Versão em PDF – 14.9 MB - Fundação Cultural Palmares
Versão em PDF – 14.9 MB - Fundação Cultural Palmares
Versão em PDF – 14.9 MB - Fundação Cultural Palmares
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
É isso. O Curuzu é uma favela<br />
abandonada pelo governo baiano<br />
preocupado <strong>em</strong> batizar tudo com o nome<br />
de certo Deputado morto.<br />
Curuzu de becos estreitos que ligam às<br />
ruas de baixo à Santa Mônica e aos frades.<br />
O Curuzu fica no bairro mais negro do<br />
Brasil. O Bairro da Liberdade. Não a<br />
liberdade de São Paulo, dos japoneses<br />
que operam sua própria economia e<br />
gerenciam seus próprios bancos. Ali,<br />
na Liberdade baiana, até atendente de<br />
banco t<strong>em</strong> olho azul.<br />
No Curuzu falta asfalto pelos lados da<br />
avenida Cariri e o esgoto da rua Nadir de<br />
Jesus ainda esta a céu aberto, a escola é<br />
capenga, o lixo anda espalhado, ali, onde<br />
fica o primeiro bloco afro do Brasil. Onde<br />
eu nasci.<br />
O Curuzu é o meu jardim do Éden,<br />
NARRATIVAS<br />
Integrante da Campanha Reaja<br />
ou será morta! Reaja ou será<br />
Morto!, militante do Movimento<br />
Negro Unificado/Bahia, ator e<br />
poeta maloqueiro.<br />
onde meu umbigo fertiliza a terra. Onde<br />
a ginga de um preto rebrilha uma força<br />
indizível, uma mágica estupenda sob o sol.<br />
Eu nasci de parto natural, minha<br />
avó me aparou e cortou rapidamente o<br />
cordão umbilical que estava enlaçado <strong>em</strong><br />
meu pescoço. Diz minha velha tia, Dona<br />
Antonieta, que eu chorei na barriga, por<br />
isso saberei o dia de minha morte.<br />
Por precaução, meu umbigo foi enterrado<br />
num pé de mangueira lá no meu quintal,<br />
onde hoje fica a oficina, ao pé da ladeira,<br />
na baixada mesmo.<br />
L<strong>em</strong>bro dos candomblés de Dona Roxa<br />
que nos oferecia mungunzá quente e história<br />
de gente morta, visagens andavam pela<br />
roça do maluco assombrando o povo.<br />
Meu amigo Gabriel disse-me certa<br />
vez, que assombração mesmo era<br />
quando <strong>em</strong> noites de lua-cheia o maluco<br />
23