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quem apanha nunca esquece: um estudo de caso sobre a violência ...

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QUEM APANHA NUNCA ESQUECE: UM ESTUDO DE CASO SOBRE<br />

A VIOLÊNCIA E A EDUCAÇÃO FÍSICA EM UMA ESCOLA DA ZONA<br />

NORTE DE ARACAJU.<br />

Eixo 2<br />

RESUMO<br />

Jackeline Santos <strong>de</strong> Carvalho 1<br />

Este trabalho é caracterizado como <strong>um</strong> <strong>estudo</strong> <strong>de</strong> <strong>caso</strong> que, propôs-se a compreen<strong>de</strong>r como os<br />

jovens percebem as diferentes manifestações <strong>de</strong> <strong>violência</strong> inseridas no convívio escolar e mais<br />

precisamente nas aulas <strong>de</strong> Educação Física. Tratou-se da <strong>violência</strong> como problema social<br />

envolvendo as mais variadas manifestações e seguimos com o trato da <strong>violência</strong> na escola e<br />

nas aulas <strong>de</strong> Educação Física. Quanto aos procedimentos metodológicos, acompanhou-se <strong>um</strong>a<br />

escola pública localizada em <strong>um</strong> bairro da Zona Norte <strong>de</strong> Aracaju/SE, mais precisamente, as<br />

aulas <strong>de</strong> Educação Física (teóricas e práticas) <strong>de</strong> duas turmas. Constatamos que os sujeitos da<br />

pesquisa reconhecem a <strong>violência</strong> não somente como algo que atinge apenas o ser em seu<br />

sentido físico; 75% dos sujeitos afirmam já ter presenciado <strong>violência</strong> na escola, porém apenas<br />

30% asseguram a existência da mesma nas aulas <strong>de</strong> Educação Física.<br />

Palavras-chave: Violência, Escola, Educação Física.<br />

ABSTRACT<br />

This article is characterized by a case study that intends to comprehend as the youngsters see<br />

the different <strong>de</strong>monstration of violence insi<strong>de</strong> school and mainly in physical education’s<br />

classes. First, the violence was <strong>de</strong>scribed as a social problem that inclu<strong>de</strong> the most various<br />

manifestations; then, it was studied the violence in the school and in the physical education’s<br />

classes. The methodological procedures focused on a public school located in a district on<br />

north of Aracaju / SE; more specifically, in the physical education’s classes (theoretical and<br />

practical) in two groups. It was perceived that the research’s subject un<strong>de</strong>rstand the violence<br />

not only as something that attain the h<strong>um</strong>an been just in the physical aspect; 75% of the<br />

subjects said that have already seen some kind of violence in school; however, just 30% of<br />

them related the existence of the violence in physical education’s classes.<br />

Keys words: Violence, School, Physical Education.<br />

CONSIDERAÇÕES INICIAIS<br />

1 Graduanda do 8º período do curso <strong>de</strong> Educação Física Licenciatura – DEF/UFS.<br />

E-mail: jackeline_efl@hotmail.com


Trabalhar com a temática da <strong>violência</strong> se configura em algo <strong>de</strong>licado, pois<br />

restringir <strong>um</strong> tema amplo e polêmico como esse é bastante complexo. O fenômeno da<br />

<strong>violência</strong> é alvo <strong>de</strong> <strong>estudo</strong>s que abrange vários aspectos a ele enraizados. Atemo-nos nesse<br />

trabalho às manifestações da <strong>violência</strong> ocorridas <strong>de</strong>ntro da escola e mais precisamente nas<br />

aulas <strong>de</strong> Educação Física.<br />

Preten<strong>de</strong>mos analisar o fenômeno da <strong>violência</strong> na Escola Estadual Secretário <strong>de</strong><br />

Estado Francisco Rosa Santos, Zona Norte <strong>de</strong> Aracaju-SE, no que diz respeito às<br />

manifestações reconhecidas e consi<strong>de</strong>radas, pelos alunos e professores, como fatores <strong>de</strong><br />

ocorrência violenta nas aulas <strong>de</strong> Educação Física e no ambiente escolar como <strong>um</strong> todo.<br />

Mais especificamente nosso objetivo é analisar o conceito que cada entrevistado<br />

tem acerca da <strong>violência</strong>; apresentar e investigar no contexto escolar os entendimentos <strong>sobre</strong> a<br />

<strong>violência</strong> e possíveis manifestações no interior da escola; e também, compreen<strong>de</strong>r e analisar<br />

essas possíveis manifestações nas aulas <strong>de</strong> Educação Física.<br />

Perspectivamos, no <strong>de</strong>correr do nosso <strong>estudo</strong>, respon<strong>de</strong>r ao seguinte problema <strong>de</strong><br />

pesquisa: Como os jovens percebem as diferentes manifestações <strong>de</strong> <strong>violência</strong> inseridas em<br />

nosso convívio escolar e mais precisamente nas aulas <strong>de</strong> Educação Física?<br />

Escolhemos trabalhar com o tema da <strong>violência</strong> na escola justamente pela gran<strong>de</strong><br />

parcela <strong>de</strong> compromisso que lhe é dada, já que é neste local que os indivíduos apren<strong>de</strong>m a ler,<br />

escrever, são alfabetizados, são instigados a <strong>de</strong>senvolver seu pensamento lógico-matemático,<br />

a <strong>de</strong>senvolverem-se corporalmente e principalmente a formarem-se cidadãos conhecedores <strong>de</strong><br />

seus direitos e <strong>de</strong>veres, enfim, socializar-se e tomar contato com as “coisas do mundo”. A<br />

escolha se dá também, e principalmente, por ser a escola (e a disciplina <strong>de</strong> Educação Física)<br />

nossa futura área <strong>de</strong> atuação profissional.<br />

Acreditamos que essa pesquisa fará com que possamos perceber, cada vez mais,<br />

manifestações <strong>de</strong> <strong>violência</strong> ao nosso redor (<strong>de</strong>snaturalizando-a) e principalmente em nosso<br />

campo <strong>de</strong> trabalho, para que possamos enten<strong>de</strong>r, diagnosticar e trabalhar <strong>de</strong> maneira mais<br />

apropriada <strong>sobre</strong> esse tema com os nossos alunos. Almejamos que essa pesquisa nos sirva <strong>de</strong><br />

alerta, assim como para os <strong>de</strong>mais profissionais da educação (e outras áreas) que lidam todo o<br />

tempo com esse fato em seu cotidiano.<br />

Cremos que a pesquisa terá relevância aos futuros interessados em estudar o tema<br />

que tratamos e mais ainda, no tocante à nossa área especificamente, perspectivamos que esse<br />

trabalho venha servir <strong>de</strong> alerta para os professores <strong>de</strong> Educação Física no sentido <strong>de</strong> atentar<br />

2


para as manifestações violentas aparentemente <strong>de</strong>spercebidas em nossas aulas, como por<br />

exemplo, a discriminação ao escolher os times, ou a exclusão daqueles que não estão <strong>de</strong>ntro<br />

do “padrão” esperado pela socieda<strong>de</strong> (ou pelo professor), geralmente relacionado àqueles<br />

alunos que <strong>de</strong>monstram mais habilida<strong>de</strong>s técnicas-esportivas que os <strong>de</strong>mais.<br />

Esperamos ainda, no tocante ao campo social, que ao <strong>de</strong>senvolver esse trabalho<br />

possamos <strong>de</strong> alg<strong>um</strong>a maneira colaborar para que esse fato seja tratado com maior relevância e<br />

maior atenção, primeiro na escola escolhida, e em seguida que se expanda esse alerta ao nosso<br />

trato (enquanto professores e indivíduos da socieda<strong>de</strong>) com a educação em nosso bairro,<br />

nosso município e afora.<br />

CONCEITUANDO A(S) VIOLÊNCIA(S)<br />

Quando falamos em <strong>violência</strong> são tantos os pensamentos que vêm em nossa mente<br />

que fica difícil conceituá-la <strong>de</strong> forma objetiva e direta. Falta <strong>de</strong> respeito, agressão física,<br />

agressão verbal/moral, abuso <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r: são tantas as variações. “Violência é <strong>um</strong>a palavra <strong>de</strong><br />

origem latina, o vocábulo vem da palavra vis que quer dizer força e se refere às noções <strong>de</strong><br />

constrangimento e <strong>de</strong> uso da superiorida<strong>de</strong> física <strong>sobre</strong> o outro” (MINAYO, 2005, p.14).<br />

De acordo com Caldas (1964, p.4231) “a <strong>violência</strong> é o ato executado com força ou<br />

gran<strong>de</strong> impulso, ímpeto ou intensida<strong>de</strong>. Força empregada abusivamente – usada além do<br />

necessário ou esperado. Constrangimento e/ou comportamento que causa dano a outra pessoa,<br />

ser vivo ou objeto”. Sendo assim, temos que o ato <strong>de</strong> violentar vai muito além do que<br />

cost<strong>um</strong>amos com<strong>um</strong>ente conceituar em nosso dia-a-dia.<br />

Subdividindo as manifestações <strong>de</strong> <strong>violência</strong> com as quais trabalhamos nessa pesquisa<br />

começaremos conceituando a <strong>violência</strong> ao patrimônio para, a partir <strong>de</strong> então, começarmos a<br />

investigar outros tipos <strong>de</strong> <strong>violência</strong>s. A <strong>violência</strong> ao patrimônio é a <strong>violência</strong> praticada contra<br />

a parte física da escola. (MARCELOS, 2011). 2 Não po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>smerecer o valor dado aos<br />

<strong>estudo</strong>s focados nesse tipo <strong>de</strong> <strong>violência</strong>, pois se faz necessário conscientizar nossos jovens a<br />

preservar o bem que servirá a muitos que por ali passarão (gerações futuras) e usufruirão<br />

daqueles materiais, assim como fazê-los reconhecer esses atos como <strong>violência</strong>.<br />

Tratando agora <strong>sobre</strong> a agressão física temos que esse tipo <strong>de</strong> <strong>violência</strong> se remete ao<br />

ato <strong>de</strong> abusar da força física com o objetivo <strong>de</strong> maltratar, machucar, ferir e prejudicar a saú<strong>de</strong><br />

2<br />

A Violência Escolar, por Viviane Avelino Marcelos. Texto disponível no site da Revista Brasil Escola on-line:<br />

http://meuartigo.brasilescola.com/sociologia/violencia-escolar.htm. Acesso dia 01 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 2011.<br />

3


física do outro. Minayo (2005, p.14-15) diz que “a <strong>violência</strong> física atinge a integrida<strong>de</strong><br />

corporal e que po<strong>de</strong> ser traduzida nos homicídios, agressões, violações e roubos a mão<br />

armada”. Esse tipo <strong>de</strong> <strong>violência</strong> é o mais falado e percebido cotidianamente, pois é muito<br />

mais notório ver as conseqüências <strong>de</strong> <strong>quem</strong> sofreu <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> <strong>violência</strong>, pois as suas marcas<br />

ficam visíveis em nosso corpo.<br />

A agressão verbal é menos notada por não <strong>de</strong>ixar marcas objetivas, só <strong>quem</strong> a sofreu<br />

sabe a dor e o constrangimento que tal agressão po<strong>de</strong> causar. Mesmo assim supomos ser o<br />

tipo mais freqüente, pois os agressores nem sempre consi<strong>de</strong>ram suas falas como <strong>violência</strong> e<br />

seguem agindo da mesma maneira. Torna-se também mais difícil a punição <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong><br />

agressão, pois não se prova fazendo <strong>um</strong> exame <strong>de</strong> corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>lito como no <strong>caso</strong> da <strong>violência</strong><br />

física. Seria necessário <strong>um</strong>a gravação ou ter testemunhas validadas pela justiça para apuração<br />

do <strong>caso</strong>.<br />

Corbisier (1991, p.214) diz: “Aristóteles con<strong>de</strong>na o uso das palavras <strong>de</strong> baixo calão<br />

porque, da agressão verbal, passa-se facilmente à agressão física”. Com isso indagamos:<br />

Quem <strong>nunca</strong> presenciou, na escola, professores que falam frases <strong>de</strong>sse tipo para seus alunos:<br />

“Ainda não enten<strong>de</strong>u? Mas eu já falei mil vezes!”. Será que esse aluno terá coragem <strong>de</strong><br />

perguntar mais <strong>um</strong>a vez <strong>sobre</strong> a explicação ou vai permanecer com sua dúvida para não ser<br />

chamado <strong>de</strong> “burro” pelos colegas <strong>de</strong> classe? Risadinhas e olhares ofen<strong>de</strong>m profundamente<br />

esses alunos. Será que esse professor percebe que a sua atitu<strong>de</strong> se configura em <strong>um</strong> ato <strong>de</strong><br />

<strong>violência</strong> e constrangimento ao seu aluno?<br />

Nesse âmbito aproveitamos o ensejo para tratar <strong>sobre</strong> outra manifestação <strong>de</strong><br />

<strong>violência</strong> que se conhece e nos dispusemos a estudar. A <strong>violência</strong> simbólica vem ganhando<br />

espaço nas discussões acadêmicas e afora justamente porque a <strong>violência</strong> vem <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> ser<br />

vista e tratada como algo que cause apenas danos físicos e materiais.<br />

“A <strong>violência</strong> moral e simbólica é aquela que trata da dominação cultural, ofen<strong>de</strong>ndo<br />

a dignida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>srespeito aos direitos do outro”, diz Minayo (2005, p.15). De acordo com essa<br />

idéia percebemos que o ato que provoque <strong>um</strong> <strong>de</strong>terminado <strong>de</strong>sconforto ao outro po<strong>de</strong> se<br />

configurar em <strong>violência</strong> simbólica. O conceito <strong>de</strong> <strong>violência</strong> simbólica, a partir <strong>de</strong> Bourdieu,<br />

citado por Socha (2010, p.46), diz que o termo:<br />

explicaria a a<strong>de</strong>são dos dominados em <strong>um</strong> campo: trata-se da dominação<br />

consentida, pela aceitação das regras e crenças partilhadas como se fossem<br />

“naturais”, e da incapacida<strong>de</strong> crítica <strong>de</strong> reconhecer o caráter arbitrário <strong>de</strong> tais<br />

regras impostas pelas autorida<strong>de</strong>s dominantes <strong>de</strong> <strong>um</strong> campo.<br />

4


Lembramos ainda <strong>de</strong> <strong>um</strong> mal que vem assolando a convivência grupal,<br />

principalmente na escola e entre os jovens. O bullying é mais <strong>um</strong> tipo <strong>de</strong> <strong>violência</strong> que iremos<br />

aqui conceituar. Quando falamos em bullying nos referimos àquelas <strong>de</strong>sagradáveis e aparentes<br />

“brinca<strong>de</strong>iras” tão comuns em escolas: a menina gordinha é chamada <strong>de</strong> “baleia fora d’água”,<br />

o menino magro e alto é conhecido como o “varapau” da escola, aqueles que usam óculos são<br />

chamados <strong>de</strong> “quatro-olhos”, as meninas <strong>de</strong> cabelos crespos são chamadas <strong>de</strong> “cabelo <strong>de</strong><br />

palha” etc.<br />

Bullying é <strong>um</strong> termo da língua inglesa (bully = “valentão”) que se refere a<br />

todas as formas <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>s agressivas, verbais ou físicas, intencionais e<br />

repetitivas, que ocorrem sem motivação evi<strong>de</strong>nte e são exercidas por <strong>um</strong> ou<br />

mais indivíduos, causando dor e angústia, com o objetivo <strong>de</strong> intimidar ou<br />

agredir outra pessoa sem ter a possibilida<strong>de</strong> ou capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r,<br />

sendo realizadas <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> <strong>um</strong>a relação <strong>de</strong>sigual <strong>de</strong> forças ou po<strong>de</strong>r.<br />

(CAMARGO, 2010) 3 .<br />

De acordo com Lopes Neto (2005, p.165) “o bullying diz respeito a <strong>um</strong>a forma <strong>de</strong><br />

afirmação <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r interpessoal através da agressão [...] que possui conseqüências negativas<br />

imediatas ou tardias <strong>sobre</strong> os envolvidos: agressores, vítimas e observadores”.<br />

Segundo Palácios e Rego (2006, p.3) “é o bullying o termo usado para <strong>de</strong>signar a<br />

prática perversa <strong>de</strong> h<strong>um</strong>ilhação sistemática <strong>de</strong> crianças e adolescentes no ambiente escolar.<br />

Tem sido inclusive objeto <strong>de</strong> política explícita <strong>de</strong> combate em estabelecimentos <strong>de</strong> ensino”.<br />

Com todas essas citações e conceitos ficou mais claro enten<strong>de</strong>r que a <strong>violência</strong><br />

abrange muitas manifestações e possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ocorrência. Precisamos, então, nos ater a<br />

essas manifestações para auxiliarmos na correção <strong>de</strong> tais atos e não na sua dissipação.<br />

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS<br />

Nosso trabalho seguiu <strong>de</strong> acordo com o campo dos <strong>estudo</strong>s <strong>de</strong>scritivo-<br />

exploratórios. Po<strong>de</strong>mos dizer que no <strong>estudo</strong> <strong>de</strong>scritivo o pesquisador se aprofunda mais em<br />

<strong>de</strong>talhes específicos da comunida<strong>de</strong> a qual ele escolheu para estudar. No nosso <strong>estudo</strong> esses<br />

<strong>de</strong>talhes foram os tipos <strong>de</strong> manifestações <strong>de</strong> <strong>violência</strong> e fatores que levam a este fenômeno na<br />

escola supracitada.<br />

3<br />

Bullying, por Orson Camargo (Colaborador Brasil Escola). Texto extraído do site da Brasil Escola disponível<br />

em: http://www.brasilescola.com/sociologia/bullying.htm. Acesso em: 31 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 2010.<br />

5


Utilizamos para tal a abordagem qualitativa. Não significa que não tivemos <strong>um</strong>a<br />

noção da quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> manifestações que ocorreram, porém não nos pren<strong>de</strong>mos às questões<br />

<strong>de</strong> quantas ocorreram, investigamos sim o porquê <strong>de</strong>ssas manifestações estarem acontecendo<br />

nessa escola.<br />

Junto à abordagem qualitativa empregamos o <strong>estudo</strong> <strong>de</strong> <strong>caso</strong> como nosso tipo <strong>de</strong><br />

pesquisa. Um <strong>estudo</strong> <strong>de</strong> <strong>caso</strong> significa fazermos <strong>um</strong> <strong>estudo</strong> aprofundado <strong>de</strong> <strong>um</strong> <strong>de</strong>terminado<br />

local, ou fato que ocorre no mesmo.<br />

No nosso <strong>estudo</strong> usamos três instr<strong>um</strong>entos para coleta dos dados, são eles: a<br />

observação simples – registrando nossos achados em <strong>um</strong> diário <strong>de</strong> campo; <strong>um</strong> questionário<br />

com os alunos (em que perguntamos – em <strong>de</strong>z questões – basicamente o que eles enten<strong>de</strong>m<br />

por <strong>violência</strong>, se vêem a ocorrência em seu bairro, na sua escola, e nas aulas <strong>de</strong> Educação<br />

Física, <strong>de</strong>ntre outras questões); e usamos do artifício da entrevista semi-estruturada com os<br />

professores (perguntamos <strong>de</strong> forma diferenciada praticamente as mesmas questões, porém<br />

inserimos a questão da exclusão <strong>de</strong> forma mais explícita que com os alunos).<br />

Para execução do trabalho, no que diz respeito à população pesquisada, visitamos<br />

todas as terças e sextas-feiras, das 13h50min às 15h30min, no período <strong>de</strong> março a maio <strong>de</strong><br />

2011, a Escola Estadual Secretário <strong>de</strong> Estado Francisco Rosa Santos – localizada no bairro<br />

Bugio, zona norte <strong>de</strong> Aracaju/SE –, sendo que, mais precisamente, acompanhamos as aulas <strong>de</strong><br />

Educação Física (teóricas e práticas) das turmas do 1º Ano “X” e do 9º Ano “Y” sendo<br />

respectivamente as turmas do ensino médio e do ensino fundamental maior.<br />

Temos então que os sujeitos da nossa pesquisa foram os 64 alunos das duas<br />

turmas investigadas e os dois professores <strong>de</strong> Educação Física <strong>de</strong>ssas mesmas turmas.<br />

Para garantir o anonimato dos alunos investigados pedimos que os alunos não<br />

assinassem a folha <strong>de</strong> questionário, porém para usarmos em nossa análise as falas dos<br />

mesmos, nomeamos as folhas <strong>de</strong> acordo com a série e a número <strong>de</strong> alunos da turma, exemplo:<br />

9º/1, 9º/2 ... 9º/34, 1º/1, 1º/2 ... 1º/30.<br />

Quanto aos Professores referimo-nos a eles como P1 e P2, sendo respectivamente<br />

os professores da turma do Ensino Fundamental e do Ensino Médio.<br />

Com isso, <strong>de</strong> maneira geral, por mais que queiramos dar conta da “totalida<strong>de</strong>” do<br />

fenômeno pesquisado, dificilmente conseguimos isso, mesmo assim, pensamos que <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong><br />

nossas possibilida<strong>de</strong>s coletamos os dados necessários para a análise e conclusão do nosso<br />

trabalho.<br />

6


APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS<br />

Neste momento tratamos com proprieda<strong>de</strong> <strong>sobre</strong> os dados <strong>de</strong> ocorrência da<br />

<strong>violência</strong> na escola estudada. Foram aplicados 64 questionários envolvendo os alunos das<br />

duas turmas – alunos que tem ida<strong>de</strong>s entre 12 e 18 anos – sendo que 41% tinham a ida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

14 anos. Em relação ao sexo, a gran<strong>de</strong> maioria (64%) dos pesquisados eram meninas.<br />

No que tange aos professores, tivemos dois entrevistados do sexo masculino, com<br />

ida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> 40 e 50 anos, com mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos <strong>de</strong> formação, sem especialização e funcionários<br />

da escola por <strong>um</strong> período superior a oito anos.<br />

Fazendo <strong>um</strong> <strong>apanha</strong>do geral <strong>sobre</strong> o questionário temos que a maioria dos alunos<br />

entrevistados se refere à <strong>violência</strong> como sendo algo que cresce muito, que acontece em todos<br />

os lugares e que envolve <strong>violência</strong> física e verbal. Foram citados, também, a <strong>violência</strong> ao<br />

patrimônio, o bullying, o preconceito e a <strong>violência</strong> contra a mulher, porém, em parcelas bem<br />

menores.<br />

Ao perguntarmos <strong>sobre</strong> as <strong>violência</strong>s que os alunos conhecem 92% marcaram a<br />

<strong>violência</strong> física, seguidos do empate <strong>de</strong> 81% para agressão verbal e bullying. Apenas 39%<br />

marcaram a <strong>violência</strong> ao patrimônio e 12%, a <strong>violência</strong> simbólica.<br />

Quando questionamos <strong>sobre</strong> a ocorrência da <strong>violência</strong> na escola 75% dos alunos<br />

marcaram já ter presenciado <strong>de</strong>sentendimentos e discussões nesse ambiente, porém, nas aulas<br />

<strong>de</strong> Educação Física, apenas 30% disse existir.<br />

Essa pequena parcela nos inquietou, pois em nossas observações constatamos <strong>um</strong>a<br />

triste manifestação simbólica da <strong>violência</strong>, que é a exclusão <strong>de</strong> muitos alunos que não faziam<br />

a aula e preferiam, aparentemente, passar todo o tempo da aula a conversar.<br />

Refletimos aqui <strong>sobre</strong> as três importantes dimensões dos conteúdos, em que<br />

Darido refere-se na citação abaixo, focamos <strong>sobre</strong> a importância da dimensão atitudinal no<br />

que se reporta ao comportamento dos alunos e reflexão dos mesmos. A autora diz:<br />

O papel da Educação Física ultrapassa o ensinar esporte, ginástica, dança,<br />

jogos, ativida<strong>de</strong>s rítmicas, expressivas e conhecimento <strong>sobre</strong> o próprio corpo<br />

para todos, em seus fundamentos e técnicas (dimensão procedimental), mas<br />

inclui também os seus valores subjacentes, ou seja, quais atitu<strong>de</strong>s os alunos<br />

<strong>de</strong>vem ter nas e para as ativida<strong>de</strong>s corporais (dimensão atitudinal). E,<br />

finalmente, busca garantir o direito do aluno <strong>de</strong> saber por que ele está<br />

realizando este ou aquele movimento, isto é, quais conceitos estão ligados<br />

àqueles procedimentos (dimensão conceitual). (DARIDO, 2001.p.21)<br />

7


Em relação à opinião dos professores tivemos a semelhança em alg<strong>um</strong>as questões<br />

e a discordância em outras. Quando falamos <strong>sobre</strong> o contexto da <strong>violência</strong> no bairro em que<br />

se encontra a escola e a cida<strong>de</strong> em que a mesma se localiza constatamos que os dois<br />

consi<strong>de</strong>ram a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Aracaju <strong>um</strong> local violento em relação ao espaço territorial da mesma,<br />

e no que se refere ao bairro eles afirmam não ser o tão violento, e sim as localida<strong>de</strong>s invasivas<br />

que cercam o mesmo.<br />

Sobre a ocorrência da <strong>violência</strong> na escola estudada, suas respostas assemelharam-<br />

se a dos alunos. Disseram que muitos fatos já ocorreram nessa escola, tanto <strong>de</strong> discussões<br />

verbais até a morte <strong>de</strong> <strong>um</strong> adolescente <strong>de</strong>ntro da escola.<br />

No que diz respeito às aulas <strong>de</strong> Educação Física <strong>um</strong> dos professores falou não<br />

haver <strong>violência</strong> em suas aulas, porém em <strong>de</strong>terminado momento da entrevista se contradisse<br />

ao falar que já ocorreram brigas <strong>de</strong> meninas no momento da Educação Física. O outro<br />

professor falou que acredita sim que as aulas <strong>de</strong>ssa disciplina propiciam tais ocorrências, pela<br />

própria dinâmica da disciplina, pelos choques a que eles estão dispostos por conta dos jogos,<br />

brinca<strong>de</strong>iras e ativida<strong>de</strong>s que acontecem. Ele diz ainda que cabe ao professor lidar com tais<br />

ocorrências para que não sejam coisas corriqueiras e difíceis <strong>de</strong> solucionar.<br />

Para a<strong>de</strong>ntrarmos mais especificamente na análise dos dados em relação aos<br />

nossos objetivos separamos em três eixos temáticos o nosso <strong>estudo</strong> analítico.<br />

Investigando Conceitos<br />

Esse eixo refere-se aos conceitos dados pelos alunos e professores acerca da<br />

<strong>violência</strong>. Constatamos que a maioria dos alunos afirma que a <strong>violência</strong> não é algo que atinge<br />

apenas a pessoa em seu sentido físico, e que envolve várias outras manifestações. Foram<br />

bastante usados termos que dizem respeito a todo mal que atinge o outro. Po<strong>de</strong>mos verificar<br />

alguns conceitos dados pelos alunos:<br />

Violência [...] é tudo o que atinge <strong>de</strong> forma ruim e nos <strong>de</strong>ixa mal. (Aluno<br />

9º/1)<br />

São vários tipos <strong>de</strong> agressões, seja ela física ou verbal, coisa que ninguém<br />

gosta, mas que existe muito no mundo. (Aluno 9º/3)<br />

É <strong>um</strong> ato on<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixa pessoas feridas [...] e a também <strong>um</strong> tipo <strong>de</strong> <strong>violência</strong><br />

que <strong>de</strong>ixa pessoas triste e muito <strong>de</strong>cepcionada. (Aluno 9º/5)<br />

8


Essa amplitu<strong>de</strong> do conceito <strong>de</strong> <strong>violência</strong>, percebida por nós, é compartilhada pela<br />

autora Mirian Abramovay que separa três dimensões para conceituar a <strong>violência</strong>, e assim não<br />

exclui nenh<strong>um</strong> fator. Ela fala que<br />

o ponto <strong>de</strong> partida é consi<strong>de</strong>rar que se trata <strong>de</strong> <strong>um</strong> fenômeno complexo e<br />

múltiplo e, portanto, sua conceituação <strong>de</strong>ve ser a mais ampla possível. Desta<br />

forma, consi<strong>de</strong>ra-se aqui o conceito <strong>de</strong> <strong>violência</strong> em <strong>um</strong>a perspectiva que<br />

abarca múltiplas dimensões. Uma <strong>de</strong>las se refere aos <strong>caso</strong>s que envolvem<br />

danos físicos que indivíduos po<strong>de</strong>m cometer contra si próprios ou contra os<br />

outros. Outra dimensão é o conjunto <strong>de</strong> restrições, que se dá no plano das<br />

instituições e que impe<strong>de</strong> que os indivíduos usufruam plenamente <strong>de</strong> seus<br />

direitos fundamentais, abrangendo, portanto, as modalida<strong>de</strong>s da <strong>violência</strong><br />

simbólica e institucional. A terceira dimensão correspon<strong>de</strong> às incivilida<strong>de</strong>s e<br />

micro-<strong>violência</strong>s, que cost<strong>um</strong>am ser as modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>violência</strong> mais<br />

recorrentes e comuns no cotidiano. (ABRAMOVAY, 2008, p.7-8)<br />

Pensando nessas variações, observemos que outros sujeitos abordaram a <strong>violência</strong><br />

das mais diversas maneiras que conhecemos. Falaram <strong>sobre</strong> <strong>violência</strong> verbal, física, ao<br />

patrimônio, bullying, e outras. Veja tais exemplos nos <strong>de</strong>poimentos que seguem:<br />

Eu entendo que é alg<strong>um</strong> tipo <strong>de</strong> agressão tanto por palavras quanto por<br />

agressão física. (Aluno 9º/4)<br />

Violência é <strong>um</strong>a coisa que acontece constantemente em todos os lugares. Há<br />

<strong>violência</strong> contra crianças, adolescentes, idosos e principalmente contra<br />

mulheres. Há o bullying que é constantemente nas escolas, que é preconceito<br />

contra alunos [...]. (Alunos 1º/17)<br />

Bom pelo que eu sei existem vários tipos <strong>de</strong> <strong>violência</strong>, tem <strong>violência</strong> verbal e<br />

física e a <strong>violência</strong> <strong>de</strong> patrimônio que é <strong>um</strong>a pessoa que agri<strong>de</strong> <strong>um</strong><br />

patrimônio público ou particular. (Aluno 9º/11)<br />

Na conclusão <strong>de</strong>sse eixo consi<strong>de</strong>ramos viável recordar que nossos conceitos<br />

revelados na introdução, que envolviam a <strong>violência</strong> física, verbal, patrimonial, o bullying,<br />

foram refletidas e comentadas também pelos alunos, o que nos faz perceber que, os sujeitos<br />

da pesquisa não vêem a <strong>violência</strong> com aquele olhar reduzido ao sentido físico.<br />

Verificamos, por fim, diante da fala <strong>de</strong> <strong>um</strong>a aluna, a angústia da mesma em<br />

relação ao que gera <strong>violência</strong> (física) e encerramos esse primeiro eixo com essa fala/reflexão<br />

que se assemelha a citação que segue logo abaixo.<br />

A aluna diz que:<br />

A <strong>violência</strong> verbal <strong>de</strong>via para porque a <strong>violência</strong> às vezes começa por causa<br />

<strong>de</strong>la. (Aluno 1º/19)<br />

9


Violência na Escola<br />

E o autor nos afirmou o mesmo pensamento da seguinte forma:<br />

Aristóteles con<strong>de</strong>na o uso das palavras <strong>de</strong> baixo calão porque, da agressão<br />

verbal, passa-se facilmente à agressão física. (CORBISIER, 1991, p.214)<br />

Criamos esse eixo porque nos preocuparmos com o que está sendo feito, por parte<br />

dos professores, com os alunos agressores, no sentido <strong>de</strong> orientá-los para que não repitam tais<br />

atos. Uma inquietação registrada pelos alunos é em relação ao local on<strong>de</strong> ocorre a <strong>violência</strong>.<br />

É triste perceber que os alunos já consi<strong>de</strong>ram as suas escolas locais tão violentos a<br />

ponto <strong>de</strong> chamarem-na até mesmo <strong>de</strong>: “o local on<strong>de</strong> mais ocorre <strong>violência</strong>”. Notemos as<br />

reflexões <strong>sobre</strong> <strong>violência</strong> na escola pela fala abaixo:<br />

Violência é <strong>um</strong>a coisa ruim que cada dia que passa vai crescendo no nosso<br />

dia-a-dia. E o lugar que mais se vê isso é nas escolas, é muito triste isso<br />

porque no lugar on<strong>de</strong> era pra ter mais união, amiza<strong>de</strong> é lugar que na maioria<br />

das vezes há mais mortes e brigas. (Aluno 1º/1)<br />

No colégio que fizemos esse <strong>estudo</strong> <strong>de</strong> <strong>caso</strong>, a maioria dos alunos disse já ter<br />

presenciado manifestações <strong>de</strong> <strong>violência</strong> no ambiente escolar e citaram variados motivos para<br />

os mesmos: agressão verbal que gera a agressão física, brigas por causa <strong>de</strong> namoro,<br />

brinca<strong>de</strong>iras <strong>de</strong> mau gosto, apelidos ou até mesmo pela disputa <strong>de</strong> <strong>um</strong>a ca<strong>de</strong>ira.<br />

Nas falas abaixo constatamos alguns <strong>de</strong>sses motivos:<br />

Foi duas meninas que começaram a brigar por causa <strong>de</strong> namorado. (Aluno<br />

9º/5)<br />

Tudo começou por causa <strong>de</strong> <strong>um</strong> giz que r<strong>um</strong>aram em mim, quando eu fui em<br />

cima <strong>de</strong>le <strong>de</strong>i vários socos na cara <strong>de</strong>le. (Aluno 9º/30)<br />

Porque quando <strong>um</strong>a pessoa passa e a outra começa a apelidar e a outra não<br />

gosta aí começa <strong>um</strong>a briga. (Aluno 9º/33)<br />

Percebemos que as brigas acontecem por tantos motivos irrisórios. Se colegas<br />

chegam à agressão física por causa <strong>de</strong> <strong>um</strong>a ca<strong>de</strong>ira, como conseguirão lidar com situações<br />

conflituosas que passarão no <strong>de</strong>correr <strong>de</strong> suas vidas?<br />

Sabemos das dificulda<strong>de</strong>s existentes, porém é nossa obrigação agir. Usamos a fala<br />

<strong>de</strong> <strong>um</strong> dos professores entrevistados para refletirmos <strong>sobre</strong> as atitu<strong>de</strong>s dos professores perante<br />

tais situações, vejamos abaixo:<br />

10


O professor, ele tem que saber impor. Como ele tem que saber impor, ele<br />

também tem que apren<strong>de</strong>r a ce<strong>de</strong>r. [...] Você tem que ter a maior calma e<br />

fazer com que, a pessoa que está envolvida se acalme também. A pessoa está<br />

exaltada então, ele não olha pra ninguém, então no momento que você vai<br />

querer conversar com essa pessoa você tem que saber lidar, o professor não<br />

po<strong>de</strong> ficar <strong>de</strong>sesperado. [...] Hoje, o ensino, a parte educacional, é mais<br />

voltada para o prazer do professor estar em sala <strong>de</strong> aula, até mais do que a<br />

parte financeira, é o prazer <strong>de</strong> você estar ensinando, porque se não tivesse o<br />

prazer a gente não ia querer estar ensinando. (P1)<br />

Muito verda<strong>de</strong>ira a fala final da reflexão do professor P1, pois, se realmente não<br />

se tem prazer em estar na sala <strong>de</strong> aula, ensinando seus alunos, vendo na maioria a vonta<strong>de</strong> da<br />

ascensão através da educação, não estaríamos ali, passando por todas as dificulda<strong>de</strong>s as quais<br />

passamos diariamente.<br />

Finalizamos esse eixo com <strong>um</strong>a rica reflexão da autora Mirian Abramovay <strong>sobre</strong> a<br />

<strong>violência</strong> no ambiente escolar. Ela pronuncia que:<br />

[...] nos estabelecimentos <strong>de</strong> ensino, a <strong>violência</strong> não é vivenciada apenas<br />

como atos <strong>de</strong> agressivida<strong>de</strong>, e sim como o modo habitual e cotidiano <strong>de</strong><br />

relacionamento, <strong>de</strong> tratamento do outro. (ABRAMOVAY, 2008, p.9)<br />

Ou seja, a <strong>violência</strong> é também conseqüência e fruto <strong>de</strong> como tratamos o outro. E<br />

na escola cabe ao professor intermediar esse tratamento, e sempre que necessário intervindo<br />

junto aos pais dos alunos, pois tal presença, se não é tida como algo normal, <strong>de</strong>ve ser cobrada<br />

pela escola, que, não <strong>de</strong>ve tentar solucionar o problema sozinha.<br />

Violência na Educação Física: excluir violenta?<br />

Deixamos as <strong>violência</strong>s ocorridas nas aulas <strong>de</strong> Educação Física para serem<br />

tratadas no último eixo e assim acabamos por contemplar nossos objetivos específicos.<br />

Infelizmente, apesar <strong>de</strong> todos os conceitos expostos pelos sujeitos da pesquisa em nosso<br />

primeiro eixo temático, a <strong>violência</strong> na Educação Física foi unanimemente vista como algo que<br />

remete apenas ao sentido físico. E, mais lamentável ainda é que a gran<strong>de</strong> maioria dos alunos<br />

alegou não haver <strong>violência</strong> nessas aulas.<br />

Sendo assim, <strong>de</strong>ntre a minoria dos entrevistados, que são os alunos que afirmaram<br />

já ter presenciado cenas <strong>de</strong> <strong>violência</strong> (física) nas aulas <strong>de</strong> Educação Física, a maior parte<br />

11


assegura que tais manifestos acontecem por <strong>de</strong>sentendimentos no jogo <strong>de</strong> futsal. Vejamos<br />

alguns dos <strong>de</strong>poimentos dos alunos:<br />

Sempre por causa <strong>de</strong> besteira, às vezes até por causa <strong>de</strong> <strong>um</strong> jogo <strong>de</strong> futebol.<br />

(Aluno 1°/30)<br />

Outro motivo banal, <strong>um</strong> chute, a bola acertou a cabeça <strong>de</strong> alguém e a briga ta<br />

feita. (Aluno 1º/7)<br />

Porque o gol que eu fiz disseram que não valeu aí tive <strong>de</strong>sentendimento com<br />

eles. (Aluno 1º/21)<br />

Tivemos, pelo menos mais uns cinco <strong>de</strong>poimentos como esses, que praticamente<br />

repetem o mesmo discurso. Acreditamos que realmente existam esses motivos relacionados<br />

aos jogos propostos nessa disciplina, porém será que eles realmente não percebem a exclusão<br />

como <strong>um</strong>a <strong>violência</strong>?<br />

Vimos em nossas observações que <strong>um</strong>a das turmas quase não tinha aulas práticas,<br />

mas quando tinham os meninos é <strong>quem</strong> ocupavam a maior parte da quadra, sempre jogando<br />

bola. Duas meninas brincavam <strong>de</strong> bola em <strong>um</strong> pequeno espaço e as <strong>de</strong>mais ficavam sentadas,<br />

conversando.<br />

Na outra turma, gran<strong>de</strong> parte das aulas eram práticas e muitos meninos e meninas<br />

participavam, porém ainda assim existe aqueles alunos que ficavam <strong>de</strong> canto, encostados, sem<br />

participar. Conversando com alguns <strong>de</strong>sses alunos eles disseram não participar, muitas vezes,<br />

porque não dava para todos pela escassez do material ou pela má distribuição do espaço.<br />

Vejamos o que alguns sujeitos dizem <strong>sobre</strong> isso:<br />

Não, eu nem jogo bola, vôlei e tênis. Fico sentado (Aluno 9º/25)<br />

Assim por causa <strong>de</strong> alg<strong>um</strong>a brinca<strong>de</strong>ira que vários querem brincar, mas as<br />

vezes <strong>um</strong> não <strong>de</strong>ixa o outro brincar, e assim começa <strong>um</strong>a briga (Aluno 9º/33)<br />

[...] se você vai fazer <strong>um</strong>a ativida<strong>de</strong> com muita gente vai haver intriga<br />

porque começa a se chocar <strong>de</strong>mais porque o espaço é muito pouco, aí eles<br />

começam a se juntar <strong>de</strong>mais e isso é ruim. Eles se sentem excluídos<br />

justamente por isso, eles sabem que não vão participar, porque não vai dá,<br />

pelo tempo ser curto e pela quantida<strong>de</strong> dos presentes, então eles vão ser<br />

excluídos e a gente as vezes nem po<strong>de</strong> fazer nada [...] (P1)<br />

Metaforizando <strong>um</strong> dito popular, ouvimos que só sabe o que é ser excluído <strong>quem</strong><br />

passa por isso, peguemos, então, o exemplo <strong>de</strong> como a nossa disciplina é tratada na escola<br />

diante das <strong>de</strong>mais disciplinas e nos colo<strong>quem</strong>os no local daquele aluno para enten<strong>de</strong>r que o<br />

12


que os outros pensam, falam e fazem conosco <strong>de</strong>ixam marcas profundas em nosso ser e em<br />

nossas atitu<strong>de</strong>s.<br />

Mauro Betti referiu-se à Educação Física como sendo <strong>um</strong>a disciplina que engloba<br />

tudo, que trabalha com tudo. Vejamos essa fala, para que possamos enten<strong>de</strong>r nossa reflexão:<br />

Ora, <strong>de</strong> modo alg<strong>um</strong> é novida<strong>de</strong> dizer que a Educação Física respon<strong>de</strong> e<br />

sempre respon<strong>de</strong>u às necessida<strong>de</strong>s e interesses <strong>de</strong> cada tempo/espaço<br />

histórico. Às vezes <strong>esquece</strong>mos o óbvio, e é bom então retomá-lo. Em<br />

tempos <strong>de</strong> guerra, a Educação Física serviu à preparação militar; em tempos<br />

<strong>de</strong> nacionalismo exacerbado, serviu à formação <strong>de</strong> valores cívicos; quando o<br />

esporte ass<strong>um</strong>iu posto central na cultura corporal <strong>de</strong> movimento,<br />

esportivizou-se; em tempos <strong>de</strong> doenças, proclamou-se seu valor higiênico, e<br />

assim por diante. (BETTI, 2009, p.18)<br />

O que queremos expor com tudo isso, e sem fugir ao ponto principal <strong>de</strong>sse eixo –<br />

exclusão – é que, se a própria caracterização histórica da nossa disciplina, da nossa prática <strong>de</strong><br />

trabalho, passou por tantas variações para chegar ao que temos hoje, <strong>de</strong>ve-se ao que cada <strong>um</strong><br />

<strong>de</strong> nós (professores <strong>de</strong> Educação Física) fizemos <strong>de</strong>la e com ela.<br />

Ou seja, se estamos à margem da escola, ou se somos <strong>de</strong>svalorizados perante as<br />

outras disciplinas, esses fatos condizem com o que nós mesmos fazemos da nossa área. Cabe<br />

a cada <strong>um</strong> <strong>de</strong> nós escolhermos reproduzir o que se fala, ou então, <strong>quem</strong> sabe, construir novos<br />

valores. Que tal começar agora <strong>um</strong> novo jogo? Com a participação <strong>de</strong> todos, é claro!<br />

CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

Após todas as fases da pesquisa vem a consi<strong>de</strong>rada pelo autor, talvez, a mais<br />

pessoal, pois aqui temos maior liberda<strong>de</strong> (com coerência) para falar <strong>sobre</strong> o nosso ponto <strong>de</strong><br />

vista efetivamente e mais que isso perceber se alcançamos ou não nossos objetivos e se<br />

respon<strong>de</strong>mos ao nosso problema.<br />

A <strong>violência</strong> na escola tem a<strong>um</strong>entado bastante nos últimos tempos. Logicamente<br />

sabemos que quando nos <strong>de</strong>bruçamos para estudar <strong>de</strong>terminado fenômeno qualquer notícia<br />

que nos lembre o mesmo nos serve <strong>de</strong> alerta, porém <strong>de</strong> uns tempos para cá é notório, não<br />

apenas para <strong>quem</strong> está estudando esse fato, que a <strong>violência</strong> no ambiente escolar tem ganhado<br />

espaço na mídia.<br />

Com tudo o que foi exposto por nós até aqui e com todas as informações extraídas<br />

em nossa coleta <strong>de</strong> dados chegamos a conclusão que os jovens consi<strong>de</strong>ram a <strong>violência</strong> sendo<br />

13


algo bem mais além da forma física e seus olhares estão voltados mais ainda para o sentido da<br />

agressão verbal como maior incidência <strong>de</strong> <strong>violência</strong> na escola. Em segundo momento é que a<br />

<strong>violência</strong> física entra, e muitas vezes como conseqüência da verbal.<br />

No que se refere às causas <strong>de</strong> tais manifestações na escola percebemos que, o<br />

aluno ser reconhecido na escola, se afirmar como figura conhecida e temida pelos <strong>de</strong>mais, faz<br />

eles se sentirem mais po<strong>de</strong>rosos e assim inibem, muitas vezes, as fragilida<strong>de</strong>s existentes. Seja<br />

por problemas <strong>de</strong> relacionamento em casa, seja pela situação financeira em que se encontram,<br />

ou ainda, por sofrer pressão <strong>de</strong> outro grupo externo ao seu.<br />

A <strong>violência</strong>, muitas vezes, é usada como escudo para as suas próprias fraquezas e<br />

a solução para essa ocorrência é <strong>um</strong> trabalho árduo e intenso que <strong>de</strong>ve ser feito por três partes<br />

concomitantemente – o indivíduo, sua escola (professores e corpo diretivo) e a família. É bem<br />

difícil chegar a resolução <strong>de</strong>sse problema se essas três partes não estiverem empenhadas e<br />

com <strong>um</strong> mesmo objetivo.<br />

A família <strong>de</strong>ve ser o suporte primordial na educação dos indivíduos, e<br />

infelizmente a <strong>de</strong>sestrutura familiar tem crescido bastante nos últimos tempos, porém nada<br />

<strong>de</strong>sobriga a família (os pais ou responsáveis) <strong>de</strong> negligenciar a educação, cuidado e apoio dos<br />

seus. A escola entre para complementar essa educação, aguçando principalmente o intelecto<br />

dos seus alunos, o pensamento crítico e sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> resolução <strong>de</strong> problemas pondo, na<br />

frente <strong>de</strong> tudo, o respeito ao próximo e o conhecimento dos seus direitos e <strong>de</strong>veres enquanto<br />

cidadão.<br />

E por fim o indivíduo <strong>de</strong>ve perceber que existem modos outros, que não a<br />

<strong>violência</strong>, para solucionar os mais variados problemas que se passa conosco enquanto seres<br />

h<strong>um</strong>anos, munidos <strong>de</strong> sentimentos e reações que fazem <strong>de</strong> nós diferentes e iguais ao mesmo<br />

tempo.<br />

Acima <strong>de</strong> tudo temos que enten<strong>de</strong>r o quanto é fundamental apren<strong>de</strong>rmos a<br />

respeitar os gostos, vonta<strong>de</strong>s, interesses a atitu<strong>de</strong>s dos outros. Não somos obrigados a<br />

compartilhar dos mesmos interesses, porém aceitar as diferenças é o primordial para <strong>um</strong>a<br />

convivência civilizada e mais h<strong>um</strong>ana.<br />

REFERÊNCIAS<br />

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ABRAMOVAY, Miriam. Violência, mediação e convivência na escola. In: BRASIL.<br />

Ministério <strong>de</strong> Educação. Temas contemporâneos em educação. TV Escola/ Salto para o<br />

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cultura esportiva e na Educação Física escolar. Motrivivência, Ano XXI, Nº 32/33, P. 16-27<br />

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