1 A REPRESENTAÇÃO DOS CONFLITOS FEMININOS ... - Unesp
1 A REPRESENTAÇÃO DOS CONFLITOS FEMININOS ... - Unesp
1 A REPRESENTAÇÃO DOS CONFLITOS FEMININOS ... - Unesp
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
ANAIS DO X SEL – SEMINÁRIO DE ESTU<strong>DOS</strong> LITERÁRIOS: “Cultura e Representação”<br />
demonstra toda a infelicidade e frustração que a atinge, a sentir que a vida caminha em linha<br />
descendente. “Mary Batson, uma mulher, caminha descalça, agora sobre o tapete verde da sala,<br />
em sua insônia pontiaguda, qual lâmina afiada. Anseia pela luz do dia, que a conduzirá de novo<br />
para a companhia dos outros, embora superficial e provisória” (UVC, p. 58).<br />
No segundo conto, com o insólito título “Reflexões sobre a (in)existência de papai<br />
Noel”, Mary inicia sua narrativa em uma sessão de psicanálise com o Dr. Klaus sobre o impacto<br />
da descoberta da inexistência do papai Noel. É claro que essa descoberta é uma metáfora da<br />
perda das fantasias por parte da protagonista que chegara aos 40 anos, desiludida e amarga.<br />
Sabe, Dr. Klaus, acho que o senhor já podia me dar alta da análise. Não acredito que ainda<br />
possa fazer alguma coisa por mim. Eu sou isso – meus conflitos, minha insatisfação, minhas<br />
carências afetivas, essa constante e dolorosa sensação de perda. Acima de tudo, minha<br />
solidão. São coisas que me doem, mas que também aprecio, porque essas coisas sou eu.<br />
(UVC, p. 75)<br />
A atividade de análise se não resolveu suas angústias afetivas, mostrou-lhe que é<br />
possível conviver com as frustrações e traumas: “É quase certo que vou carregar minha<br />
esquisitisse até a morte” (UVC, p. 78). Se para ela o “potencial do amor secou” nem mesmo o<br />
sexo livre lhe daria algum prazer: “E talvez falasse de seus últimos casos amorosos, tão<br />
decepcionantes. Não se apaixonava mais por ninguém e estava achando todos os homens<br />
horrendos, menos o seu analista” (UVC, p. 79).<br />
Ao contrário de Lola e Madalena, na faixa dos 30 anos e que ainda acreditam<br />
encontrar um amor, Mary mostra todo o peso da realidade á uma mulher de 40 anos, sozinha,<br />
trabalhando para sobreviver e sem ilusões: “A análise me mostrou que as fantasias são só<br />
fantasias. Agora estou procurando olhar de frente o real , mas não me sinto nada animada.<br />
Queria que o senhor invertesse tudo, que devolvesse minhas fantasias, mostrasse que a<br />
realidade é mágica” (UVC, p.80). Sabendo que a análise não poderá devolver as ilusões e<br />
fantasias perdidas, Mary resolve encerrar o tratamento, sabendo que precisa “curtir a dor” de<br />
viver a realidade.<br />
Nos dois contos que representam a história de Mary Batson, assim como outros da<br />
coletânea, é recorrente a imagem da heroína de histórias em quadrinhos Mary Marvel que dizia<br />
shazan e voava. Essa projeção na imagem da heroína com superpoderes reflete o desejo<br />
dessas personagens na sua busca incessante de superação dos conflitos e de liberdade:<br />
7