Versão em PDF – 14.9 MB - Fundação Cultural Palmares
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civilizações que já haviam<br />
tido contato com a Ásia e<br />
com as Américas. Esta é<br />
uma história que t<strong>em</strong>os que<br />
contar mais.<br />
Precisamos falar mais<br />
também sobre Chico Rei,<br />
Dom Obá, “o Cabra”,<br />
aquele artista que se paresentou<br />
no Cristo morto<br />
que esculpiu a pedido de<br />
um senhor, que representou<br />
sua agonia nas pedras<br />
de rubi que <strong>em</strong> seguida<br />
colocou na obra. Nossas<br />
crianças precisam ouvir<br />
mais sobre a Zeferina<br />
do Quilombo do Urubu,<br />
Acotirene e tantas outras<br />
mulheres que começaram<br />
a história no Brasil.<br />
A tradição institui um<br />
t<strong>em</strong>po, às vezes o recria,<br />
inventa. Ela faz isso através<br />
de ritos capazes de<br />
fazer, por ex<strong>em</strong>plo, comidas<br />
brasileiras ser<strong>em</strong><br />
apreciadas por ancestrais<br />
africanos. O rito muda<br />
até os tipos e as características<br />
das folhas. E<br />
qu<strong>em</strong> t<strong>em</strong> esse saber não<br />
revela; qu<strong>em</strong> sabe não<br />
conta porque o rito ao<br />
mesmo t<strong>em</strong>po que descobre,<br />
encobre uma série<br />
de coisas. E aqui quero<br />
evocar velhos tios e tias<br />
que não somente tinham o<br />
poder de “encantar<strong>em</strong>-se”,<br />
transformar-se <strong>em</strong> pedras,<br />
peixes, aves, mas também<br />
de estar<strong>em</strong> <strong>em</strong> dois lugares<br />
ao mesmo t<strong>em</strong>po.<br />
Patrimônio t<strong>em</strong> a ver<br />
com M<strong>em</strong>ória e esta se não<br />
pode ser s<strong>em</strong>pre algo viva,<br />
depende dos vivos para está<br />
s<strong>em</strong>pre atualizada. S<strong>em</strong> dúvida<br />
alguma, o maior patrimônio<br />
são as pessoas, ou<br />
trazendo presente o velho<br />
provérbio, os que nasc<strong>em</strong> é<br />
que são s<strong>em</strong>pre vivos.<br />
A fim de ilustrar este fato<br />
me permitam evocar o final<br />
de uma fala de uma sacerdotisa<br />
jeje mahin da cidade<br />
de Cachoeira ao interromper<br />
a sua biografia. Após<br />
quase duas horas de entrevista,<br />
com a sua voz falhando<br />
por causa da sua idade,<br />
Luiza Franquelina da Rocha<br />
como ela costumava se<br />
apresentar ou Gaiaku Luiza<br />
falou: É um pouco da minha<br />
história. Se você quiser<br />
venha a noite. Gosto<br />
mesmo é de falar a noite.<br />
A Noite eu conto mais.<br />
Eu fico aqui <strong>em</strong> cima sozinha...<br />
Na maioria das vezes<br />
homens e mulheres negras<br />
têm ficado sozinhos.<br />
Ainda está para ser feita<br />
a historia de Mãe Cecília<br />
do Bonocô, “a grande vidente<br />
da Rua da Liberdade”<br />
a qual Edson Carneiro<br />
apenas se deu o trabalho<br />
de escrever esta linha;<br />
Joãozinho da Goméia,<br />
Eduardo de Ijexá, Nezinho<br />
do Portão, Bernadino<br />
da Paixão, Tio Anacleto,<br />
Zé do Vapor, Dona<br />
Baratinha, Gaiaku Luiza<br />
e tantos outros. Pessoas<br />
que viv<strong>em</strong> na m<strong>em</strong>ória<br />
de seus filhos, filhas,<br />
amigos e amigas como<br />
verdadeiros Baba tundê.<br />
Pais e mães s<strong>em</strong>pre presentes,<br />
retornados.<br />
Oxalá, a história destas<br />
pessoas, suas estratégias<br />
de luta nos motive<br />
a fazer cada vez mais a<br />
fazermos um grande ajô,<br />
união, um encontro baseado<br />
<strong>em</strong> caminhos baseados<br />
<strong>em</strong> relações mais justas<br />
que se efetivam <strong>em</strong> praticas<br />
políticas como estas.<br />
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