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[1º Ano] Platão - Fedro - Charlezine

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SÓCRATES: - Ficaste agastado, caro <strong>Fedro</strong>, porque caçoei contigo atacando o<br />

homem a quem adoras. Acreditas realmente que eu me atreverei a competir em<br />

sabedoria com esse homem?<br />

FEDRO: - Quanto a isso, caro amigo, estás numa situação semelhante à minha, de há<br />

pouco. Tens de falar como melhor puderes. Mas tome cuidado para não imitar o feio<br />

costume dos autores de comédias, cujas personagens estão sempre devolvendo uma à<br />

outra as mesmas palavras! Não me obrigues a dizer: “se eu pudesse enganar-me a<br />

respeito de Sócrates, também seria capaz de me esquecer” e “ele tem vontade de falar,<br />

mas finge não querer”! Lembra-te que não sairemos daqui enquanto não tiveres<br />

exprimido aquilo de que, segundo disseste, o teu coração está cheio! Estamos sós, num<br />

lugar ermo e afastado dos homens, e eu sou o mais forte e o mais moço. Reflete no que<br />

te digo! Não me obrigues à violência! Fala! Faze-o voluntariamente, se não preferes<br />

falar à força!<br />

SÓCRATES: - Meu bem-aventurado <strong>Fedro</strong>! Eu me tornaria ridículo se, ignorante<br />

como sou, falasse sem estar preparado, concorrendo com um autor tão perfeito!<br />

FEDRO: - Sabes de uma coisa? Deixa de melindres. Não demora que eu diga uma<br />

coisa com que te obrigarei a falar.<br />

SÓCRATES: - Não precisas pronunciá-la.<br />

FEDRO: - Direi, sim. Minha declaração, porém, terá a forma de um juramento. Jurote...<br />

mas por qual dos deuses?<br />

Queres que jure por este plátano? Pois bem, se não fizeres o teu discurso perante esta<br />

árvore, nunca mais te mostrarei nem te repetirei discurso algum.<br />

SÓCRATES: - Ó homem sagaz! Com que astúcia soubeste encontrar um meio de<br />

obrigar a fazer o que exiges a um homem que é apaixonado por discursos!<br />

FEDRO: - Então por que ainda hesitas?<br />

SÓCRATES: - Depois do juramento que fizeste, não me esquivarei mais. Como<br />

poderia eu renunciar a tais alegrias?<br />

FEDRO: - Então fala.<br />

SÓCRATES: - Sabes o que farei?<br />

FEDRO: - O quê?<br />

SÓCRATES: - Falarei com a cabeça encoberta. Quero terminar o discurso o mais<br />

depressa possível e não me envergonhar olhando para ti.<br />

FEDRO: - Mas fala! Quanto ao resto, podes fazer o que quiseres.<br />

O primeiro discurso de Sócrates<br />

SÓCRATES: - A vós invoco, Musas! Pouco importa que vos chameis “sonoras” por<br />

causa da doçura do vosso canto ou que esse epíteto vos venha do musical povo dos<br />

lígios! Auxiliai-me no discurso que este ótimo homem me obriga a fazer, para que seu<br />

amigo, que já antes se lhe afigurava sábio, seja considerado mais sábio ainda!<br />

Pois bem: houve outrora um rapaz belíssimo, ou melhor, houve um mancebo que<br />

tinha grande número de adoradores. Um destes era muito esperto. Ele, que realmente<br />

amava o rapaz como todos os outros, convenceu-o de que não o amava. Ao tentar<br />

conquistá-lo, esforçou-se por persuadi-lo de que antes se devem conceder favores ao<br />

que não ama do que ao apaixonado. Um dia dirigiu-lhe o seguinte discurso: em todas as<br />

coisas, meu rapaz, para que se tome uma resolução sábia é mister saber sobre o que se<br />

delibera, pois, de outro modo, certamente nos enganamos. A maioria dos homens não<br />

nota, entretanto, que ignora a essência das coisas. Isso porém não os impede de acreditar<br />

erroneamente que a conhecem; segue-se daí que no começo de uma pesquisa não<br />

definem as suas opiniões, acontecendo depois o que era esperado: tais pessoas não

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