strong>os</strong> que lideraram cada ciclo (o com-<br />

plexo americano em relação <strong>ao</strong> britâni-<br />

co, o britânico em relação <strong>ao</strong> holandês,<br />

o holandês em relação <strong>ao</strong> genovês-ibé-<br />

rico) e, de outro, o equilíbrio de poder<br />

na qual a competição interestatal pelo<br />

capital se baseou. E lógico que a primeira<br />

condição não pode ser indefinidamente<br />

reproduzida sem minar a segunda. A<br />

expressão "cedo ou tarde" simplesmen-<br />

te aponta para esse limite lógico do pro-<br />

cesso descrito no livro. A expressão é<br />

vaga, porque podem<strong>os</strong> não ter atingido<br />

o limite - uma questão que o Epílogo<br />

deixa prop<strong>os</strong>ítalmente em aberto. Mas<br />

pouca dúvida pode haver de que estam<strong>os</strong><br />

perto do limite. Se já não está prestes a<br />

ser atingido, certamente o será no fim<br />

do próximo ciclo.<br />

JE - O sr. g<strong>os</strong>taria de dizer algo mais<br />

especifico para <strong>os</strong> leitores brasileir<strong>os</strong> de<br />

seu livro?


! Wí íííííííííííííííííSíííííí mmmm i:<br />

Quinzena N 0 228 - 30/04/96 26 Economia<br />

Arrighi - Eu g<strong>os</strong>taria de estimular<br />

<strong>os</strong> leitores brasileir<strong>os</strong> a investigar que<br />

novidades a interpretação do capitalis-<br />

mo mundial propsta no livro traz para<br />

que se compreenda a história do Brasil.<br />

Dada a importância do Brasil como uma<br />

formação social periférica, ou semi-pe-<br />

riférica, da economia capitalista mun<br />

Anállw Samanal de Conjuntura Econàn Ica -13de Maio - NEP-04 a 11/04/96<br />

dial em, pelo men<strong>os</strong>, três d<strong>os</strong> quatro<br />

cicl<strong>os</strong> descrit<strong>os</strong> no livro, uma<br />

reinterpretação desses cicl<strong>os</strong> a partir de<br />

uma perspectiva brasileira seria uma<br />

contribuição importante para que p<strong>os</strong>-<br />

sam<strong>os</strong> compreender melhor <strong>os</strong> própri-<br />

<strong>os</strong> cicl<strong>os</strong>. Além disso, eu g<strong>os</strong>taria de<br />

estimular <strong>os</strong> brasileir<strong>os</strong> a moiblizar as<br />

O mundo gira (IX)<br />

dádivas de sua geografia e as heranças<br />

de sua história (tamanho, localização,<br />

abundância de recurs<strong>os</strong> naturais, heran-<br />

ça multicultural) para buscar novas<br />

formas de cooperação transnacional<br />

capaz de ultrapassar <strong>os</strong> aspect<strong>os</strong> mais<br />

destrutiv<strong>os</strong> da emergência do sistema<br />

mundial pós-modemo, □<br />

A doutrina moral d<strong>os</strong> capitalistas é do tamanho de<br />

Cingapura, um paraíso de mercadorias sem território, sem<br />

máquinas e sem trabalho<br />

O grupo das sete maiores economias<br />

do mundo (G-7) fez uma reunião de cú-<br />

pula na França, para discutirem saídas<br />

para o desemprego mundial. Como era<br />

previsível, não se chegou a nenhuma<br />

prop<strong>os</strong>ta concreta para o problema. "A<br />

reunião do Grupo d<strong>os</strong> Sete - França, Ale-<br />

manha, Grã-Bretanha, Estad<strong>os</strong> Unid<strong>os</strong>,<br />

Itália, Japão e Canadá - terminou ontem,<br />

sem que <strong>os</strong> ministr<strong>os</strong> da Economia e do<br />

Trabalho, que participaram da conferên-<br />

cia em busca de uma solução para o de-<br />

semprego e de estabelecer normas bási-<br />

cas de trabalho em todo o mundo, defi-<br />

nissem, na declaração final, prop<strong>os</strong>tas<br />

concretas sobre <strong>os</strong> níveis mínim<strong>os</strong> de<br />

condições de trabalho, segurança no<br />

emprego e benefíci<strong>os</strong> sociais". O Esta-<br />

do de S. Paulo, 3/04/96.<br />

Não foram capazes de dizer qualquer<br />

coisa sobre a chamada cláusula social,<br />

que trata do trabalho de crianças, de pri-<br />

sioneir<strong>os</strong> e do massacre de mulheres nas<br />

linhas de produção. N<strong>os</strong>so sempre pre-<br />

sente Robert Reich, secretário do Tra-<br />

balho d<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong> Unid<strong>os</strong>, estava lá.<br />

Declarou apenas que é necessário man-<br />

ter um "enfoque pragmático" em rela-<br />

ção a países que não respeitam <strong>os</strong> direi-<br />

t<strong>os</strong> d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>. Quer dizer, é me-<br />

lhor não mexer em coisas que são fonte<br />

de ocean<strong>os</strong> de lucro para o capital<br />

mundializado.<br />

Como já vim<strong>os</strong> anteriormente, Riech<br />

sabe perfeitamente que no seu próprio<br />

país a livre exploração de tailandeses,<br />

mexican<strong>os</strong>, etc, é fundamental para man-<br />

ter funcionando aquela economia de<br />

ponta do sistema. Se existisse verdadei-<br />

ramente respeito a<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> d<strong>os</strong> traba-<br />

J<strong>os</strong>i Maiiim<br />

lhadores em geral n<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong> Unid<strong>os</strong>, há<br />

muio tempo o capital já teria desabado<br />

naquela economia. Os japoneses, por seu<br />

lado, sabem que sem as "duras condições"<br />

trabalhistas das mulheres, também no país<br />

o capital não se sustaitaria: as mulheres<br />

representam no Japão 40% da mão-de-<br />

obra e recebem men<strong>os</strong> da metade d<strong>os</strong> sa-<br />

lári<strong>os</strong> d<strong>os</strong> homens. São condições que se<br />

alastram por todo o G-7 e seria realmente<br />

uma falta total de "pragmatismo" destes<br />

saihores, reunid<strong>os</strong> em Lille, França, con-<br />

denar o resto do mundo por práticas que<br />

eles mesm<strong>os</strong> não são capazes de conter n<strong>os</strong><br />

seus própri<strong>os</strong> países.<br />

Por isso, eles são obrigad<strong>os</strong> a assu-<br />

mir publicamente suas verdadeiras con-<br />

vicções, deixando de lado a p<strong>os</strong>tura de-<br />

magógica d<strong>os</strong> benemérit<strong>os</strong> sociais e irem<br />

direto <strong>ao</strong> que interessa <strong>ao</strong> capital. O<br />

melhor, então, é apelar para que as coi-<br />

sas talhara seu livre curso, não atrapa-<br />

lhando aquilo que faz parte da ordem<br />

natural do mercado mundial. "No comu-<br />

nicado, o G-7 reafirma seu compromis-<br />

so com a estratégia de abertura comer-<br />

cial, além de apelar a<strong>os</strong> ministr<strong>os</strong> que<br />

mantenham seu apoio <strong>ao</strong> livre comércio,<br />

durante a reunião da Organização Mun-<br />

dial do Comércio (OMC), marcada para<br />

Cingapura" O Estado de S. Paulo, idem).<br />

Não é por acaso que a próxima reu-<br />

nião da OMC será realizada em<br />

Cingapura. Esta antiga feira asiática de<br />

pimenta-do-reino é o modelo de livre<br />

comércio que <strong>os</strong> países imperialistas<br />

querem m<strong>os</strong>trar às burguesias d<strong>os</strong> paí-<br />

ses dominad<strong>os</strong>. Cingapura tem uma po-<br />

pulação de 2,8 milhões de habitantes<br />

(men<strong>os</strong> do que a da zona leste da cidade<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

de São Paulo). E 100% da sua popula-<br />

ção se encontra, evidentemente, na área<br />

urbana, mesmo porque lá não existe área<br />

airal. Cingapura não passa de uma zona<br />

livre. Por isso, ela consegue apresentar<br />

anualmente estatísticas como Produto<br />

Interno Bruto de US$ 55,1 bilhões, im-<br />

portações de US$ 85,2 bilhões e expor-<br />

tações de US$ 74,0 bilhões! É um belo<br />

exemplo de milagre de livre comércio;<br />

em 1993, conseguiu a proeza de "pro-<br />

duzir" US$ 13,56 bilhões e exportar US$<br />

63 bilhões de produt<strong>os</strong> industrializad<strong>os</strong>!<br />

Cingapura acumula reservas internacio-<br />

nais de USS 48,3 bilhões e a sua taxa de<br />

inflação anual não passa 2,5%. Modelo<br />

perfeito, também, agora para orientar as<br />

políticas econômicas daquelas que são<br />

conhecidas tecnocraticamente como<br />

"economias emergentes".<br />

Só duas "economias" no mundo con-<br />

seguem estes esdrúxul<strong>os</strong> resultad<strong>os</strong> eco-<br />

nômic<strong>os</strong>: Cingapura e Hong-Kong. Etano<br />

uma quanto a outra não têm território,<br />

população, nem produção propriamente<br />

dita. Por isso, representam a utopia reali-<br />

zada do livre Comércio, cultuada e im-<br />

p<strong>os</strong>ta pelo sistema imperialista às econo-<br />

mias dominadas do mercado mundial,<br />

onde o que não falta é terra, população<br />

trabalhadora e produção de capital.<br />

Os capitalistas imaginam o mundo como<br />

uma imensa Cingapura. E o que se pode<br />

verificar é que, na busca daquela imagem<br />

perfeita de livre comércio, construída pda<br />

sabedoria do G-7, estão se processando rá-<br />

pidas mudanças populacionais e produtivas<br />

nas chamadas "economias emergentes",<br />

onde se concentra a produção de 85% da<br />

população mundial.


'.■,•,•.■,';•,•,•,•,•;•,•,•,•;•,',■,•;',•;■;■;■:■;';':■;■;■<br />

Quinzena N° 228 - 30/04/96<br />

íífí íííífí; ííxmíiííííííií: im<br />

27 Economia<br />

Área, população e produção na Economia Mundial - total e<br />

grup<strong>os</strong> de economias relacionadas (1993)<br />

Mundo/ gnpo de<br />

paiws<br />

Território<br />

(mllKm2)<br />

% do Total População<br />

(aiibôes)<br />

«do Total Produto<br />

NadQMl<br />

BmfaKPNB)<br />

US$ milhões<br />

«do Total<br />

Mundo<br />

Grupo d<strong>os</strong> 7 Pabc*<br />

Ric<strong>os</strong> (G7)<br />

(Estad<strong>os</strong> Unid<strong>os</strong>,<br />

133.690 100 5.501 100 23.112 100<br />

Japão. Alemanha,<br />

França, Itália, Inglaterra,<br />

Canadá)<br />

21.618 16 662 12 15.924 69<br />

Grupo d<strong>os</strong> 7 Paiscs<br />

Pobres (g7)<br />

(China,<br />

índia, Rússia,<br />

Brasil,Indonésia,<br />

Méuco,Àfnca do<br />

Sul)<br />

43.520 32 2.736 49 2.015 9<br />

Resto do Mundo 68.552 52 2.103 39 5.083 22<br />

Fonte: Banco Mundial "World Development Report 1.996", Washington, USA, 1996.<br />

Os númer<strong>os</strong> acima estão listad<strong>os</strong><br />

de acordo com áreas e grup<strong>os</strong> de eco-<br />

nomias que dão a verdadeira dinâmi-<br />

ca da globalização capitalista. A soma<br />

de Grupo d<strong>os</strong> Sete Ric<strong>os</strong> (G-7) e do<br />

Grupo d<strong>os</strong> Sete Pobres (g-7) repre-<br />

senta a metade do território mundial,<br />

mais de 60% da população e quase<br />

80% da produção. O mais importante<br />

é que, tanto as economias do G-7<br />

quanto aquelas selecionadas po nós<br />

para compor <strong>os</strong> g-7 d<strong>os</strong> pobres,<br />

Divida Externa - PEDEX - 09/04/96<br />

determinam também a dinâmica de<br />

acumulação e crise das demais econo-<br />

mias que se espalham pelas suas res-<br />

pectivas áreas geo-econômicas mundi-<br />

ais. Quanto <strong>ao</strong> g-7, em particular, te-<br />

m<strong>os</strong> a China dando o ritmo para a Ásia<br />

Oriental e Pacífico; a índia e Indonésia<br />

para a Ásia Meridional; a Rússia para a<br />

Europa do Leste e Ásia Central; a Áfri-<br />

ca do Sul para a África Subaasariana;<br />

finalmente. Brasil e México para a<br />

América Latina e Caribe.<br />

O que salta á primeira vista é uma<br />

clara desproporção entre <strong>os</strong> dois gru-<br />

p<strong>os</strong>. O G-7 ocupa apaias 16% do terri-<br />

tório, 12% da população e, no entanto,<br />

concentra quase 70% da produção mun-<br />

dial. O g-7 é o outro lado da moeda:<br />

32% do território, metade da popula-<br />

ção e men<strong>os</strong> de 10% da produção glo-<br />

bal. E na combinação desta desigual-<br />

dade que se desenvolve também uma<br />

característica ampliação da força de tra-<br />

balho mundial. G<br />

Você sabia que... Dívida social do Brasil<br />

chega a R$ 80 bilhões<br />

A maior dívida social encontra-se na<br />

área habitacional: o déficit de moradias<br />

atualmente é calculado em 6,4 milhões<br />

de unidades. Acrescenta-se o acesso a<br />

serviç<strong>os</strong> de saneamento também precá-<br />

rio. Cerca de 4,2 milhões de moradias<br />

brasileiras não contam com água<br />

encanada e outras 8,9 milhões não têm<br />

ligação á rede de esgoto ou f<strong>os</strong>sa séptica.<br />

Para cobrir o déficit habitacional são<br />

necessári<strong>os</strong> investiment<strong>os</strong> de R$ 50,7<br />

bilhões. Para canalização de água nas<br />

moradias desabastecidas são necessári-<br />

<strong>os</strong> R$ 25 bilhões, incluindo recurs<strong>os</strong> para<br />

canalização de esgot<strong>os</strong>.<br />

Outro déficit grave é o da coleta de<br />

lixo. Segundo o último censo, apenas<br />

63% d<strong>os</strong> domicíli<strong>os</strong> brasileir<strong>os</strong> conta-<br />

vam com coleta de lixo.<br />

Nas cidades, esse serviço atinge a<br />

80% do total de moradias. Após a cole-<br />

ta, cerca de 47% do lixo recolhido é jo-<br />

gado a céu aberto. Outr<strong>os</strong> 45% são ater-<br />

rad<strong>os</strong> e apenas 5% recebem tratamento<br />

em usina. Nas regiões Norte e Nordeste,<br />

cerca de 90% do lixo é jogado a céu aber-<br />

to ou em áreas alagadas.<br />

Apesar de uma dívida social alta, <strong>os</strong><br />

investiment<strong>os</strong> para cobrir esses déficits<br />

minguaram n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong>. Paralela-<br />

mente, cresceram <strong>os</strong> pagament<strong>os</strong> de ju-<br />

r<strong>os</strong> e serviç<strong>os</strong> das dívidas, além d<strong>os</strong> pa-<br />

gament<strong>os</strong> do principal. Nunca o Brasil<br />

pagou tanto como n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong>, des-<br />

de que Fernando Henrique Card<strong>os</strong>o tor-<br />

nou-se ministro da Fazenda e se elegeu<br />

presidente. São mais de R$ 20 bilhões<br />

anuais só para pagamento de jur<strong>os</strong> e<br />

'SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

serviç<strong>os</strong> <strong>ao</strong> Primeiro Mundo a cada ano.<br />

E a dívida externa promete aumentar<br />

mais do que nunca. A meta do governo<br />

é chegar a<strong>os</strong> US$ 170 bilhões n o an<strong>os</strong><br />

2.000, de acordo com o anunciado Pla-<br />

no Plurianual.<br />

O primeiro ano de governo FHC<br />

m<strong>os</strong>tra que esses recurs<strong>os</strong> não serão des-<br />

tinad<strong>os</strong> a sanear a dívida social com o<br />

povo brasileiro. Mas irão tapar <strong>os</strong> bura-<br />

c<strong>os</strong> do sistema financeiro.


Quinzena N° 228 - 30/04/96 28<br />

Tempo e presença - Jan/Fev/96 - N 0 285<br />

Mudou o país ou mudam<strong>os</strong> nós?<br />

Para se entender a sociedade brasi-<br />

leira n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong> é preciso levar<br />

em conta <strong>os</strong> divers<strong>os</strong> ajustes neoliberais<br />

que lhe têm sido imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>. Para não<br />

falar em crise da sociedade o<br />

<strong>neoliberalismo</strong> centra seu fogo na cri-<br />

se do Estado. Uma análise perspicaz da<br />

atual conjuntura brasileira é apresen-<br />

tada neste artigo.<br />

O país mudou com o Plano Real. Ou<br />

melhor, o Pais vem mudando <strong>ao</strong> longo<br />

d<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> sete an<strong>os</strong>, desde que a pri-<br />

meira versão de um plano de ajuste fis-<br />

cal de caráter neoliberal - com o "feijão-<br />

com-arroz" de Maílson da Nóbrega - foi<br />

colocado em prática. As sociedades<br />

mudam primeiro na cabeça d<strong>os</strong> homens,<br />

isto é, quando se constituem nov<strong>os</strong> con-<br />

sens<strong>os</strong>, quando nov<strong>os</strong> valores passam a<br />

comandar a forma das pessoas pensarem<br />

o mundo e, depois, apoiado neles, são<br />

transformadas as sociedades.<br />

Novo modelo hegemônico. O<br />

<strong>neoliberalismo</strong> foi-se impondo em escala<br />

mundial, conforme o capitalismo foi per-<br />

dendo o ímpedto que havia propnciado<br />

seu ciclo de maior crescimento econô-<br />

mico - no segundo pós-guerra, seu mo-<br />

mento de maior crescimento na sua his-<br />

tória, com um Estado regulador. Foi a<br />

partir dali que diagnóstic<strong>os</strong> como o que<br />

toma o Estado e a regulação social res-<br />

ponsáveis pela crise da economia e da<br />

sociedade, em govern<strong>os</strong> de extrema di-<br />

reita clássica - Pinochet ou Reagan e<br />

Thatcher -, depois na social-democracia<br />

européia - Miterrand e Felipe Gonzalez<br />

- até retomar á América Latina, via Par-<br />

tido Revolucionário Institucional (PRI),<br />

peronismo, Ação Democrática (AD) da<br />

Venezuela, Partido da Social-Democra-<br />

cia Brasileira (PSDB), tod<strong>os</strong> membr<strong>os</strong><br />

da Internacional Socialista.<br />

Foi a partir dai que se pôs em prática<br />

um processo de transformações sociais<br />

sob a égide desse tipo de diagnóstico.<br />

Seu norte - ou melhor, seu desejo - esta-<br />

va mais bem expresso na frase otimista<br />

de Thatcher: "Não mais sociedade, ape-<br />

nas indivídu<strong>os</strong>", retomando a utopia li-<br />

beral do século XVIII, que busca recons-<br />

truir as relações sociais estritamente<br />

norteadas pelo mercado.<br />

Emir Sader<br />

O certo é que as sociedades foram<br />

transformadas à luz d<strong>os</strong> ajustes fiscais<br />

neoliberais. Não se pode mais partir do<br />

mesmo diagnóstico de antes deles. Não<br />

que eles representem um ano-zero de<br />

n<strong>os</strong>sas sociedades. Os problemas de fun-<br />

do não apenas continuam <strong>os</strong> mesmo,<br />

como se aprofundaram. E que a eles se<br />

somaram outr<strong>os</strong>. E, além disso, é preci-<br />

so partir de outro tipo de entendimento<br />

que a maior parte das pessoas - ou, pelo<br />

men<strong>os</strong>, a grande maioria d<strong>os</strong> principais<br />

mei<strong>os</strong> formadores de opinião - têm de<br />

n<strong>os</strong>sas sociedades, uma parte<br />

indissolúvel do novo modelo<br />

hegemônico.<br />

Consenso. A propaganda neoliberal<br />

introduziu na cabeça das pessoas a iden-<br />

tificação entre privado, mercado, liber-<br />

dade e desenvolvimento, em op<strong>os</strong>ição à<br />

regulação estatal, caracterizada como<br />

despótica, antinatural, geradora de pri-<br />

vilégi<strong>os</strong> corporativ<strong>os</strong>. E esse novo con-<br />

senso que permitiu <strong>ao</strong> governo<br />

criminalizar <strong>os</strong> funcionári<strong>os</strong> públic<strong>os</strong>,<br />

desmontar <strong>os</strong> parc<strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong> de<br />

controle estatal, privatizar de qualquer<br />

forma as empresas. E nessa direção que<br />

caminha também a atuação laborai, apoi-<br />

ada no tal "custo Brasil", enfocado uni-<br />

lateralmente, isto é, apenas do lado d<strong>os</strong><br />

cust<strong>os</strong> d<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> formais do traba-<br />

lho. E assim que o governo brasileiro<br />

incentiva a informação das relações de<br />

trabalho: somente no primeiro ano de<br />

vigência do Plano Real, aumentou em<br />

17% a massa de <strong>trabalhadores</strong> na eco-<br />

nomia informal. Uma das maiores trans-<br />

formações da n<strong>os</strong>sa sociedade n<strong>os</strong> últi-<br />

m<strong>os</strong> an<strong>os</strong> é essa: quando FHC diz que<br />

vai "virar a página do getulismo", e está<br />

fazendo pelo lado bom do getulismo - o<br />

das relações formais de trabalho, o da<br />

carteira assinada. O governo FHC pro-<br />

move, incentiva, "doura a pílula" do<br />

abandono que significa o trabalho infor-<br />

mal, com seu caráter carente, inconstan-<br />

te, sem retaguarda, desamparado.<br />

Crise do Estado. O <strong>neoliberalismo</strong><br />

centra seu fogo na crise do Estado e na<br />

sua (contra)reforma. De alguma forma,<br />

fala da crise do Estado, para não falar da<br />

crise da sociedade. A crise do Estado,<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO! 1<br />

ííííííííííí íííííííí<br />

Nacional<br />

na realidade, é a ponta do íceberg da cri-<br />

se social. O que pretende é transformar<br />

as relações do Estado com a sociedade,<br />

<strong>ao</strong> desenvolver um projeto de<br />

(contra)reformas daquele.<br />

A regulação estatal atuou em duas<br />

direções de classe distintas: a das<br />

insenções, d<strong>os</strong> busidi<strong>os</strong>, d<strong>os</strong> perdões fis-<br />

cais, d<strong>os</strong> crédit<strong>os</strong>, d<strong>os</strong> incentiv<strong>os</strong>; e a das<br />

políticas sociais e garantias salariais (ba-<br />

sicamente do salário minimo). Na pri-<br />

meira direção, o Estado atende às clas-<br />

ses dominantes e a tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> setores alia-<br />

d<strong>os</strong> a ela no bloco hegemônico.<br />

O diagnóstico neoliberal aponta para<br />

a necessidade de passar a limpo as fi-<br />

nanças públicas, o que significa central-<br />

mente eliminar a divida pública. No en-<br />

tanto, a estabilização da moeda repou-<br />

sando na atração de capitais<br />

especulativ<strong>os</strong> mediante a taxa de lucro<br />

mais alta do mundo, leva a que apenas a<br />

dívida interna tenha subido de 42 a 108<br />

bilhões de dólares desde que FHC assu-<br />

miu o Ministério da Fazenda. Em outras<br />

palavras, <strong>os</strong> neoliberais estão levando o<br />

Estado brasileiro à bancarrota. Eles mes-<br />

m<strong>os</strong>, que diagn<strong>os</strong>ticam que o déficit pú-<br />

blico é a fonte da inflação e a primeira<br />

prioridade deve ser cortá-lo.<br />

Com muito men<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> em mã<strong>os</strong><br />

- foram pag<strong>os</strong> 26 bilhões de dólares da<br />

dívida interna e extema em 1995, e se<br />

destinaram 6 bilhões apenas para educa-<br />

ção e saúde -, eles são distribuíd<strong>os</strong> con-<br />

forme o poder de cada setor social, sua<br />

capacidade de pressão e, em última ins-<br />

tância, seu lugar daitro da aliança de clas-<br />

ses que sustenta o govemo. Assim, o cha-<br />

mado "Estado Providência" não está em<br />

cnse para as classes dominantes, porque<br />

<strong>os</strong> subsidies, <strong>os</strong> crédit<strong>os</strong> especiais (ape-<br />

nas n<strong>os</strong> dois primeir<strong>os</strong> meses do Progra-<br />

ma Federal de Reestru- turação do Siste-<br />

ma Bancário - Proer destinou-se para a<br />

assistência a<strong>os</strong> banc<strong>os</strong> em dificuldades<br />

mais do que o orçamento anual de todas<br />

as universidades federais brasileiras), as<br />

isaições, <strong>os</strong> incentiv<strong>os</strong> fiscais foram man-<br />

tid<strong>os</strong>. Enquanto que <strong>os</strong> cortes vieram pelo<br />

lado do pessoal, das políticas sociais e d<strong>os</strong><br />

investiment<strong>os</strong> do govemo. Ou seja, acen-<br />

tuou-se o caráter de classe do govemo.


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 29 Nacional<br />

Fragmentação social. Um d<strong>os</strong> re-<br />

sultad<strong>os</strong> de mais transcendência é a<br />

aceleração da fragmentação social,<br />

tendo como efeito, tanto a dificuldade<br />

de organização para resistência, quan-<br />

to o debilitamento do movimento sin-<br />

dical. Outro é a primazia de uma ideo-<br />

logia da realização individual, conso-<br />

lidando o mercado como o espaço de<br />

legitimação d<strong>os</strong> indivídu<strong>os</strong>. Os ric<strong>os</strong><br />

voltaram a exibir sua riqueza, agora<br />

como prova de sucesso pessoal, de ca-<br />

pacidade individual.<br />

Quanto mais fragmentada a socieda-<br />

de, mais onipotente o Estado. Uma so-<br />

ciedade comp<strong>os</strong>ta por indivídu<strong>os</strong> - como<br />

deseja Tatcher - requer mais do que nun-<br />

ca um Estado que a unifique de cima,<br />

magicamente, que lhe dê o sol e a luz,<br />

como dizia Marx a respeito do<br />

bonapartismo. Enfraquecem-se <strong>os</strong> laç<strong>os</strong><br />

sociais e, com eles, as formas de organi-<br />

zação da sociabilidade. Não por acaso a<br />

antropóloga Ruth Card<strong>os</strong>o teorizava so-<br />

Documento - PSTU / PCB - 12/04/96<br />

bre o papel d<strong>os</strong> nov<strong>os</strong> moviment<strong>os</strong> soci-<br />

ais, enquanto que a primeira-dama or-<br />

ganiza o Comundiade Solidária e não<br />

convida para integrá-lo nenhum movi-<br />

mento social, nem a qualquer das enti-<br />

dades de educadores, sanitaristas, urba-<br />

nistas. É que o <strong>neoliberalismo</strong> adora o<br />

vácuo, detesta a organização social.<br />

Assim, mudam o Estado e as relações<br />

sociais no <strong>neoliberalismo</strong> e muda, sobre-<br />

tudo, a cabeça das pessoas, sob o influxo<br />

das políticas econômicas, sociais e ideo-<br />

lógicas. Se na saída da ditadura militar,<br />

até o governo Samey teve que se render<br />

<strong>ao</strong> déficit social que o consenso social da<br />

época apontava como cruel hemaça da<br />

ditadura, estabelecendo o lema do "Tudo<br />

pelo social" para seu governo, desde o<br />

final d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> de 1980 esse consenso foi<br />

saído modificado. A inflação, o Estado<br />

foram saído transformad<strong>os</strong> em vilões d<strong>os</strong><br />

problemas do País e, junto com eles, as<br />

formas de organização social e de reivin-<br />

dicação das classes subalternas.<br />

Estado com alma social. Um Bra-<br />

sil pós-neoliberal tem que partir dessa<br />

herança - da crise fiscal multiplicada do<br />

Estado, da fragmentação social acentu-<br />

ada, de uma mentalidade de darwinismo<br />

social impulsionada pelo governo e pe-<br />

l<strong>os</strong> principais órgã<strong>os</strong> de comunicação<br />

social. Tem principalmente que transfor-<br />

mar radicalmente um Estado, que hoje<br />

governa para pouc<strong>os</strong>, em nome do mer-<br />

cado. Transformá-lo em um Estado que<br />

assuma como sua principal função ga-<br />

rantir <strong>os</strong> direit<strong>os</strong> básic<strong>os</strong> de cidadania<br />

para tod<strong>os</strong>, por cima das pressões do<br />

mercado (monopolizado) e d<strong>os</strong> grup<strong>os</strong><br />

de poder constituíd<strong>os</strong> à sombra do Esta-<br />

do e que o transformam em instrumento<br />

privado de acumulação de capital. Tere-<br />

m<strong>os</strong> assim um Estado democrático com<br />

alma social. □<br />

Emir Sader, é professor de sociologia<br />

na USP e autor de O Anjo Torto,<br />

Brasiliense.<br />

Sem o debateprogramático não se constrói<br />

a unidade da esquerda<br />

1 - As eleições para a Prefeitura de<br />

São Paulo, devem ser aitendidas pelas<br />

esquerdas como o palco privilegiado<br />

para o enfrentamento do projeto<br />

neoliberal e do capitalismo. Podem<strong>os</strong><br />

dizer que este processo eleitoral se cons-<br />

tituirá em um laboratório político -, onde<br />

se expressarão alternativas político-eco-<br />

nômicas para o país. Dentro dessa ótica,<br />

o PSTU e o PCB lançam este Manifes-<br />

to a<strong>os</strong> partid<strong>os</strong> e militantes de esquerda,<br />

na perspectiva de construir uma Frente<br />

Política que p<strong>os</strong>sa derrotar FHC e Maluf<br />

nas eleições.<br />

2 - Assim, pensam<strong>os</strong> ser de funda-<br />

mental importância que o campo de atu-<br />

ação das esquerdas esteja claramente<br />

delimitado, que p<strong>os</strong>sibilite a elevação do<br />

nível de consciência das classes traba-<br />

lhadoras, a partir de um arco de alianças<br />

políticas que transcenda o quadro tático<br />

de uma mera disputa eleitoral, e que<br />

aponte para a criação de um campo po-<br />

litico-ideológico estratégico, que<br />

priorize a elaboração de um programa<br />

de ação política de corte marcadamente<br />

classista, como altemativa de poder, seja<br />

a nível do poder municipal da cidade de<br />

São Paulo.<br />

3 - Entendem<strong>os</strong> que a luta pela pre-<br />

feitura da cidade de São Paulo, dentro de<br />

uma perspectiva classista, só é justificá-<br />

vel se a colocarm<strong>os</strong> a serviço d<strong>os</strong> traba-<br />

lhadores e da luta pelo socialismo. Nesse<br />

sentido, deve ser questão de princípio a<br />

não aceitação de dinheiro de empreiteiras<br />

e de banqueir<strong>os</strong>, para financiamento de<br />

campanhas eleitorais, assim como rejá-<br />

tar coligações com partid<strong>os</strong> comprome-<br />

tid<strong>os</strong> de uma forma ou de outra com o<br />

projeto neoliberal, marcadamente, o<br />

PSDB, o PTB, o PFL, o PPB, o PMDB e<br />

o PDT. Por isso, encaram<strong>os</strong> com profun-<br />

da preocupação as declarações de cert<strong>os</strong><br />

dirigaites do PT no saitido de procurar<br />

alguns desses partid<strong>os</strong> e, <strong>ao</strong> mesmo tan-<br />

po, declarando-se contrári<strong>os</strong> à unidade da<br />

esquerda. Esta política leva à divisão d<strong>os</strong><br />

<strong>trabalhadores</strong> e joga o movimento para<br />

alianças com a burguesia.<br />

4 - Também entendem<strong>os</strong> que a am-<br />

pliação do espectro político de uma can-<br />

didatura classista deve se dar dentro do<br />

próprio movimento d<strong>os</strong> trabalhado-<br />

res, a partir de amplas e democráticas<br />

discussões com didicalistas, com <strong>os</strong> re-<br />

presentantes do movimento popular,<br />

com <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> sem-teto etc. e, <strong>ao</strong><br />

mesmo tempo, articulando o debate d<strong>os</strong><br />

problemas nacionais com as questões<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

candentes que afligem a maioria da po-<br />

pulação paulistana, denunciando o des-<br />

monte d<strong>os</strong> equipament<strong>os</strong> sociais<br />

efetuad<strong>os</strong> pelo governo Maluf, como o<br />

desmantela- mento da CMTC, a<br />

privatização e elitização da saúde públi-<br />

ca municipal, além da perseguição a<strong>os</strong><br />

moradores de favelas e de cortiç<strong>os</strong>, fa-<br />

vorecendo interesses d<strong>os</strong> especuladores<br />

imobiliári<strong>os</strong>, sob a capa demagógica do<br />

excludente projeto Singapura.<br />

5 - Nesse sentido, propom<strong>os</strong> a reali-<br />

zação de um seminário, no campo d<strong>os</strong><br />

<strong>trabalhadores</strong> (PSTU, PCB, PC do B e<br />

PT, movimento sindical combativo, mo-<br />

vimento popular e estudantil), para cons-<br />

truir um programa de governo na ótica<br />

socialista.<br />

6 - A campanha eleitoral é um mo-<br />

mento destacado para a esquerda expor,<br />

<strong>ao</strong> conjunto das massas exploradas, um<br />

programa político que tenha como cen-<br />

tro o combate <strong>ao</strong> <strong>neoliberalismo</strong>. Dessa<br />

forma, pensam<strong>os</strong> que devem ser articu-<br />

lad<strong>os</strong>, dois eix<strong>os</strong> de luta:<br />

a) o que daiuncia o governo FHC,<br />

plano nacional:<br />

- Não à Reforma Constitucional e <strong>ao</strong><br />

desmonte do Estado;


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 30 Internacional<br />

- Não às Reformas da Previdência e<br />

administrativa;<br />

- Defesa intransigente d<strong>os</strong> Serviç<strong>os</strong><br />

Públic<strong>os</strong>;<br />

- Reforma Agrária sob. Controle d<strong>os</strong><br />

Trabalhadores;<br />

- Contra o Acordo de Flexibilização<br />

das Conquistas Sociais d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>;<br />

- 40 horas semanais, sem redução de<br />

salári<strong>os</strong>;<br />

- Nenhuma Prisão d<strong>os</strong> líderes d<strong>os</strong><br />

sem-terra;<br />

- Cadeia para <strong>os</strong> banqueir<strong>os</strong>;<br />

- Direito irrestrito de greve.<br />

b) A luta contra a destruição d<strong>os</strong> re-<br />

curs<strong>os</strong> do muncícpio de São Paulo.<br />

- Suspensão da Dívida Interna e Não<br />

pagamento da Dívida Externa do mu-<br />

nicípio, acompanhadas por auditorias<br />

públicas;<br />

- Anulação das privatizações realiza-<br />

das pelo governo Maluf particularmen-<br />

te da CMTC acompanhadas por audito-<br />

rias públicas;<br />

- Educação gratuita e de qualidade;<br />

- Sáude pública para tod<strong>os</strong>;<br />

- Estabilidade e direito de greve, <strong>ao</strong><br />

funcionalismo municipal;<br />

- Reforma Urbana - apoio <strong>ao</strong> mo-<br />

vimento por moradias e <strong>ao</strong> MST;<br />

- IPTU progressivo;<br />

- Conselh<strong>os</strong> Populares deliberativ<strong>os</strong>,<br />

Interação - Jan/Fev/Mar/96 - N 0 18<br />

Rússia, Ucrânia, Betarus<br />

O oculto que se vê<br />

Incorporada <strong>ao</strong> idioma falado no<br />

dia-a-dia depois das reformas capita-<br />

listas, a expressão "desemprego ocul-<br />

to " tira o sono de burocratas, sindica-<br />

listas e <strong>trabalhadores</strong>.<br />

Na época da URSS, O léxico russo não com-<br />

portava cert<strong>os</strong> term<strong>os</strong> muito comuns n<strong>os</strong> idiomas<br />

"capitalistas". Então inexistente, "bezrabotissa",<br />

por exemplo, seria inpronunciável até mesmo para<br />

um russo.<br />

A palavra significa desemprego. N<strong>os</strong> últi-<br />

m<strong>os</strong> an<strong>os</strong>, o verbete não apenas foi incorporado à<br />

lingua, como também ganhou um adjetivo e criou<br />

novo conceito - "skritaia bezrabotitsa". Em tra-<br />

dução literal, isto seria desemprego oculto, um<br />

velho conhecido de guerra do Ocidente. Os dois<br />

fantasmas teriam o sono de burocratas, sindica-<br />

listas e <strong>trabalhadores</strong>.<br />

A legislação soviética ditava que trabalhar não<br />

era somente um direito, então plenamente asse-<br />

gurado pelo Estado, mas principaknente um de-<br />

ver de todo cidadão. A pessoa que não tinha em-<br />

prego fixo e carteira de trabalho assinada era con-<br />

siderada crimin<strong>os</strong>a. Numer<strong>os</strong><strong>os</strong> foram <strong>os</strong> cas<strong>os</strong><br />

de soviétic<strong>os</strong> pres<strong>os</strong> pelo fato de se enquadrarem<br />

nesta condição.<br />

É sabido que a economia mundial tem cres-<br />

cido n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong> como em nenhum ou-<br />

tro período do desenvolvimento humano, mas<br />

o crescimento do do nível de emprego está<br />

muito aquém do econômico. A economia eu-<br />

ropéia, por exemplo, cresceu 73% entre 1970<br />

e 1992, enquanto o emprego, tímid<strong>os</strong> 7% in-<br />

dicando um forte incremento na produtivida-<br />

de do trabalho humano.<br />

Os <strong>trabalhadores</strong> estão trabalhando mui-<br />

to mais hoje do que 20 an<strong>os</strong> atrás - estão<br />

mais produtiv<strong>os</strong>, reza o discurso liberal -, em<br />

todas as partes do mundo. Ou melhor, em qua-<br />

se todas, porque em pelo men<strong>os</strong> um sexto<br />

do território do planeta experimenta-se outro de-<br />

senvolvimento.<br />

Enquanto <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> de vári<strong>os</strong> países<br />

se deparam com problemas de aumento de pro-<br />

dutividade, desqualifica- ção, requalificação e<br />

retreinamento profissional, flexibilização da<br />

jornada de trabalho, novas tecnologias etc, seus<br />

colegas da ex-URSS enfrentam as bruscas mu-<br />

danças de rumo na economia e política de seus<br />

países - as chamadas reformas -, que destróem<br />

cruelmente a capacidade produtiva d<strong>os</strong> nov<strong>os</strong><br />

Estad<strong>os</strong> Independentes (junt<strong>os</strong>, estes são res-<br />

ponsáveis, hoje, por 40% do total produzido<br />

pela URSS em seu último ano de funcionamen-<br />

to normal, 1990).<br />

Três forças - De fonna geral, pode-se afir-<br />

mar que <strong>os</strong> process<strong>os</strong> de transformação econô-<br />

mica naquele que foi o muildo soviético caracte-<br />

riza-se pela luta entre três grup<strong>os</strong> econômic<strong>os</strong>: o<br />

capital financeiro, o complexo energético (TEK)<br />

e o complexo industrial militar (o fam<strong>os</strong>o VPK).<br />

O capital financeiro é a favor da abertura do<br />

mercado da CEI <strong>ao</strong> capital estrangeiro, desde que<br />

este não venha a investir no setor bancário e fi-<br />

nanceiro. Afirma-se que este setor da economia é<br />

muito jovem e, por isso, necessita de proteção. Já<br />

em relação a<strong>os</strong> setores primário e secundário, o<br />

capital financeiro defende a ampla abertura do<br />

mercado e a concorrência selvagem, o que lhe é<br />

conveniente, já que por aqui não se produz<br />

Mercedes-Benz ou BMW.<br />

A moçada do TEK (petróleo, carvão, gás)<br />

busca a integração da Rússia á economia mundi-<br />

al, na qualidade de fornecedora de matérias-pri-<br />

mas, tentando, dessa forma, repetir o sucesso d<strong>os</strong><br />

países árabes nas décadas de 70 e 80, quando es-<br />

tes, com <strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> provenientes da vencia de pe-<br />

tróleo, financiaram o desenvolvimento e investi-<br />

ram pesado na área militar.<br />

Por outro lado, <strong>os</strong> russ<strong>os</strong> vêem em seus recur-<br />

constiuíd<strong>os</strong> com independência e auto-<br />

nomia.<br />

Este manifesto é a contribuição do<br />

PCB e do PS TU, para o desencadeamen-<br />

to de uma discussão programática entre<br />

<strong>os</strong> partid<strong>os</strong> e militantes, particularmen-<br />

te, o PT e o PC do B. Entendem<strong>os</strong> que a<br />

unidade das esquerdas em tomo de um<br />

acordo programático é fundamental, para<br />

a elaboração de um projeto político que<br />

tenha como centro a contração de uma<br />

alternativa de poder, sob controle d<strong>os</strong><br />

<strong>trabalhadores</strong>. O<br />

Pela vitória do Socialismo!<br />

São Paulo, 12 de abril de 1996<br />

PSTU e PCB<br />

s<strong>os</strong> naturais um forte instrumento para subjugar as<br />

demais ex-repúblicas soviéticas, que dependem to-<br />

talmente do gás e do petróleo vind<strong>os</strong> da Rússia.<br />

O VPK defende o isolamento econômico e a<br />

indústria nacional - é contra todo e qualquer in-<br />

vestimento estrangeiro que abale a soberania<br />

nacional. O complexo militar reivindica, porém,<br />

fronteiras abertas á exportação, ou seja. plena li-<br />

berdade para exportar sua produção para quem<br />

quer que seja sem nenhum controle do Estado.<br />

Em linhas gerais, nenhum d<strong>os</strong> três grup<strong>os</strong><br />

leva para sua pauta de prioridades temas como<br />

aumento da qualidade, racionalização e reorga-<br />

nização da produção, redução de cust<strong>os</strong>, econo-<br />

mia de recurs<strong>os</strong>, globahzação etc.<br />

A luta básica entre eles é: qual d<strong>os</strong> três gru-<br />

p<strong>os</strong> terá o controle absoluto da máquina estatal<br />

para. a partir daí. ditar suas regras a<strong>os</strong> perdedores<br />

e definir, de uma vez por todas, o caráter das<br />

transformações. Cada um deles busca apenas<br />

garantir seus própri<strong>os</strong> interesses corporativ<strong>os</strong>.<br />

Os setores industrial e agrícola são <strong>os</strong> que<br />

mais sofrem com esta situação de indefinição.<br />

Os três grandes grup<strong>os</strong> não têm interesses dire-<br />

t<strong>os</strong> em relação a estes setores. A privatização<br />

(mais adiantada na Rússia do que nas demais re-<br />

públicas) resultou em apropriação da proprieda-<br />

de estatal pel<strong>os</strong> burocratas e falta de nov<strong>os</strong> in-<br />

vestiment<strong>os</strong>.<br />

Aquelas empresas que ainda contam com a<br />

participação do Estado no capital estatutário não<br />

recebem daquele um centavo sequer de investi-<br />

mento. Falta <strong>ao</strong> governo uma política de desen-<br />

volvimento econômico clara.<br />

Máquinas paradas - Praticamente todas as<br />

empresas têm atrasado o pagamento de salári<strong>os</strong><br />

(em média, três meses) e estão com suas linhas<br />

de produção paradas, ou funcionando com cerca<br />

de 50% de sua capacidade. Falta capital de giro.<br />

gritam em coro <strong>os</strong> diretores das empresas.<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 31<br />

Neste caso, a legislação estabelece que, se fica-<br />

rem em casa por culpa da empresa (férias coleti-<br />

vas), <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> têm direito de receber apenas<br />

dois terç<strong>os</strong> do salário - o corte representa, na verda-<br />

de, mais de 50% d<strong>os</strong> salári<strong>os</strong>, já que o empregado<br />

deixa de receber prêmi<strong>os</strong>, compensações e gratifi-<br />

cações que engordam a remuneração bááca.<br />

Apesar de todas as dificuldades que atraves-<br />

sam, as empresa da CEI não estão demitindo.<br />

Isto tem a ver, em parte, com a velha formação<br />

"socialista" de seus diretores; mas deve-se tam-<br />

bém a um preceito legal que confere a<strong>os</strong> sindica-<br />

t<strong>os</strong> prerrogativas de barrar uma demissão - sem a<br />

anuência do sindicato, o trabalhador não pode ser<br />

mandado embora. Deve-se, finalmente, a políti-<br />

cas populistas d<strong>os</strong> govern<strong>os</strong> locais: para não ter<br />

de pagar auxüio-desemprego nem m<strong>os</strong>trar a ver-<br />

dadeira cara das reformas, estes proíbem que as<br />

empresas demitam.<br />

Desesperad<strong>os</strong> com esta situação, <strong>os</strong> trabalha-<br />

dores são obrigad<strong>os</strong> a encontrar soluções nem<br />

sempre muito louváveis.<br />

Parte considerável d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> pde de-<br />

missão das empresas para integrar o batalhão de<br />

"empresári<strong>os</strong>" de ma - biscateir<strong>os</strong> e camelôs que<br />

invadem as áreas livres em volta d<strong>os</strong> grandes es-<br />

tádi<strong>os</strong> de futebol e parques das principais cida-<br />

des da ex-URSS em busca de lucr<strong>os</strong> e da liberda-<br />

de que o comércio oferece.<br />

Ou seja, engr<strong>os</strong>sam as fileiras do desempre-<br />

go encoberto e da economia informal, dificibnente<br />

identificad<strong>os</strong> pelas estatísticas oficiais.<br />

Muit<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> que vão para a eco-<br />

nomia informal continuam registrad<strong>os</strong> nas em-<br />

presas em que trabalhavam anteriormente, o<br />

que artificializa as estatísticas relativas <strong>ao</strong> nú-<br />

mero de empregad<strong>os</strong>. São comuns <strong>os</strong> cas<strong>os</strong> de<br />

operári<strong>os</strong> especializad<strong>os</strong> da indústria automo-<br />

bilística que transformam suas garagens em<br />

oficinas mecânicas.<br />

A redução "natural" do quadro de funcioná-<br />

ri<strong>os</strong> - quando <strong>os</strong> mais velh<strong>os</strong> se ap<strong>os</strong>entam e não<br />

são substituíd<strong>os</strong> por jovens - também contribui<br />

para a redução do número total de pessoas em-<br />

pregadas no país.<br />

^<br />

( ) Semestral R$25,00<br />

( ) Extenor - Semestral US$ 60,00<br />

Nome completo<br />

Esta realidade, entretanto, não está espelhada<br />

nas estatísticas de desemprego, uma vez que,<br />

como no Brasil, o jovem que nunca trabalhou na<br />

vida, mesmo que esta não seja a sua opção, não é<br />

considerado desempregado.<br />

Desemprego oculto - Os dad<strong>os</strong> oficiais, as-<br />

sim, levam a cre que o desemprego na ex-URSS<br />

é um d<strong>os</strong> menores problemas enfrentad<strong>os</strong> pe-<br />

l<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong>. Realmente, o que mais preo-<br />

cupa <strong>os</strong> sindicat<strong>os</strong> e <strong>trabalhadores</strong> é o desem-<br />

prego oculto.<br />

Como desempregado oculto pode-se consi-<br />

derar o n<strong>os</strong>so amigo metalúrgico que transfor-<br />

mou sua garagem em uma oficina mecânica.<br />

Este, na pior das hipóteses, ainda consegue no<br />

final do mês uns trocad<strong>os</strong> para o pão e o leite<br />

das crianças.<br />

Desempregado oculto é também aquele tra-<br />

balhador era férias coletivas prolongadas que re-<br />

cebe apenas dois terç<strong>os</strong> do salário (quando rece-<br />

be) e, com isso, não consegue sustentai a si pró-<br />

prio. Devido a impediment<strong>os</strong> legais, complica-<br />

ções burocráticas e falta de oportunidades reai<strong>os</strong><br />

e dignas, esse trabalhador fica proibido de deixar<br />

seu emprego em busca de algo melhor. Ele não<br />

trabalha, mas não pode ser considerado desem-<br />

pregado, pois tem carteira de trabalho assinada.<br />

Em situação muito pior encontra-se aquele<br />

trabalhador que tem emprego garantido, diaria-<br />

mente vai à fábrica, trabalha, mas não recebe sa-<br />

lário. Este é o caso de 100.000 funcionári<strong>os</strong> da<br />

Lada, que não recebem seus salári<strong>os</strong> desde no-<br />

vembro do ano passado, apesar de estarem traba-<br />

lhando normalmente.<br />

Infelizmente, as estatísticas oficiais e <strong>os</strong> con-<br />

ceit<strong>os</strong> de desemprego em voga não refletem esta<br />

nova situação criada pele economia da CEI. E<br />

necessário elaborar nova definição para o desem-<br />

prego e nov<strong>os</strong> métod<strong>os</strong> de medição.<br />

O sindicato d<strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> na indústria<br />

automobilística da Ucrânia, por xemplo, robus-<br />

tece as estatísticas do desemprego oculto consi-<br />

derando: a queda da produção e o número de tra-<br />

balhadores "empregad<strong>os</strong>", a quantidade de fá-<br />

bricas paradas, a capacidade produtiva destas<br />

Ficha de Assinatura<br />

( ) Anual R$ 50,00<br />

( ) Extenor - Anual US$ 120,00<br />

Endereço N 0<br />

Bairro C. P<strong>os</strong>tal<br />

Cidade Estado<br />

Profissão/Categona<br />

TRABALHO QUE FAZ NO MOVIMENTO:<br />

Assinatura: Data:<br />

■;■;■:-:-:■:■:■:■:■:■:■:■:■:■:■:■;■:■:■;';■:■:■:■:•:■:■:■;■:■:■:■:■:■:■:■:■:■;■:■:■<br />

Internacional<br />

fábricas e o tempo em que elas se encontram<br />

paradas.<br />

Mas ainda é pouco para resolver a questão. E<br />

preciso uma mudança radical em toda a concep-<br />

ção de emprego e desemprego para que o quadro<br />

fique mais próximo da realidade. E preciso levar<br />

em consideração a qualidade do emprego, seus<br />

efeit<strong>os</strong> sobre a sociedade, a acumulação de capi-<br />

tal e distribuição de renda gerada, entre outr<strong>os</strong><br />

fatores. Uma coisa é criar 100 p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> na indústria<br />

de computação ou automobilística.<br />

Prop<strong>os</strong>tas - Até o momento, o movimento<br />

sindical d<strong>os</strong> três principais países tem atacado<br />

apenas causas isoladas do problema do desempre-<br />

go. Sindicat<strong>os</strong> ucranian<strong>os</strong>, bielo-russ<strong>os</strong> e russ<strong>os</strong> rei-<br />

vindicam de seus govern<strong>os</strong>, por exemplo, mudan-<br />

ça na legislação que confere a<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> priori-<br />

dade nas listas de pagamento das empresas - de-<br />

pois d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>, vêm a quitação de dívidas era<br />

geral, o pagamento de matérias-primas e insum<strong>os</strong><br />

e, finalmente, o pagamento de salári<strong>os</strong>. Os sindi-<br />

calistas querem que <strong>os</strong> salári<strong>os</strong> sejam promovid<strong>os</strong><br />

a categoria de prioridade número um.<br />

Ucranian<strong>os</strong> e bielo-russ<strong>os</strong>, por sua vez, lu-<br />

tam por radical mudança na legislação tributária,<br />

visando diminuir a pesada carga de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> que<br />

recai sobre <strong>trabalhadores</strong> e empresas.<br />

Sindicat<strong>os</strong> russ<strong>os</strong> tentam recuperar o nível de<br />

emprego e salári<strong>os</strong> reivindicando na justiça que<br />

as empresas quitem suas dívidas junto a<strong>os</strong> traba-<br />

lhadores cora o próprio patriraônio.<br />

Na cidade de Sarnara, por exemplo, foi aber-<br />

to um precedente jurídico neste sentido: uma<br />

empresa de autopeças teve que passar parte de<br />

seu patrimônio para <strong>os</strong> <strong>trabalhadores</strong> (...) □<br />

bloco<br />

Fone( )...<br />

Cep<br />

O pagamento deverá ser feito an nome do CPV - Centro de Documentação e Pesquisa Vergueiro em cheque nominal cruzado, ou<br />

vale p<strong>os</strong>tal DESDE QUE SEJA ENDEREÇADO PARA A AGÊNCIA BELA VISTA - CEP: 01390-970 Código da Agèiaa 403.300<br />

QUINZENA<br />

Publicação do CPV - Caixa P<strong>os</strong>tal 65.107 - Cep: 01390-970 São Paulo, Fone: (OU) 285-6288<br />

"SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"<br />

Apto.


Quinzena N 0 228 - 30/04/96 32 Cultura<br />

Funeral do Lavrador<br />

Esta cova que estás<br />

com palmo medida<br />

é a conta menor<br />

que tiraste em vida.<br />

É de bom tamanho<br />

nem largo nem fundo<br />

é a parte que te cabe<br />

neste latifúndio.<br />

Não é cova grande<br />

é cova medida<br />

é a terra que querias<br />

ver dividida.<br />

E uma cova grande<br />

pra teu pouco defunto<br />

estarás mais ancho<br />

que estavas no mundo.<br />

E uma cova grande<br />

prá teu defunto parco<br />

porém mais que no mundo<br />

te sentirás largo.<br />

E uma cova grande<br />

prá tua carne pouca<br />

mas a terra dada<br />

não se abre a boca.<br />

J. C. de Mello Neto<br />

O Boletim QUINZENA divulga text<strong>os</strong>, artig<strong>os</strong>, e document<strong>os</strong> produzid<strong>os</strong> pel<strong>os</strong> moviment<strong>os</strong>. Caso você queira<br />

divulgar algum documento no QUINZENA, basta enviar-n<strong>os</strong>. Pedim<strong>os</strong>, dentro do p<strong>os</strong>sível, ater-se a 8 laudas. Text<strong>os</strong><br />

que ultrapassem este limite estarão sujeit<strong>os</strong> a cortes, por imp<strong>os</strong>ição de espaço.<br />

Atenção Poetas do Quinzena: estam<strong>os</strong> esperando sua contribuição desesperadamenteü!<br />

Seja a contra-capa do próximo QUINZENA!<br />

'SE CALARMOS, AS PEDRAS GRITARÃO!"

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!