[1º Ano] Platão - Fedro - Charlezine
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SÓCRATES: - Quem não segue esse método é como se caminhasse às cegas. Mas<br />
quem examina uma coisa de acordo com a arte não pode ser comparado a um cego nem<br />
a um surdo e, obviamente, quem expõe um assunto artisticamente deve definir com<br />
exatidão a natureza desse assunto. Ora, tal assunto é a alma.<br />
FEDRO: - Isso mesmo.<br />
SÓCRATES: - É esse, pois, o objeto do seu esforço. A persuasão é o que ele, orador,<br />
se esforça para produzir. Não é isso?<br />
FEDRO: - Claro que é.<br />
SÓCRATES: - Logo, é evidente que Trasímaco e os outros, que procuram ensinar a<br />
arte retórica, deveriam antes descrever com exatidão o que é a alma e mostrar-nos se ela<br />
é por natureza uma coisa simples, ou se, como o corpo, é multiforme. Isso é o que se<br />
chama definir a natureza de um objeto.<br />
FEDRO: - Perfeitamente.<br />
SÓCRATES: - Em segundo lugar nos mostrarão qual seja a ação que, por sua<br />
natureza, a alma é capaz de exercer sobre outras coisas, e qual a influência que pode<br />
sofrer por parte dessas.<br />
FEDRO: - Sim.<br />
SÓCRATES: - Em terceiro lugar, deve-se classificar os gêneros de discursos e de<br />
almas, mostrar as influências que estes sofrem e as causas de tais influências, relacionar<br />
cada gênero do primeiro grupo com cada um do segundo e ensinar por qual espécie de<br />
discursos cada gênero de almas é necessariamente persuadido, apontar as causas de tal<br />
fato, e as razões pelas quais outros gêneros não se deixam convencer.<br />
FEDRO: - Na verdade, esse parece ser o melhor método.<br />
SÓCRATES: - Evidentemente, meu amigo. A não ser desse modo, nem este assunto<br />
nem outro qualquer poderá ser discutido ou descrito com arte. Mas os que atualmente<br />
escrevem sobre a arte de compor discursos, os homens que tu conheces, são astutos: têm<br />
conhecimentos sobre a alma, mas escondem-nos. Entretanto, não daremos crédito à sua<br />
arte enquanto não falarem e escreverem da seguinte maneira...<br />
FEDRO: - De que maneira?<br />
SÓCRATES: - Não é muito fácil exprimi-lo com palavras. Direi, porém, de um<br />
modo geral, como se deve escrever para que a exposição seja tão artística quanto o<br />
assunto o permite.<br />
FEDRO: - Então dize!<br />
SÓCRATES: - Visto que a força da eloquência consiste na capacidade de guiar as<br />
almas, aquele que deseja tornar-se orador deve forçosamente conhecer quais formas<br />
existem na alma. Elas são em certo número e têm as suas respectivas qualidades. É por<br />
isso que os homens têm caracteres diferentes. Depois de classificar as almas desse<br />
modo, deverá distinguir, também, cada espécie de discurso em suas diferentes<br />
qualidades.<br />
Desse modo, há homens que serão persuadidos por certos discursos, enquanto os<br />
mesmos argumentos terão pouca ação sobre a alma de outros.<br />
É mister que o orador que aprofundou suficientemente os seus conhecimentos seja<br />
capaz de discernir rapidamente, na vida prática, o momento exato em que é oportuno<br />
usar uma ou outra forma de argumentação. Se assim não for, ele nunca saberá mais do<br />
que sabia quando ainda andava na escola. Quando for capaz de dizer por qual espécie de<br />
discurso se pode levar à persuasão as mais diferentes almas, quando, posto à frente de<br />
um indivíduo, ele souber ler no seu coração e souber reconhecer para si mesmo: eis o<br />
homem, eis o caráter que os meus mestres pintaram. Quando souber aplicar a esse<br />
homem o discurso apropriado, quando possuir todos esses conhecimentos, quando<br />
souber discernir o momento em que deve se calar ou falar, quando souber empregar ou