Murilo Rubião e a narrativa do insólito. Flavio ... - Dialogarts - Uerj
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A principal característica <strong>do</strong> Maravilhoso é a existência<br />
e a procura de fatos sobrenaturais, independentemente da reação<br />
<strong>do</strong>s personagens frente ao fato. O conto li<strong>do</strong> não se esquadra<br />
nesse gênero, pois não ocorre a busca desse acontecimento<br />
sobrenatural nem expectativa de que ele ocorra.<br />
Já o Estranho caracteriza-se pela hesitação de ter que<br />
aceitar ou não a situação insólita como verdadeira, ten<strong>do</strong> que<br />
escolher uma única opção antes que a história chegue ao fim, e<br />
dá-se esclarecimento lógico e racional para o fato. Nota-se que<br />
nesse conto não ocorre essa busca pela verdade nem uma explicação<br />
racional e lógica. O povo prefere não questionar, e sim<br />
aceitá-lo sem explicações.<br />
No conto “O Pirotécnico Zacarias” descarta-se a hipótese<br />
de a <strong>narrativa</strong> ser maravilhosa ou estranha. Pensar-se-á, então,<br />
na possibilidade de ser realista-maravilhosa. Esse gênero<br />
tem como característica principal o encantamento, mas não existe<br />
a presença dessa marca no conto, não poden<strong>do</strong> ser enquadra<strong>do</strong><br />
em tal gênero.<br />
A Ficção Científica e o Terror são outros <strong>do</strong>is gêneros<br />
em que o conto não pode ser enquadra<strong>do</strong> por não apresentar características<br />
evidenciadas. A Ficção Científica é uma forma de<br />
ficção desenvolvida no século XIX, que trabalha principalmente<br />
com o impacto da ciência, tanto verdadeira como imaginada,<br />
sobre a sociedade ou os indivíduos. O termo é usa<strong>do</strong>, de forma<br />
mais geral, para definir qualquer fantasia literária que inclua a<br />
ciência como componente essencial, e num senti<strong>do</strong> ainda mais<br />
geral, para referenciar qualquer tipo de fantasia literária. A <strong>narrativa</strong><br />
rubiana não apresenta nenhuma característica desse gênero<br />
apresenta<strong>do</strong>. O Terror ou Horror existe em qualquer meio<br />
de comunicação em que se pretenda provocar a sensação de<br />
me<strong>do</strong>. Desde a década de 1960, qualquer obra de ficção com<br />
um tema mórbi<strong>do</strong> ou repelente é conhecida <strong>do</strong> público como<br />
um gênero à parte, com grupos de fãs muito específicos que<br />
rendem cultos a subgêneros ou a determina<strong>do</strong>s filmes e litera-<br />
<strong>Murilo</strong> <strong>Rubião</strong> e a <strong>narrativa</strong> <strong>do</strong> <strong>insólito</strong> / ISBN 978-85-86837-31-9 / <strong>Dialogarts</strong> 2007<br />
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tura a eles associa<strong>do</strong>s. Este gênero está intimamente liga<strong>do</strong> à<br />
ficção fantástica e à ficção científica.<br />
Apesar de possuir algumas características <strong>do</strong> gênero<br />
ficcional <strong>do</strong> terror, como um homem morto estar andan<strong>do</strong> pela<br />
cidade tranquilamente, o “Pirotécnico...” não pode ser considera<strong>do</strong><br />
integrante deste gênero, pois não causa espanto e principalmente<br />
me<strong>do</strong> ns pessoas que estão conviven<strong>do</strong> com ele.<br />
A partir <strong>do</strong>s eventos <strong>insólito</strong>s sobre os quais se estruturam<br />
as reações da <strong>narrativa</strong>, verifica-se a possibilidade de que<br />
na obra de <strong>Murilo</strong> <strong>Rubião</strong> ocorra a presença de um novo gênero<br />
literário: o Insólito Banaliza<strong>do</strong>. A morte vivenciada pelo<br />
personagem principal e a reação <strong>do</strong>s rapazes que o atropelam é<br />
algo que foge à expectativa quotidiana. Não há dúvida se aceitam<br />
ou não o acontecimento como possibilidade de ocorrer; eles<br />
apenas aceitam, banalizan<strong>do</strong> o fato.<br />
Verifica-se que o conto não se filia ao Fantástico, pois<br />
além de não ocorrer qualquer hesitação em relação à morte <strong>do</strong><br />
personagem-narra<strong>do</strong>r, nota-se total banalização por parte <strong>do</strong>s<br />
personagens que o cercam, mesmo daqueles que a princípio<br />
manifestam uma dúvida, mas logo em seguida aceitam o fato<br />
com naturalidade.<br />
Outro aspecto que pode ser aborda<strong>do</strong> no conto “O Pirotécnico<br />
Zacarias” é o fato de ele apresentar epígrafes bíblicas.<br />
<strong>Murilo</strong> <strong>Rubião</strong> utiliza-se desses versículos bíblicos para dar ênfase<br />
ao que será conta<strong>do</strong>. O versículo bíblico <strong>do</strong> conto foi retira<strong>do</strong><br />
<strong>do</strong> livro de Jó no Velho Testamento.<br />
Jó foi um homem que sofreu na carne to<strong>do</strong> tipo de <strong>do</strong>r<br />
pelo amor que tinha por Deus. E mesmo ten<strong>do</strong> perdi<strong>do</strong> tu<strong>do</strong><br />
que possuía, Jó não duvi<strong>do</strong>u e nem negou Deus, e no final recuperou<br />
tu<strong>do</strong> o que ele perdeu, e em <strong>do</strong>bro. Percebe-se que Zacarias<br />
tem uma segunda chance para mudar sua história; mesmo<br />
ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>, morto, ele não foi venci<strong>do</strong> por isso,<br />
e no final consegue até ultrapassar a morte, tornan<strong>do</strong>-se uma<br />
pessoa mais feliz.<br />
<strong>Murilo</strong> <strong>Rubião</strong> e a <strong>narrativa</strong> <strong>do</strong> <strong>insólito</strong> / ISBN 978-85-86837-31-9 / <strong>Dialogarts</strong> 2007<br />
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