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[1º Ano] Platão - Fedro - Charlezine

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Novamente, obriga-os a se aproximar, contra a vontade, não lhes concedendo muito<br />

repouso, e, depois de breve intervalo de receio, ele os lembra do amado esquecido e os<br />

obriga - aos relinchos e empuxões - a tentarem novo assalto ao objeto amado. E quando<br />

deste se aproximam, o mau cavalo se precipita, estende a cauda, morde o freio puxandoo<br />

sem pudor. Mas o cocheiro, ainda mais impressionado que antes, logo se retrai,<br />

repuxando com mais força o freio do cavalo mau. Escorre-lhe o sangue da língua e das<br />

mandíbulas, apertadas que tem a um tempo as pernas e as ancas de encontro ao chão,<br />

pelos maus tratos do guia. Depois de sofrer tudo isso, o mau cavalo amansa e segue o<br />

governo do cocheiro. Agora, quando vê o belo, quase morre de medo.<br />

Só então a alma do amante segue, com receio e pudor aquele que ama.<br />

Entretanto, o jovem que se vê mimado e honrado como um deus pelo seu amante,<br />

tem desperta em si a necessidade de amar. Se antes, os seus amigos ou outras pessoas<br />

lhe denegriram esse sentimento, afirmando ser vergonhoso tal consórcio amoroso, e se<br />

esses conselhos o afastaram do seu amante, o tempo que passa, a idade, a necessidade<br />

de amar e de ser amado, levam-no, de novo, aos braços do amante. Não é desígnio do<br />

fado que o malvado ame o malvado e que um homem virtuoso não possa ser amado pelo<br />

homem virtuoso. Quando o amado recebe o amante, que desfrutou da sua doçura e do<br />

seu convívio, compreende que o afeto de seus amigos e parentes em nada é comparável<br />

ao de um amante inspirado pelo delírio. Assim vivem, se veem e se tocam, ora nos<br />

estádios, ora em outros lugares. Assim nasce essa emanação que Júpiter, quando amara<br />

Ganímedes, chamou de desejo. Esse desejo se insinua no amante, e quando este se<br />

encontra cheio dele, transborda. Do mesmo modo que um zéfiro ou que um som<br />

refletido por um corpo sólido e polido, também as emanações da beleza, entrando pelos<br />

olhos através dos quais - como lhe é natural - atingem a alma, volta esta ao belo, estende<br />

as asas e, molhando-as, as torna capazes de gerar novas asas, inundando também de<br />

amor a alma do amado. Ele ama, mas sem saber o quê. Nem sabe, nem pode dizer o que<br />

aconteceu consigo; assim como um contaminado de oftalmia desconhece a origem de<br />

seu mal, assim também o amado, no espelho do amante, viu-se a si mesmo sem dar por<br />

isso. Na presença do amado a dor do amante se esvai, e o mesmo sucede com este na<br />

presença daquele. Quando o outro está longe, o amante sente tristeza, e da mesma forma<br />

esta sacode o amado, porque ele abriga o reflexo do amor - acreditando, contudo, que se<br />

trata de amizade, e não de amor. Embora com menor intensidade, deseja aproximar-se<br />

do outro, vê-lo, tocá-lo, acariciá-lo, deitar-se ao seu lado e, assim, não tardará a<br />

satisfazer o seu desejo. Enquanto está a seu lado, o corcel indócil do amante tem muitas<br />

coisas a dizer ao cocheiro. Como recompensa de tantos sofrimentos, ele apenas pede um<br />

instante de prazer. O corcel do amado nada diz, mas, sentindo algo que ele não<br />

compreende, toma o amante nos braços e cobre-o dos mais ternos beijos.<br />

Não tem forças para recusar os favores que o amigo lhe pede. Mas o bom corcel e o<br />

cocheiro resistem, em nome do pudor e da razão.<br />

Se a melhor parte da alma sair vitoriosa e os conduzir a uma vida bem ordenada e<br />

filosófica, eles passarão o resto de sua vida felizes e em harmonia, sob o comando da<br />

honestidade, reprimindo a parte da alma que é viciosa e libertando a outra que é<br />

virtuosa. E ao morrer recebem asas e ficam leves, pois venceram um dos três combates<br />

verdadeiramente olímpicos, o maior bem que a sabedoria humana ou a loucura divina<br />

podem proporcionar a um homem. Mas se se entregam a uma vida em comum sem<br />

filosofia, e contudo honesta, poderá suceder que os dois corcéis rebeldes assumam o<br />

domínio num momento de embriaguez ou de descuido. Os cavalos indomáveis dos dois<br />

amantes, dominando suas almas pela surpresa, os conduzirão ao mesmo fim. Eles se<br />

entregarão ao tipo de vida mais invejável aos olhos de vulgo, e se atirarão aos prazeres.<br />

Satisfeitos, gozarão ainda estes mesmos prazeres, mas raramente, porque esses mesmos

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