Cartas Familiares e Bilhetes de Paris - Logo Metasys
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Inglaterra pelos Normandos; a batalha <strong>de</strong> Azincourt, que <strong>de</strong>u meta<strong>de</strong> da França aos Ingleses;<br />
a batalha <strong>de</strong> Lutzen, em que morreu Gustavo Adolfo e que terminou a Guerra dos Trinta Anos;<br />
a batalha <strong>de</strong> Marengo, que entregou a Itália aos Franceses, outras muitas foram pelejadas<br />
com menos <strong>de</strong> oitenta mil homens.<br />
Foi pois esta uma cerimónia gran<strong>de</strong>mente militar, apesar <strong>de</strong> que o chefe do exército, segundo<br />
a constituição, estava no landau, <strong>de</strong> casaca, entre as senhoras. E tão bela, na sua totalida<strong>de</strong> e<br />
nos seus <strong>de</strong>talhes, provando tão soberbamente a gran<strong>de</strong>za militar readquirida pela França,<br />
que logo <strong>de</strong>pois, ao almoço, no meio <strong>de</strong> quinhentos oficiais, o czar ergueu o seu copo <strong>de</strong><br />
champanhe e proclamou a confraternida<strong>de</strong> <strong>de</strong> armas entre Franceses e Russos.<br />
Portanto, amigos, esta visita certamente pôs no espírito do senhor <strong>de</strong> todas as Rússias muita<br />
segurança, porque ele verificou que este povo que lhe esten<strong>de</strong> os braços, há três anos, como<br />
noivo <strong>de</strong>slumbrado, é na sua cida<strong>de</strong> em festa extremamente doce, e é no campo em armas<br />
extremamente forte.<br />
Ora, que mais se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sejar num amigo, com quem se vai trilhar um bocado <strong>de</strong> caminho na<br />
história, do que muita doçura aliada a muita força?<br />
Mas o povo francês, esse, com que segurança ou certeza ficou <strong>de</strong>pois que a vasta Rússia veio<br />
a <strong>Paris</strong>, na pessoa um pouco franzina e melancólica <strong>de</strong>sse seu césar a que ela chama<br />
paizinho! Essa impressão talvez se resuma nas palavras consi<strong>de</strong>ráveis que eu ouvi a um<br />
condutor <strong>de</strong> ónibus. Chovia: apenas três passageiros ocupavam as longas banquetas <strong>de</strong><br />
veludo; e o digno homem, na plataforma, filosofava sobre as festas russas, com um sujeito<br />
bilioso, zarolho, <strong>de</strong> barbicha rala e ruiva, que parecia minado por um cepticismo mortal.<br />
O imenso ónibus parara na estação do Arco da Estrela. E o condutor concluiu, à pressa, num<br />
gesto que trasbordava e triunfava:<br />
– Enfim, seja como for!... Agora é trabalhar para a Exposição, e já se não está sempre com<br />
medo e po<strong>de</strong>m vir os reis e os imperadores, sem que a república fique aí para um canto<br />
envergonhada!<br />
Admirei esta síntese. E senti que ela resumia numa forma grossa e rápida, numa forma<br />
a<strong>de</strong>quada a um ónibus, o sentimento das classes que se chamam dirigentes.<br />
Este homem <strong>de</strong> boné agaloado, que vive carimbando bilhetes, sem dúvida pertence por<br />
nascimento, se não já por direito <strong>de</strong>mocrático, à casta política. Há nele em botão um próximo<br />
conselheiro municipal, talvez um <strong>de</strong>putado, em todo o caso um dirigente. E a sua opinião sobre<br />
a amiza<strong>de</strong> franco-russa, ainda que enunciada sem elegância académica, não seria <strong>de</strong>certo<br />
<strong>de</strong>smentida pelos altos corpos do Estado.<br />
Mas o sentimento do povo miúdo, das classes dirigidas, esse mais especialmente me foi<br />
revelado por um pequeno <strong>de</strong> sete anos, que toda esta tar<strong>de</strong>, sob os castanheiros e as faias do<br />
jardim vizinho, brandindo uma ban<strong>de</strong>ira russa e esporeando um corcel <strong>de</strong> pau, ainda não<br />
cessou <strong>de</strong> ganir esta copla <strong>de</strong>cisiva:<br />
La Russie, la France,<br />
Se donnant la main,<br />
Gar<strong>de</strong>n l’ espérance<br />
D’aller à Berlin<br />
Dire ao vieux Guillaume...<br />
Através da folhagem copada que este fusco Outubro ainda não arrancou do arvoredo, não<br />
logrei perceber o que a França e a Rússia, assim <strong>de</strong> mãos dadas, iam a Berlim dizer ao velho<br />
Guilherme... E porquê ao velho Guilherme? Esse avô augusto morreu. E agora há em Berlim<br />
um Guilherme novo, a quem é excessivamente perigoso o dizer coisas.<br />
Em todo o caso, a copla esganiçada do meu pequeno vizinho <strong>de</strong>senha muito graficamente a<br />
atitu<strong>de</strong> das duas nações que se entrefestejam. A França, a Rússia, com efeito, <strong>de</strong>ram as